Foi com um processador caseiro dado pela avó que Manoela Braguini, 27, fez sua primeira pasta de amendoim. Isso lá na cozinha da casa dos pais, no Rio Grande do Sul. Ali iniciou-se um outro “processo”, bem mais transformador, que deu início à Holy Nuts, a primeira marca brasileira a oferecer produtos — farinhas, cremes e snacks — à base de castanhas. Os itens estão presentes em mais de 200 pontos de venda espalhados do país, mas agora Manoela acaba de dar um novo salto no negócio: a Holy Nuts inaugurou um café na Vila Madalena, em São Paulo, que serve o café da manhã o dia inteiro. Ali, o público tem a chance de experimentar iogurtes, snacks, doces e milk shakes com o “sagrado” ingrediente em vez do leite animal: tudo é feito de castanhas (de caju, amêndoas, amendoim).
Formada em administração com foco em empreendedorismo, Manoela teve uma breve carreira em um banco de investimentos. “Eu trabalhava captando empresas para receberem investimentos, conversava muito com empreendedores e logo me dei conta que gostava mais do que eles faziam do que do meu trabalho no banco”, conta. Decidida a mudar de carreira, ela deixou o emprego e juntou-se com um amigo para criarem uma marca de cervejas artesanais, a Selva. Acontece que para começarem as operações era necessário vencer algumas etapas burocráticas e foi nesse meio tempo que ela resolveu se aventurar na cozinha.
Na mesma época a amiga, colega de faculdade e futura sócia, Luiza Vortmann, 26, estava focada em prestar concursos públicos. “Nós duas havíamos feito intercâmbio nos Estados Unidos durante a faculdade e lá conhecemos as pastas de amendoim que são tão populares na cultura norte-americana. Sugeri para a Luiza que ela começasse a fazer as pastas para vender e ter uma renda extra enquanto estudava, mas aí acabei me envolvendo no projeto”, conta Manoela.
EMPREENDER PARA TER PRAZER NO TRABALHO
Cada uma tinha cerca de 5 mil reais em economias para investir no novo negócio. Intuitivamente, na base do acerto e erro (e do “uau, essa ficou boa”), elas desenvolveram 15 sabores de pastas, abriram uma conta de email e criaram uma página no Facebook. Poucos dias depois, receberam uma ligação de uma padaria de Porto Alegre interessada em revender o produto. Em seguida, quem as procurou foi a rede de produtos naturais Mundo Verde. Com esses dois clientes, as meninas foram forçadas a se profissionalizar rapidamente. Manoela conta da correria que foi:
“A gente não tinha nem empresa aberta. Tivemos que correr para achar um imóvel onde pudéssemos instalar a produção”
Ela menciona também as dificuldades burocráticas para obter os registros e alvarás de funcionamento. “Essa parte foi bem difícil, falta informação, ninguém sabe explicar direito que documentos você precisa, nem na universidade que era focada em empreendedorismo conseguimos esse suporte.”
No começo apenas as duas davam conta de tudo. “A gente ia juntas no atacadão comprar amendoim. Uma fazia a pasta, outra lavava a louça, nunca tivemos isso de contratar alguém para fazer as coisas. Para montar o escritório, levamos cadeira de casa, computador pessoal. Quando sobrava um dinheiro comprávamos um processador novo”, diz a empreendedora. Por quase um ano, Manoela ainda se dividiu entre a Holy Nuts e a Selva, mas chegou um momento em que ela teve que escolher e acabou vendendo sua participação na cervejaria.
Cerca de um ano após o início da operação, em meados de 2014, elas iniciaram a estratégia (usada até hoje) de enviar os produtos da marca para nutricionistas influenciadoras nas redes sociais. A recomendação, sabe-se, vale muito mais do que a mídia convencional. Os kits (com snacks naturalmente nutritivos e com opções sem açúcar, sem conservantes, sem lactose etc) agradam as profissionais e essa propaganda fez com que mais lojistas procurassem a Holy Nuts.
Mesmo com o negócio crescendo, elas continuaram a levar as coisas de forma artesanal até o final de 2015 quando, pensando em dar um próximo passo e de fato se preparar para expandir, providenciaram a entrada de dois outros sócios, que fizeram um aporte de 60 mil reais na empresa. Com o investimento, adquiriram equipamentos mais profissionais para a moagem, aumentaram a produção, ampliaram a linha de produtos e investiram em novas embalagens.
Foi apenas no início de 2016 que elas contrataram os primeiros funcionários: duas pessoas para ajudar a produção. Isso permitiu, como também é comum a muitos empreendedores, que as sócias finalmente tivessem mais tempo para cuidar do negócio em si. Como a maioria dos clientes já estava concentrada em São Paulo, Manoela, que namorava a distância com um paulistano, decidiu mudar-se para a capital paulista. E aí começou outro capítulo na história da Holy Nuts.
