Engenheiro, Marcio Boruchowski, 45, trabalha em uma missão tão óbvia quanto necessária: ele quer unir da melhor maneira educação e tecnologia — transformando isso, também, em oportunidade de negócio. Na mesma lógica das fintechs (termo que designa as startups que agregam tecnologia a serviços financeiros), as edtechs já são bastante difundidas no exterior. Em 2014, Marcio fundou o Hackademia e, pouco depois, a Educare. E, aos poucos, abrem território por aqui também. Ao todo, investiu nas duas plataformas 750 mil reais. A Hackademia é quase uma metalinguagem, pois se trata de um espaço digital que visa discutir o uso de tecnologias no aprendizado por meio de simpósios online. Nesses quatro anos, já produziu mais de 150 conteúdos diferentes, entre transmissões de palestras e vídeos com especialistas e empreendedores da área.
A Hackademia também opera offline. Um dos eventos que promove é o EdTech Day, no Cubo, que em 2016 reuniu educadores, fundações e representantes do governo para o debate no centro de inovação do Itaú. A produção mais recente e que está no ar é uma série gravada na Finlândia, país número um no ranking de educação da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O conteúdo resulta de uma aceleração concedida a iniciativas educacionais de países emergentes durante a etapa de Helsinque da Slush Global Impact Accelerator (um programa de aceleração de negócios sociais). O acesso ao conteúdo do Hackademia é totalmente gratuito, mediante cadastro. Como assim? O empreendimento lucrativo vem a reboque, com a Educare.
A Educare, por sua vez, é uma plataforma que conecta estudantes dos ensinos fundamental e médio a professores particulares. Presente em 600 municípios do país, já intermediou 480 mil minutos de aulas para 21 mil alunos. Marcio acredita que a tecnologia é capaz de gerar uma experiência semelhante à de uma aula individual, como conta:
“A aula particular tradicional é um recurso eficiente, mas muito caro e inacessível para grande parte dos estudantes. O meio digital é uma ótima maneira de difundir conhecimento com custos mais baixos”
Mas não é só digital: as aulas na Educare podem ser tanto online como presenciais (bastando agendar entre as duas partes). Qual seria, então, a vantagem disso em relação ao método tradicional, de buscar professores conhecidos na região ou indicados por alguém? Marcio conta que, na Educare, os profissionais têm o currículo previamente analisado (o que inclui aulas-testes) e isso gera um cadastro que permite que a plataforma indique o perfil que melhor se encaixa ao do aluno naquele momento.
Outro diferencial, no caso das aulas online, ele prossegue, é que o ambiente virtual onde elas acontecem traz uma tela dividida (parece bobagem, mas é algo que pode melhorar em muito a interatividade de quem está “do lado de cá” da aula. Essa espécie de “lousa digital” tem uma interface semelhante à do Photoshop, além de acesso ao Dropbox (usado na transferência de arquivos pesados), a vídeo e a um chat.
Além das disciplinas do currículo tradicional, os professores também podem ensinar música, mágica, entre outras. O sistema da plataforma ainda ranqueia o professor por número de aulas dadas, avaliações dos alunos e se o profissional tira eventuais dúvidas gratuitamente, por exemplo. O modelo de negócio é o seguinte: para estar na plataforma, cada professor paga a partir de 30 reais por mês (o valor varia se ele quiser aparecer entre as primeiras opções). Uma porcentagem do valor pago pelo aluno também vai para a plataforma.
QUANDO UM PROBLEMA FAZ SEU MODELO DE NEGÓCIO MUDAR
No meio da trajetória da Educare, entretanto, a equipe (formada por três desenvolvedores, um diretor de marketing e uma pedagoga, além de Marcio, que é CEO) notou que muitos professores e alunos usavam a plataforma para um primeiro contato com o aluno, mas não formalizavam o acordo no sistema, marcando aulas particulares por Skype, por exemplo. Em vez de tentar barrar o fenômeno, o empreendedor mudou a estratégia do seu negócio. “Hoje o meu foco além do B2C, em que os consumidores finais são alunos e professores particulares, está voltado a oferecer o serviço para escolas que queiram proporcionar aulas de reforço aos estudantes”, conta.
Dessa forma, os colégios determinam as matérias e conteúdos que desejam proporcionar via Educare e fecham pacotes de aulas com a plataforma. Com isso, os alunos podem assistir o conteúdo sozinhos ou em grupos, fora do horário regular. O Colégio Humboldt, em São Paulo, e o Instituto Votorantim, que atua em projetos nas cidades onde há operações da empresa, estão entre os clientes.
UM EMPREENDIMENTO QUE É, TAMBÉM, UMA MISSÃO
Marcio conta que quer mudar a maneira que se fala de educação e de tecnologia no Brasil.“Há muitas pautas negativas na imprensa, como o roubo das provas do Enem e a violência contra professores. Mas eu acredito na construção de uma agenda positiva para o ensino brasileiro por meio das novas tecnologias”, diz.
Formado pela Escola Politécnica da USP, Marcio se diz apaixonado por estudar (diz que sempre foi ótimo aluno) e pelo tema educação em si. Depois de fazer um MBA na Wharton School, faculdade de administração e economia da Universidade da Pensilvânia, em 2002, ele partiu para um período sabático de cinco meses na Índia e voltou ao Brasil disposto a trabalhar com consultoria de inovação.
Por muito tempo deu certo: ele já atuou em projetos para marcas como Avon, Bradesco e BRF e esteve à frente da área de inovação digital do Itaú até 2014. Nesse meio tempo, trabalhou na Mandalah, consultoria que ajuda empresas a inovar com impacto social – lá, ele participou de consultorias para o colégio Bandeirantes, em São Paulo, e para a Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). Toda essa experiência o levou a entender que sua forma de causar impacto seria pela via da educação — e gerar conhecimento acadêmico a respeito. É onde a Hackademia entra em cena:
“O mercado de educação digital já é uma realidade, mas a influência das tecnologias no ensino é um tema que não chegava à academia. Trazer isso para a discussão acadêmica me levou a criar a Hackademia”
Segundo Marcio, desde que as duas iniciativas foram criadas, a Educare tem bancado boa parte dos custos da Hackademia – juntas, elas faturaram 500 mil reais em 2017. Desde o ano passado, a Educare vive um processo de fusão com um portal semelhante, o Profes.com.br, passando de 7 mil para 28 mil professores cadastrados, inclusive com oferta para quem tem ensino superior (com aulas preparatórias para concursos públicos, por exemplo). “Um dos meus desejos com esse crescimento é atingir mais alunos de escolas públicas”, diz o CEO. Ainda não foi definido se haverá mudança de nome e qual será o escolhido.
Para este ano, embalado por Copa do Mundo e eleições presidenciais, Marcio idealizou o evento MAP – A Maior Aula do Planeta, no Allianz Parque, na capital paulista, a se realizar em abril. A ideia é intercalar aulas-show com foco no Enem e apresentações musicais e artísticas. Em ambientes paralelos, no próprio estádio, também haverá workshops para professores. Por enquanto, está em busca de apoiadores e entusiastas da educação potencializada por tecnologias inovadoras como ele.
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