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Da cabeça aos pés: como a Arezzo&Co pensa suas estratégias de inovação para continuar ditando moda pelos próximos 50 anos

Marcela Marcos - 13 out 2022
Maurício Bastos, Chief Digital Officer da Arezzo.
Marcela Marcos - 13 out 2022
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“O nível de abertura da companhia para a inovação mudou drasticamente. Então, pensando nesses dez anos, nem parece que estou na mesma empresa.” 

É dessa forma que o gaúcho Maurício Bastos Turquenitch, 35, resume a evolução que ele testemunhou ao longo de uma década de carreira (e contando) na Arezzo&Co

Fundada há meio século, em 1972, como uma empresa de calçados criada por Alexandre Birman em 1972, a Arezzo encorpou e hoje é uma companhia que engloba ao todo 18 marcas – entre as aquisições mais recentes estão Reserva e Carol Bassi.

Maurício começou sua história na Arezzo dez anos atrás, em abril de 2012, como gerente de e-commerce. Depois ocupou o cargo de diretor de estratégia e inovação, até ser alçado ao seu posto atual, de Chief Digital Officer.

Antes, diz Maurício, imperava na companhia uma certa “cultura industrial”, pouco acostumada ao risco; hoje, essa mentalidade mudou. Como CDO, ele ajuda a traçar as estratégias de inovação da Arezzo, orientadas pelo que chama de “omnicommerce”, a integração de canais para uma venda bem-sucedida. 

Com o forte apelo digital, intensificado na pandemia, ganhou força  A necessidade de “abrir a empresa para o mundo” por meio do ZZ HUB, polo de inovação aberta na sede da Arezzo, em Campo Bom, cidade gaúcha a cerca de 50 quilômetros de Porto Alegre. O espaço tem mais de 4 mil metros quadrados de área e abriga um programa de aceleração de produtos e negócios digitais. 

A iniciativa chega agora à segunda fase, com inscrições abertas até 4 de novembro, pelo site. A Arezzo poderá formalizar contratos de prestação de serviços após a finalização do programa, que serve como oportunidade para que as startups ganhem visibilidade no ecossistema do varejo, além de incluir uma jornada de Capacitação Empreendedora, com módulos de aprendizado para desenvolvimento de negócio.

“Acho que a gente encontrou mais maturidade no contexto do ambiente de startups, que passou por uma fase do ‘oba-oba’, quando começaram a surgir os primeiros unicórnios”, diz Maurício. “Hoje, até pelo contexto do mercado, vejo empresas mais maduras, com desafios claros.”

Na conversa com o Draft, o CDO da Arezzo&Co fala sobre sua rotina (em que cada dia da semana é dedicado a uma das várias áreas que estão debaixo de seu guarda-chuva), os aprendizados que adquiriu no primeiro ciclo do programa de aceleração e como a empresa encara o metaverso. 

Maurício comenta, ainda, a polêmica envolvendo uma coleção estrelada pela influenciadora Jade Picon – e o que ficou como lição da repercussão negativa. Leia a seguir:

 

Maurício, pode resumir um pouco a sua trajetória na Arezzo? Como/quando você entrou na companhia? E como foi evoluindo dentro dela?
Entrei na companhia em 2012, com o objetivo de estruturar uma operação de e-commerce dentro da marca Schutz

Felizmente, foi uma jornada bem sucedida. A gente começou literalmente do zero e, em poucos anos, alcançou o patamar de 100 milhões de reais de faturamento 

Depois começamos a criar uma estratégia para trabalhar com outras marcas e, posteriormente, tive a oportunidade de estruturar, de 2017 para 2018, a área de estratégia de inovação da empresa. 

Dentro da estrutura de transformação digital, que eu lidero até hoje, colocamos os pilares de e-commerce, que a gente chama de “omnicommerce”: a ideia de poder conectar todas as pontas – não só a venda no digital, mas também ligar o cliente online com a loja [física].

O seu cargo hoje é de Chief Digital Officer. Pode explicar, de forma objetiva, concreta, quais são as suas atribuições, e como é a sua rotina?
A cadeira de Chief Digital Officer, por ser algo relativamente novo, não é igual em todas as empresas. Mas eu vejo o cargo como muito parecido com o papel do CFO, com muitas variáveis. 

