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A Conspiração Libertina mostra como é possível ganhar dinheiro com bom humor e ativismo

Nana Queiroz - 24 maio 2017
Luciana e Gabi, no último Carnaval, com adesivos da Conspiração Libertina: bom humor e ativismo em qualquer superfície.
Nana Queiroz - 24 maio 2017
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Há um drama que só empreendedores de Brasília entendem. Imagine os desafios de abrir um negócio em uma cidade em que o mercado privado é praticamente nulo e o sonho de todo universitário quando se forma é passar em um concurso público e dedicar o resto da vida à mesma instituição, até conquistar uma aposentadoria integral?

A alma das designers Luciana Lobato e Gabriela Alves tremia só de pensar em limitar a vida a essa narrativa. Luciana tinha 27 anos, estava desempregada, vivendo de freelas aborrecidos. Passava o tempo vago em protestos e movimentos sociais pelos direitos das mulheres. Gabi tinha 30 e tentava apostar em trabalhos que aliassem sustentabilidade e responsabilidade social, de preferência envolvendo comunidades carentes. Mas ainda lhe faltava algo.

As tatuagens temporárias da Conspiração Libertina foram um sucesso de vendas no Carnaval.

As tatuagens temporárias da Conspiração Libertina foram um sucesso de vendas no Carnaval.

É como se as duas precisassem de uma conspiração contra o sistema. E elas criaram uma: foi dessa vontade de dar sentido ao trabalho e à criatividade latente das duas que nasceu a Conspiração Libertina, uma loja virtual com o lema “Ativismo que cola”, e que vende camisetas, ímãs de geladeira, adesivos e tatuagens removíveis inusitadas. A missão da marca é transformar qualquer superfície em mídia para defender a transformação que elas querem ver no mundo. A Conspiração se apóia em três princípios: custos acessíveis, bom humor e primor estético.

O conceito da marca nasceu quase por acaso quando as sócias, que então eram três, estavam em uma festa de rock observando as pessoas brincarem com tatuagens temporárias (essas de embalagens de chiclete). “As manifestações de mulheres na rua e nas redes sociais estavam a todo o vapor e a gente já tinha este desejo de fazer um negócio que colaborasse com as causas em que acreditamos”, conta Gabi, que na hora teve o estalo e lançou um “Nossa, a gente podia juntar as duas coisas e fazer tatuagens temporárias feministas!”.

As três toparam e, juntas, lançaram a marca em setembro daquele ano, com um investimento minúsculo de 1.300 reais cada. Quatro meses depois, com a chegada do Carnaval de 2016, as tatuagens com viés feminista e de protesto já vendiam mais do que esperado, ampliavam o número de fornecedores, recuperavam o aporte inicial e viam as primeiras cores do lucro.

PROTESTAR NA PELE CUSTA POUCO E RENDE MUITO

Fecharam o primeiro ano com um faturamento de 48 mil reais. Pode parecer pouco para quem está acostumado a ler sobre cases de empresas milionárias, mas basta pensar que elas multiplicaram em 12 vezes o investimento inicial em apenas um ano, período em que maioria dos novos negócios ainda estaria ainda em fase de drenagem de recursos.

A cartela de produtos ativistas da Conspiração Libertina inclui, hoje, as tatuagens removíveis que deram origem à marca, além de pôsteres, quadros, adesivos, camisetas, ímãs, bolsas, patchs bordados e bótons. As mensagens bem humoradas vão de “Ditadura gayzista” e “Sapatânica”, passando por “Útero Laico” e chegando até “Amar sem TEMER” — sucesso de vendas entre opositores de um dos presidentes mais impopulares da história. Luciana fala da estratégia de se divertir, enquanto pratica o ativismo e, ainda, ganha dinheiro:

“Viver é um ato político, se divertir também pode ser. A ideia é que qualquer superfície pode servir para o ativismo, até mesmo sua pele”

Na operação do pequeno negócio, os princípios foram incorporados na linha de produção: os preços começam em 2 reais (um ínfimo adesivo #foratemer) e não ultrapassam os 120 reais (o kit com quatro posters de temática feminista). Tudo é fabricado por pequenos produtores locais.

Além de observarem os princípios que definiram lá no começo do business, as duas sócias também administram o caixa da Conspiração Libertina de maneira bem simplificada. “Tudo que entra é divido em três: um terço para mim, um para Luciana e outro é reinvestido no negócio”, conta Gabriela. “Tratamos a empresa em si como se fosse mais uma sócia e, assim, garantimos que continue crescendo.”

