Os supermercados acumularam uma alta de 5% nos preços, de janeiro a maio de 2021, segundo a Associação Brasileira de Supermercados, e a inflação tende a corroer ainda mais o poder de compra dos brasileiros.
As famílias vêm quebrando a cabeça para equilibrar as contas sem ter que esvaziar demais o carrinho de supermercado. Ao mesmo tempo, as indústrias de alimentos e bens de consumo se veem constantemente obrigadas a descartar produtos com prazo de validade prestes a expirar.
A SuperOpa surge como uma solução para esses dois desafios. O marketplace firma parcerias com distribuidoras para disponibilizar ao consumidor final produtos próximos da data de vencimento, com descontos de até 70%.
Segundo Luis Borba, 27, fundador e CEO da empresa:
“O Brasil descarta 41 mil toneladas de alimentos por dia, sendo que 44% acabam perdendo a validade antes mesmo de chegar aos supermercados. A SuperOpa quer combater esse problema evitando desperdícios e trazendo preços mais baixos para o consumidor”
Em 2020, de acordo com o empreendedor, a SuperOpa evitou que cerca de 20 toneladas de produtos fossem descartados. Esse ritmo vem se intensificando em 2021: somente em julho, diz Luis, a startup impediu que 4 toneladas de alimentos e 11 toneladas de bebidas fossem incineradas — comercializando esses itens a tempo.
COMO FUNCIONA A FERRAMENTA DA SUPEROPA
A SuperOpa atende (por enquanto) 500 cidades, exclusivamente nos estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Em seu aplicativo, o consumidor encontra mais de 800 produtos convencionais ou próximos do vencimento, como alimentos, bebidas, cosméticos e produtos de higiene.
Depois de baixar o app, o usuário preenche o seu CEP, para saber se a cidade onde vive está no raio de atuação da empresa. Daí, é só adicionar os produtos a cesta de compras, que atualmente precisa somar um valor mínimo de 150 reais (mas que, ainda neste semestre, deve baixar para 90 reais, segundo o empreendedor).
A SuperOpa fica com 30% de margem sobre as compras de mercadorias com prazo de validade menor e 15% sobre os produtos convencionais.
DURANTE A FACULDADE, ELE DESPERTOU PARA A QUESTÃO DO DESPERDÍCIO
A história da SuperOpa começou em 2016, quando Luis cursava administração na Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo.
“Eu sabia que queria atuar com tecnologia, mas trabalhava no mercado financeiro, na parte de fusão e aquisição no Citibank… Até que, um dia, vi uma [matéria] eletiva de gamificação”
No curso, o professor Leandro Zanardi desafiou os alunos a propor uma solução gamificada para algum problema socioambiental. Os alunos foram divididos em grupos; no de Luis havia um intercambista de Taiwan que trouxe a questão do desperdício de alimentos.
No fim, o projeto desenvolvido naquela aula inspirou a escolha de tema de Luis para seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), que o levou a se aprofundar na questão do descarte de alimentos no Brasil.
O ESTALO VEIO EM UMA VISITA A UMA DISTRIBUIDORA DE ALIMENTOS
Na época, Luis visitou uma grande distribuidora de alimentos para entender o porquê de tanto desperdício.
“Cheguei lá e fui passear com o diretor de operações, até que percebi uma rua naquele Centro de Distribuição gigantesco onde estava escrito ‘quarentena’. Havia um portão de metal e uma corrente passada com cadeado.”
O lugar armazenava produtos em boas condições para o consumo. O estarrecedor é que, como o prazo de validade (entre 15 e 60 dias) era considerado curto, aqueles itens não seriam vendidos ao varejo.
“A doação de alimentos costuma ser um processo complicado; por isto a distribuidora o fazia apenas uma vez por trimestre. O pior é que eles pagavam para incinerar a maior parte daqueles produtos”
Luis decidiu ajudar a dar um fim àquele prejuízo ambiental e social.
“Pensei que poderíamos pegar esses produtos e vender mais barato para quem não tem acesso.”
O PROFESSOR DA FACULDADE EMBARCOU COMO SÓCIO NO PROJETO
Luis deu seus primeiros passos em sua jornada empreendedora comprando alguns produtos que revendia entre amigos. “Tinha dias em que eu enchia meu carro de coisas e via se as pessoas teriam interesse.”
Leandro, o professor da eletiva da gamificação, acabou embarcando no projeto como sócio. A ideia do nome surgiu quando os dois ainda se dedicavam part-time à startup, virando madrugadas. A interjeição opa! fazia pensar na necessidade de acordar para o desperdício.
Para tirar o negócio do papel, eles investiram 370 mil reais. A primeira versão do aplicativo foi lançada em 2019.
“No começo, tínhamos medo de que tudo pudesse dar errado. Por isso, nos esforçamos para a ideia ir adiante: o Leandro com o desenvolvimento da tecnologia e eu na prospecção dos produtos”
Em 2019, a SuperOpa ainda estava numa fase de aprimorar a tecnologia. Naquele ano, os empreendedores resolveram participar do Web Summit Portugal.
O interesse de outros participantes da conferência de tecnologia ajudou a convencê-los de que o desperdício de alimentos era uma questão global — e que a jornada que eles vinham trilhando estava no caminho certo.
O VOLUME DE PRODUTOS COMERCIALIZADOS CRESCEU 36 VEZES EM 2020
Construir parcerias com distribuidores e a indústria de alimentos foi crucial para escalar o negócio.
“É lá [nessa ponta da cadeia] que está o maior desperdício”, diz Luis. “E, com a pandemia, tivemos em 2020 um salto na quantidade de transações.”
