O paciente realiza um check-up no Hospital Israelita Albert Einstein. Após os exames, se consulta com o nutricionista, que recomenda um plano alimentar conforme suas condições de saúde. Ele também pode seguir as orientações por um aplicativo, tirar dúvidas sobre o plano alimentar via chat, escrever um diário sobre cada refeição e até usar um scanner (com a câmera do celular) para saber, pelo rótulo, se determinado produto industrializado é saudável
Com cerca de 30 pacientes em um projeto-piloto, o aplicativo foi criado pela N2B, uma das startups incubadas na Eretz.bio, centro de empreendedorismo e inovação do Einstein inaugurado há dois anos na unidade do hospital na Vila Mariana, em São Paulo.
“A pessoa faz um check-up, passa um ano e volta, mas não tínhamos uma ferramenta digital para apoiá-la ao longo desse tempo”, diz José Claudio Terra, 54, diretor de Inovação e Transformação Digital do Einstein. “A nutrição é fundamental para a saúde. Então, oferecemos a solução de uma startup.”
Para ser incubada, diz Terra, a empresa precisa convencer a instituição de sua competência técnica e de que sua solução traz melhorias para a saúde do país.
AS DECISÕES ESTRATÉGICAS AGORA PASSAM POR UM NOVO COMITÊ
O exemplo da N2B ilustra como a “colisão de mundos” (contada por Terra ao Draft em 2017) tem transformado nos últimos anos o ecossistema do Einstein e contribuído para o negócio. O executivo analisa o que mudou de lá para cá:
“Nossa capacidade de trabalhar com esses empreendedores melhorou muito. Não apenas apoiá-los, mas fazer com que eles influenciem a nossa prática, o nosso cuidado com o paciente — e a adoção de soluções”
A Eretz.bio começou com 12 startups incubadas, em novembro de 2017. Agora são 42 (sendo que 13, de fora de São Paulo, assistidas virtualmente). As mais recentes, selecionadas em setembro deste ano, são DataLife, In Situ, Appia, Immunogenic e Bioz.
A incubadora está ligada a uma rede de mentores, com gente como Felipe Fioravante, co-fundador do iFood, Daniel Cleffi, líder do Google Educação para América Latina, e parceiros como a Plug and Play, plataforma de inovação global que reúne startups, corporações e investidores.
Formado em 2019, um comitê de empreendedorismo e inovação dá respaldo ao projeto. Hoje, quase todas as decisões estratégicas passam pelo comitê, diz Terra. “Até o ano passado, decidíamos em nível de diretoria e com o presidente do Einstein. Agora, formalizamos e isso está no nível do conselho”.
EVENTOS GRATUITOS DEBATEM DE AI A INOVAÇÕES EM CARDIOLOGIA
A agilidade no processo e a oportunidade de experimentação têm possibilitado à Eretz.bio uma nova frente de interação com a comunidade empreendedora de saúde.
Desde 2018, encontros gratuitos (divulgados pelas mídias sociais) reúnem profissionais de diversos segmentos, estudantes, empresas, fundos de investimento e empreendedores para debater desde inteligência artificial na saúde até inovações em cardiologia ou genética.
“A gente faz com que as pessoas se encontrem — e a gente as encontre. Apesar de ser meio ‘batido’, acreditamos na história do ecossistema. Isso aqui é uma comunidade de pessoas querendo reinventar a saúde”
Em um ano, cerca de 100 eventos atraíram aproximadamente 3 mil pessoas. Os encontros são oportunidade para os empreendedores testarem seu pitch com investidores externos e o próprio Einstein.
Acomodar as atividades tornou a Eretz.bio meio “apertada” (o espaço atual tem 800 m²). A previsão é que a incubadora se mude para um local maior e mais próximo da unidade do Einstein no Morumbi.
NA HORA DE DEFINIR O APORTE, O FOCO SÃO STARTUPS EARLY STAGE
Nem todas as startups recebem aporte da instituição. Algumas firmam acordo de co-desenvolvimento de produtos; outras, de cooperação científica, caso da mineira Medlogic (cujo acordo envolve parceiros de Brasil e Reino Unido, além dos respectivos governos, no projeto Citizen). Por ora, 15 incubadas receberam investimento da instituição, e a maioria é early stage.
“Damos apoio aos empreendedores na fase inicial. Investimos quando acreditamos que a empresa pode deslanchar um dia, pode virar um unicórnio”
O executivo não detalha exatamente os valores, mas a maioria das 15 startups investidas recebeu aporte na categoria seed (de R$ 1 milhão a R$ 3 milhões), o que dá à instituição uma fatia de participação de 5% a 15% nas empresas.
