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Como a Strider precisou se adaptar, sem perder a essência, após ser comprada

Marina Audi - 2 ago 2018
O CEO Luiz Tangari conta como foi o processo de aquisição de sua startup pela multinacional Syngenta.
Marina Audi - 2 ago 2018
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Antes mesmo de ser perguntado, Luiz Tangari, 43, cofundador e CEO da Strider – proprietária do primeiro software de monitoramento e controle de pragas brasileiro e criadora de uma plataforma para controle operacional das propriedades rurais – diz que, de vez em quando, gosta de voltar a ler a reportagem publicada pelo Draft em dezembro de 2016, quando contamos a história do surgimento da startup, fundada no final de 2013.

Na época, carro-chefe da empresa era o Strider Protector, cujo mantra de venda continua a ser: “aplicar os defensivos no tempo certo é a única forma de manter os custos sob controle, proteger a safra e garantir produtividade”. O Protector usa informação georreferenciadas, imagens de satélite e sensores para indicar ao agricultor onde e quando usar o defensivo agrícola. Com essa tecnologia, a empresa monitorava 1,2 milhão de hectares em 500 fazendas do Brasil, Austrália, Bolívia, EUA, México e tinha 40 funcionários.

A história da Strider foi contada pela primeira vez no Draft no final de 2016 (clique no link para ler mais).

No mês da primeira publicação, a Strider também tinha acabado de lançar o segundo produto desenvolvido pela empresa, o Space – que usa tecnologia espacial para realizar análise histórica das safras e informar as áreas com falha de desenvolvimento vegetal, perda de biomassa e estresse hídrico em uma fazenda. Estava ainda no roadmap de desenvolvimento o Tracker – equipamento embarcado nos tratores a fim de rastrear ativos e indicar, em tempo real, a posição das máquinas no campo.

Os números atuais da startup tiveram incremento. A equipe dobrou de tamanho e, hoje, são 4 milhões de hectares monitorados com soluções da Strider, em cerca de três mil fazendas. Em volume de contratos, são 2 mil, pois há clientes que têm mais de uma fazenda. Isso significa que a empresa detém 3% de market share. Luiz fala mais a respeito: “O Brasil tem 60 milhões de hectares produtivos. Desses, calculamos que aproximadamente, 40 milhões sejam de agricultura empresarial. No final, esse é o tamanho da pizza que dividimos. Estamos chegando perto de 10% de hectares monitorados. A meta para 2018 é avançar nos dois dígitos”.

Um padrão de expansão se manteve: 5% dos clientes estão no exterior. A Strider segue com atuação mais forte no Brasil, o mercado que considera, junto com os Estados Unidos, o mais promissor e evoluído em relação a tecnologias para o agronegócio, mas já expandiram para Colômbia, Paraguai e Moçambique.

Um novo produto, focado no pequeno produtor rural (com pouco fôlego para usar tecnologia), surgiu no final de 2017. Chamado de Base, trata-se de um software que faz todo o controle financeiro para fazendas menores, uma versão bem mais simples das soluções já testadas. O Base possibilita a comparação de performance de cada variedade cultivada e dos produtos usados. Em suma, o sistema dá a última linha do balanço e diz se a fazenda vai ter lucro ou prejuízo. Luiz conta: “Estamos trabalhando com as cooperativas para sermos úteis aos pequenos produtores, para termos uma oferta que eles suportem e consigamos desenvolver esse mercado. Hoje, temos uma equipe que cuida só desse segmento”.

OS DESAFIOS DE EXECUÇÃO DE UM HARDWARE PARA QUEM É DE SOFTWARE

Entre os atuais produtos comercializados pela Strider, o que mais cresce em termos de número de clientes é o Tracker. Paradoxalmente, ele também é a solução que mais trouxe desafios – e problemas – para a empresa superar.  Luiz fala:

“Estamos aprendendo o que é fazer produção de hardware em volume industrial. Não imaginávamos que seria tão difícil. O processo de incluir esse conhecimento para dentro da empresa deu muito trabalho”

Para fazer o acompanhamento do caminho que os tratores percorrem na fazenda, o Tracker precisa de um rádio embarcado no trator e de torres colocadas na fazenda. A fabricação desses equipamentos envolve produção de placas eletrônicas, além da programação do software. É a esse processo de fabricação que Luiz refere-se ao dizer: “Tivemos de alugar uma planta industrial com robô para produzir as placas. Primeiro fomos fazer na China, atualmente, estamos em Contagem (MG). Depois, acertamos a segunda etapa de montagem mecânica, que é injetar o plástico e colocar a placa dentro”.

O Tracker: olhando assim parece inofensivo. Mas a produção do hardware foi um desafio e tanto para a Strider.

Ele continua com o “desabafo” sobre as dificuldades dessa jornada: “A empresa teve que lidar com o custo de estoque, engenharia de fábrica de hardware, escolher o melhor equipamento e fornecedores. O GPS é de uma empresa, o processador é de outra, o rádio é de uma terceira, o chip vem de Israel… É uma dinâmica diferente para nós. E ainda estamos tentando terceirizar a terceira etapa, o controle de qualidade que, no momento, é feito dentro da Strider”.

Depois de pronto, o Tracker é instalado nas fazendas por funcionários da Strider e também por revendas e assistências técnicas autorizadas. A montagem de equipe costuma ser motivo de preocupação para gestores, mas o CEO afirma que o maior gargalo da empresa foi mesmo a capacidade de execução. Por ser um negócio que cresce muito rápido, em um segmento que também muda muito rápido, a operação é complexa.

