Enquanto cursavam a faculdade de Administração, em meados de 2004, Marcelo Furtado e Rodrigo Silveira, 35, já queriam empreender. Como, na época, falava-se muito em biodiesel, pensaram em montar uma usina de biocombustível. Passaram um ano envolvidos no projeto, deixando inclusive seus estágios de lado (Marcelo trabalhava na PepsiCo e Rodrigo, na Kaiser) mas ainda não era hora e, um ano depois dessa experiência, ambos foram trabalhar no mercado financeiro. As trajetórias seguiram tão parecidas que, novamente de forma sincronizada, se incomodaram com a impessoalidade da área e decidiram pular fora. Agora sim, era hora de empreender — e assim nasceu o Convenia, uma HRTech, como são conhecidas as startup que atuam na área de Recursos Humanos. No caso, o negócio oferece serviços para otimizar e desburocratizar o RH, da contratação ao desligamento de um funcionário.
O ponto de virada na vida dos colegas de faculdade aconteceu em 2012. “Estávamos insatisfeitos com o sentido da vida que tínhamos na época, porque o propósito do mercado financeiro é ganhar dinheiro, mas não queríamos mais estar ali, meramente pelo dinheiro. Pedi demissão e logo depois o Rodrigo pediu, sem muito combinar”. Se eles já tinham plano B? Não mesmo! “Desde picolé na praia até colocar um foguete no espaço a gente pensou em fazer”, conta Marcelo.
A ideia do negócio veio quando começaram a olhar para trás e se deram conta de que, apesar da carreira promissora que tinham, sentiam-se mal geridos, como conta o empreendedor:
“As empresas em que trabalhávamos não viam pessoas como algo importante, viam apenas mais um número ali. Se você dá resultado e o resultado dá lucro, você vai receber um bônus, então seu feedback é dinheiro na conta”
Feedback, aliás, foi a palavra que deu o “click” de que era preciso mudar. “Um exemplo que me marcou muito foi uma avaliação de desempenho anual necessária para que o bônus fosse distribuído. Lembro que, nessa época, um chefe falou ‘olha, faz o seguinte: preenche lá a sua (avaliação) e me traz aqui, que eu assino’. Mas será que esse meu chefe sabia fazer gestão de pessoas?”, questiona o administrador.
Ele prossegue: “Talvez pela forma como fizeram com ele, não via tanta importância em orientar os funcionários a desenvolver a carreira da melhor forma”. Foi questionando esse modus operandi que Marcelo e Rodrigo pensaram em uma forma de oferecer tecnologia para gestão de pessoas em empresas de pequeno e médio porte. Nascia, em 2013, a primeira versão do Convenia.
COMO DESENGESSAR PROCESSOS BUROCRÁTICOS
A questão crucial da startup, desde o início, é sensibilizar a gestão de pessoas por meio de software. Pode parecer paradoxal pensar em como a tecnologia “humaniza” os processos burocráticos, mas é aí que entram os bons exemplos, na visão de Marcelo. “A gente pensou em tecnologia para empresas que supervalorizam o funcionário e sua capacidade criativa, como fazem a Google, a Unilever e o Facebook, que têm capacidade financeira e contratam profissionais de RH muito bons”.
Só que, no caso do Convenia, a ideia é oferecer isso para empresas de pequeno e médio porte. “Soluções para as grandes empresas já existem e a gente quer que as pequenas e médias possam competir com as grandes. Uma SAP, uma Totvs têm muito mais força pra investir em inovação.” Marcelo ainda diz:
“A área de Recursos Humanos sempre foi muito manual, com muita papelada e um gap de tecnologia muito grande”
Ele conta que para mudar esse cenário, pensou junto com Rodrigo em um software que fosse barato, fácil de usar e com tecnologia em nuvem. Investiram 200 mil reais de recursos próprios e, para viabilizar a parte tecnológica, se juntaram a Anderson Poli, 30, que cuidou da parte de programação do software e o colocou efetivamente no ar.
O Convenia oferece uma cartela de produtos — com teste gratuito — como gestão de ponto, de folha de pagamento e de férias. Dentre as mil empresas clientes, estão companhias como Bradesco Seguros, NotreDame Intermédica e SulAmérica. “É como se fosse uma loja para o RH. A empresa pode vir aqui e comprar só a solução de benefícios ou tudo o que precisa e o preço varia de acordo com o nível do serviço, a quantidade de funcionários e o tamanho da solução necessária.” A startup não quis informar o faturamento, mas a mensalidade no modelo SaaS vai de 400 a 20 mil reais, em média.
