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A Omunga cria bibliotecas na África e no sertão do Brasil com doações e vendas de camisetas e material temático

Bibiana Maia - 26 nov 2018
Roberto Pascoal largou a publicidade e foi voluntariar no continente africano. De lá, voltou com a ideia do negócio de incentivo à leitura em regiões carentes e, desde 2013, já foram 15 mil livros doados (foto: Daniel Machado).
Bibiana Maia - 26 nov 2018
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Do Caminho de Santiago de Compostela até a fundação da Omunga, foi um longo caminho trilhado pelo publicitário Roberto Pascoal, de 38 anos. O negócio social, que hoje é a razão de sua vida, leva bibliotecas para o interior do Brasil e de países africanos, desde 2013. Mesmo com sucesso na empreitada, no último ano chegou o momento do empreendedor frear e repensar qual direção deveria seguir para não abandonar sua missão.

Omunga significa união ou unidade, na língua angolana Umbundu. O negócio social tem um modelo triplo de financiamento: compre, doe ou assine. É possível comprar uma camiseta da marca por 69,90 reais, doar qualquer valor através do instituto ou, desde setembro deste ano, assinar o Omunga Clube, por 69,90 reais.

Nesta última opção, o assinante tem acesso, mensalmente, a recompensas como camisetas, livros e vídeos relacionados aos projetos atendidos. A curadoria é feita por especialistas da área de educação e ainda é possível concorrer a uma viagem para conhecer os projetos de perto. O modelo parece redondo, mas chegar a ele não foi tão simples.

ELE LARGOU O TRABALHO EM RÁDIOS PARA VOLUNTARIAR NA ÁFRICA

Quando decidiu que carreira gostaria de seguir, nos idos de 2000, o Jornalismo fez os olhos de Roberto brilharem. Como vários estudantes da área, havia o sonho de estar na bancada de um grande jornal, mas logo ele seguiria outro rumo. Ainda enquanto estagiário da TV RBS, afiliada da TV Globo em Santa Catarina, suas aptidões comerciais foram notadas e ele mudou para o curso de Publicidade na Associação Educacional Luterana Bom Jesus (IELUSC). Aos 23, Roberto já era gerente da Rádio Atlândida, do grupo RBS. Pouco depois, migrou para a Transamérica e , em seguida, para a Jovem Pan.

Roberto em uma de suas visitas a uma escola na região metropolitana de Luanda, em Angola.

Aos 29 anos, conhecido por exigir o máximo de sua equipe, sentiu-se  incomodado com tudo que havia conquistado. Tirou, então, 40 dias para fazer a famoso peregrinação do Caminho de Santiago de Compostela.

Segundo Roberto, não houve uma revelação mágica, ele apenas “olhou para dentro” de si e percebeu que havia “um oceano inexplorado”. Nove meses depois da viagem, amigavelmente, saiu da rádio e passou a frequentar bibliotecas públicas, onde estudava de tudo das 8h às 18h. Nos finais de semana, ele mantinha uma antiga rotina de visitar penitenciárias, asilos e creches.

Veio, então, um insight de usar parte das economias para conhecer o continente africano e fazer trabalho voluntário. Ao buscar ONGs, se deparou com uma lista de exigências acadêmicas que não cumpria, como mestrado. Por sorte, ao tentar algo através de uma agência de viagens, conheceu uma freira que o ajudou a ir para Angola por uma missão católica, onde ficou por três meses. Sentiu-se tão bem que voltou ao Brasil, vendeu o apartamento e o carro e ficou lá por quatro anos. Além do voluntariado, ele conseguiu trabalhar como consultor comercial para a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil). Ele diz:

Trabalhei em tudo quanto é projeto social em Angola, Moçambique e África do Sul”

E prossegue: “Em Angola, tinha recém terminado a guerra civil de 27 anos. Luanda era considerada uma das maiores favelas do mundo. Passava uma Ferrari de um lado e do outro alguém estava morrendo de fome. O país não produzia nada, era tudo importado e muito caro. Pagava 30 reais em uma lata de coca, por exemplo, mas me apaixonei”.

Seis anos após a mudança, ele já havia participado de projetos de padaria comunitária e aulas de informática para jovens. Roberto morou com frades franciscanos e, neste período, além de meditar, lia muito. Dois autores transformaram sua perspectiva de vida: John Wood, de Saí da Microsoft para mudar o mundo, e o prêmio Nobel da Paz Muhammad Yunus, autor de O banqueiro dos pobres. Com tantas fontes de inspiração, os anseios do que viria a ser a Omunga começaram a ficar mais claros.

