No vídeo de apresentação do programa Future Footwear, um calçadista de 2050 manda um recado do futuro para os calçadistas de 2016, contando que a indústria conseguiu ser sustentável, conectar pessoas e máquinas, aproveitar os materiais inteligentes e os robôs. Estamos em 2018 e essa ainda é uma realidade distante no Brasil. Para ajudar o setor a caminhar no sentido desejado, o objetivo da iniciativa é atuar em bloco para fazer a cadeia olhar mais para a inovação, além de antecipar mudanças e se conectar às novas tecnologias.
A ideia teve início com a gestora de projetos da Abicalçados (Associação Brasileira das Indústrias de Calçados). Roberta Ramos, 36, está na associação há 11 anos e é jornalista e estudiosa do Futurismo. “Quando comecei a falar sobre isso era vista como a louquinha da Abicalçados. Mas hoje já existe uma consciência de como é urgente olhar para o futuro”, diz. Além da Abicalçados, participam do projeto a Abrameq (Associação Brasileira das Indústrias de Máquinas e Equipamentos para os Setores do Couro, Calçados e Afins), a Assintecal (Associação Brasileira de Empresas de Componentes para Couro, Calçados e Artefatos) e o CICB (Centro das Indústrias de Curtumes do Brasil).
O Future Footwear foi lançado em 2016 e atua sobre três pilares: novos produtos, novos processos e novos modelos de negócios. As ações do programa ao longo de seu primeiro ano mostraram, segundo Roberta, que o setor ainda está muito atrasado em termos de tecnologia e que a resistência às mudanças é forte e precisa ser quebrada com urgência. “É necessário sensibilizar os empresários para as mudanças que já estão acontecendo. Dizer que a impressora 3D nunca vai estar no processo é um olhar muito míope. “Ela vai estar e, provavelmente, dentro de um processo que ainda nem existe”, afirma. E continua:
“Precisamos olhar para um futuro pós-emergente para conseguir, de fato, trabalhar a inovação no setor calçadista”
As duas principais ações do Future Footwear são o FF Exchange, uma rodada de negócios feita no formato de pitches (algo que não é comum neste meio) e o FF Enterprise, um torneio empreendedor voltado para as demandas e problemas da área. Na edição deste ano, 20 novos negócios foram selecionadas. “A gente quer que as startups desenvolvam tecnologia para o setor porque estamos carentes disso.”
Em 2017, o FF Enterprise premiou a Bioplas, um projeto de aproveitamento de resíduos do couro para a produção de plásticos biodegradáveis. Mas na avaliação da gestora de projetos da Abicalçados ficaram pontas soltas. “Percebemos que é preciso, ainda, fazer a conversão do que surge para dentro do setor.
Desta vez, para abranger todos os agentes dessa indústria, a banca avaliadora dos projetos terá empresários das áreas de máquinas, componentes, couro e produtos Ela ainda conta que no ano passado, o programa focou nas aceleradoras, no entanto, a percepção foi de que é necessário trazer os empresários para participar dessa ação desde o início para que estejam, de fato, abertos a observar as iniciativas e os novos negócios que estão surgindo.
COLABORAÇÃO ENTRE INDÚSTRIA TRADICIONAL E INOVADORA
A necessidade de mudança é urgente , pois de acordo com Roberta, o salto só vai acontecer com investimento em inovação. E aqui, não se trata apenas de design e tecnologia (fundamentais, é claro), mas também de modelo de negócios, já que os hábitos de consumos das pessoas estão mudando e isso mexe com toda a cadeia de produção. Ela cita como exemplo desse movimento o que faz a Insecta Shoes, marca de acessórios e sapatos ecológicos e veganos produzidos no Brasil. “É um case de uma empresa alinhada a um novo comportamento do consumidor, que trabalha a sustentabilidade, preocupações com o meio-ambiente e com as pessoas. A inovação não tem necessariamente a ver com tecnologia, mas sim com estar alinhado com o espírito do nosso tempo.”
Se por um lado existem empresas que já nascem com essa pegada inovadora, o setor tem muitas empresas grandes, tradicionais e de perfil familiar que tendem a resistir mais às mudanças. “Não consigo ligar para uma empresa calçadista hoje e pedir o contato da área de inovação. Isso não existe. Quando precisamos falar com alguém, a gente não sabe se procura o presidente, o diretor, o designer ou a pessoa da produção”, diz.
Para tentar criar um ambiente mais propício ao novo e despertar nos empresários essa curiosidade, Roberta conta que foi criado, em 2016, o Grupo Futuro que, embora não faça parte do Future Footwear, conversa bastante com os objetivos do projeto. Esse grupo é uma mescla de jovens que estão na linha de sucessão das empresas mais tradicionais com jovens empreendedores inovadores, como o pessoal da Insecta Shoes. “É uma troca entre aqueles que têm muita flexibilidade, mas pouco dinheiro, e aqueles que têm muito dinheiro para investir, mas pouca flexibilidade”, analisa.
Reuniões criativas, palestras e visitas a empresas de diversos setores para conhecer novos modelos de atuação fazem parte das atividades.
“É um trabalho bem colaborativo, de uma troca muito qualificada, inclusive, para que a próxima geração dessas grandes empresas familiares possa falar sobre suas dificuldades e barreiras internas”, conta a gestora da Abicalçados.
Alguns resultados desse trabalho são empresas criando spin-offs ou investindo em startups que conversam com sua área de atuação. Roberta cita o case da Dublauto, da área de componentes, que investiu em uma startup de nanotecnologia, incubada no parque tecnológico da Universidade Feevale, em Porto Alegre, e juntas desenvolveram uma palmilha que absorve a umidade e não deixa o pé suar.
AINDA FALTA UM GRANDE SALTO TECNOLÓGICO
O caminho da inovação para o setor calçadista tem como um de seus principais objetivos chegar à Indústria 4.0, na qual mundo físico e virtual se encontram, com tecnologias avançadas como internet das coisas, robótica, impressão 3D, Big Data, inteligência artificial e realidade virtual. Para Roberta, o setor ainda está no momento 2.0. “Eu entendia que a gente estava um pouco mais avançado em termos de tecnologia, mas vi nesses primeiros projetos que não estamos.” E complementa:
“Agora, a gente precisa ir do 2.0 direto direto para o 4.0, sem passar pelo 3.0. Vai ter que ser um salto grande, um virada realmente forte e inovadora”
Pensando nessa necessidade, o Future Footwear está desenvolvendo o projeto de uma fábrica virtual. Hoje, a tecnologia dentro da linha de produção é essencial e, ao mesmo tempo, um gargalo na modernização da indústria. “Muitas empresas compram uma máquina inteligente e colocam no meio de um processo burro. Isso gera ainda mais resistência porque a avaliação é de que a nova máquina não é tão produtiva quanto a outra. A fábrica virtual vai mostrar que o que gera produtividade é o processo integrado e não apenas colocar uma máquina moderna no meio de um processo tradicional”, diz Roberta.
Um mapeamento também vai levantar os processos de fabricação mais eficientes no mundo, que serão implantados nesse ambiente virtual. A ideia é que os empresários tenham acesso a essa plataforma e possam fazer simulações de mudanças práticas na sua linha de produção, visualizando os impactos de tais mudanças. Porque a tecnologia já existe. Só precisa ser aplicada da melhor maneira.
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