Uma pesquisa recente do Fórum Econômico Mundial mostra que sete em cada dez micro e pequenas empresas têm dificuldades para sobreviver. Esse perfil representa 99% dos CNPJs brasileiros, segundo o Ministério da Economia, e 90% no mundo, e gera 27% do PIB no Brasil e 70% no mundo, além de cerca de 70% dos empregos.
As micro e pequenas empresas participam da cadeia de fornecedores de muitas grandes corporações, e por isso passaram a fazer parte de suas estratégias de sustentabilidade. É o caso da Coca-Cola. Do total aproximado de 1 milhão de pontos de vendas da companhia, cerca de 600 mil são de pequeno porte.
A Coca-Cola quer ser vista como uma melhor parceira de negócios e por isso mantém programas de apoio a empreendedores, que a ajudam também a cumprir suas metas relacionadas aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, da ONU, como promoção de igualdade de gênero, trabalho decente e crescimento econômico.
Um desses programas tem as mulheres como foco e acaba de ser ampliado, de 1 300 para 6 mil vagas. Segundo Katielle Haffner, gerente sênior de Relações Corporativas e ESG da Coca-Cola:
“As mulheres têm mais dificuldade de acesso a crédito, mais dificuldade de fazer networking, a questão da síndrome da impostora e a necessidade de quebrar barreiras de estereótipos de gênero”
O programa “Empreenda como uma mulher” conta com parceiros como engarrafadores, Sebrae e governos locais e oferece às empreendedoras mentorias com especialistas de negócios, capacitação em gestão através de videoaulas curtas enviadas por WhatsApp e microcrédito.
São mulheres como Verônica Dourado Ribeiro Dias, 37, de Salvador. Ela é dona do Ôh, Farofeiro!, uma bike food de espetinhos de churrasco especializada em eventos, e diz que participar do programa a fez mudar sua atitude diante do mercado, o que resultou em um tíquete médio maior e na expansão dos seus negócios.
“Eu tinha muito medo de vender e esperava muito o cliente vir até a mim”, diz Verônica. “Hoje, corro atrás do cliente.”
Não se trata só de uma mudança de atitude. Verônica conta que passar pelo programa de capacitação, com videoaulas recebidas pelo WhatsApp e o acompanhamento de uma mentoria em finanças, lhe deu mais segurança – financeira, inclusive.
“Hoje consigo, com menos eventos, ter um faturamento muito melhor do que eu tinha antes.”
Isabel Cristina da Silva Oliveira, 57, de Porto Alegre, é outra empreendedora beneficiada pelo primeiro ciclo do programa da Coca-Coca.
Dona de bar há 35 anos, ela teve seu faturamento duramente impactado desde o início da pandemia com a proibição de aglomerações, e viu outras empreendedoras sofrerem o mesmo problema. Resolveu, então, desengavetar o projeto de formar a Rede Kitanda de Mulheres Negras para apoiar outras mulheres na criação de pequenas mercearias:
“Esse projeto visa unir a mulher do campo com a mulher da periferia através de alimentação saudável a um preço acessível que dê para a sustentabilidade de ambas”
Primeiro, em parceria com um coletivo de 14 pessoas, Isabel Cristina criou uma organização sem fins lucrativos, que dirige junto com outras três empreendedoras: Elis, Beatriz e Cibele. O Instituto Camélia, em referência à flor usada como símbolo abolicionista, financia a Rede Kitanda e outros projetos com recursos de editais, como o da Coca-Cola.
Depois, ela transformou seu bar na Kitanda da Tyna – quitanda com K, para reforçar a etimologia da palavra (que vem do kimbundo, língua falada em Angola, e significa originalmente “feira”, “venda”).
Com a mentoria que recebeu no “Empreenda como uma mulher”, da Coca-Cola, Isabel Cristina pôde relembrar ferramentas que havia aprendido ainda na sua graduação de administração de empresas, como ter controle total do fluxo de caixa e metas de venda, e recebeu apoio para aplicá-las na prática.
