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A ABlab nega conceitos da publicidade – BV, Atendimento, Criação – enquanto fatura seus primeiros milhões

Breno Castro Alves - 7 dez 2016
Hugo Collier e Paulo Fernandes, fundadores, têm funções definidas na empresa: os funcionários, não. A gestão é horizontal.
Breno Castro Alves - 7 dez 2016
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“A publicidade faliu.”

A afirmação é ousada e vem de Ricardo Martins, 30, chefe de inovação da ABlab, agência que faturou em seu primeiro ano de operação um total de 4,5 milhões de reais e clientes como Citroën, Sodexo e Basf. Fundada em 2015 por Paulo Fernandes, 36, e Hugo Collier, 30, a empresa utiliza a análise de uma montanha de dados para substituir a criação publicitária tradicional, baseada no insight e na criatividade de poucos. Além disso, diz Ricardo, dissolveu as hierarquias e trabalha na perspectiva da horizontalidade.

“Somos uma agência de business inteligence que entrega publicidade, que é mais legal do que entregar relatórios”, diz, e completa: “Transformamos a análise dos dados em campanhas de mídia, post, inovação”. Business inteligence (ou BI) pode ser traduzido como inteligência empresarial e significa a tomada de decisões baseadas em dados recolhidos pelos diversos sistemas de informação. Esta abordagem analítica, em oposição à tradicionalmente criativa, é um diferencial competitivo da ABlab.

Mas o que nos leva a contar a história da agência aqui é o fato de, em meio a uma máquina eficiente, eles funcionarem na perspectiva da horizontalidade — que, lembrando, é também o diferencial na gestão da Vagas (que já teve a história contada aqui no Draft). A premissa da gestão horizontal parece algo tirado de um trabalho de conclusão de curso de faculdade: uma empresa sem cargos, onde os profissionais escolhem de quais processos participar. Hugo Collier e Paulo Fernando fundadores da ABlab, garantem ter conquistado esse diploma.

Hugo era sócio da Conversion, uma agência de SEO (a técnica de tornar um site mais facilmente encontrável no Google), e Paulo já foi CEO da Riot Games e diretor comercial da Hive. Eles investiram 500 mil reais (recursos próprios) no novo negócio e lançaram a ABlab em agosto de 2015 propondo, de partida, este modelo alternativo de gestão de pessoas.

GESTÃO HORIZONTAL DESDE O DIA 1

Hoje, a empresa tem 27 clientes e 33 funcionários contratados em regime CLT trabalhando sem um gestor que lhes cobre as entregas. Alguns cargos até existem, Ricardo é CIO (o Chief Innovation Officer, chefe de inovação). Sua tarefa é garantir que a agência sempre se questione, que a proposta de inovação pelo digital seja prática e não só discurso. O trio de gestores com cargo se completa com Hugo e Paulo, que dividem o papel de CEO (o Chief Executive Officer, diretor executivo). Enquanto Hugo foca na estrutura interna, Paulo atua mais como comercial e relacionamento, voltado para fora da agência.

Ricardo Martins, chefe de inovação da ABlab.

Ricardo Martins, chefe de inovação da ABlab.

Além da gestão, as áreas possuem líderes técnicos, que vão garantir a qualidade final do trabalho. Não possuem, porém, gerentes ou diretores com funcionários posicionados abaixo de si. A ABlab avalia seus profissionais pela “leitura do ecossistema”, que regula e seleciona quem está gerando valor ou não. Um dos papeis do Hugo é balancear as áreas e funções dos indivíduos dentro delas. Ele é o fiel do ecossistema: acompanha as reuniões das áreas e mensura a participação de cada um nos processos.

A demanda dos 27 clientes é grande e a proposta horizontal, na prática, funciona assim: quem fecha o acordo é o comercial e o gerente de produtos (até aí, similar à gestão tradicional). Quando isso acontece, gestores e líderes técnicos se unem para entender a demanda em detalhes (também, normal). Com o trabalho quantificado, estes apresentam aa demanda às suas áreas: “entrou tal cliente com tal história, quem quer pegar?”. (A partir daqui, fica bem diferente).

Os grupos espontaneamente se dividem, sem cobranças, respeitando as individualidades de cada profissional. A tarefa a ser entregue é responsabilidade do grupo, e cabe ao indivíduo se posicionar nos processos. É isso que eles chamam “ecossistema”. Desde o dia 1 até hoje, afirmam, está funcionando. E eles querem mais disso aí.

DESFAZER OS FEUDOS: DESAFIO PERMANENTE

A cultura da ABlab também propõe o cruzamento de áreas. Fisicamente, a agência ocupa dois andares de um prédio perto do metrô Vila Madalena, em São Paulo. Há apenas uma porta, além das da copa e banheiros. Há uma pequena sala de reunião no segundo andar. Fora isso, tudo é aberto.