O PRIMEIRO CAFÉ INTEIRAMENTE DEDICADO A CASTANHAS NO PAÍS
Até então, trabalhando com o modelo de revenda, as duas tinham pouco (ou quase nenhum) contato com o consumidor final e, consequentemente, pouco feedback sobre os produtos. “Percebemos que estava na hora de darmos um próximo passo e sentíamos falta desse contato com o cliente. Pensamos em abrir uma loja física, mas a gente não queria concorrer com nossos parceiros de revenda. Foi aí que chegamos na ideia de montar um café”, diz Manoela. Assim, para evitar um desconforto com revendedores, ela acabou criando talvez algo até melhor que um laboratório de experiência do consumidor:
“Queríamos ter essa troca com o consumidor, testar produtos com edições limitadas e também oferecer perecíveis, como iogurtes e pães. Por isso abrimos o café”
O Holy Nuts Café abriu no final de junho deste ano na mesma casa, um sobrado, onde funciona também o escritório da empresa. Além das duas sócias, há outras três pessoas no administrativo e mais seis funcionários no café. “No começo a ideia era que o café fosse um investimento de marca, se pagasse o aluguel já estava valendo. Mas ele está indo melhor do que a gente esperava”, afirma. Ela conta que 70% do faturamento da empresa vem da revenda de produtos, mas o café já responde por 25% (e as vendas no e-commerce representam 5%).
Com um conceito americano de cafés grandes servidos em copos para levar, o Holy Nuts Café está conquistando o público da Vila Madalena e recebe também muita visita de estrangeiros e gente que segue a dieta vegana (ou seja, que evitam qualquer produto de origem animal). Desde que abriram, as meninas já tiveram que ampliar o horário de funcionamento. Hoje o café abre também nos fins de semana, das 9h às 13h com um brunch. Todos os perecíveis, como leites, iogurtes e pães, são produzidos fresquinhos diariamente na cozinha do café.
Em média os produtos da Holy Nuts têm um preço que varia entre 15 e 35 reais, o que faz com que o público da marca seja um pouco mais seleto. Segundo Manoela, são pessoas de classe AB, na maioria mulheres (80%), de 25 a 40 anos e que estão dispostas a pagar um pouco mais por um item menos industrializado, com menos conservantes e mais valor nutricional. A marca tem ao todo 14 produtos: 4 cremes de amendoim 450g, 1 creme de amêndoa 200g, 1 creme de amendoim em sachê 30g, 6 farinhas de castanhas, 1 mix de pão e 1 chips de coco. O mix de pão, que é na verdade uma mistura para fazer pão, é o queridinho e mais vendido.
PASSOS PEQUENOS PARA CHEGAR MAIS LONGE
Se em 2013, quando lançaram a marca, Manoela e Luiza reinavam praticamente sozinhas no mercado de pastas de amendoim, hoje, lidam com a concorrência, que cresceu e apareceu. Atualmente existem pelo menos outras quatro marcas grandes no mercado. “O lado bom disso é que o produto vai ser popularizando e as pessoas estão comendo algo mais saudável do que margarina, por exemplo. E querendo ou não a concorrência também nos força a estar sempre inovando, criando novos produtos”, afirma.
Dos aprendizados tirados até aqui, ela destaca uma lição comum a muitos empreendedores. Testar primeiro para lançar depois, ou ainda, começar pequeno para só então fazer algo em larga escala. “Isso eu aprendi ainda na época da cervejaria, quando a gente imprimiu rótulos para quase um ano e aí se queríamos alterar alguma coisa na composição tínhamos um problema. Na Holy Nuts a gente já fez tudo mais bem pensado. Hoje se a gente cria um produto novo, a gente começa com um piloto, faz uma embalagem simples adesivada, testa primeiro no café para ver como vai ser a aceitação”, conta.
Outros exemplos de adequação que ela cita são as embalagens, que antes eram de vidro, mas encareciam muito o frete pelo peso e causavam muita perda de produto por quebra. Foram substituídas por embalagens de PET. Para Manoela, ter terceirizado a produção e evitado um alto investimento em maquinário também é um exemplo da importância de não dar um passo maior que as pernas.
Elas já receberam pedidos de franquias da marca e, apesar de continuarem cautelosas e acreditarem que ainda não é a hora de dar esse passo, no site do café há um formulário online para cadastrar os possíveis interessados. “Queremos arredondar melhor a operação antes de fazer isso”, diz Manoela, que também fala do interesse de outros cafés e lojas em revender leites (o de amendoim sai a 10 reais o litro, o de amêndoa, a 16 reais), iogurtes (500 mil do de amêndoa custam 18 reais), farinhas (1 kg de farinha de amendoim custa 20 reais) e cremes (2 kg de creme de amendoim custam 20 reais) da Holy Nuts em modelo de food service.
A empresa era uma revenda para lojistas e e-commerce. Hoje, é isso e também um café, com food service e a possibilidade de atender a encomendas para eventos, além de oferecer cestas de café da manhã. A demanda se diversifica e isso existe ajustes na logística do negócio. “Estamos considerando a possibilidade de ter uma segunda cozinha para atender essa demanda”, diz Manoela. E ela quer mais. Entre os planos para o futuro há uma possível empreitada em shopping centers. “Queremos testar um modelo de quiosque em um lugar de grande fluxo de pessoas, mas não temos nada certo ainda”. De passinho em passinho, as meninas vão em frente. Com tanta castanha, não vai faltar energia.
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