O dia 14 de março de 2022 foi provavelmente o mais importante da carreira do engenheiro carioca Marcus Moraes, 47.
Depois de uma espera de 27 anos, ele realizou o sonho de colocar a sua marca em uma das academias de musculação mais famosas do mundo: a Muscle Beach, área ao ar livre e à beira-mar localizada em Venice Beach, na Califórnia.
Contratada pelo órgão que administra áreas públicas de lazer em Los Angeles, a Mude (Mobiliários Urbanos Desportivos), empresa de Marcus, repaginou o espaço, instalando equipamentos de aço inox fabricados aqui no Brasil.
Essa reinauguração coroa uma trajetória de duas décadas. Fundada em 2001, a Mude hoje se define como uma plataforma de atividades físicas e bem-estar que conecta pessoas, profissionais de educação física, cidades e marcas.
Em parceria com prefeituras e patrocinadores, a empresa viabiliza espaços públicos para a prática de esportes, como academias e estações de ginástica, que operam por meio de um aplicativo gratuito, no qual são oferecidas aulas e experiências. Segundo Marcus:
“É um sistema onde todos saem ganhando: alunos, professores, marcas e o poder público”
O modelo vem dando certo. O fundador informa que, mesmo com a pandemia, a Mude cresceu 80% de 2019 para 2020 – e prevê triplicar o faturamento em 2022.
Para isso, deve utilizar o aporte recebido em janeiro deste ano – 25 milhões de reais do fundo HS Investimentos – para aumentar o número de estações e academias, e aprimorar o app.
A Mude nasceu da paixão de Marcus pelos esportes.
O empreendedor, por sinal, diz que a trajetória até aqui bem-sucedida da Mude deve muito a seu próprio estilo, uma mistura da tranquilidade do ioga com a garra do jiu-jitsu, atividades que pratica.
“O jiu-jitsu ajudou a me forjar como empresário. Com ele aprendi que, se não é do dia para noite que se constrói uma faixa preta, não é do dia para noite que se constrói uma empresa ou produto de impacto”
Filho de um lutador de jiu-jitsu faixa vermelha e preta (um dos graus mais altos na arte marcial), começou a treinar aos 4 anos, na academia de Relson Gracie.
A trajetória no tatame o levou aos Estados Unidos em 1995, onde disputou um campeonato em Venice Beach, praia de Los Angeles. Lá, entre uma luta e outra, o então jovem de 20 anos visitou e ficou encantado com a academia à beira-mar Muscle Beach.
“Achei legal os caras grandões e fortões treinando com o público tirando foto em volta. E tudo ao ar livre”, relembra.
Ele voltou ao Brasil com a ideia de montar um espaço semelhante no Rio de Janeiro, mas com equipamentos que não enferrujassem. Foi essa a ideia inicial que impulsionou a Mude.
No ano seguinte à passagem por Venice Beach em 1995, Marcus decidiu trancar a faculdade de engenharia de produção para morar durante uma temporada de seis meses no Havaí.
Em 1997, ele retornou ao Brasil para terminar a faculdade. Dois anos mais tarde, deu o primeiro passo no projeto de empreender no setor fitness.
Por essa época, em 1999, Marcus treinava na academia Radar, em, Copacabana. Seu professor de musculação era Sergio Malveira (mais conhecido como Tucano), dono da Radar, que tinha desenhado seus próprios aparelhos. Os dois, então, decidiram se unir:
“Como ele já tinha feito equipamentos em ferro para equipar a Radar, nos juntamos para o desenvolvimento dos equipamentos de aço inox – e com apoio de professores da UFRJ de Educação Física, também desenvolvemos o conceito da academia ao ar livre”
Dentro desse conceito, por exemplo, entrava o sistema de aulas de 30 minutos (“com filas por ordem de chegada, como num parque da Disney”). Os dois alugaram um galpão, no bairro da Ilha do Governador, para produzir o primeiro conjunto de aparelhos.
Marcus convenceu a prefeitura carioca a fazer um primeiro teste, instalando uma academia pública na Praia de Ipanema. Os equipamentos ficaram lá durante seis meses, e depois foram levados para Campos dos Goytacazes, no norte fluminense.
“Esse foi o primeiro projeto-teste de academia ao ar livre”, diz Marcus. “Na época ainda não existia a Mude.”
Nesse período, já formado, Marcus teve algumas experiências profissionais. Depois de um estágio em uma empresa no setor petrolífero, trabalhou com marketing esportivo e foi diretor de marketing da Orquestra Sinfônica Brasileira.
Em 2001, abriu uma boate, mas não se adaptou à vida noturna e a vendeu três meses depois. Ele gostava mesmo era de saúde e esporte. vendeu o negócio, entrou em uma pós-graduação em Administração Esportiva e começou a estruturar a Mude.
Na construção da marca, o “M” estilizado em um ziguezague sinuoso representa as curvas do caminho da transformação. Não deixa de ser um símbolo para as mudanças da empresa nesses 21 anos.
O primeiro modelo de negócios era simples e baseado no teste de 1999: fabricar os equipamentos, vender e esperar pelo próximo comprador.
Surfando na onda dos royalties de petróleo, que injetaram recursos públicos em cidades fluminenses como Macaé e Rio das Ostras, a Mude chegou a instalar cerca de 20 academias na região.
