Cinesthesia, novo projeto de Facundo Guerra, e a reinvenção da experiência de ir ao cinema

Phydia de Athayde - 24 out 2014Cinesthesia
O Cine Joia, que é uma casa de show, será palco da nova experiência em cinema oferecida por Facundo
Phydia de Athayde - 24 out 2014
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Facundo Guerra é um dos mais bem sucedidos empresários da noite paulistana. Em 2005, inaugurava com alguns sócios o Vegas, casa noturna que foi a precursora da revitalização da região do Baixo Augusta, na capital paulista. A primeira experiência dele como empreendedor tinha sido amarga: investiu, com uma amiga, numa marca de roupas, mas nada deu certo. O Vegas era seu segundo tiro — e empreender na noite acabou se revelando uma vocação.

Quase dez anos depois, Facundo está à frente do Grupo Vegas, que criou junto a Marcelo Beraldo, Lúcio Ribeiro, Cacá Ribeiro, Bob Yang e Alex Atala para administrar a meia dúzia de casas noturnas que têm hoje — além de quase uma dezena de ideias de novos empreendimentos. O sócio dos bares Riviera, Volt e Z Carniceria, das baladas Yatch Club e Lions Nighclub e da casa de shows Cine Joia quer muito mais. Ele contou ao Draft que está trabalhando “como nunca”, e falou sobre o atual momento da noite paulistana, além de dar mais detalhes sobre a sua mais nova aposta: a Cinesthesia. Como o negócio de Facundo é inovar, sonhar alto e fazer primeiro, ele pretende, no próximo dia 9 de novembro, “reinventar a experiência do cinema”. Leia a seguir.

Facundo

Facundo em uma apresentação no TEDxESPM

Draft: O que significa, na prática, este ritmo mais puxado de trabalho?
Facundo Guerra: Sempre toquei no máximo dois projetos por ano. Mas, agora, vou fazer em dois anos o que não fiz em dez. Estamos indo para entretenimento no sentido mais amplo da palavra. Temos projetos em cinema, casa de show, boate, restaurante, palco. São quase dez projetos, é muita coisa.

Por que a sobreposição de projetos? 
Comecei a fazer noite 10 anos atrás. De uma certa forma, agora é a hora em que estou colhendo os frutos disso, de ter projetos consistentes, de ter profissionalismo na noite. Nunca fui muito dinheirista, sempre me preocupei muito mais com a reputação das coisas, com a minha reputação, do que com apenas ganhar dinheiro. Pra mim, tudo foi um investimento de médio e longo prazo. Então agora aparecem oportunidades de todos os lados.

O que explica essa efervescência?
Tenho uma teoria de que uma nova identidade do paulistano está emergindo. Essa identidade está trocando de pele, se reconfigurando. Tenho quase 41 anos e a minha geração sempre se encastelou, sempre foi a do shopping center, do condomínio fechado. Essa mesma classe média, que hoje tem 20 anos, está usando as ruas como espaços de socialização. Todo final de semana você tem festas ao ar livre, Free Beats, Metanol na Rua, Selvagem, VoodooHop… As festas são gratuitas, as pessoas estão morrendo de amores pelo Centro.

“O paulistano sempre teve uma relação de ódio com a cidade, sonhava em ter uma pousada na Bahia. Agora, relação do pessoal de 20 anos com a cidade passa pela rua. É um momento histórico muito feliz”

Ter uma prefeitura minimamente progressista, que não impede esse abraço, também ajuda. Mas tem um monte de idealistas fazendo coisas o tempo inteiro, há uma militância pelo espaço público, que começou no Belas Artes, depois com o Parque Augusta.

Cartaz para o evento, que promete uma experiência totalmente nova com o cinema

Cartaz para a primeira sessão do projeto: um filme, um show, outro filme — e open bar de pipoca

Como isso se reverte em oportunidades de negócio?
No meu campo de atuação, estamos vivendo uma época tão fértil quanto o Velho Oeste. A gente já tem uma rede de noite estabelecida, mas tem muita coisa para fazer ainda. São Paulo tem palcos para menos de 100 cem pessoas e para mais de 600, mas entre um e outro não tem absolutamente nada. Aqui a gente ainda pensa em palco como se fosse só o show, enquanto os lugares mais legais lá de fora nunca oferecem só uma coisa. Se você pensa só no tíquete, deixa de valorizar a experiência.