As oficinas e mentorias de que ela participou fortaleceram também sua estrutura emocional para continuar sendo um exemplo para outras mulheres:
“Aprendi a ter consciência de que preciso separar um tempo para cuidar de mim, que a vida da empreendedora individual não é fácil. Somos uma ‘euquipe’, como se diz, e como mulheres ainda temos a casa, o fogão, os filhos, o marido para cuidar, então é interessante deixar de se cobrar a ser uma supermulher perfeita em tudo”
De acordo com uma pesquisa do Sebrae, apenas 6% das mulheres contaram com bancos para abrir seus negócios e 87% não possuem empregados. Mais de 40% dos microempreendedores individuais (MEI) – o perfil de empresa que mais cresce no Brasil – são mulheres.
“Uso a ajuda das grandes empresas para manter a sustentabilidade do meu negócio. Eu tenho todos esses produtos da agricultura familiar, mas continuo trabalhando com o freezer da Ambev – e agora da Coca-Cola”, diz Isabel Cristina. “Se o povo quer, não vou conseguir de uma hora para outra fazer ele tomar suco e esquecer o refrigerante.”
PELAS CONTAS DA COCA-COLA, JÁ SÃO 5 MILHÕES DE MULHERES NO MUNDO IMPACTADAS COM CONTEÚDOS DE EMPREENDEDORISMO
Adotado por uma série de grandes empresas, o conceito de valor compartilhado foi criado há mais de uma década pelos professores Michael Porter e Mark Kramer, da Universidade Harvard, e consiste em fortalecer as comunidades onde uma empresa atua para obter vantagem competitiva.
O apoio a empreendedores faz parte da estratégia de valor compartilhado da Coca-Cola. Katielle afirma:
“Para além de ser um bar, um restaurante, um pequeno empreendimento local é onde a comunidade se encontra, então quando falamos em valor compartilhado é sobre o que podemos fazer que vai ser bom para a empresa, bom para nossos parceiros e bom também para a sociedade”
O conteúdo oferecido pela Coca-Cola sobre empreendedorismo foi atualizado em abril e inclui dicas básicas para economia de água e energia, além de estimular a compra de embalagens retornáveis – que substituem o uso de até 30 embalagens descartáveis, custam menos para o consumidor e têm maior margem de lucro para os comerciantes.
Uma grande meta do programa já foi atingida: 5 milhões de mulheres impactadas pelos conteúdos de empreendedorismo da Coca-Cola em todo o mundo, entre 2011 e 2020.
A estratégia da companhia, porém, ainda precisa evoluir no mesmo ponto em que patina a maioria das empresas adeptas da estratégia de valor compartilhado – comprovar seu real impacto positivo na sociedade.
No caso do “Empreenda como uma mulher”, a companhia ainda não dispõe de dados sobre a riqueza e os empregos que essas mulheres que participaram do programa de empreendedorismo foram capazes de criar após as mentorias. Tampouco existe no momento um acompanhamento para ajudá-las nos desafios de médio e longo prazo.
E os desafios virão, sempre. A terceira e a quarta quitanda que o Instituto Camélia inaugurou, por exemplo, fecharam pouco tempo depois. Uma delas ficava numa região de tráfico e sua presença não foi aceita pelos criminosos; no caso da outra, a dona teve câncer e não conseguiu manter o negócio.
Um artigo escrito em 2022 por Kriss Deiglmeier, especialista em inovação social para o blogue do Fórum Econômico Social, ajuda a iluminar a questão:
“A história mostra que a promessa de valor compartilhado não foi exatamente cumprida. Na última década, a maioria dos índices de desigualdade, saúde e mudança climática pioraram, não melhoraram. A lacuna na igualdade de riqueza aumentou […]. Enquanto isso, as empresas obtiveram lucros e crescimento significativos em suas avaliações de mercado no mesmo período.”
Para a especialista, empresas realmente comprometidas com a construção de valor compartilhado deveriam usar os dados para benefício social com o mesmo afinco, escala e velocidade que utilizam para os fins lucrativos.
Na estratégia da Coca-Cola, o próximo passo é justamente começar a medir o impacto dessas iniciativas no Índice de Desenvolvimento Humano das comunidades onde atua. A companhia revela que um projeto piloto de mensuração do impacto deve começar em Salvador. Falta definir uma meta.
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