Em agosto, a Hand Talk anunciou uma grande novidade: sua mais nova solução de tecnologia assistiva.
Batizada de Motion, ela realiza o inverso do que a startup alagoana entregou até aqui. Ou seja, transforma a Língua Brasileira de Sinais (Libras) em áudio e texto.
“Essa tecnologia pretende solucionar a dor que os surdos sentem de morar em um país onde ninguém entende o que querem dizer em uma loja ou em um restaurante, por exemplo”, diz Ronaldo Tenório, CEO e cofundador da Hand Talk.
Não é pouca gente. O último censo (de 2010) contabilizou 9 milhões de brasileiros com algum grau de surdez. O anúncio da tecnologia ocorreu no Link – Festival Digital de Acessibilidade, evento anual promovido pela empresa.
“Usamos processamento de linguagem natural para detectar em tempo real movimentos corporais e faciais — porque o rosto é muito importante para dar o tom da comunicação em língua de sinais – e traduzi-los em frases”
É possível ver o funcionamento do Motion neste vídeo. A tecnologia foi acelerada pelo Google AI Impact Challenge. A Hand Talk foi a única empresa do Brasil entre as 20 selecionadas para o desafio, que rendeu um aporte de 3 milhões de reais.
“O Motion é um sonho de tempos atrás”, diz Ronaldo. “E está começando a virar realidade agora, depois de dois anos de pesquisa.”
UM NEGÓCIO SOCIAL COM 600 EMPRESAS CLIENTES E 300 MIL USUÁRIOS ATIVOS
Setembro é o mês mais importante do ano para a comunidade surda (confira aqui o calendário comemorativo). O que só reforça a pertinência de atualizarmos a história da Hand Talk aqui no Draft.
A empresa foi fundada em 2012, em Maceió, por Ronaldo e mais dois sócios, Carlos Wanderlan e Thadeu Luz. Desde sua origem, oferece dois produtos principais.
Um deles é o Hand Talk Plugin, sistema de acessibilidade que traduz conteúdos de sites para a língua de sinais (com a ajuda dos tradutores virtuais Hugo e Maya, que aparecem em uma janelinha no canto da tela).
Essa solução conta com mais de 600 empresas clientes, incluindo Claro, Magazine Luiza, Samsung e Unimed. Os planos começam em 599 reais mensais e variam de acordo com o tráfego do site.
O segundo produto é o Hand Talk App. Gratuito, o aplicativo registra mais de 4,5 milhões de downloads, 300 mil usuários ativos mensais no Brasil e cerca de 1,5 bilhão de palavras traduzidas.
A startup apareceu no Draft em 2014 e em 2017. No ano seguinte, adquiriu sua principal concorrente, a pernambucana ProDeaf, absorvendo a tecnologia e parte do time da empresa. Hoje, a equipe da Hand Talk é composta por 70 pessoas.
DE ALAGOAS PARA O MUNDO: A HAND TALK AGORA É FLUENTE EM INGLÊS
No mesmo programa do Google que alavancou o desenvolvimento do Motion, a Hand Talk deu início à internacionalização do seu aplicativo.
Em 2020, o app começou a traduzir áudios e textos em inglês para a Língua de Sinais Americana (ASL, na sigla em inglês).
Hoje, segundo Ronaldo, o aplicativo da Hand Talk já chega, organicamente, a quase 30 mil usuários ativos mensais nos Estados Unidos.
“Acreditamos que no pós-pandemia, o aplicativo vai decolar ainda mais nos EUA, porque muitos dos usuários utilizam a ferramenta nas escolas e universidades, onde as atividades foram temporariamente paralisadas”
Ronaldo se diz emocionado com relatos de alguns usuários do país. Um deles é o bombeiro Stan Barnes, que vive no estado de Michigan. Ele contou ao empreendedor que recebeu o chamado de socorro de uma família com deficiência auditiva — e conseguiu se comunicar graças ao app da Hand Talk.
“Ele disse que isso foi uma porta de entrada para entender esse universo e que se não tivesse o aplicativo provavelmente não conseguiria se comunicar e atender ao chamado”, diz Ronaldo.
A Língua de Sinais Americana é usada por até 2 milhões de pessoas nos EUA, e adotada também no Canadá, México, República Dominicana e Filipinas — países para onde a Hand Talk também pode escalar sua solução.
