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Alimento saudável na mesa e preço justo para o produtor: a Raízs vem vencendo a luta para democratizar a venda de orgânicos no Brasil

Juliana Afonso - 3 jan 2023
Tomás Abrahão, fundador da Raízs (foto: Rodolfo Regini).
Juliana Afonso - 3 jan 2023
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Estamos sempre fazendo coisas diferentes. Tem dias que trabalhamos e outros que descansamos. Às vezes lavamos louça e às vezes acumulamos pratos na pia. Comer, porém, é algo que fazemos todos os dias – mas são poucas as vezes em que refletimos de verdade sobre os alimentos que consumimos.

Tomás Abrahão, 31, conta que sempre se interessou pela origem da própria comida: 

“Minha mãe nos instigou a pensar sobre o que comemos: quem plantou, quem trabalhou para a comida chegar na nossa mesa, o que foi utilizado para produzir”

O ensinamento transformou sua relação com os alimentos e foi a base para a criação da Raízs, foodtech que conecta pequenos produtores de orgânicos diretamente aos consumidores. 

Fundada em maio de 2016, a empresa (que saiu aqui no Draft em outubro daquele ano) cresceu de forma constante até a pandemia da Covid-19 – quando viu o seu faturamento aumentar 200%.

“Ao ficar mais em casa as pessoas começaram a olhar para a comida de uma forma diferente”, diz Tomás.

A partir dessa reflexão, o empreendedor enxergou, na mudança de postura provocada pela pandemia, uma oportunidade para ampliar o acesso a alimentos de qualidade a um público ainda mais amplo.

COMO DEMOCRATIZAR A VENDA DE ALIMENTOS SAUDÁCEIS E CHEGAR A UM PÚBLICO MAIS DIVERSO

O primeiro passo aconteceu após a foodtech fechar uma parceria com a Prefeitura de São Paulo que consistia na distribuição de cestas de alimentos orgânicos para famílias em situação de vulnerabilidade em todo o município. 

Foram mais de 25 mil cestas ao longo de seis meses. A experiência, diz Tomás, foi fundamental para pensar em formas de alcançar um público maior e mais diverso. 

Hoje, a área de entrega da Raízs abrange a capital paulista, parte da Grande São Paulo (as cidades do ABC, mais Osasco), Campinas e São José dos Campos, além de todo o litoral norte do estado. 

“Estamos chegando em espaços menos elitizados. Continuamos com uma maioria de clientes de classe A e B, mas começamos a ver umas regiões no nosso mapa de calor de classe C”

Outra proposta para democratizar o acesso foi a venda de alimentos sustentáveis, que são produtos sem certificação oficial. Muitos produtores, explica Tomás, não conseguem se certificar porque isso demanda tempo e dinheiro. 

“Começamos a trabalhar com esses produtores em um galpão separado e a vender os sustentáveis para uma população que não tem dinheiro para pagar o orgânico, principalmente em frutas e legumes.”

AO CORTAR INTERMEDIÁRIOS NO PROCESSO, A RAÍZS GARANTIU RAPIDEZ E MELHOR PREÇO PARA OS CLIENTES

O cuidado com a saúde e com a qualidade dos alimentos fez a procura por orgânicos crescer na pandemia – e a foodtech só conseguiu dar conta do recado por já ter uma estrutura preparada para o aumento da demanda. 

No início da trajetória da empresa, cada entrega demorava cerca de três a quatro dias. Com o aperfeiçoamento da tecnologia e da logística, foi possível fazer entregas com menos de 24 horas. 

“Chegam muitos carros todos os dias e é por isso que o alimento chega tão fresco para o consumidor”, explica Tomás 

O empreendedor compara o frescor dos produtos vendidos pela Raízs e a oferta disponível nas grandes redes de supermercados:

“O que a gente compra no supermercado não é vivo. Se você for olhar para a cadeia supermercadista você vai ver que o melão normalmente fica dois meses em uma câmara fria. Já o nosso produto não fica nem uma semana”

A rapidez na entrega é importante quando se trata de orgânicos, e se tornou possível a partir do corte de intermediários. 