No ano passado, o volume de produtos oferecidos pela SuperOpa aumentou 36 vezes, devido às parcerias costuradas — com marcas como JBS, BRF, Ambev, Nestlé e Unilever — e ao avanço das compras online, impulsionadas pela Covid-19.
“Nosso volume comercializado aumentou significativamente. Recebemos os produtos, enviamos para um centro de distribuição parceiro e fazemos a roteirização das entregas para o consumidor final”
Luis lembra, por exemplo, de uma picanha que ficou retida na alfândega e chegaria com apenas dez dias de validade à distribuidora — e, por isso, seria descartada. A SuperOpa conseguiu mudar essa história.
“Aquele lote de picanha vendeu em dois dias — zerando o desperdício do produto na distribuidora.”
A EMPRESA REDUZIU SUA TAXA PARA TORNAR PRODUTOS MAIS ACESSÍVEIS
A SuperOpa dispara pesquisas entre os usuários para conhecer melhor o seu público. “Temos cerca de 10 mil usuários ativos na nossa plataforma”, diz Luis. Cadastrados, são mais de 50 mil.
Segundo os dados das enquetes, essa base é composta principalmente por famílias com uma renda mensal inferior a 5 mil reais.
“Uma senhora respondeu uma pesquisa afirmando que comprava quando tinha dinheiro…. A realidade é que tem gente passando aperto e isso está aumentando.”
Para ajudar o consumidor, o empreendedor conta que chegou a diminuir o take rate (taxa cobrada pelo marketplace), que em geral gira em torno de 20% a 30%, para 5% dependendo do produto.
“Comercializamos alguns produtos pelo custo da transação e da entrega. Vimos que, direcionando para as pessoas que necessitam mais, criamos um público e resolvemos um problema dos distribuidores que estão com produtos travados”
A startup começou 2020 comercializando 20 mil reais por mês; fechou o ano com um total 780 mil reais em transações.
Em 2021, a expectativa é crescer e evitar o desperdício de 150 toneladas de produtos próximos do vencimento.
“É uma métrica interna, temos esse viés socioambiental para mapear se estamos de fato ajudando o meio ambiente e se conseguimos vender produtos para pessoas que realmente necessitam”, diz Luis.
DAS PLANILHAS MANUAIS À AUTOMATIZAÇÃO DO PROCESSO
No início, os empreendedores faziam de forma manual o upload dos produtos no sistema, selecionando itens a partir das planilhas de alimentos enviadas pelo distribuidor.
“Aos poucos, a gente criou uma arquitetura de integração de forma que puxássemos o banco de dados do estoque do distribuidor, alimentando nosso sistema de forma 100% automática”
Hoje, o processo ficou mais simples: a SuperOpa faz apenas uma curadoria para a entrada de novos itens, editando a descrição e as fotos dos produtos. Os preços são automaticamente atualizados, ajustando ao take rate.
O prazo de entrega dos alimentos é de apenas um dia; a entrega de bebidas ocorre três vezes por semana. A escala foi roteirizada para baratear a compra para o consumidor. “Mesclamos de forma a atender o máximo de cidades e com um custo pequeno.”
Parte da logística fica a cargo do distribuidor, mas em algumas cidades onde a demanda é mais recorrente — como Guarulhos (SP) –, a entrega é realizada por um prestador de serviços da SuperOpa.
Buscando suprir um critério de confiabilidade, a marca envia ao distribuidor um encarregado para analisar o estoque e credenciar os produtos com um QR Code, atestando a qualidade do produto e informando a necessidade de consumo rápido.
O MERCADO DE PRODUTOS PARA CONSUMO IMEDIATO VEM CRESCENDO NO PAÍS
A bandeira do combate ao desperdício de alimentos tem levado startups a apostar em negócios similares ao da SuperOpa. Com a possibilidade de pagar menos, quem ganha é o consumidor.
Aqui no Draft, já apresentamos a Gooxxy, fundada em 2017. Outra solução, o aplicativo Último Pedido foi lançado em 2020 e reúne restaurantes em Porto Alegre, Canoas e Esteio (RS) e soma mais de 5 mil downloads e cadastros. Ao abrir o app, o consumidor encontra uma opção surpresa de prato montado por algum restaurante com sobras de ingredientes.
No começo de 2021, surgiu mais um player, a B4waste. Diferentemente da SuperOpa, que comercializa produtos dos distribuidores, a startup atua com o varejo (supermercados, restaurantes, empórios, padarias e cafés).
O OBJETIVO É ERGUER UM CENTRO DE DISTRIBUIÇÃO E AMPLIAR O MIX DE PRODUTOS
Trazer impacto positivo para a sociedade é um pré-requisito para os negócios que não quiserem desaparecer, diz Luis, da SuperOpa.
“Quando estamos com um produto inviável para a comercialização, mas ainda em condição de consumo, acionamos ONGs parceiras que os distribuem para entidades”
Até aqui, os sócios da startup captaram 330 mil reais com o fundo Downwind, numa rodada pré-seed. Mais tarde, a SMU Investimentos e a Bossa Nova injetaram outros 2,3 milhões de reais no negócio.
Olhando à frente, o empreendedor almeja aportes mais robustos para erguer um centro de distribuição próprio, o que permitiria um mix maior de produtos. “Esse é um objetivo que queremos alcançar em 2022.”
Ao mirar o retrovisor, ele se revela surpreso com a velocidade com que a startup cresceu.
“A gente não tinha a visão de que o negócio daria tão certo em um espaço de tempo tão curto”, afirma Luis. “Existe muita demanda — e nosso sonho é expandir para o Brasil todo.”
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