Enxergo como a junção das interfaces de marketing com tecnologia, de duas estratégias de maneira casada. Minha rotina acaba tendo agendas muito distintas. 

Na parte de omnicommerce, há uma agenda comercial, tenho que participar da compra de coleção, análise de performance de produto e cuidar disso de ponta a ponta, da concepção do produto, chegada ao nosso centro de distribuição, até o canal de distribuição final, que é o próprio site 

A parte comercial, então, tem uma rotina que envolve vendas, metas, desafios, avaliação de audiência. Para todas as rotinas que eu tenho, trabalho organizando-as por temáticas e comitês. 

No chapéu de tecnologia, que é mais orientado por produtos, tenho desde projetos de um novo sistema de armazém, até o suporte da operação. Aí tem também outras áreas, como CRM, que tem uma missão de ser guardião do cliente. 

São dinâmicas bem distintas. Costumo quebrar meus dias por temáticas. Tem dia que estou mais voltado para novos negócios, em outro fico mais voltado para o e-commerce etc.

Como a visão de inovação da companhia avançou ao longo dessa década em que você está na Arezzo? Quais foram as grandes transformações nesse sentido?
Começando pelo próprio e-commerce… nós não fomos pioneiros em inventar isso, porém, pensando numa empresa com origem na indústria e com o modelo de negócio principal de B2B com franquia naquele momento [em 2002], o e-commerce para o nosso contexto era algo muito disruptivo. 

Havia dúvidas se daria certo, porque tem que administrar um canal de venda online, tem loja etc. Mas a gente sempre deu muito resultado. O canal de e-commerce hoje representa 25% das receitas da empresa. 

Uma grande revolução do nosso negócio, que foi muito acelerado na pandemia, é uma solução que a gente desenvolveu, chamada de “ZZ App”, que é o aplicativo do nosso vendedor 

É uma aplicação que tem, na palma da mão, tudo de que o vendedor precisa, como a capacidade de saber quem são os clientes no momento da compra, o que eles gostam ou não, poder mandar link de pagamento… Na [fase mais crítica da] pandemia só tinha isso, porque não tinha loja aberta. 

A gente tinha pouca abertura ao erro e à experimentação, pela nossa cultura industrial, mas inovar pressupõe tomar mais riscos. O nível de abertura da companhia para a inovação mudou drasticamente. Então, pensando nesses 10 anos, nem parece que estou na mesma empresa.

Como as estratégias online e offline convergem hoje na Arezzo? A pandemia trouxe alguma mudança nesse sentido?
A gente sempre enxergou que a grande força do nosso negócio estaria em fazer o melhor uso do ecossistema e que isso resultasse na melhor experiência da cliente. 

Então, quando montei um Business Case do e-commerce em 2013, a primeira página falava: “Quando a gente pensa em e-commerce para Arezzo&Co, a gente tem que pensar em omnicommerce. Qual é nossa razão de ser? Entregar mais para o cliente” 

Em 2019, fizemos um evento em que chamamos todos os franqueados para mostrar tudo o que tínhamos em tecnologia para que eles pudessem turbinar suas lojas. Mas o nível de engajamento foi baixo, porque muitos deles já tinham lojas cheias e não havia a preocupação em adotar novas ferramentas se o modelo antigo estava dando resultado. 

A pandemia, no entanto, trouxe uma aceleração e um engajamento alto para as provocações que a gente já vinha fazendo. Em 2020 não havia opção, porque ou usávamos as novas ferramentas para ter resultado, ou não haveria resultado.

Fale especificamente sobre o ZZ HUB. Quais são os objetivos principais do programa de incubação de startups? E o que já podem contar sobre seus primeiros meses?
O ZZ HUB é um espaço que nós criamos aqui na cidade de Campo Bom e é um local que tem uma simbologia importante pra história da empresa, porque já abrigou várias operações, inclusive o início da operação da Arezzo em Campo Bom aconteceu lá. 

O prédio tem o legado do calçado, porque foi construído no ano em que a Arezzo foi fundada, em 1972, embora, na ocasião, fosse uma fábrica de amostras. 

A gente vinha discutindo há um bom tempo sobre ter um ambiente diferenciado, ter outro espaço que não fosse nossa sede principal, algo como um polo de tecnologia. Mas, na pandemia, vimos que não fazia muita diferença o lugar onde estaríamos. O ZZ HUB foi criado para ser um ponto de conexão da nossa empresa com agentes externos. 

