Fabiano Kenzo Rokutan construiu uma carreira tradicional em seus dez anos de Riachuelo. Trabalhou na área de tecnologia, onde tornou-se gerente de sistema. Aos 35, porém, foi pego pela crise da idade e, diante da angustiante pergunta “qual é o meu propósito” decidiu rever sua relação com o trabalho.
Hoje, aos 41, Fabiano é o cofundador da startup Neopag e parece sereno e feliz em ter conseguido unir sua experiência na área de tecnologia e de gestão de pessoas a uma ferramenta que democratiza o crédito a lojistas e consumidores de pequenas cidades do interior do Brasil.
“Quando a gente entra em crise, achamos que precisamos abandonar tudo o que sabemos para começar algo novo. Mas, na realidade, não. Eu estou fazendo algo novo sem abandonar o que eu já sabia”
A IDEIA FOI TESTADA DENTRO DA LOJA DA MÃE DE UM DOS FUNDADORES
A história da Neopag de certa forma começa em Descalvado, cidade paulista a 240 quilômetros da capital, onde a mãe de Lucas Ruiz, sócio de Fabiano, tem desde 1986 uma loja de roupa e acessórios, a Artimanha.
Por todos esses anos, Dalva Margareth Franzin Ruiz manteve sua loja fazendo o que muitos outros pequenos varejistas fazem: oferecendo parcelamento, crediário, o famoso carnê, e até fiado na base da confiança. “Algo muito característico no Brasil”, afirma Fabiano.
E não é para menos. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), há 60 milhões de pessoas não bancarizadas no Brasil. Ou seja, metade da população economicamente ativa, estimada em 110 milhões de brasileiros.
Com tanta gente sem conta em banco e nem cartão de crédito, o pequeno varejo criou sua própria solução. “Sessenta por cento do comércio brasileiro oferece algum tipo de crédito para seu cliente. A questão é como esse crédito é oferecido. Geralmente, de forma frágil e amadora”, diz Fabiano.
Foi então que, em meados de 2017, Lucas teve a ideia de criar o cartão de crédito da própria Artimanha para os clientes da loja — o private label da Artimanha — e chamou para a empreitada o amigo com quem tinha trabalhado junto na Riachuelo. Fabiano explica:
“É algo que os grandes varejistas já fazem há algum tempo. Mas é uma tecnologia muito cara e até então muito distante para o micro e pequeno lojista. Oferecer o private label é muito rentável, pois agrega serviços ao cliente, além de alavancar as vendas da loja de forma segura”
A plataforma da Neopag oferece cartão de crédito digital para os clientes das lojas cadastradas. Através da plataforma, o lojista oferece crédito de forma segura e profissional, já que a startup também se encarrega de fazer a gestão desse empréstimo, incluindo a cobrança dos devedores. Neste momento, são mais de 1 700 clientes (desse total, 1 500 estão em teste e 200 já são assinantes da plataforma), 6 mil consumidores e 5 milhões de reais de movimentação desde seu início, em agosto de 2018.
Os estabelecimentos comerciais que assinaram o serviço pagam mensalidades que variam de 59 a 199 reais. “Quarenta por cento são lojistas de confecção e calçado, seguido por estética e beleza, mercado, entre outros. Além disso, 95% estão no interior do Brasil”, diz o empreendedor
Fabiano afirma que a Neopag torna a cadeia mais segura para todas as partes envolvidas. O varejista aumenta seu faturamento e diminui o risco; o cliente, por sua vez, recebe crédito (que possivelmente lhe seria negado por uma instituição financeira tradicional) e tem acesso a um cartão, talvez o primeiro de sua vida. E assim o comércio local sai fortalecido.
“Para aprovar o crédito, nós fazemos as análises tradicionais, mas, também, perguntamos diretamente ao lojista sobre aquele consumidor, que já é cliente da loja, se podemos oferecer crédito a ele. A resposta do lojista aumenta a chance daquele CPF ser avaliado positivamente”, diz Fabiano.
