Em 2024, enquanto muitas pessoas me aplaudiam pelas conquistas profissionais, meu coração chorava em silêncio. Foi o ano em que a tristeza ocupou um lugar importante na minha vida — um espaço que eu precisei aceitar, acolher e, acima de tudo, respeitar.
Aos 42 anos, engravidei naturalmente de gêmeos, vivendo uma montanha-russa de emoções. Do momento em que descobri a gravidez até às consultas médicas, vi sonhos ganhando forma. Planejei, imaginei e me deixei levar por esse sentimento de renovação e esperança.
Mas com 15 semanas de gestação, precisei enfrentar uma das dores mais profundas que uma pessoa pode viver: a perda gestacional. O chão literalmente sumiu dos meus pés. Foi um luto que veio acompanhado de perguntas sem resposta, uma dor solitária que só quem já viveu consegue compreender
Naquele momento, aprendi que a tristeza não pede licença. Ela chega e toma espaço. O mais fácil seria tentar sufocá-la, fingir que tudo estava bem, vestir uma máscara e seguir adiante como se nada tivesse acontecido. Mas minha história — e minha vivência em saúde mental — me ensinaram o oposto: era preciso parar, sentir, me recolher. Foi o que fiz.
Tive que me permitir chorar nos encontros com minha psicóloga. Aos prantos, tentava elaborar o vazio que sentia. Tive que aceitar que havia dias que simplesmente não dava para levantar da cama, e está tudo bem. Tristeza, afinal, não é fraqueza. Ela é, muitas vezes, a ponte para a reconstrução de nós mesmos.
E foi esse processo de acolher a minha dor que me permitiu reconstruir meu chão e, pouco a pouco, redescobrir recursos que eu não sabia que tinha.
Não foi um caminho linear — luto nunca é. Alguns dias eu me sentia pronta para enfrentar o mundo, em outros parecia que a tristeza voltava ainda mais pesada. Mas, ao me permitir viver plenamente esse luto, percebi algo muito importante: tristeza não é um inimigo a ser combatido, mas uma emoção humana que nos transforma
No mesmo ano em que vivi essa perda devastadora, também alcancei realizações profissionais que, há anos, sonhava conquistar. Contribuí para evoluções significativas na regulamentação da saúde mental no Brasil, participei de debates históricos sobre saúde no trabalho e liderei projetos que promoveram mudanças reais.
Por fora, parecia que minha vida estava repleta de vitórias. Por dentro, eu estava juntando meus caquinhos e me reconstruindo após uma das maiores perdas que tive. Ela me fez entender que, para cada queda, existe um recomeço. Que cada dor pode ser o ponto de partida para algo novo. E, acima de tudo, que aceitar nossa vulnerabilidade não é fraqueza, mas um dos atos mais corajosos que podemos realizar. É assim que seguimos em frente, transformando dor em aprendizado, e tristeza em resiliência.
Foi uma convivência paradoxal — celebrar um lado da vida enquanto lidava com a dor em outro. Mas isso me trouxe uma das lições mais importantes deste ano: não precisamos esconder nossa tristeza para conquistar e crescer. Não precisamos fingir que tudo está bem para inspirar os outros
A vulnerabilidade, essa capacidade de mostrar quem somos de verdade, é também um ato de força. Ela nos conecta, nos humaniza, nos faz lembrar que todos somos atravessados por perdas e ganhos, alegrias e tristezas.
Na última semana, uma rede social popularizou a trend “como vou ser triste em 2024 se…”, acompanhada de imagens que exaltam conquistas e momentos felizes. Embora pareçam leves e divertidas à primeira vista, essas trends refletem um problema mais profundo: a ideia de que não há espaço para a tristeza em nossas vidas.
Essa narrativa reforça a cultura da felicidade tóxica, onde sentir-se triste é visto como algo errado ou um desvio do que se espera de uma vida “bem-sucedida”. É como se a tristeza precisasse ser justificada ou rapidamente substituída por algo positivo.
O problema dessas tendências é que elas invalidam a experiência emocional humana, tornando a tristeza quase um tabu. Elas nos incentivam a ignorar momentos difíceis, a cobrir nossas dores com filtros e a medir nosso valor com base na aparência de felicidade constante
A vida real não é feita apenas de picos de alegria e vitórias — ela também é composta de momentos de silêncio, de pausas, de recomeços que surgem após atravessarmos vales de dor. Ao invalidar a tristeza, essas trends nos afastam da oportunidade de crescer com ela, de reconhecer sua importância como parte do processo de cura e autoconhecimento.
Precisamos urgentemente normalizar a tristeza. Assim como a alegria, ela tem um propósito essencial: nos conecta com nossa humanidade, nos lembra de desacelerar e nos oferece a chance de reconstruir nossas bases.
Ao invés de perpetuarmos a narrativa de que sempre há um “mas” para justificar a tristeza, que tal convidarmos as pessoas a reconhecer e aceitar os sentimentos como eles são? Essa é uma verdadeira revolução emocional: permitir-se sentir, sem culpa, sem pressa, sem medo de parecer vulnerável. Afinal, é na coragem de abraçar todas as nossas emoções que nos tornamos inteiros.
No filme Divertidamente, a personagem Tristeza desempenha um papel crucial. Ela nos lembra que, ao nos permitirmos sentir, nos tornamos mais íntegros e autênticos.
A tristeza não nos paralisa — ela nos ensina a pedir ajuda, a buscar apoio, a nos conectar de forma mais verdadeira com as pessoas ao nosso redor.
Se há algo que quero compartilhar com este texto, é isso: está tudo bem sentir tristeza. Está tudo bem parar, respirar e reconhecer que não somos feitos apenas de felicidade.
A cultura da felicidade a qualquer custo, amplificada pelas redes sociais, nos coloca sob uma pressão constante de aparentar que nossas vidas são perfeitas. Mas a verdade é que não somos feitos apenas de luz. Somos complexos, feitos de sombra e brilho, de dias bons e ruins
Está tudo bem não estar bem. É justamente isso que nos torna humanos. Aceitar nossa vulnerabilidade, permitir-nos sentir cada emoção — seja ela leve ou avassaladora — é um ato de coragem, de conexão com nossa essência. Não precisamos ser perfeitos para sermos completos, nem felizes o tempo todo para sermos realizados.
No fim, o que realmente importa é o que fazemos com nossas emoções.
A tristeza, assim como a alegria, tem o poder de nos transformar, de nos ensinar a cuidar melhor de nós mesmos e daqueles ao nosso redor. Então, que possamos olhar para nossas dores com a mesma compaixão com que celebramos nossas vitórias, reconhecendo que cada etapa, cada sensação, tem seu valor e seu tempo
Porque a vida não é sobre ser feliz o tempo todo. É sobre ser verdadeiro consigo mesmo, acolher o que vier e seguir em frente — um passo de cada vez, com toda a coragem e resiliência que carregamos dentro de nós.
Fundadora e CEO da Vittude, referência no desenvolvimento e gestão estratégica de programas de saúde mental para empresas, Tatiana Pimenta é engenheira civil de formação, com MBA Executivo pelo Insper e especialização em Empreendedorismo Social pelo Insead. Empreendedora, palestrante, TEDx Speaker e produtora de conteúdo sobre saúde mental e bem-estar, foi reconhecida em 2023 como LinkedIn Top Voice, e em 2024 como uma das 500 pessoas mais influentes da América Latina pela Bloomberg Línea.
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