O nome é um ponto interessante. Muitas empresas criam os “Labs”, mas eu sou muito chato em querer aprofundar o que os conceitos significam, se tem relação com a etimologia da palavra. 

“Lab” passava a ideia de um ambiente fechado onde só entram cientistas. Eu queria algo aberto, para conectar a empresa ao mundo – por isso, “Hub”, que é um ponto de conexões 

Depois de entender a lógica, a gente colocou lá todos os times ligados ao desenvolvimento de novos negócios digitais. Fizemos hackathons internos, já com o sonho de trazer startups para programas de aceleração que fosse evoluindo ao longo do caminho. 

Fizemos o primeiro ciclo este ano, de um processo inicial de aceleração. Quatro empresas foram selecionadas. Todas trouxeram grandes aprendizados – e a ideia é trazer mais empresas agora. 

Como se deu o processo de seleção das startups escolhidas para a incubação? O que chamou a atenção do grupo sobre cada uma das empresas?
A gente fez uma peneira grande na convocação, para ter uma base grande e, depois, filtrar. A ideia era que as empresas tivessem um portfólio de soluções para aspectos distintos do nosso negócio. 

Uma delas, por exemplo, tem soluções ligadas à produção da fábrica. Já outra vem para resolver um problema ligado a lastmile. Tem empresas diferentes se a gente olhar para os fundadores, como a [edtech] Growdev, fundada por professores de faculdade, pessoas da área acadêmica. 

Acho que a gente encontrou mais maturidade no contexto do ambiente de startups, que passou por uma fase do “oba-oba”, quando começaram a surgir os primeiros unicórnios que encheram os olhos de muita gente, mas que tinham pouco fundamento, pouca base de conteúdo 

Hoje, até pelo contexto do mercado, vejo empresas mais maduras, com desafios claros.

Em março, vocês realizaram um hackathon com colaboradores da companhia, em parceria com a Amazon Web Services? Pode explicar melhor como foi essa iniciativa? Quais foram os aprendizados extraídos, e o que mudou de lá para cá?
Foi a segunda edição de um hackathon de grande porte. O primeiro tinha sido com o time do Google. 

Para o da Amazon Web Services estávamos preocupados em promover discussões que gerassem soluções aplicáveis ao negócio. Tínhamos o envolvimento de times como da contabilidade, do administrativo, não só o pessoal da tecnologia 

E foi bem valioso, porque a Amazon abriu a maneira dela de fazer as coisas. É sem dúvida alguma uma das empresas mais inovadoras do mundo e que mais prosperou nos últimos anos. 

No hackathon, a AWS abriu as portas para nós. O saldo positivo foi termos conseguido ordenar melhor os desafios e ter soluções aplicáveis.

A Arezzo recebeu críticas pela escolha da influenciadora Jade Picon, uma mulher branca, para estrelar a campanha sobre os 50 anos da companhia: a coleção, feita em parceria com a marca de roupas baiana Meninos Rei, traz elementos representativos da cultura africana. O que você diz sobre essas críticas de apropriação cultural e falta de representatividade na campanha? Como esses questionamentos repercutiram dentro da Arezzo?
Sendo transparente como sempre sou e de coração aberto, posso dizer que a gente trabalha profundamente para ser uma empresa melhor a cada dia, estando muito atentos a todas as temáticas que envolvem ESG e cuidado em todos os ciclos da cadeia. 

Obviamente uma situação como essa causa um mal-estar, de se perguntar: o que poderíamos ter feito melhor? O que a gente não viu? Como fazer diferente? 

A gente tem trabalhado bastante em ampliar diversidade e tem desafios, como aqui na região [de Campo Bom], que é de origem alemã, italiana. 

Pegando outro exemplo, a empresa acabou de lançar um programa para mulheres em tecnologia. Temos, também, um estágio afirmativo para pessoas negras, porque sabemos que há uma questão de racismo estrutural na sociedade, que precisamos combater. Não tínhamos divulgado ainda, porque poderia parecer oportunismo, as conversas ficariam misturadas. 

Obviamente ninguém teve a intenção de fazer uma construção com um olhar que fosse negativo, que pudesse ser enxergado como apropriação [cultural]… Os próprios criadores [da Meninos Rei] têm uma ligação forte com a cultura africana. 

