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Como a Nestlé criou (e desmembrou) seu hub de inovação para consolidar uma mudança em sua cultura interna

Adriana Fonseca - 5 set 2019
José Pereira Jr., head de inovação da Nestlé.
Adriana Fonseca - 5 set 2019
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A “moça” não é mais tão jovem, mas continua formosa. A imagem de uma camponesa suíça já ilustrava o rótulo quando a Nestlé começou a produzir leite condensado, em 1878. A marca ainda se chamava Milkmaid em 1921, ano de inauguração da primeira fábrica no Brasil, em Araras (SP). O nome Leite Moça só foi incorporado em 1937.

Presente em 191 países, dona de um portfólio global de 8 mil produtos, a fabricante de alimentos e bebidas tem que batalhar como qualquer companhia para se encaixar nos padrões de um mundo cada vez mais antenado em nutrição e saúde. No Brasil (quarto maior mercado, atrás de Estados Unidos, China e França), são 31 unidades industriais e 20 mil colaboradores.

A empresa tem a meta global de reduzir em 5% os açúcares adicionados e em 10% o sódio até 2020. “À medida que a Organização Mundial de Saúde detecta ingredientes controversos, a Nestlé submete seu portfólio de produtos a uma readequação para entrar nas novas especificações”, diz José Pereira Jr., 36, gerente de inovação.

“A sociedade muda, as necessidades mudam, o conhecimento nutricional muda e a gente tem de estar na ponta disso tudo, em linha com o que a sociedade precisa”

Desde 2014, especificamente no Brasil, a empresa investiu R$ 400 milhões em pesquisas e lançamentos de produtos considerados mais saudáveis. O Nescau, por exemplo, ganhou uma versão com 33% menos açúcar — e depois outra com zero açúcar e sem adoçantes sintéticos. Em 2018, foram 20 projetos nessa linha. Até o fim de 2019, devem ser mais 25 (de cada projeto pode surgir mais de um produto).

SETE GERENTES DE ÁREAS DIVERSAS FORAM CONVOCADOS PARA O HUB

“Ao longo de sua história, a Nestlé lançou marcas incríveis, mas por alguma razão isso foi se perdendo de forma sutil”, diz José. Ele chegou à companhia em janeiro de 2015, para estruturar o hub. “Nossa missão era colocar a inovação no ‘core’ da empresa”, diz. Isso implicava em estabelecer processos e mudar a mentalidade, aprimorando o olhar para a inovação.

Com orçamento e estratégia definidos, o hub ganhou sete pessoas. Eram sete gerentes de projetos de diferentes áreas da Nestlé que passaram a integrar o hub para pensar a inovação em diferentes categorias de negócio, com foco no cliente.

“Tínhamos que pensar no consumidor, no que faz sentido para ele, e não somente no que otimiza a linha de produção. Tínhamos que mudar a maneira como as pessoas pensam e como elas olham a inovação”

Um case emblemático é o do Nescafé Dolce Gusto. As caixas são vendidas com 16 cápsulas do mesmo sabor de café. A unidade de negócio entendeu que isso era um entrave para aumentar as vendas. No supermercado, o consumidor resistia a incluir um novo sabor em seu carrinho. E se ele não gostasse? As 15 cápsulas restantes iriam para o lixo?

Junto com o hub de inovação, o time da Dolce Gusto teve a ideia de criar caixas para 50 ou 100 cápsulas que podem ser preenchidas à vontade, com sabores à escolha. Totalmente desenvolvido no Brasil, do conceito à tecnologia para adaptar a linha de produção, esse sistema lançado em 2018 já foi exportado pela companhia para outros países.