A N2B, do app de nutrição, está nesse time. Criada em 2016, a startup paulista vende a licença do aplicativo para 20 clientes (como VR Benefícios e as redes de academia Xprime e Smartfit), que repassam o acesso a seus parceiros e colaboradores. Ao todo, a ferramenta soma quase 300 mil usuários.
A startup chegou à Eretz.bio em 2018. Aqueles 30 pacientes do projeto-piloto acessam a plataforma gratuitamente. “O Einstein é bem presente em termos de entender o negócio, saber como está evoluindo, se há outras formas de ajudar, e sempre procura trazer benefícios às startups”, diz o cofundador Cesar Terrin.
A SINERGIA COM O EINSTEIN PODE GERAR INVESTIMENTOS MAIORES
O investimento raramente supera a faixa do seed, de até R$ 3 milhões, mas acontece. Teria sido assim com a recifense Genomika, de Recife, uma startup de medicina personalizada; e a Neoprospecta, de Florianópolis, dedicada à análise, gerenciamento e controle microbiológico.
A relação com a Eretz.bio começou focada em acordos de cooperação (técnica e científica) e co-desenvolvimento de produtos. Com o tempo, percebeu-se, nas palavras de Terra, que havia “sinergia com os negócios do Einstein”. E assim o investimento se tornou mais robusto.
No caso da Genomika, o Einstein detém parte da empresa em um acordo que deve culminar em sua compra integral até 2020. “A Genomika é fundamental para uma área estratégica do Einstein, a medicina personalizada”, conta o executivo. É também, por isso, a única incubada a carregar o nome do hospital.
IDENTIFICAR EMPRESAS DE FATO PROMISSORAS AINDA É UM DESAFIO
Na Eretz.bio, 11 colaboradores de perfis distintos (os três heads vêm das áreas de biotecnologia, ciências farmacêuticas e economia) se dedica à operação. As tarefas vão desde apoiar as startups na inscrição de um edital, na validação científica de projetos e em assuntos como investimentos e gestão empresarial, até fazer o “meio de campo” operacional entre as empresas e o Einstein.
Trimestralmente, um relatório sobre desempenho econômico e financeiro traz avaliação de caixa, receita e margem de cada startup investida. Também são analisados indicadores como a quantidade de patentes a empresa já conseguiu ou no caso de empresas de aplicativos, a evolução no número de usuários.
Identificar empresas de fato promissoras é o principal desafio da Eretz.bio. Como são negócios novos, desbravando muitas vezes áreas recentes da medicina, há sempre chance de subestimar ou superestimar o potencial.
“Já erramos para os dois lados: apostamos em startups que achávamos que iam deslanchar, e não foram para lugar nenhum ou estão muito devagar… E fizemos investimentos que estávamos em dúvida — e que deram muito certo”
Faz parte do segundo grupo a catarinense GnTech, de testes farmacogenéticos baseados no genoma humano. Segundo Terra, de um ano para o outro, a startup multiplicou a receita em sete vezes (e sim, a Eretz.bio se surpreendeu).
O APP DE PLANTÕES É HOJE USADO POR 2 MIL MÉDICOS DO EINSTEIN
As empresas nascidas dentro do Einstein, as “pratas da casa”, ilustram como a inovação tem permeado o dia a dia da instituição. Quatro — Hefesto, Medway, RadSquare e Osler — já saíram do “guarda-chuva” e operam por conta própria. Varstation e Escala estão em fase de transição para se tornarem spin-offs.
Usado hoje por 2 mil médicos do Einstein, o Escala é um app para montar e gerenciar escalas de trabalho. Os gestores criam os turnos considerando folgas e férias dos colaboradores, que acessam seus horários e podem solicitar trocas pela ferramenta. Há duas modalidades: Plantões, destinada aos médicos; e Jornada, para enfermeiras, bombeiros e profissionais de manutenção.
A empresa cresce 20% ao mês e tem hoje 30 funcionários. A ideia surgiu há quatro anos, quando o médico Rodrigo Deliberato foi promovido e descobriu a elaboração da escala entre suas novas atribuições. Insatisfeito com o “trabalho braçal”, ele submeteu ao laboratório de inovação do Einstein um projeto para automatizar o processo.
“Montamos o aplicativo dentro da área de inovação e pilotamos por dois anos no Einstein”, diz Paula Jereissati, que na época era gerente de operações do laboratório do hospital e hoje ocupa o cargo de CEO da Escala. “Nosso viés na área de inovação é olhar para o mercado. Observamos que [a elaboração de escalas] não era apenas um problema do Einstein — e, sim, do setor.”
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