“Um alimento normalmente passa na mão do produtor, de três distribuidores e de um distribuidor supermercadista para chegar ao consumidor”, diz Tomás. “Isso gera muito desperdício.”

Esse corte também possibilita um preço mais acessível: o valor das frutas, legumes e verduras vendidas pela Raízs é em média 20% menor que em orgânicos em outros lugares.

Rapidez, qualidade e bom preço garantem um cliente satisfeito: o NPS [Net Promoter Score, métrica de satisfação dos consumidores] da Raízs é de 80, enquanto o setor supermercadista, segundo Tomás, tem uma média de 40. 

“O nosso cliente quer mais qualidade, quer entender de onde vem o que ele come. Comprar também é um ato político.”

A PREVISIBILIDADE DE VENDAS FOI FUNDAMENTAL PARA GANHAR A CONFIANÇA DOS PRODUTORES

Lá atrás, em 2016, quando estava tirando a Raízs do papel, Tomás visitou dezenas de pequenos produtores do interior paulista para conhecer a realidade e as necessidades desses profissionais e montar uma rede de fornecedores. 

Em seguida, trabalhou no desenvolvimento de uma tecnologia que pudesse dar maior previsibilidade no trabalho.

“A gente usa nossa inteligência de dados para ajudar o produtor a planejar sua produção. Desenvolvemos essa tecnologia para entender o quanto de banana vamos precisar daqui duas semanas, um ano ou dezoito meses”

Essa organização foi fundamental para estabelecer uma relação de confiança com os agricultores. “Parte do nosso trabalho é dar segurança financeira para esse profissional saber o que produzir”, diz Tomás. 

Com essas informações em mãos, foi possível reduzir outro problema da cadeia: o desperdício. Segundo o Índice Global do Desperdício de Alimentos da Organização das Nações Unidas (ONU), 17% de todos os produtos disponíveis para consumo vão para o lixo. Na Raízs, o desperdício ao longo do processo varia de 2% a 3%. 

Para Tomás, o trabalho com tecnologia de dados e a eficiência gerada em toda a cadeia a partir dessas informações é o que tornam a Raízs uma empresa inovadora no mercado de alimentos orgânicos. 

A estrutura permite diminuir o desperdício, reduzir o preço final para o consumidor e engrossar o faturamento de quem produz: desde 2016, quando a Raízs surgiu, diz Tomás, a renda média dos produtores que fornecem para a empresa cresceu 23%. 

A EMPRESA INVESTE EM INICIATIVAS PARA ESTIMULAR AUTONOMIA DOS PEQUENOS AGRICULTORES

A Raízs funciona majoritariamente no modelo D2C, direct-to-consumer. A maior parte dos funcionários atua nas áreas de operações e logística, mas a empresa conta também com as áreas de marketing, branding, comercial, financeiro, tecnologia e relação com os produtores.

Além dos 180 funcionários, a foodtech trabalha com cerca de mil agricultores da América do Sul e conta com mais de 60 mil clientes. 

“Queremos expandir nosso território de atuação e ampliar nosso portfólio de produtos, mas sempre com uma curadoria muito forte, respeitando a nossa lista de produtos e substâncias que não podem entrar”

Um dos passos nesse sentido aconteceu no começo deste ano, com a inclusão de artigos em cobranding com alguns produtores. Entre os itens estão queijos artesanais, sopa, pão e outros alimentos do dia a dia.

Para Tomás, o crescimento precisa estar aliado à melhoria das condições de trabalho dos produtores. Entre suas apostas estão iniciativas como o Fundo do Pequeno Produtor, para o qual é direcionado 10% do resultado financeiro da foodtech. 

No final de cada ano, produtores que já estão há mais de dois anos na Raízs decidem como usar o dinheiro. Compra de insumos e aquisição de estufas para produção já foram algumas das ideias colocadas em prática.

O empreendedor acredita na importância de estimular a autonomia. 

“Eu pretendo ser um cara importante para a Raízs crescer, mas desnecessário para ela sobreviver. Temos que trabalhar para a empresa não ter dependência da gente.”

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