Ainda hoje, 12 anos após o surgimento do cloud computing, a computação em nuvem, muitos gestores de TI se perguntam quando e como migrarão suas aplicações para essa tecnologia. Foi exatamente esse questionamento que levou, em 2013, os empreendedores Ricardo Brandão, 37, Rennan Sanchez, 32, Rodrigo Burjato, 35, e Caio Klein, 45, a fundarem a Sky.One — empresa que oferece três soluções para facilitar a utilização do ambiente em nuvem para empresas.
Para os leigos, ir para nuvem pode parecer uma decisão simples, mas para os desenvolvedores e usuários de sistemas robustos e complexos, essa é uma tarefa ingrata, ainda mais se os tais sistemas foram desenvolvidos com base na tecnologia da geração anterior, que usava servidores on premise (hardwares físicos armazenados em uma sala da empresa). A dúvida costuma girar em torno do seguinte dilema: é viável, em termos econômicos, reescrever todo o código do software para poder usá-lo na nuvem ou é melhor ficar do jeito que está? (Aqui vai uma ajudinha histórica: em 2006, a Amazon introduziu a Elastic Compute Cloud, EC2, e inaugurou o AWS – Amazon Web Services — materializando assim o conceito de “nuvem”, usado pela primeira vez, em 1997, pelo professor indiano Ramnath Chellappa, durante uma palestra em Dallas, EUA. No Brasil, a AWS chegou em dezembro de 2011.)
Essa transição, ou cloudificação, como diz o CEO Ricardo, é feita sem a necessidade de reconstrução dos softwares, porque a plataforma Auto.Sky, da startup, “move tecnologias”. Ele fala mais a respeito:
“Criamos uma camada de inteligência que lê os softwares da forma que foram escritos no sistema antigo e os adapta para o sistema novo”
Essa solução é responsável por 70% do faturamento da startup e é vendida em modelo de recorrência a um ticket médio de 6,5 mil reais mensais.
A maioria dos clientes da Sky.One tem porte médio e nem sempre possui uma estrutura parruda de TI. Então, a startup oferece um segundo tipo de solução chamada de Guru.Sky, consultoria especializada em cloud computing que pode avaliar a estrutura do cliente e organizar a implantação da melhor solução, com formato e investimento customizados. Esse segmento cresceu tanto dentro da startup — já representa 25% do faturamento — que, seis meses atrás, os fundadores decidiram transformá-lo em uma unidade de negócio independente.
UMA GERADORA DE SPIN OFFS
O Guru.Sky, também da startup, passou a ter CNPJ próprio e um sócio minoritário, além da Sky.One. “Como crescemos muito, não conseguíamos dar conta de outras oportunidades. Nossa opção foi trazer um outro empreendedor para a parte de serviços, que utiliza toda a estrutura que já temos aqui (marketing, back office, nome, dinheiro, clientes e parceiros). A gente queria alguém para bater o gongo desse negócio diariamente!”, conta Ricardo.
A ascensão da Sky.One ao status de holding não tirou a responsabilidade de crescimento em ritmo de startup, ainda mais depois do aporte de 22,5 milhões de reais feito pelo fundo Invest Tech, em janeiro. Nos primeiros três anos de vida, a empresa cresceu 300% ao ano. Este ano, o faturamento irá dobrar (por conta de contrato de confidencialidade, a empresa só informa um valor genérico, que fica entre 50 e 100 milhões de reais). E a meta é dobrar de novo em 2019. Ricardo afirma:
“Como empreendedores, temos um plano: queremos ser um unicórnio. Nada menos que isso nos interessa”
A estratégia continua a ser prestar um serviço com qualidade para os atuais 1 000 clientes (5% deles de fora do Brasil, em especial, Estados Unidos e México) e gestar spin-offs com base em produtos que se transformam em novas unidades de negócios. O próximo da fila é Sky.Saver, solução para empresas que usam a AWS e reduz em até 80% os custos do Amazon EC2, com o uso de Instâncias Spot. Melhor traduzir, certo?
Os cloud providers — AWS, Google Cloud Platform, Microsoft Azure, IBM Cloud, Oracle Cloud, Alibaba Cloud — sempre precisam ter capacidade extra além da contratada para atender a demandas de urgência. Eles costumam ter 75% de ociosidade em períodos do dia e do mês, de acordo com sazonalidade. Então, esses players fazem leilões da parte ociosa, com preço bem abaixo da tabela. Entretanto, na hora do pico, o custo da capacidade ociosa sobe, como as ações da bolsa de valores. Então, são oferecidos pacotes fechados para uso da nuvem às empresas que não querem se arriscar. Se o contratante não usar a quantidade combinada, têm de pagar por ela da mesma forma.