Para otimizar os serviços oferecidos, a empresa que contrata o Convenia precisa ter um histórico de dados dos funcionários e, em 70% dos casos, a startup participa ativamente do processo de importação desse banco e auxilia na busca de informações junto ao contador do cliente. Os serviços por meio de software só não incluem recrutamento e seleção. “O Convenia gerencia o colaborador a partir do momento em que é contratado e durante toda a vida dele dentro da empresa. Assim que ele é admitido, consegue preencher, pela nossa plataforma, todos os dados, tirar cópia dos documentos de seus dependentes, mandar foto pelo celular. O RH só acompanha esse processo”, fala o cofundador.
FEEDBACK TAMBÉM FAZ PARTE DO COMBO
Para Marcelo Furtado, com a obrigatoriedade a partir desse ano, das empresas aderirem ao eSocial (programa do governo federal que unificará informações trabalhistas), os serviços que a startup oferece serão ainda mais relevantes. “É uma mudança gigantesca para as empresas porque a comunicação tem que ser em tempo real. Se o funcionário sai de férias, você tem que mandar as informações imediatamente para o governo. É um exemplo de que o RH não pode mais ser manual, só papel”.
E, se foi por causa de um feedback feito sem a devida importância que o empreendedor passou a questionar a gestão de pessoas em geral, o Convenia não poderia deixar de facilitar esse processo. “A gente cria todo um ambiente para que a avaliação de desempenho seja possível. O próprio gestor pode convidar o funcionário pela plataforma para oferecer o feedback Mas mesmo com esses recursos tecnológicos, nada vai superar o contato humano.”
Marcelo prossegue: “O software permite enviar alertas sobre as coisas mais simples, como lembrar que um funcionário está prestes a fazer um ano, até as mais complexas, como mostrar que dois funcionários no mesmo cargo recebem de forma desigual” É justamente por meio da integração e cruzamento desses dados que surgem retratos como o seguinte: em uma determinada companhia, para as funções de analista, há 50% de homens e 50% de mulheres ocupando esse papel. Mas quando se trata do cargo de coordenador, homens passam a 70%. “A gente não consegue resolver o problema, mas consegue mostrar que ele existe. Aí, depende da gestão tomar uma atitude.”
MAIS DO QUE AUTOMATIZAR, ELES QUEREM HUMANIZAR O RH
O Convenia, segundo seu sócio fundador, já lançou vários micro produtos que não deram em nada, que o mercado não comprou. Isso porque, na visão dele, o entendimento inicial era de que as companhias brasileiras precisavam de softwares para estimular engajamento dos funcionários, fazer avaliação de desempenho etc.
Mas isso, por incrível que pareça, era uma necessidade mais avançada. De imediato, o problema era outro, diz Marcelo: “A gente viu que as dores eram mais altas na gestão de RH e que as empresas nem conseguiam pensar nisso ainda. Elas precisavam do básico”. Agora que afinaram o básico, o cofundador acredita que, de fato, a startup está “resolvendo a vida de alguém” e trazendo feedbacks positivos para os próprios fundadores por parte dos clientes.
A startup acaba de lançar um novo módulo de folha de pagamento totalmente integrado ao eSocial e, em breve, disponibilizará um novo módulo de benefícios.
Os próximos passos, “mais abstratos” na visão do próprio fundador, são levar empatia e diversidade à gestão de pessoas à medida em que permite às empresas conhecerem melhor seus funcionários e suas diferenças. Isso pode parecer óbvio para departamentos pessoais, mas na prática não é.
“O mundo está cada vez mais polarizado. O fenômeno da informação chegar a qualquer aparelho fez com que todas as opiniões possam ser ouvidas, mas você só segue opiniões parecidas com as suas. A falta de diversidade está levando o ser humano ao extremismo. Falta ouvir um pensamento diferente, por ouvir, e não para tentar argumentar contra. Espero levar um pouco disso ao RH”, diz Marcelo, com fé nas mudanças que o Convenia pretende provocar.
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