ELES QUASE PIVOTARAM, MAS A ACELERAÇÃO DA VISA DEU FORÇA AO NEGÓCIO
A Neopag ainda não completou um ano de vida, mas Fabiano afirma que a expectativa está bem alinhada ao business plan inicial. Chegar aqui não foi simples. Assim que decidiram mergulhar no projeto, Fabiano e Lucas fizeram algo comum e importante nesse estágio de amadurecimento do projeto: conversaram com pessoas experientes para validar a ideia. Fabiano conta:
“Falamos com muita gente experiente do mercado de varejo e todos diziam que estávamos no caminho errado. Que o foco era outro. Por que focar no micro lojista? Diziam que deveríamos atender as pontas: ou os grandes varejistas ou o consumidor final”
Passar por essa “provação”, segundo ele, foi algo natural, pois o produto que eles oferecem não existia até então. “É algo comum de acontecer. Pois a nossa solução é única no mercado e é muito inovadora. E foi feita para um público que não tem acesso a essa tecnologia. Ou seja, encontramos um mar de oportunidades. O grande desafio foi manter o foco do private label para micro lojistas no interior do Brasil, como tínhamos desenhado desde o início.”
Eles quase pivotaram, mas mantiveram-se alinhados à proposta inicial. “Teve uma provocação que nos abalou. Um executivo experiente do mercado, alguém cuja opinião é importante para nós, disse que precisaríamos ter uma financeira para organizar o nosso negócio”, explica Fabiano. “Mas entendemos que nós somos um meio. Nós não assumimos o risco do crédito. Pois, quem dá crédito é o lojista, como ele já fazia antes. A Neopag é um meio que oferece segurança ao varejo através da tecnologia e da gestão desse crédito.”
Com esse perfil, a Neopag foi escolhida como uma das cinco startups selecionadas para o Programa de Aceleração da Visa do primeiro semestre deste ano. Desde 2017, a companhia já selecionou 53 startups com um investimento médio de 215 mil reais por empresa. São quatro meses de mentoria, novos contatos e uma viagem de duas semanas para o Vale do Silício para conversas e networking com gente do ecossistema local.
Segundo Beatriz Montiani, gerente de inovação da Visa do Brasil e responsável pelo projeto, a sinergia acontece de muitas formas. Às vezes, os acelerados fecham negócios com parceiros da Visa. E, às vezes, com a própria empresa. No caso da Neopag, que já recebeu uma primeira rodada de investimentos em março deste ano, a parceria pode se dar nos dois formatos.
Há, por exemplo, a chance de oferecer mais crédito aos clientes da plataforma através da parceria da marca com a chancela da Visa. Nesse caso, o cliente da Artimanha — a loja da mãe do Lucas, lá em Descalvado — poderia receber um cartão com as duas logomarcas, Neopag e Visa.
E há, também, a chance de um outro tipo de colaboração. O cofundador da Neopag diz que a startup está em contato com muitos pequenos lojistas que têm CNPJ, mas não uma conta jurídica. Assim, haveria a possibilidade de, por meio de algum parceiro da Visa, oferecer uma conta jurídica a esses clientes.
Fabiano conta que sua startup cresce 40% ao mês. Enquanto isso, dona Dalva Margareth continua oferecendo crédito aos clientes da sua loja de roupas e acessórios, mas agora com menos risco: o private label fornecido pela Neopag reduziu a inadimplência dos clientes da sua loja de 20% para apenas 2%.
Ao popularizar uma tecnologia até então restrita a grandes grupos varejistas, os sócios conseguiram evitar a exposição do micro lojista por meio da venda fiada e, ao mesmo tempo, democratizar o acesso ao crédito nas cidades do interior do Brasil.
Falar de dinheiro ainda é um tabu em muitos lares do Brasil. Gabriel Roizner e Yael Israeli, fundadores da Mozper, explicam como a fintech quer mudar essa mentalidade e formar uma nova geração mais consciente de suas finanças.
Os adolescentes querem administrar seu próprio dinheiro, seja a mesada ou o salário do estágio. A Z1 mira esse público com uma conta digital gratuita, sem controle dos pais (e sem risco de alguém estourar o limite do cartão).
Que tal transformar padarias, papelarias e outros comércios de rua em pontos de apoio logístico para o e-commerce? Com essa sacada, a Kangu realiza milhões de entregas mensais (e atraiu a atenção do gigante Mercado Livre).