Foi no meio de uma mudança e de reuniões que Tiago Compagnoni, CEO e co-fundador do Queremos! conversou com o Draft, em uma conexão Nova York-São Paulo. Mesmo em meio à confusão, o rapaz de 36 anos mostrou-se calmo e até um tanto hiperativo, respondendo minhas perguntas antes mesmo delas serem feitas. Nesse clima realizador e ao mesmo tempo despretensioso nasceu o Queremos! — plataforma que é referência em financiamento coletivo de shows no Brasil e que agora está também em Nova York, e no mundo.
A história é conhecida: um grupo de cinco amigos, Pedro Garcia, Bruno Natal, Pedro Seiler, Pedro Continentino e Tiago perceberam que os shows internacionais até passavam pelo Brasil ou América Latina, mas deixavam de fora o Rio de Janeiro e decidiram fazer algo a respeito. Foram investigar os motivos e perceberam que muito disso acontecia porque os produtores cariocas tinham medo de não ter o retorno financeiro esperado para as apresentações. Muitas vezes, os shows aconteciam, mas o público interessado ficava sabendo só depois de saber do fracasso.
Depois de uma conversa, e municiados de uma boa dose de ousadia e despretensão, os amigos imaginaram que o crowdfunding poderia ser uma saída. O ano era 2010 e esta forma de financiamento coletivo era menos conhecida do que hoje em dia, mas valia tentar. De maneira bem precária, tiveram a oportunidade de trazer o sueco Miike Snow para o Rio, que já viria a São Paulo, no dia 22 de setembro de 2010.
Eles começaram com o crowdfunding “na unha” mesmo. Mandaram e-mails para todos os conhecidos e pediram para, mesmo quem não quisesse participar do projeto, que encaminhasse o e-mail para quem achavam que pudesse gostar da ideia. A ideia era bem simples: bastava pagar 200 reais, através do PayPal de Tiago e, caso chegassem à cota necessária para a apresentação se realizar, o show aconteceria. Se não rolasse, todos teriam o valor investido de volta.
Deu certo! Em apenas 12 horas, eles já tinham todas as cotas vendidas e o show aconteceu no Circo Voador (o local seria o primeiro parceiro do site, que nasceria em seguida). A segunda banda a se apresentar pelo projeto foi o Belle & Sebastian. Conhecida na cena indie, mas longe de ser uma banda de multidões, o financiamento para trazer o Belle ao Rio também conseguiu bater a meta em menos de 24 horas. “Daí, começamos a pensar: como podemos organizar tudo isso?”, conta Tiago.
Àquela altura, cada show era anunciado por um blog, como o “queremosbelleandsebastian”. Daí nasceu o nome do projeto, apenas “Queremos!”, eles passaram a conversar com outros promotores no Rio de Janeiro e, depois disso, conseguiram realizar um lendário show do LCD Sounsystem, com um James Murphy (vocalista) emocionado por estar tocando no Brasil por causa dos fãs. Além disso, também se apresentaram no Rio Vampire Weekend, The National, Metronomy, The Kills, Foster the People, Friendly Fires, Chromeo, Of Montreal, The Gossip, Dirty Projectors, Nouvelle Vague, Yo La Tengo, De La Soul, Chet Faker e Sharon Von Etten, entre outros, chegando à marca de mais 130 shows internacionais financiados pelo site.
A coisa funcionada assim: na plataforma os fãs pedem o show de qualquer artista. Quanto mais gente pedindo determinado show, mais probabilidade de dar certo. Ele pode acontecer financiado pelos próprios fãs (via crowdfunding) ou com um produtor bancando junto a ideia (o produtor tem, no site, uma visão geral de em qual cidade fazer o show e, daí, escolhe correr o risco, ou dividir com os fãs). Esse processo diminui o risco da operação de se trazer um show internacional ao país, ao mesmo tempo em que também ajuda o artista a fazer mais shows pelo país e, até, pela América Latina. Tiago fala dessa apropriação coletiva do risco:
“É um clima diferente, as pessoas se sentem donas do evento e na verdade elas são. Se não fosse por elas, ele não aconteceria. Se você está envolvido com a organização, a coisa muda”
Ele conta que, a cada evento realizado o Queremos! faz um mosaico com a foto dos fãs que apoiaram e a pessoa pode se ver lá. Essa é uma ferramenta totalmente colaborativa que gera engajamento online também: “Quando alguém quer ver um show, ela começa a fazer a propaganda, fala para todos os amigos e começa assim a divulgação”.