AS DIFICULDADES DE FAZER UM NEGÓCIO SOCIAL VINGAR

A legislação brasileira não prevê um modelo de negócio social, segundo o conceito criado por Yunus. Por isso, quando voltou ao Brasil, em 2012, ao buscar apoio de consultores para desenvolver seu plano de negócios, Roberto se deparou com três possibilidades: abrir uma ONG, incentivar a criação de uma marca de camisetas e fundar um negócio criativo. Morando na casa da mãe, ele decidiu fazer um mochilão pelo nordeste para entender, de fato, quais eram as demandas de cidades pobres, intercalando ainda com novas viagens à África. Ele fala mais sobre seus anseios na época:

“Decidi que queria um empreendimento para potencializar as crianças em condições de extrema pobreza, que não são crianças carentes e sim potentes”

A ideia era atuar em cidades com vulnerabilidade a partir de indicadores sociais. Em Betânia do Piauí, no Piauí, uma professora contou que o que mais precisava era de livros. Seria a primeira experiência para facilitar a construção de uma biblioteca com 2 500 publicações.

A venda de camisetas foi uma das formas de gerar renda encontradas pela Omunga para construir bibliotecas. Cada modelo custa 69,90 reais.

A forma de angariar fundos para a construção foi com a venda de camisetas:  “Lancei a primeira coleção, em 2013, como sacoleiro mesmo, ainda sem CNPJ”. Esse primeiro passo permitiu que a Omunga fosse se desenhando como uma marca de articulação, que facilitaria a criação de bibliotecas e a capacitação de professores. A cidade, através da comunidade ou da prefeitura, entrariam com o espaço e a Omunga com os livros.

O negócio, que teve aporte de 100 mil reais de economias pessoais, prosperou e passou a investir em desfiles, exposições e material para brindes corporativos. O faturamento, na época, de 800 mil reais financiava a operação para abastecer as duas bibliotecas criadas no nordeste e uma em Angola, com um total de 15 mil livros doados. Mas quem diria,  sucesso atrapalhou o andamento do projeto:

“Chegou uma hora que eu estava mais centrado na operação de varejo da marca e nas palestras do que em respirar a causa em si”

Era preciso retomar o foco. A Omunga buscou ajuda: passou a ser acelerada na Spin e encubada na Cause. As mentorias mostraram que Roberto não sabia o que queria e foi preciso parar de produzir as camiseta para se reestruturar, em 2017, o que abalou ou  no faturamento, que passou para 400 mil reais. O fundador conta: “Vi que tinha me perdido, mesmo dando certo. Fomos estudar o comportamento das pessoas, o que amolece o coração. Por que todo mundo fala em propósito? Colocamos isso em post-its e começamos a reconstruir a forma de arrecadar recurso”.

É PRECISO QUEBRAR A VISÃO DE ONG E FAZER A RODA GIRAR

Com um pouco de cara de pau, ele conseguiu chegar à TAG, clube de assinatura de livros, onde passou um tempo observando a experiência e entendeu que as pessoas precisavam estar próximas da causa. Daí nasceu a Omunga Clube.

 

No Brasil, a Omunga já construiu duas bibliotecas: uma em Curral Novo e a da foto acima  em Betânia do Piauí, ambas no Piauí. A meta é construir uma terceira, na Amazônia, no ano que vem.

Ainda assim, muitas pessoas insistiam que não queriam nada em troca, criando uma demanda por outro CNPJ, o Instituto Omunga. E havia ainda aqueles que insistiam para que Roberto não abandonasse as camisetas. Assim, se constitui o tripé do Omunga. Hoje, o negócio tem quatro funcionários e uma rede de 20 voluntários, que ele deseja no futuro que sejam remunerados:

“Cada vez menos peço favor, eu quero que todo mundo ganhe”

Ele diz que tenta quebrar essa visão de “ongueiro quebrado”, buscando recursos para que a roda gire e beneficie também outras pessoas. E parafraseia o slogan da Artemisia, aceleradora de negócios sociais: “Entre mudar o mundo e ganhar dinheiro, eu fico com os dois”.

DRAFT CARD

Draft Card Logo
  • Projeto: Omunga Grife e Instituto Social
  • O que faz: Contrói bibliotecas em locais de vulnerabilidade social
  • Sócio(s): Roberto Pascoal
  • Funcionários: 4 (e 20 voluntários)
  • Sede: Joinville (SC)
  • Início das atividades: 2013
  • Investimento inicial: R$ 100.000
  • Faturamento: R$ 400.000 (em 2017)
  • Contato: [email protected] e (47) 98889.3007
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