Como levar isso para o cinema?
No Brasil, a experiência do cinema é quase binária: blockbuster no multiplex ou blockbuster na sala vip. Existe ainda o cinema para cinéfilos, do qual o Caixa Belas Artes é o represetante máximo. Mas ainda são maneiras obsoletas de apresentar conteúdo audiovisual. Hoje as TVs estão cada vez maiores, os arquivos mais disponíveis, e as pessoas ficam na segunda tela toda hora. Minha tese é que o cinema tem que entregar mais do que só o filme. A experiência de ir ao cinema está se transformando, vai virar algo completamente diferente e ninguém está fazendo nada com isso. Como ninguém está fazendo, vou fazer.

E como é o seu projeto?
Estamos fazendo o piloto dessa tese, o Cinesthesia. Vamos usar como laboratório o Cine Joia (a casa de shows funciona em um antigo cinema, convertido em palco e plateia). Dia 9 de novembro vamos passar O Massacre da Serra Elétrica, seguido de um show dos Zumbis do Espaço, seguido de O Exorcista para uma plateia de 300 pessoas. E vamos usar os recursos da casa de show, como o sistema de luzes e de som, para expandir a experiência do cinema.

As pessoas ficarão em pé?
Sentadas, em bean bags, que são pufes mais confortáveis e anatômicos. A pessoa senta um pouco mais reclinada, já que a tela ficará um pouco acima do palco.

E o que acontece?
São intervenções. Na cena em que o Leatherface chuta a porta de um celeiro, lá dentro tem um casal transando, ele pega a serra elétrica e fatia os dois. No Cinesthesia, quando ele dá o chute a gente derruba a chave geral. Fica tudo escuro por 15 segundos. Sampleamos o barulho da serra elétrica, e o técnico de som vai ficar soltando o vreeem-vreeem-vreeem. Quando liga o sistema de novo, o Leatherface fatia os dois adolescentes e jorra o sangue em mapping. Na cena d’O Exorcista em que o padre asperge água benta na menina, vamos colocar quatro contrarregras no mezanino com pistolas de água para jogar no público. A menina gorfa verde, o cinema inteiro fica verde. É uma experiência meio Be Kind Rewind do 4D. Meio tosca, mas muito divertida. No fundo, é tratar o filme como se fosse uma banda.

Vai haver programação fixa ou serão eventos esporádicos?
O Cinesthesia é uma proposta nova. Estamos muito próximos de esgotar os ingressos para esta primeira sessão. Acho que vamos fazer duas sessões de terror.

Você já sabe como serão as outras?
Teremos sempre filmes inseridos na cultura pop. Em ficção científica, a gente vai botar Blade Runner com Allien – o Oitavo Passageiro. Em animação, Ghost in the Shell com Akira. Em musical, Grease com Rocky Horror Picture Show.

Sempre ter dois filmes e uma banda tocando entre eles?
Com manipulação de som e luz. Mas também vamos fazer sessões com bandas tocando trilhas sonoras.

“Vamos chamar o Pink Floyd Cover para tocar The Wall enquanto passa o filme O Mágico de Oz. Vários filmes têm sincronicidade com álbuns. O Kid A, do Radiohead, sincroniza com Nosferatu. O filme Wall-e também sincroniza com The Wall”

A gente vai pedir para as bandas cover ensaiarem com o filme passando atrás. Elas vão criar o show assim.

Como você vai cobrar pelo produto?
O ingresso custa 40 reais e dará direito a dois filmes, um show, uma cerveja e open bar de pipoca.

Quanto você investiu no Cinesthesia?
Não muito, uns 20 mil reais. O custo está na produção, em mandar fazer os bean bags, mandar fazer a tela, que vai ser bem grande. Vai ter 6,20 por 4,60 metros, isso dá mais de 28 metros quadrados.

Você tem medo do projeto dar errado? Como lida com isso?
Eu sempre acho que vai dar errado. Sempre parto desse pressuposto. Mas alguns projetos, como o do Cinesthesia, eu sei que vai dar certo. Para eu me blindar, ou para eu ter certeza de que vai dar certo, o projeto tem que ser inovador. Para mim, o Cinesthesia é isso. Tratar um filme como se fosse uma banda é uma abordagem superinteressante. Ainda mais para filmes tão assistidos. Mostrar O Exorcista de novo para uma pessoa, e ainda assim soar fresco, é um desafio enorme. E, puxa, a gente acaba de receber a notícia de que 20 cegos, da Fundação Dorina Nowill, estarão no Cinesthesia. Cegos no cinema: isso é demais!

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