O modelo de negócios do Queremos! se baseia em três fontes de receita: o fee cobrado dos promotores e artistas que vendem ingressos pela plataforma, o lucro dos shows que produzem e, também, o patrocínio de marcas que têm interesse em música e patrocinam os shows.
UMA INOVAÇÃO ACELERADA, AGORA EM NOVA YORK E NO MUNDO
O Queremos! começou suas atividades de maneira bem caseira e sem gastar muito dinheiro. Não houve um investimento real inicial. Apenas o tempo e uma boa ideia foram testadas. Foi a partir do primeiro investimento bem-sucedido, as coisas começaram a acontecer. Depois do sucesso no Brasil, porém, Tiago e os sócios perceberam que havia uma oportunidade de expandir. Para onde? Que tal Nova York?
O conceito do Queremos!, desde o princípio, é sonhar alto mesmo. Porém, dessa vez, a coisa seria bem diferente. “Precisávamos de um investimento de 1 milhão de dólares para exportar a ideia para lá. Um amigo nos deu a dica de participar do projeto de aceleração da 21212 [que trabalha com startups e faz uma conexão entre EUA e Brasil] e nos transformar em uma empresa global”, conta Compagnoni.
Tiago atuou durante este período de aceleração como representante da startup em São Francisco e, no final do processo, a plataforma conseguiu um show da banda canadense Badbadnotgood. Foi um sucesso e o Queremos! tornou-se a primeira empresa brasileira selecionada pela Techcrunch, empresa que trabalha com tecnologia dedica a startups inovadoras na internet, além de trazer notícias do mundo digital.
Frederico Lacerda, um dos fundadores da 21212, fala da startup: “Acreditamos que o Queremos! teve destaque no Techcrunch justamente por possuir um modelo de negócios disruptivo em uma indústria extremamente grande como a de entretenimento. E a sua participação no evento foi decisiva para a entrada no mercado americano, já que permitiu uma exposição extremamente positiva frente à indústria”.
Com os investimentos e investidores interessados, a versão internacional precisava agora de um nome e o escolhido foi We Demand (que em tradução literal seria “Nós exigimos”). Tiago conta que um “We Want”, por exemplo, não teria o mesmo impacto do “Queremos” brasileiro. Hoje, o site já acumula 1,2 milhão de pedidos de shows, tanto nos Estados Unidos, como México e até na Europa.
O site continua focando em música, mas abre espaço para outras possibilidades também como essas celebridades da internet que queiram se apresentar no país. Um Meet & Greet custeado pelos fãs. Nesta linha, entra o comediante Olan Rogers, que está circulando pelos EUA graças ao site. Ele, como tantos outros, virou um celebridade na internet com seus vídeos, mas como não tinha como custear as viagens usou o We Demand. “É um show barato, porque o que um comediante precisa, além de uma sala e um microfone?”, diz Tiago.
Com o sucesso, veio também a necessidade de mudança e Tiago foi o escolhido para ir morar em Nova York, onde fica o escritório do We Demand. Outro sócio que fica na ponte área Brasil-Estados Unidos é Bruno Natal. O restante deles permanece no Rio, onde o escritório da empresa emprega mais 13 pessoas (nos EUA são cinco funcionários).
A VIDA DE EMPREENDEDOR EM NOVA YORK
Tiago mudou-se para a cidade com a mulher e teve a “sorte” de logo pegar um dos piores invernos da cidade, com temperaturas abaixo de 0°C. Mas o carioca disse ter passado bem pelo frio, graças à calefação dos locais fechados. Nova York é considerada a cidade objeto de desejo de gente do mundo inteiro e das mais diferentes áreas, desde comércio até arte, moda e tecnologia e também atraía Tiago.
“Como turista, você tem muita coisa para fazer. Mas tudo é muito diferente quando você mora na cidade. Eu fico até meio maluco, porque sempre tem um show incrível acontecendo e muitas vezes não consigo ingresso. Mas é uma cidade incrível e muito recompensadora. Os principais escritórios estão aqui, é fácil marcar reuniões e adoro ir ao Central Park no verão”, conta ele.
Perguntado se ainda tem algum show que quer fazer, mas ainda não fez no Brasil, Tiago, como fez há cinco anos, vai longe: “Taylor Swift e Radiohead”. Sonhar alto está no DNA do Queremos e a trajetória já mostrou que essa despretensão, aliada a muito trabalho, tem dado frutos. Ou melhor, shows. Queremos mais.
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