CINCO DIAS PARA DESENVOLVER UM PROTÓTIPO E COLETAR FEEDBACKS

A estreia do hub trouxe novos procedimentos e rituais para fomentar ideias. Um exemplo são os sprints, jornadas de ideação em ritmo acelerado. Durante cinco dias, um time multidisciplinar de profissionais quebra a cabeça para bolar um protótipo. Discute-se o produto em si, a embalagem, precificação, onde será vendido, como deve ser comunicado…

Antes do fim da semana, consumidores com perfis distintos (por gênero, faixa etária etc.) degustam o novo alimento ou bebida e dão feedbacks. “Começamos a ter mais argumentos para ver se seguimos com essa oportunidade de lançamento dentro da empresa”, diz José. Esses comentários orientam o desenvolvimento do produto nas etapas seguintes, até chegar às prateleiras.

Os sprints partem sempre de alguma sacada específica. Um exemplo foi a percepção de que havia uma demanda para alimentos saudáveis e práticos, que pudessem ser consumidos no trânsito ou enquanto se espera o ônibus.

Esse insight gerou sprints diferentes que se desdobraram em novos produtos, por exemplo o Nescau Protein+, achocolatado pronto com mais proteína e zero açúcar, e a linha de cookies integrais da Nesfit em embalagens portáteis, de 20 gramas.

O IMPACTO DOS NOVOS PRODUTOS NO FATURAMENTO DEU UM SALTO

Desde a implantação do hub, o impacto dos novos produtos para o resultado da companhia deu um salto. Em 2015, itens lançados nos 36 meses anteriores respondiam por apenas 0,03% do faturamento da Nestlé no Brasil. Em três anos, esse percentual chegou a 6%. Além disso, as margens de lucro desses produtos são hoje, em média 26% maiores do que as de outros da mesma categoria.

Com o sucesso da iniciativa, era hora de um movimento contraintuitivo: “desapegar” do hub e pivotar a ideia.

“Em 2018, percebemos que havíamos chegado a um índice bom de inovação. Estava na hora de espalhar essa inovação por toda a empresa, para fazer parte da cultura”

Assim, no fim do ano passado, os gerentes de produtos que haviam ingressado no hub retornaram às áreas de negócio como gerentes de inovação, cada um deles incumbido da missão de multiplicar a mentalidade para suas equipes, com cada unidade pensando suas inovações em paralelo.

UMA PLATAFORMA ONLINE PARA CONECTAR BOLEIRAS E CONSUMIDORES

Em 2019, José e seu time começaram a refletir sobre os impactos de plataformas como Uber e Rappi. “Não somos uma empresa de serviços, mas o consumidor é o mesmo. Era hora de criar opções além dos produtos.” Dessa reflexão foram surgindo novas possibilidades de se relacionar com o público.

Uma delas é o Jogadeira, que nasceu a partir de uma ação da marca Nescau que conectava crianças e recreadores em um espaço público, proporcionado brincadeiras relacionadas ao esporte de forma gratuita. Agora, o projeto virou um serviço de recreação vendido aos condomínios, mas ainda com foco social. O lucro é destinado à ONG Gerando Falcões, que constrói espaços para a prática esportiva em bairros menos favorecidos.

Outra iniciativa é a Vem de Bolo, uma plataforma online que conecta boleiras e o consumidor final. Numa operação conjunta com startups, a Nestlé ajuda com a geração de audiência para o site e oferece desconto em sua loja física e virtual, o Empório Nestlé, para as confeiteiras comprarem os ingredientes.

A Vem de B0lo começou a funcionar em janeiro na zona sul da cidade de São Paulo e hoje cobre toda a capital. Por enquanto são 40 boleiras cadastradas (há uma lista de espera de mais 300). Elas ganharam uma capacitação no Facebook intermediada pela Nestlé para aprender como alavancar as vendas usando as redes.

Na prática, é um misto de projeto social com negócio, porque gera vendas para a companhia. “Brincamos que a Vem de Bolo é a primeira startup da Nestlé”, diz José. “O propósito da empresa passa por indivíduos, comunidades e o planeta. A inovação está nesse caminho.”

 

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