Criado oficialmente em meados de 2016, o Instituto Procomum (IP) foi concebido com o propósito de mapear projetos de inovação em Santos, litoral paulista, e criar redes para a transformação social. Desde então, se estabeleceu em uma sede própria, no centro da cidade, com 1 200 metros quadrados distribuídos em inúmeras salas e galpões, utilizados para dinamizar a inovação cidadã e a cultura livre. Isso foi possível graças a um comodato de cinco anos, fruto de uma parceria com a ONG Prato de Sopa, dona do espaço, e com o investimento de 250 mil reais para a reforma da infraestrutura básica.
Se na época da primeira reportagem publicada aqui no Draft, em março de 2017, o IP ainda buscava definir seu modelo de atuação, gestão e financiamento, pode-se afirmar que a iniciativa solidificou seu modo de intervenção (com o incentivo a ações articuladas na prática cotidiana da cidade), diversificou suas fontes de financiamento e viu seus projetos ganharem musculatura. Uma jornada e tanto, que descrevemos a seguir.
Os primeiros investimentos realizados em 2015, 2016 e 2017 pela Fundação Ford, nos valores de 125 mil, 275 mil e 250 mil dólares, respectivamente, permitiram a estruturação do IP e, também, a viabilização de seu primeiro e mais importante projeto, o LAB Santista (LABxS), que reune iniciativas locais com foco em transformar a realidade da região, a partir de um processo de escuta coletiva. Essa primeira experiência desembocou no LAB.IRINTO — Encontro Internacional de Cultura Livre e Inovação Cidadã.
Em 2018, o Instituto obteve validação internacional para operar de acordo com a legislação dos Estados Unidos e o financiamento oriundo da Fundação Ford para o biênio 2018-2019 será de 275 mil dólares. Trata-se de um percurso de institucionalização do IP, como fala Georgia Haddad Nicolau, 32, uma das diretoras: “Os recursos são geridos para fortalecer a organização, sua sustentação e potencial de crescimento a partir da nossa missão e teoria da mudança. É o chamado core funding”.
Uma das primeiras ações do LABxS, o Circuito LABxS, foi ampliada nesse período. Até o momento, 28 iniciativas foram contempladas com uma bolsa de 1,3 mil reais para a viabilização de cada projeto. As iniciativas são variadas, a maioria delas foram propostas por mulheres: construção de banheiros secos; intervenções artísticas; criação de hortas comunitárias; oficinas de autoconhecimento e autocuidado e de móveis com madeira reutilizada.
COLABORAÇÃO E COCRIAÇÃO PARA MUDAR REALIDADES
A ONG, que nasceu em um contexto pós-impeachment de Dilma Rousseff, vê na construção coletiva e na cocriação uma saída para os desafios da sociedade brasileira atual, que são muitos e complexos. Rodrigo Savazoni, 37, cofundador do IP, diz:
“Vivemos em uma sociedade violenta e intolerante. O exercício da cidadania é capaz de promover inovação, trazer soluções a partir da prototipagem de ideias comuns”
Neste contexto, as principais iniciativas que fazem parte do LABxS são A Colaboradora e as residências nacionais e internacionais, que se viabilizam via chamada pública. Na Colaboradora foram selecionados este ano projetos de arte e cultura de 13 artistas e produtores culturais que, durante dez meses, terão acesso gratuito à infraestrutura e à rede articulada do Labxs.
Ao longo deste período, que se encerra em março de 2019, serão realizadas atividades formativas definidas de maneira coletiva pelos seus integrantes. Ou seja, as regras de convivência, cuidado com o espaço, gestão dos recursos e eleição dos cursos serão decididos pelos próprios participantes.