Mas, como tudo o que a gente vive, foi algo que serviu de aprendizado, para olhar com mais atenção.

Ainda sobre esse assunto, não era óbvio que a escolha de uma mulher branca, associada a uma marca de estética afro, poderia desagradar muita gente? Gerar polêmica foi justamente a razão dessa escolha?
Aí é uma questão mais profunda. O que eu posso falar é o que está na própria carta [com o posicionamento da marca]. 

Tínhamos várias modelos na campanha, modelos pretas e, também, a Jade [Picon]. A maneira como saiu despertou o olhar em críticas, porque não foi óbvio dentro do processo de quem passou, validou, não foi a intenção. Se fosse totalmente óbvio, não teríamos feito 

De maneira alguma foi criado para virar um burburinho. Não é assim que a gente trabalha, não é essa a história da marca Arezzo.

É um aprendizado acima de tudo. Sendo privilegiados, vindos de uma minoria – e me coloco nesse barco –, precisamos fortalecer uma cultura mais diversa da empresa. Fica de lição.

A Arezzo&Co hoje reúne uma grande gama de marcas, incluindo aquisições de anos mais recentes, como Reserva e Carol Bassi. Que vantagens e desafios essa multiplicidade de marcas traz na gestão da inovação?
Falando sobre a Reserva primeiro, é uma marca que tem um DNA diferente do nosso, é mais voltada para um cliente final, do que para um modelo B2B, de franquia.

É também uma marca com DNA muito forte de inovação. Não à toa, foi a primeira do Brasil a ter pagamento com criptomoedas, lançou uma coleção de NFTs. A Reserva traz, também, sócios que agregam muito valor 

Já sobre Carol Bassi é uma marca que fortalece nosso núcleo de Luxury e que se apresenta muito fortemente no relacionamento forte através das redes, que é um fenômeno, com grandes números e que também traz um conhecimento sobre vestuário feminino.

O que você já pode adiantar sobre a segunda etapa do programa de aceleração de startups da Arezzo&Co?
A expectativa é que a gente possa amadurecer o trabalho que começamos. Não tem grandes mudanças em relação aos desafios, mas tem muitos aprendizados. O objetivo é fortalecer as agendas, as áreas internas de negócio da companhia. 

Agora também podemos ter mais variedade de experimentações com cada uma das startups, para conseguir testar, aprimorar e refinar. A ideia é explorar soluções de maneira mais rápida, embora não superficial, para realmente extrair mais aprendizados 

Com o segundo ciclo, queremos trazer mais startups e pavimentar o caminho para um ecossistema maior. Também temos a missão de fortalecer o ecossistema de startups aqui do Rio Grande do Sul, embora algumas empresas não sejam necessariamente da região.

Qual é a estratégia da Arezzo pensando em metaverso? E que outras iniciativas ligadas a digitalização, inteligência artificial etc. os clientes podem esperar a curto, médio e longo prazo?
Dentro do que a gente tem de negócios digitais, há um trabalho de experimentar praticamente tudo o que é novo, porque nunca se sabe se algo realmente vai se tornar mainstream

Tivemos um exemplo recente de algo que parecia que iria revolucionar e que, de certo modo, desapareceu, que foi o Clubhouse, uma rede social por voz. Foi um hype gigantesco, mas, assim como veio, esfriou. Então, precisamos testar, porque ninguém tem bola de cristal para saber o que realmente vai vingar 

E aí, quando a gente fala de metaverso, é algo que entra na linha de experimentações, porque é difícil saber o que vai se materializar. 

A própria internet como era quando foi criada, quase como um repositório de dados e consultas bibliográficas, não tem nada a ver com o que é hoje. A tecnologia é a mesma, mas as aplicações são diferentes. 

A gente ainda vê uma dificuldade em como relacionar o tema “metaverso” com nossa base de clientes – mas tem, claro, realidades já existentes. Desenvolvemos, por exemplo, uma collab de um tênis digital com a Reserva, para a plataforma PK XD e tem, também, um tênis phygital 

Temos uma visão muito otimista de tudo o que está por vir, porque hoje, com a multiplicidade de marcas, passamos a ter um ecossistema dentro de casa que tem uma inteligência coletiva muito grande, que serve para abastecer e fortalecer todas as linhas de negócios que estamos desenvolvendo.

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