“O grande problema é que as prefeituras não cuidavam, não faziam manutenção… Não geriam o projeto”
Percebendo a falha, ele evoluiu o modelo de negócios em 2005 para permitir que a Mude participasse mais dos projetos.
Em uma das frentes, a empresa alugava a academia para as prefeituras com a contrapartida de qualificar os professores e deixar a manutenção em dia.
Na outra, passou a promover eventos de atividade física e bem-estar patrocinados, voltados para experiências de marca. A operadora de planos de saúde Amil foi a primeira empresa privada a patrocinar a Mude, com uma academia na Barra da Tijuca que oferecia aulas de ioga.
“Como empresa de saúde, a Amil viu a importância da atividade física para a construção da marca – e nos patrocinou por dez anos.”
A terceira curva na trajetória da Mude veio em 2010, quando a empresa enxergou a oportunidade de transformar suas academias e estações em espaços para publicidade em mídia Out of Home (OOH).
“Passamos a figurar entre as gigantes de OOH internacionais com um produto brasileiro, patente brasileira, e nos transformamos em uma empresa de mídia e bem-estar.”
A empresa não vende mais os equipamentos. Marcas e cidades interessadas em alugar uma academia, com manutenção e acesso ao aplicativo, desembolsam em torno de 13 mil reais por mês.
“Desenvolvemos um conceito que chamamos de Fitness as a Service, com produtos e serviços de bem-estar que são ofertados de maneira contínua e em conjunto”
Projetos continuados de branding, por sua vez, custam 100 mil reais. E eventos mais longos (que podem se esticar pelo verão inteiro) saem por cerca de 1,5 milhão de reais – incluindo equipamento, tablado, produção visual, taxas da prefeitura, professores e uniformes personalizados.
O caminho de transformações da Mude culminou, enfim, na transformação digital. Em 2016, Marcus criou o primeiro aplicativo da empresa, baseado em uma plataforma americana de branded app.
“Todo mundo na empresa dizia que ia dar errado, mas em menos de um ano a gente já tinha mais de 100 mil usuários cadastrados”
Com o sucesso, ele decidiu montar uma equipe para desenvolver um app próprio. Chamou como consultor executivo André Braz, que havia chefiado a área de design, produto e user experience do portal Globo.com.
Além do projeto do aplicativo, Braz coordenou a criação do branding e da estratégia digital, posicionando a Mude não apenas como uma empresa de academias ou de OOH, mas como uma plataforma de saúde e bem-estar que conecta todo um ecossistema.
A mudança para o digital veio em boa hora. Em 2020, durante o primeiro ano da pandemia de Covid-19, a Mude esteve preparada para enfrentar a abrupta suspensão das atividades coletivas e ao ar livre.
De um dia para o outro, todas as aulas (e alguns contratos de locação) foram interrompidas.
“Em 15 dias, a gente lançou aulas gravadas e ao vivo”, diz Marcus. “A equipe de tecnologia foi rápida para lidar com isso e mantermos todos os professores e funcionários trabalhando de casa.”
E o que no início, como para todo mundo, foi um susto, para a Mude virou uma oportunidade. Segundo o CEO, o coronavírus despertou as pessoas e marcas para a importância do bem-estar e da qualidade de vida.
“Antes eu ouvia das empresas que o bem-estar não era parte da plataforma de comunicação deles… Hoje, todas as empresas têm o bem-estar como principal plataforma de comunicação, de entregas e retenção de funcionários. Isso entrou no mainstream mundial e fez a nossa demanda subir”
Atualmente, a Mude tem 100 academias gratuitas e 650 estações de exercícios físicos espalhadas pelo Brasil. Os aparelhos, hoje, são fabricados pela Mude em outro endereço, num terreno anexo à universidade Unisuam, em Bonsucesso, Zona Norte do Rio.
Para manter tudo funcionando, a empresa conta com quase 120 pessoas empregadas indiretamente, incluindo professores contratados por prefeituras e patrocinadoras, e assessores esportivos que usam os espaços para atender os clientes.
A chegada a Venice Beach talvez seja a melhor ilustração da paciência, persistência e visão de futuro do empreendedor.
“Toda vez que eu ia a Venice, ia lá no tiozinho que cuidava da academia e deixava um folder e um cartão.”
Até que a oportunidade veio quando Ron Kramer, dono da marca Muscle Beach nos EUA, viu que no Brasil os direitos de uso do nome pertenciam à Mude. “Esse cara me inspirou e me ajudou a vender para a prefeitura [de Los Angeles]”, diz Marcus.
O contrato para a revitalização da Muscle Beach foi assinado em 2018. Os equipamentos, produzidos no Rio, foram enviados à Califórnia no ano seguinte – mas a pandemia suspendeu a inauguração, que só foi acontecer em março de 2022.
“Foi mais uma coisa que o jiu-jitsu me ensinou: esperei 20 anos para ter a faixa preta… E agora esperei 27 anos para ter a academia em Venice Beach”
Marcus ainda não se dá por satisfeito — agora, quer transformar a Mude em um ecossistema completo de práticas de bem-estar, promovendo desde atividades físicas até competições. Para isso, já tem planos de evoluir mais ainda a parte digital, criando mais produtos e aumentando a comunidade.
“Agora temos um investidor e bastante dinheiro para apostar em novos sonhos. E eu tenho uma maior segurança pessoal e experiência profissional.”
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