Nascidos em uma era digital, eles manejam o smartphone com desenvoltura antes mesmo de aprender a ler. A geração de crianças e adolescentes que hoje absorve a realidade por meio de telas e não consegue imaginar um mundo sem internet é o público-alvo de um novo evento de inovação organizado pelos mesmos idealizadores do Black Sheep Festival, realizado há três anos em Porto Alegre (a edição de 2018 recebeu cerca de 5 mil pessoas; a próxima está marcada para ocorrer entre 18 e 20 de agosto).
Em pleno período de férias escolares, o Black Sheep Kids Festival deve mobilizar a garotada a partir de amanhã, sexta, 19 de julho, e até o dia 28, em dois pisos do Shopping Iguatemi, na capital gaúcha. A expectativa é receber mais de 10 mil visitantes ao longo desses dez dias. A programação se divide em seis hubs temáticos e inclui palestras (sim, para crianças), oficinas e experiências interativas, cobrindo desde robótica até design thinking, além de uma imersão numa estrutura geodésica com projeções mapeadas. É preciso fazer agendamento e usar pulseira de identificação com o horário programado. No site do festival e no regulamento, dá para conferir a recomendação de faixa etária e a lotação máxima de cada atividade.
Quais serão as habilidades mais valiosas? Como a educação vai se transformar? Como é possível aproveitar a abertura das crianças para que elas desenvolvam autoconhecimento? De que forma a tecnologia pode resolver grandes problemas? Essas são perguntas que os organizadores do festival – os fundadores do Black Sheep Project, João Ramos e Wayner Bechelli, e a gestora de projetos Maria Cristina Pastor – não querem responder de bate-pronto. Em vez disso, o trio tomou para si o desafio de montar um quebra-cabeça de conteúdos para que as respostas partam dos próprios visitantes. Segundo Wayner:
“É uma forma de trazer o tema da inovação de uma maneira simples, descomplicada e divertida. Queremos dar ferramentas para as crianças, que no fim vão acabar nos ensinando como será o futuro”
Os fundadores do Black Sheep se definem como um hub de inovação criativa, que trabalha oferecendo eventos, curadoria, consultoria e conteúdos. Na cartela de clientes estão empresas como Elo, Fábrica do Futuro, Grupo Amanhã, Grupo RBS e a fábrica de refrigerantes Fruki. Apesar da gama variada de produtos e serviços, os festivais são os projetos proprietários. Organizar um festival voltado para crianças, porém, traz suas próprias dificuldades.
Os sócios recrutaram um time de curadores com traquejo para pensar a programação e transpor o tema da inovação ao universo infanto-juvenil. O grupo inclui Agnès Françoise, psicoterapeuta e sócia-fundadora da escola de educação infantil Yellow; Marcelo Paes, mestre em Design e fundador da Tantum Inovação; Graziela Pereira, mestre em Ciência da Computação e project manager na Thoughtworks; Giovanni Comunello, CEO e fundador da iTinvent, startup que desenvolve projetos interativos; e Pedro Wolf, sócio-diretor de duas unidades porto-alegrenses da Happy Code, uma franquia de escolas de programação.
“Tivemos muitos parceiros para colocar isso de pé”, diz Maria Cristina. “Corremos atrás de uma verba de produção e houve uma contrapartida de mídia e orçamento de produção e cenografia com o Iguatemi. Até porque precisamos fazer a cenografia do zero. Mas grande parte de programação foi feita por parceiros e sem cachê nenhum. Fechar conteúdo de qualidade para dez dias de evento, com oito horas diárias, foi uma loucura.”
Às vésperas da estreia, o Draft conversou com João Ramos, a terceira “cabeça” do trio organizador, para saber como foi o processo de concepção do festival e quais foram os cuidados para levar o assunto “inovação” a um novo público.
O que, na opinião de vocês, é inovação para crianças?
Ela é 360 [graus] e aborda todos os grandes desafios do mundo atual. As novas habilidades, novos modelos de educação, autoconhecimento, habilidades técnicas, hackathons, resolução de problemas globais por meio Design Thinking. Mas a grande sacada por trás de tudo é que partimos da ideia de que um festival de inovação para adultos serve para desconstruir conceitos, porque muita gente perde na fase adulta o seu processo criativo. A gente vai se moldando para viver em sociedade, e isso nos limita. Então vamos partir do princípio que as crianças já são criativas e livres, e estão abertas para autoconhecimento e bom humor.
Por que vocês decidiram criar uma versão do Black Sheep Festival focada no público infantil?
A ideia surgiu no ano passado, e foi bem inesperada. A Cris, que é nossa gestora de projetos, um dia fez uma provocação: “A gente fala de inovação para adultos. E se tentássemos falar para crianças? Porque falamos muito sobre transformações, mas quem vai construir isso são elas, as crianças”. Como a gente não conhecia nenhuma outra iniciativa relacionada a isso, partimos para uma pesquisa e concluímos que ninguém estava explorando esse formato, e entendemos que seria interessante colocar as crianças como protagonistas. Por que não trazer a visão delas, que é menos limitada e filtrada que a nossa? Afinal, é disso que precisamos para quebrar paradigmas.
Como vocês chegaram nessa proposta de abordagem e formato?