COM UMA NOVA TRADUTORA VIRTUAL, A STARTUP MIRA A DIVERSIDADE
Englobar mais línguas de sinais (no mundo todo, há cerca de 200) é uma ambição da Hand Talk.
Até recentemente, a empresa contava com uma rede relativamente pequena de intérpretes parceiros no Brasil e nos EUA (que, mesmo assim, abasteceu sua base com mais de um milhão de contribuições).
Agora, a startup acaba de lançar a Hand Talk Community, uma plataforma colaborativa de dados sobre língua de sinais. A ideia é que qualquer pessoa do planeta possa se candidatar como voluntária para aprimorar o sistema da empresa.
Outra novidade anunciada em agosto foi a Maya, uma tradutora virtual que veio dividir com o Hugo a missão de traduzir áudios e textos para a linguagem de sinais.
“O Hugo foi ‘a cara’ da Hand Talk por muito tempo”, diz Ronaldo. “No início, foi essencial nos concentrarmos em apenas um personagem para criar essa identidade e relação com as pessoas.”
O lançamento da Maya incorpora uma camada extra de diversidade à Hand Talk.
“A gente fala sobre inclusão o tempo todo, porém estava faltando alguém como a Maya para trazer mais representatividade, já que existe muita diversidade também entre as pessoas com deficiência”
O figurino da dupla pode ser customizado. Empresas clientes, por exemplo, vestem o Hugo e a Maya com roupas e adereços que levem sua logomarca. E os usuários também podem personalizá-los com acessórios através de uma lojinha no app.
ACESSIBILIZAR O SITE É BOM PARA O CLIENTE SURDO E TAMBÉM PARA A EMPRESA
Com a discussão sobre a agenda ESG em alta no mundo corporativo, Ronaldo acredita que as empresas estão mais atentas sobre a necessidade de acessibilizar seus sites. Hoje, apenas 1% das páginas no Brasil é acessível.
“Não é porque fala-se mais de acessibilidade que tudo funciona… Há empresas que querem adotar essas práticas apenas como estratégia de marketing — e outras que buscam causar impacto de verdade.”
Não se trata só de impacto social. Acessibilizar um site ajuda a atrair consumidores, simples assim.
“As empresas têm que entender que acessibilidade não é só filantropia, mas pode representar uma oportunidade. São quase 10 milhões de pessoas que movimentam em média 576 bilhões de reais por ano”
Esse público consumidor é maior do que parece: além de surdos, o uso de Libras ajuda a tornar sites mais acessíveis para pessoas autistas, com Síndrome de Down, ouvintes com paralisia cerebral e afasia.
A Hand Talk tem até um e-book gratuito sobre o tema. O título já dá a deixa: Por que investir em acessibilidade pode ser um trunfo para a sua organização.
COMO TORNAR O TRABALHO E O ENTRETENIMENTO VIA ZOOM MAIS ACESSÍVEL
Como fazer reuniões por Zoom e oferecer acessibilidade para os funcionários surdos nas vídeochamadas?
Esse dilema se impôs com a presença do coronavírus. Depois de alguns meses de pandemia, diz Ronaldo, as empresas se mexeram e trouxeram intérpretes para suas reuniões.
A Hand Talk promoveu uma campanha para ajudar a divulgar o trabalho de intérpretes que perderam seus empregos com o fim dos encontros presenciais, mostrando como eles poderiam ajudar a tornar os eventos online mais acessíveis.
“O trabalho remoto hoje está muito mais adaptado à acessibilidade do que o presencial antes da pandemia — pelo menos para surdos. E isso por conta da facilidade que é ter um intérprete numa janela do Zoom, interpretando o conteúdo de forma simples e rápida”
Pelo lado do entretenimento, Ronaldo afirma que as lives sertanejas foram pioneiras no uso do recurso. “Isso virou febre e mostrou a importância desses profissionais.”
Mesmo que não haja surdos na reunião ou na plateia, a presença de um intérprete estimula o interesse deles em fazer parte da empresa ou do evento:
“Temos que abrir as portas e esperar as pessoas chegarem”, diz Ronaldo. “E não deixá-las apenas batendo na porta — e só adaptar depois que elas entrarem.
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