Voltando ao Sky. Saver, ele é um software que prevê o momento em que os preços do leilão explodem para que as empresas possam tomar a decisão de voltar ao preço de tabela. “Ele orquestra esse preço o tempo todo e traz os benefícios do desconto. O cliente não conseguiria fazer isso sozinho, na mão, porque são centenas de combinações”, conta Ricardo. A mensalidade média desse serviço fica em torno de 1.500 reais.
O NEGÓCIO NÃO FOI UMA DESCOBERTA, MAS UMA CONSTATAÇÃO
Quando é convidado a voltar no tempo e relembrar o que inspirou os fundadores a criarem a startup, Ricardo é categórico: “A gente não descobriu nada. A gente constatou. Essa é a grande vantagem de se estar em uma empresa ouvindo o cliente, o fornecedor, os colaboradores. É aí que aparecem as dores. E cabe a quem tem o perfil de ser ‘resolvedor de problemas’ fazer alguma coisa”.
Era começo de 2013. Os brasileiros ainda desconfiavam da migração de tecnologia para a nuvem por questões de custos, prazo e segurança. Ricardo e Rennan, COO da Sky.One, estavam prestes a vender a empresa para a qual tinham se dedicado por 11 anos, a desenvolvedora de software DN4, e sondavam o que fariam dali em diante. Ainda dentro do negócio e em contato com clientes, perceberam que a adoção do cloud computing seria uma disrupção importante de se acompanhar. Ricardo conta: “Era quase como uma transição de DOS para Windows”. E continua:
“Muitas empresas já tinham vivido o trauma da migração de sistemas e nossa ideia foi criar algo para utilizarem a nuvem mais facilmente, sem gastar tanto dinheiro e em um processo rápido”
Ricardo e Rodrigo, CFO, uniram-se a Caio, COO International, e Rennan, CTO, para montar o negócio. Enquanto os dois últimos desenvolviam o software em si, os demais iam para a rua procurar investidores ou clientes (o que aparecesse primeiro!). O dinheiro para negócios em estágio pré-operacional, o chamado seed money, era muito raro. Por outro lado, a rede de contatos, as conversas e apresentações renderam uma pivotada geral na ideia original. O software que os empreendedores imaginavam fazer é hoje uma parte integrante da plataforma Auto.Sky.
O CEO fala mais sobre a proposta inicial dos sócios: “Nossa ideia era ser apenas um software na ponta. O cliente iria até a Amazon (o único fornecedor da época) para usar nosso produto. Mas percebemos que o cloud computing era uma coisa tão nova que se nós não ajudássemos as empresas e desenvolvedores a fazerem a transição, eles nunca usariam nossas soluções”.
Os quatro fundadores da Sky.One começaram a trabalhar em um coworking e foram crescendo. Em março de 2014, entrou o primeiro cliente pagante. A partir de agosto do mesmo ano, a empresa pegou tração. Atualmente, a equipe tem 110 pessoas, a maioria delas na sede de São Paulo. Há estruturas de vendas em Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Miami, para onde Caio se mudou há dois anos. Novas equipes serão formadas no início de 2019 para atender Goiânia, Porto Alegre e o nordeste do país.
A ARTE DE CRESCER MANTENDO A AGILIDADE DE STARTUP
Apesar da startup já estar bastante estruturada, os sócios sentem-se recomeçando todos os anos e isso continua a tirar o sono dos empreendedores:
Antes eu pensava se o negócio iria sobreviver, vender e funcionar bem. Agora penso: ‘Se a gente não dobrar de tamanho, como acomodaremos todos da equipe?
No começo a preocupação de Ricardo era não morrer no meio do caminho. Os fundadores se arriscaram e investiram 500 mil reais de recursos próprios e se propuseram a ficar entre dois e três anos sem retirada. Em retrospectiva, Ricardo diz: “Temos de lidar com as expectativas. Tem os que só olham dinheiro e os que olham toda a trajetória”.
O CEO afirma que achar a combinação certa entre crescimento rápido e a necessidade de ter processos corporativos mais amarrados de back office, controladoria e governança, é difícil “Estamos, exatamente neste momento, sofrendo um tipo de crise de identidade” diz. Ele prossegue: “Somos uma startup, queremos crescer na velocidade de uma startup e trazer inovação o tempo todo, só que precisamos apresentar números e ser auditados anualmente”.
Um entrave para esse desabrochar do negócio está na linha tênue do desenvolvimento de pessoas. O fundador comenta que uma característica difícil de se achar nos profissionais é o timing:
“Em um ambiente de tecnologia, não se pode estar nem adiantado, nem atrasado, senão você morre”
Ele prossegue: “Cada pessoa tem seu tempo de desenvolvimento. Como somos uma empresa muito jovem, tem gente que começou conosco três anos atrás e ainda não está pronta para dar o próximo passo”. Para se tornarem candidatos a unicórnios em 2020, não há outra maneira de dar conta dos desafios, senão deixando vir à tona as duas faces: a startup e a empresa mais estruturada. Ninguém disse que seria fácil.