E QUANDO O FACEBOOK BOICOTA SEU BUSINESS?

Além dos desafios comuns a empreendedores sem experiência prévia, as conspiradoras-empreendedoras se depararam também com um inimigo inesperado: o Facebook. Como uma das principais plataformas de divulgação da marca é a rede social, isso acabou se tornando um desafio, por esbarrar nas nem sempre claras políticas da plataforma. Luciana fala a respeito:

“Tudo que abordamos é considerado profano ou inadequado pelas as políticas do Facebook. Por um lado essa censura fez a marca crescer graças à indicação dos clientes. Mas isso nos prejudica, por exemplo, na hora de fazer planos de expansão”

Em seus esforços para burlar essa dificuldade, Luciana e Gabriela tentaram levar o assunto a jornais e revistas, mas não obtiveram sucesso. “A imprensa do eixo Rio-São Paulo pratica uma espécie de boicote a negócios que não são de lá”, diz Luciana. “É como se tivéssemos que provar que também existem negócios criativos e de qualidade em Brasília.”

Por sua vez, Gabriela conta que o medo de que isso inviabilizasse o negócio passou quando elas perceberam o entusiasmo da clientela. Foi como se descobrissem que havia muito mais gente sentindo falta de produtos que dessem vazão às mensagens que as duas queriam gritar para o mundo. E, assim, só no boca a boca, o negócio cresceu (e segue crescendo) além do esperado.

FEMINISMO TAMBÉM É UM BOM NEGÓCIO

O Anuário das Mulheres Empreendedoras, publicado pelo Sebrae, mostrou que as mulheres representam 31,1% dos 23,5 milhões de empresários do país e que a taxa de mulheres que decide empreender a cada ano (1,4%) é maior que a de homens que tomam a mesma decisão (0,8%). Dentro dessa tendência de crescimento pode-se destacar a economia alimentada pela popularização do feminismo. Depois da chamada “Primavera Feminista” pegar força no Brasil, em 2015, com movimentos online mobilizando milhões de pessoas com mensagens anti-assédio, por igualdade salarial e, mais recentemente, contra a reforma da Previdência, o mercado — e a organização do nicho — explodiu.

As tatuagens da Conspiração são provocadoras e divertidas.

As tatuagens da Conspiração Libertina são, pelo conceito da marca, provocadoras e bem humoradas.

A demanda vai de prestação de serviços (como assistência técnica ou reparos domésticos feitos por mulheres) a produtos como os da Conspiração Libertina. Nas redes sociais, proliferam comunidades para quem, por exemplo, quer apenas comprar produtos feitos por outras mulheres, como a Compro de Quem Faz das Minas. Há grupos que ensinam mulheres a empreender, como o Rede de Mulheres Empreendedoras (que já conta com mais de 300 mil inscritas, atendidas por 40 voluntárias no Brasil todo), e grupos que associam mães para facilitar o fluxo de trabalho com os pequenos, como o Maternativa.

No Carnaval deste ano, o segundo da empresa, Luciana e Gabriela sentiram na pele, e no bolso, o potencial do negócio que fundaram. Somente por ocasião do feriado, elas venderam 2 mil itens, faturando 13,5 mil reais em menos de um mês (quase um terço do faturamento de todo o ano passado).

Aliás, apesar de receberem críticas eventuais, como a de “lucrar com o ativismo”, as duas dizem estar com a consciência tranquila. Luciana fala:

“Ruim seria ganhar dinheiro explorando a mão de obra de outras mulheres. Vender produtos feministas é um jeito de reconhecer, dar valor e voz para esse grupo”

Gabriela completa o raciocínio: “Não vemos problema em ganhar dinheiro falando sobre feminismo, porque também precisamos ser reconhecidas e remuneradas pelo nosso trabalho. Fazemos porque amamos, mas também precisamos ter renda para continuar na luta.” Se não faltam motivos para lutar pelo que se acredita, que não falte bom humor, e grana, para ninguém.

DRAFT CARD

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  • Projeto: Conspiração Libertina
  • O que faz: Camisetas, tatuagens removíveis, bótons, quadros e pôsteres de ativismo feminista
  • Sócio(s): Luciana Lobato e Gabriela Alves
  • Funcionários: 2 (as sócias)
  • Sede: Brasília
  • Início das atividades: setembro de 2015
  • Investimento inicial: R$ 3.900,00
  • Faturamento: R$ 46.000,00 (em 2016)
  • Contato: [email protected]
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