Já o programa de residências, que possui interface direta com A Colaboradora, selecionou cinco artistas em uma lista de 138 inscritos. Entre aqueles que já passaram pelo LABxS, está o mineiro Fernando Hermógenes que instalou o “Museu do Objeto Encontrado” em um das salas do LAB. Um lugar que antes estava sem utilidade definida passou, então, a ser um ponto de encontro, de prosa e criação. Outro exemplo é o argentino Santiago Cao que cartografou o LAB e seu entorno, formando artistas e criadores locais, que agora se tornaram um grupo de trabalho de cartografias.
O artista Nemecio Guerrero, diretor da companhia de danças afrocolombianas Permanencias, estimulou as mulheres negras, moradoras de abrigos e de moradias populares do centro a pensarem sua existência e contarem suas histórias por meio de uma metodologia própria. O residente atual é Sumugan Sivanesan, da Malásia. Ele está trabalhando no projeto “Almoço contra o Trabalho”, promovendo uma série de refeições semanais, valendo-se da diversidade local e da criação de grupos de trabalho de fermentação, jardinagem e explorações na cidade utilizando bicicletas. Todos esses trabalhos serão registrados em um documentário, previsto para ficar pronto no final do ano.
COMO SEGUIR ADIANTE? DIVERSIFICANDO AS FONTES DE FINANCIAMENTO
Para 2019, além da Colaboradora e das Residências, o Instituto deve priorizar os grupos de trabalhos temáticos, sendo eles: Cuidados, Permacultura, Cultura Hacker, Interseccional (Causa LGBT), Audiovisual e Memória e Negritude. Nestes grupos, os projetos são autogeridos. Como pontos de apoio, os grupos contam com os chamados ativadores, como o projeto Germinação e o Santos Hacker Clube. Parte da verba para a manutenção desses grupos veio do ProAC e de editais como o da Lush, marca britânica de cosméticos naturais que teve lojas no Brasil até meados deste ano.
Os planos para 2019 preveem ainda a conclusão de uma série de quatro oficinas (duas delas já realizadas em 2018), com duração de três dias, baseadas na metodologia Active Citizens, que tem como objetivo preparar pessoas para uma cidadania mais ativa a partir da formação de redes de interesses diversos.
A verba de 25 mil reais é oriunda de um projeto global com presença em mais de 50 países do Conselho Britânico. Os participantes poderão se inscrever em um edital realizado anualmente.
Na pauta para o próximo ano está, ainda, a intensificação da agenda internacional do IP, que contará para isso com parte de um financiamento de 60 mil dólares já garantidos por uma instituição familiar, cujo nome não foi revelado. Sobre o tema, Georgia afirma:
“Já passamos por pelo menos dez países, promovendo trocas, ampliando nosso repertório e aprofundando o entendimento e a prática do commons based economy”
Recentemente, ela voltou da Romênia, onde ministrou uma oficina sobre o conceito de commons, ou em tradução livre procomum, e ainda este ano irá para Gana falar sobre “o poder do desaprender e imaginar novos futuros”. Afinal, apesar das mudanças, a missão do IP, seja aqui ou em qualquer outro lugar, permanece a mesma: agir para reconhecer, fortalecer e proteger os bens comuns, evitando que ocorram processos de cercamento pela ação privada ou estatal.
Bem antes que a pandemia mobilizasse o apoio de pessoas a projetos sociais, Murilo Farah e Tati Leite já abraçavam o crowdfunding como ferramenta de transformação. Conheça a trajetória pioneira da Benfeitoria.
Continuamos nossa série sobre mulheres inspiradoras. A conversa de hoje é com Silvana Bahia, diretora do Olabi e coordenadora do PretaLab, projeto de inclusão e mapeamento de negras na tecnologia. Ela fala como o racismo institucionalizado afeta a apuração de dados sobre essas profissionais na área da inovação.
Com apoio do Google, o programa Startup in School é o carro-chefe da consultoria de inovação social, que encoraja o protagonismo dos alunos do Ensino Médio engajando estudantes da rede pública no desenvolvimento de aplicativos para resolver problemas concretos.