Normalmente, criamos projetos baseados no que a gente conhece [a partir] do Black Sheep. Temos uma rede grande de pessoas, e entendemos nosso público. Mas, pensando de forma mais ampla, a gente vê que não tem como dar errado. Porque estamos abordando assuntos que estão em alta, como a ressignificação da educação. E tudo o que existe de evento hoje – e que é feito fora do ambiente da escola – é focado apenas em entretenimento. Em muitos casos, a proposta é engajar a criança em alguma atividade para poupar o tempo dos pais.
Nunca teve nada no formato desse festival, que une conhecimento e entretenimento. A gente quer falar de inovação de forma lúdica, olhando para vários aspectos além da tecnologia, como gestão de emoções
Tivemos o cuidado de pegar tudo o que abordamos em festivais de inovação e adaptar para a linguagem da criança. Mas, sendo sincero, o festival já nasceu muito grande, então quando a gente olhou para aquela planilha de conteúdo, bateu um desespero. [risos]
Como vocês se prepararam e se muniram de conhecimento para isso?
O festival não poderia acontecer sem uma curadoria absurda, e sem um time de curadores – composto por pais de filhos pequenos, que convivem com crianças no dia a dia – que possui bases teóricas e científicas para filtrar o conteúdo e dizer quais são os nossos limites. Foram eles que definiram o que entra na grade, como entra, e qual linguagem vamos usar. Lidar com o público infantil é uma responsabilidade muito grande, porque eles estão formando valores, e nós não queremos entregar respostas prontas.
Qual foi o maior desafio na organização do festival?
Muito palestrantes ainda não construíram essa experiência com crianças. Então, o maior desafio foi preparar essas pessoas e convencê-las de que elas poderiam falar com esse público. O Dado Schneider, por exemplo, é um palestrante conhecido internacionalmente, mas para o fechamento do evento com ele pensamos em uma forma das crianças poderem escolher do que ele vai falar. Ele fará [a palestra] traçando um overview de todo o festival, trazendo os principais conceitos. E durante todo o talk, as crianças definirão o caminho que ele segue.
Do ponto de vista de negócio, foi um desafio encontrar uma empresa que acreditasse no projeto, porque é difícil vender uma ideia assim. O Iguatemi abraçou de forma grandiosa, entre novembro e dezembro do ano passado. Nós já tínhamos um relacionamento com o shopping, porque fizemos um projeto com eles no ano passado, e a gente precisava de um lugar que oferecesse segurança, que fosse um ambiente controlado, confortável e conveniente. Além disso, o evento também poderia contar com a audiência de quem visita o shopping.
Os pais poderão deixar os filhos sob a supervisão de monitores?
Temos monitores e eles foram todos treinados por especialistas, mas o festival não assumirá a responsabilidade da guarda da criança. Oitenta por cento das atividades são desenhadas para os pais estarem juntos. Quando for uma atividade onde não participam, eles devem aguardar do lado de fora e esperar a saída dos filhos para recebê-los com segurança.
Quais serão as atividades dentro de cada hub temático?
O Hub Content, que é o mais repleto de atividades, vai trazer contação de histórias por um robô social, meditação, uma oficina dinâmica com foco em grandes problemas mundiais, um espaço para os pais e especialistas discutirem o futuro do trabalho e da educação, e uma experiência para promover a empatia, a partir da escuta de um relato em áudio sobre um fato marcante na vida de alguém. O Hub Coplay é um espaço para compartilhar brincadeiras, e as crianças poderão ter contato com óculos de realidade virtual, para que elas tenham uma experiência de fazer pinturas em 3D.
No Hub Tech Art, teremos oficinas de prototipagem eletrônica, programação do game Minecraft, criação de maquetes e brinquedos inteligentes. Na Feira Maker, dez expositores trarão invenções tecnológicas como impressoras 3D, drones adaptados, braços mecânicos, games hackeados, entre outras.
No Startup Kids, fundadores de startups e de produtos inovadores para o público infantil estarão expondo suas ideias. Por fim, no Espaço Pais teremos um lounge para os adultos, com um jogo em realidade virtual, o Beat Saber, em que o objetivo é cortar [com sabres de luz virtuais] as batidas que se encaixam perfeitamente nas músicas.
O Black Sheep Festival já tem três anos, mas agora vocês estão estreando em um formato inédito. Dá um frio na barriga? Quais são as expectativas?
No Black Sheep, temos o DNA de tirar ideias do papel. A gente não tinha histórico de fazer nada para crianças, então para nós é tudo novidade. Esse é um projeto que demanda muito trabalho, e é um grande teste.
Estamos validando uma ideia – mas acreditamos muito nela. Esse evento também é uma maneira de alguns pais perderem o medo da tecnologia ou o receio de falar de futuro, de mudanças na educação
Vamos entender se deu certo ao longo desses dez dias, observando a quantidade de famílias participando juntas nas atividades, o nível de engajamento…
Hoje existe uma grande discussão sobre vício em tecnologia e os efeitos de estarmos sempre conectados. Como vocês enxergam a infância nessa perspectiva?
Pensamos muito nisso, nessa abundância – e até certo descontrole – de abordagens e formas educação. Com qual idade deve se começar a usar celular? Questões como essa ainda não têm uma resposta certa, e todo dia algum especialista faz um diagnóstico. A ideia do festival também é de trocar ideias sobre isso em um papo mais adulto. A grande verdade é que existem vários caminhos abertos, e não há uma fórmula pronta para lidar com essas questões. Não temos a pretensão de entregar uma única verdade.
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