Ricardo diz haver um incentivo permanente para que as pessoas ali conversem fora de suas áreas nativas. Tudo bem um opinar em qualquer etapa do outro. Tudo bem um querer saber tudo da área do outro. A ideia horizontal propõe, inclusive, que qualquer um possa responder pela empresa.

E daí vem uma diferença fundamental em relação a agências tradicionais: ali não há o “Atendimento”, que é o profissional responsável por dialogar com o cliente e defender suas demandas dentro da agência. Na ABlab isso não existe. Se quiser uma mudança no texto, o cliente irá conversar diretamente com o redator. Ricardo fala a respeito:

“O Atendimento é necessário quando não há horizontalidade, quando é preciso ter uma voz única para o cliente. Aqui, o o contato é direto entre cliente e criação”

Bonito na teoria. E na prática? Vamos usar o case da Sodexo, uma das líderes mundiais em serviços de alimentação, como o vale-refeição, para demonstrar o processo da ABlab. A multinacional trabalhava para construir, nas redes sociais, um posicionamento de segurança institucional, mas os dados apontavam uma história diferente. O público reagia mais e melhor a posts práticos e engraçados, em detrimento daqueles sobre segurança.

Não é a primeira vez, nem há de ser a última, que um cliente de agência está tão preocupado com o que a marca tem a dizer que se esquece do que, ora ora, ela também tem a ouvir. Incentivados pela agência, eles toparam o teste: mudaram suas publicações para um conteúdo mais leve e, nos meses seguintes, observaram o crescimento imodesto de 700% no engajamento em suas redes. Dados. Inteligência. Resultados.

PODE TUDO, MAS TEM QUE TER ALGUMA ORDEM NA CASA

O exemplo da Sodexo é oportuno porque, junto do sucesso com o cliente, levou para dentro da ABlab uma mudança em seu modelo idílico de gestão horizontal. A demanda (pense em 700% mais qualquer coisa que existisse antes) os fez rever seus processos internos. A equipe, “mal acostumada”, no bom sentido, tinha resistências a qualquer burocracia. Ricardo lembra o exato momento em que percebeu que algo precisava mudar:

“Sexta-feira, à noite, tem um erro pontual online. Quem vai corrigir? Eu. Perceber isso foi um baque. Entendemos que era inevitável criar algum processo operacional no time”

A saída, diz ele, foi regulada pela relação. Ele reuniu o time, reafirmou a crença na gestão horizontal, mas destacou que aquele problema não podia se repetir. “Pedi para eles gerarem  um mecanismos de controle, que ajudassem a inventar a melhor maneira de resolver a questão”, conta.

De volta à relação com clientes em geral, outra diferença do processo da ABlab para as agências publicitárias comuns seja a seguinte: não existe criação. “É BI, cara, os dados vão dizer o que a gente vai fazer. Se não tivermos a conclusão é porque faltam dados, amanhã vamos levantar mais, até conseguir responder”, diz o Ricardo. “Fico vinte dias estudando dados das redes dos clientes até entender o melhor caminho para resolver a demanda dele. Não tem o glamour.”

UMA AGÊNCIA QUE NÃO COBRA BV, PRAZER

Na lista de diferenças da ABlab em relação a seus companheiros de área, a mais impressionante talvez seja o fato de eles cobrarem verba de mídia. Conhecida como BV (de “bônus de veiculação”), a prática é comum e consiste em destinar uma porcentagem do que o cliente paga para veicular seus anúncios na velha mídia (especialmente TV e mídia impressa) para a agência de publicidade. Ricardo considera isso um erro: “Como eu posso fazer um bom trabalho se eu ganho mais sempre que meu cliente gasta mais?” De opiniões contundentes, ele segue com a palavra:

“No fundo, todo mundo sabe que o mercado publicitário está falido, nivelado por baixo. As cinco maiores agências, hoje, são empresas de tecnologia e o mercado não fala disso”

Ele prossegue: “Todos preferem fingir que a IBM não é a maior agência de publicidade do mundo. E quando a maior gigante de tecnologia é a maior agência de publicidade, o mundo mudou”.

Se não acabou, mudou. E à ABlab resta o desafio de atuar no que seus fundadores consideram um mercado falido. Mais que isso, fazê-lo sustentando o desafio de revolucionar o modelo de gestão de pessoas, via horizontalidade. Tudo isso, enquanto responde a uma expectativa de alta rentabilidade, que o resultado de seu primeiro ano — 4,5 milhões de faturamento — trouxe. Até aqui, parece estar indo bem.

DRAFT CARD

Draft Card Logo
  • Projeto: ABlab
  • O que faz: Agência de marketing digital
  • Sócio(s): Hugo Collier e Paulo Fernandes
  • Funcionários: 33
  • Sede: São Paulo
  • Início das atividades: 2015
  • Investimento inicial: R$ 500.000
  • Faturamento: R$ 4,5 milhões (em 2015)
  • Contato: [email protected]
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