Sob o aspecto de gestão de pessoas, a solução encontrada pela liderança da startup para uma boa execução foi trazer profissionais competentes, como conta o fundador:

“Quando há pessoas com fome de fazer, tudo o que se precisa é sair da frente delas! Dar autonomia para resolverem os problemas, conseguir os recursos necessários e dar contexto para saberem em que negócio estão”

No período entre a primeira reportagem e esta, a estratégia da Strider para aumentar a base de clientes e hectares monitorados andou em paralelo com a ideia de atender mais intensivamente cada hectare. Ou seja, a empresa se propôs a aumentar a quantidade de softwares, produtos usados e valor gerado para cada hectare que já estava na base.

“Se quiséssemos expandir hectare de forma rápida era muito fácil. Era só distribuir o software de graça, em modelo freemium e deixar o cliente brincar um pouquinho. Mas não queremos isso. É preciso ter um equilíbrio entre a base de hectares e a proporção de clientes heavy users”, afirma o CEO. Assim, surgiu o formato de plataforma de serviços que integra de forma transparente os três produtos mais completos da empresa. Como resultado, 15% dos clientes da Strider têm mais de um produto contratado.

Além disso, um outro cenário começou a se desenhar no mercado e impactou os planos de expansão. Os produtores rurais passaram a pedir aos fabricantes de defensivos sistemas de controle para otimizar o uso do produto adquirido. Desta forma, 30% das vendas da startup começaram a ser feitas em conjunto com a Bayer, Dupont e Syngenta. A percepção geral era de que o mercado queria uma solução só. “O cliente não quer comprar pesticida de um, manejo de outro, seguro daquele outro. Ele quer alguém que vá lá e resolva o problema de praga para ele. E se precisar de software para isso, que venha junto”, diz Luiz.

Quando a própria oferta das multinacionais ficou mais complexa e a Strider se viu no meio do caminho, sem ter uma operação independente e fazendo parte de um pacote que oferecia tudo, a startup decidiu aproximar-se e conversar mais com as empresas para acompanhar bem de perto os novos formatos de comercialização.

A VENDA PARA UMA MULTINACIONAL: SONHO CHECKED

No final de março de 2018, a Strider tornou-se a primeira agritech brasileira a ser 100% adquirida por uma multinacional, a Syngenta. Luiz conta que a decisão, tomada em conjunto com os demais sócios Carlos Gonçalves e Gabriela Mendes, permitirá um crescimento mais rápido porque ganharão fôlego para investir e mais acesso aos milhares de clientes da multinacional.

A negociação começou porque a Strider decidiu captar uma rodada de investimento série B. A Syngenta Ventures – braço de investimento da companhia – mostrou interesse e conclui que não fazia sentido investir na empresa se, depois de dois anos, provavelmente, decidiria comprá-la. Então, propuseram o acordo de imediato. “Achei que fazia sentido encurtar o ciclo e desenvolver o negócio focado em um único parceiro. Foi melhor para o time, pois agora temos um posicionamento mais objetivo na oferta conjunta com um fornecedor de peso no mercado”, diz o CEO.

A aquisição teve final feliz também para os outros  investidores, Barn, monashees e Qualcomm Ventures, que saíram contentes com os múltiplos de capital recebidos. Luiz destaca a seriedade que é captar dinheiro e precisar devolver valor: “Ser capaz de cumprir a promessa é uma grande preocupação de quem levanta fundos”.

Luiz conta ainda que, sob o ponto de vista prático, não houve muitas mudanças na startup e que ele continua a ter a mesma liberdade de antes: “O serviço continua igual e a missão permanecem iguais. Continuo trabalhando do mesmo jeito que trabalhava antes”. Logicamente, houve adaptação da governança para alinhamento com a da Syngenta, mas como a Strider tinha sócios-investidores, o time estava habituado a se reportar para fora.

Equipe da Strider reunida no dia do anúncio da aquisição pela Syngenta, em março deste ano.

Passados pouco mais de quatro meses da aquisição, Luiz fala sobre a diferença que viu no modo da Syngenta enxergar a aquisição, em comparação a antigas histórias de outras corporações que destruíram os negócios que compraram por ingerência e desconhecimento de como proceder. “M&A de startup é algo relativamente novo, mas as empresas estão aprendendo rápido. Vimos mais maturidade nesse desenho.” Ele prossegue:

“A Syngenta entendeu que é preciso conservar a cultura e manter a startup boa no que ela é boa. Concordaram que o time de liderança da casa era quem deveria gerir o negócio. Não veio ninguém novo”

Uma coisa, porém, o CEO não tem mais permissão de revelar: o faturamento da empresa. Ele conta apenas que até 2016, quando faturou 25 milhões de reais, a startup triplicava de tamanho. A partir de 2017, passou a duplicar o faturamento. Portanto, se tudo correr bem, em 2018, a Strider seguirá no mesmo ritmo.

A novidade mesmo para Luiz ficou por conta de ter ganho uma carteira de trabalho. Como empreendedor serial, ele nunca se imaginou com um documento desses em mãos. “Agora é um capítulo novo. Não tem drama não. Eu adoro, está ótimo”, diz, em paz com os novos rumos da empresa e da própria vida.

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