Quase dois anos depois da primeira reportagem publicada no Draft, que destacava o faturamento de mais de 1,2 milhão de reais, muita coisa mudou na Leaf. Lançada em 2012, foram os primeiros a produzir óculos de madeira no Brasil. Em fevereiro de 2015, viviam o auge da empresa, que se definia como uma marca de óculos de madeira. Com o negócio crescendo e recém mudados para uma sede nova, os meninos nem imaginavam o que estava por vir. “Reler o texto foi meio chocante. Era uma época em que o Brasil vivia um momento sensacional. Estávamos indo muito bem, empolgados com o novo espaço. A gente não tinha a menor noção do que poderia acontecer com a empresa e com o país nos meses seguintes”, diz um dos sócios, Juan Carri.
No ano que está terminando, eles viram o faturamento cair, fecharam pontos de venda e, em outubro, ao perceber que o barco estava quase afundando de vez, os sócios tomaram uma decisão desesperada — mas que acabou salvando a empresa da falência. Abriram o jogo e, numa campanha no Catarse, intitulada “Vida Longa à Leaf” conseguiram fundos para manter no negócio de pé.
Eles montaram diversos kits de produtos com valores que iam de 20 a 1.700 reais. O objetivo era ambicioso (eles escolheram como meta 120 mil reais, no modelo de campanha flexível, ou seja, que não precisa necessariamente bater o teto para ser bem sucedida) e, no entender deles, funcionou: amigos e admiradores da marca se mobilizaram e ao todo foram arrecadados 26.210 reais. Juan conta como foi o processo:
“Fomos transparentes. Contamos para todo mundo que a crise tinha batido forte e que precisávamos de ajuda para manter a Leaf de pé”
Ele conta que a somatória do valor arrecadado no Catarse com as vendas do site em outubro — que foram bem acima da média, até por consequência da campanha — seguraram a empresa. “A gente espera fechar o faturamento esse ano em mais ou menos 900 mil reais”, diz, aliviado.
QUASE FALIR, ARRUMAR A BAGUNÇA E, SÓ ENTÃO, RENASCER
O susto fez com a Leaf amadurecesse. Eles ajustaram o modelo de negócio, redefiniram funções, aumentaram o portfólio de produtos, aperfeiçoaram a produção e conseguiram realizar um sonho antigo: ter um bar junto com a loja par reunir amigos e clientes. “A essência da Leaf ainda é a mesma, mas entendemos que a gente precisa de outros caminhos para não ficar numa corda bamba”, afirma Juan.
A equipe, hoje, está mais enxuta. Enquanto em 2015 eram 15 funcionários, hoje são 13. “Dois pediram para sair, porque resolveram tocar outros projetos, e aproveitamos isso para rever nossa estrutura. Decidimos não substituir essas pessoas e redistribuir as tarefas”, conta Juan.
Nesse caminho de superação da dificuldade, agora cada um tem uma função mais bem definida na empresa. Eles fizeram a lição de casa de avaliar o perfil das pessoas e colocá-las na função em que se saíam melhor. Isso permitiu, como consequência, que aperfeiçoassem a produção e também a qualidade das peças. “Antes, quando chegava um pedido muito grande a gente sambava. Hoje, temos a tranquilidade de que saber vamos conseguir entregar”, diz o sócio fundador.
A mudança de sede trouxe também mais profissionalismo para a rotina da empresa. Se antes tudo acontecia meio junto (e meio bagunçado), no novo sobrado que ocupam em Perdizes, na capital paulista, a produção e o administrativo estão em andares separados.
Agora a Leaf se define como um estúdio de produto. Juan fala de como foi acomodar seu produto original, os óculos de madeira, a uma ideia de estúdio capaz de produzir também outras peças. “Acredito que os óculos de madeira são atemporais, não só uma moda. Mas a gente não queria fazer só óculos para sempre”, diz, e prossegue:
“Se a gente tivesse ficado só fazendo nos óculos, estaríamos mortos. Diversificar o portfólio foi uma questão estratégica, mas também de satisfação pessoal”
Hoje, além dos óculos de madeira que são a marca registrada deles (com modelos custando de 494 reais a 569 reais), a Leaf agora tem uma linha de headphones (por 379 reais), uma linha de “home design” onde há desde cadernos com capa de madeira, a 79 reais, até uma luminária, a 409 reais, e uma peça única na linha “mobiliário”: uma versátil mesa, chamada 2 para 1, que sai 970 reais e tem meia dúzia de montagens possíveis. Tudo de madeira.
Outra coisa que eles foram obrigados a aprender neste ano tão difícil foi buscar alternativas para diminuir custos. Aproveitar inteligentemente as sobras foi um dos caminhos. A Leaf tem hoje uma pessoa focada apenas em desenvolver produtos a partir das sobras de corte de madeira. Com a maior diversidade de produtos, a empresa passou a ter também designers dedicados somente ao desenvolvimento das peças, e agora estuda a possibilidade de estabelecer parcerias com universidades.
A RETOMADA E OS DILEMAS DE UM NEGÓCIO QUE PRECISA SE MANTER
Acreditando que o pior momento já passou, a Leaf faz planos para 2017. Estes incluem a reabertura de pontos de venda próprios e, até mesmo, uma possível linha de óculos de acetato. “Esse na verdade é um dilema. Se formos ver, todas as marcas de óculos de madeira do mundo seguiram esse caminho. A gente pensa em talvez misturar a madeira e o acetato. Isso seria uma forma de baratear o produto e conseguir produzir em maior escala”, diz o fundador.
Para ele, essa seria uma forma de alcançar outros consumidores. “Tem gente que quer consumir Leaf mas às vezes não se identifica totalmente com a madeira, ou acha que o preço está muito acima do que ele pode pagar. Com o acetato a gente conseguiria atingir essas pessoas.” A seu ver, a mudança no material não descaracterizaria a marca. “Desvirtuar a Leaf seria a gente produzir óculos de madeira em massa, isso acabaria com a nossa essência, teríamos que ter uma produção industrial e não queremos isso”, afirma.
Apesar de todas as dificuldades deste último ano, Juan não se vê fazendo outra coisa que não seja ter seu próprio negócio. Além de manter a Leaf em pé, esses dois últimos anos foram de grandes mudanças na vida do jovem empreendedor de 27 anos. Ele concluiu a faculdade de design de produto e saiu da casa dos pais para morar sozinho. Ele conta:
“Me vejo como empreendedor para sempre. Não por dinheiro, pois não há como monetizar os benefícios de empreender, como ter meu horário, criar meu dia. Ao mesmo tempo, nunca paro de trabalhar”
Ele prossegue falando de um futuro talvez mais distante: “Pode ser que a Leaf chegue em um tamanho em que passe a caminhar sozinha e em que a função de empreendedor vá se transformando mais em uma função de gestor. Aí, pode ser até que eu resolva tocar outros projetos em paralelo”. Empreender, sempre.
Criada em 2011, a plataforma de financiamento coletivo enxugou a equipe, automatizou processos e abriu novas modalidades de campanha – incluindo a assinatura, com apoiadores mensais que sustentam iniciativas como o site The Intercept Brasil.
A produtora paulistana foi pioneira e inovou na criação publicitária digital na década passada. Andre Passamani e Eduardo Camargo compartilham as lembranças e aprendizados à frente da empresa.