Os livros cuidam de mim! Você sabia que os livros cuidam de muitas pessoas? Como assim?
Lá vem minha história de amor pelos livros e gosto pela leitura. A curiosidade e o interesse pelo aprendizado me acompanham desde criança.
A escolha pelo magistério aconteceu naturalmente. O ofício de ensinar e aprender me mobiliza e realiza há décadas e os livros são meus parceiros de jornada.
Professora com carreira consolidada, aposentadoria batendo à porta, eu tinha a vida profissional “planejada e quadradinha”. Mas minha inquietude por mudanças e a procura por um estudo diferenciado me levaram a uma reviravolta: uma pós-graduação em contação de histórias
O curso “A arte de contar histórias por meio de abordagens poético literária, filosófica e performática” foi um divisor de águas na minha vida e das pessoas que cruzaram meu caminho.
Minha busca pela contadora de histórias escondida continua. Adentrar por esse portal de magia, conhecer contadores de histórias, gente de maravilhas, frequentar eventos culturais, ministrar cursos na área de literatura, ficar mais próxima dos livros e das histórias de vida, tudo isso ampliou meu repertório profissional e me tornou um ser humano melhor.
Em 2012, acompanhei meu marido no hospital por 15 dias. Ali, conheci a importância do trabalho voluntário e o valor da humanização hospitalar, que despertaram meu interesse.
Em 2015, cheguei à ONG Canto Cidadão para fazer uma oficina e o encantamento pela palhaçaria me levou de volta ao ambiente hospitalar, mas dessa vez, vestida de Dra. Massa Flor, palhaça criada para esse trabalho voluntário em hospitais públicos de São Paulo. Lá, fiz morada, e a arte da fala e da escuta me ensinou muito a cada visita nos leitos do Hospital Cruz Azul, nos últimos anos.
Tempinho depois, os livros me conduziram a novos caminhos e o chamado da biblioterapia foi irrecusável. E como explicar esse transbordamento?
Biblioterapia é uma prática de autocuidado e autoconhecimento por meio da literatura, da narração de histórias e de relatos de vida
É uma arte do encontro, com o propósito de compartilhar saberes, ampliar olhares, visões de mundos, permitir a livre expressão dos sentimentos e das emoções sem julgamentos.
Ela possibilita trocar impressões, partilhar histórias com afetividade, ouvir o outro, visando a saúde integral de todos envolvidos. Tudo isso tendo como protagonista a leitura de contos, crônicas, poemas e livros infantojuvenis.
A vida toda ouvi as pessoas dizerem que eu tinha alma poética, e não sabia diferenciar se tal comentário era elogio ou crítica. Ainda não sei, mas agora não me preocupo, me ocupo com o que me faz bem. Se faz bem para mim, pode fazer para os outros também!
A prática da biblioterapia me deu licença poética para ser eu mesma, conhecer gente com os mesmos interesses, multiplicar meus conhecimentos e leituras que me tocaram, transformaram meu dia e me ajudaram a atravessar momentos difíceis.
Desde 2017, após meu arrebatamento pela descoberta da “terapia por meio dos livros” e depois de concluir a imersão em Biblioterapia, ter realizado cursos e encontros, venho difundido essa prática por meio de círculos de biblioterapia.
São encontros nos quais abordarmos temas que são sensíveis à existência humana: relações afetivas, morte, tempo, envelhecimento, felicidade, esperança, laços afetivos, propósito, literatura negra, entre outros. O círculo com maior número de edições foi “Mulheres que me habitam”. Outro ponto forte tem sido a presença de escritoras e escritores divulgando suas obras e dialogando com outros autores que levo para essa partilha.
(Também venho oferecendo cursos de formação de Biblioterapia. Nove turmas já tiveram a oportunidade de descobrir seus benefícios e encantos.)
A narração de histórias está a serviço dessa prática. Por isso, gosto de iniciar esses encontros com um conto relacionado à temática que escolho: os fios das histórias nos conduzem por esses mundos de afetos, fragilidades e potências do humano.
Como facilitadora desses círculos de biblioterapia, posso testemunhar o poder terapêutico das histórias, me aproximar de autores e suas obras, perceber o poder transformador e humanizador dos livros com públicos de diferentes faixas etárias, em contextos diversos: na sala de aula, no hospital, na família, entre amigos, em bibliotecas e eventos culturais…
Em experiências familiares, posso afirmar que os livros me prepararam para enfrentar mudanças inevitáveis, como o luto, a demência, o ninho vazio e minha incompletude da poética do viver.
Percurso fácil? Nem um pouco! Me exige estudo contínuo, paciência e determinação para a conquista de público. Além de um acervo bem selecionado, locação de espaço para os encontros, divulgação, reconhecimento do trabalho, parcerias, apoio da família, sem falar no investimento e na remuneração.
O fomento à leitura é um desafio diário e prazeroso. Sonho com o dia em que falarei em biblioterapia e não precisarei mais explicá-la, pois seus encantos e benefícios são imensuráveis.
E quem sabe um dia virá a conquista do patrocínio de editoras, livrarias oferecendo seus espaços gratuitamente para seus públicos participarem de círculos de biblioterapia, empresas abrindo as portas para o cuidado da saúde mental de seus funcionários e mais convites para palestras e congressos — de preferência, remunerados.
Durante a pandemia, posso afirmar que a biblioterapia me curou, literalmente, da falta do convívio social, do tédio, da solidão, da tristeza e da saudade de estar longe de familiares e dos amigos. Ao mesmo tempo, me oferece a possibilidade de expansão
Investi na minha biblioteca pessoal, que chamo de “farmácia literária”, participei de lives e realizei o projeto Biblioterapia em Casa, em que as pessoas abriram as portas de seus lares (pelas janelas das videoconferências) para encontros literários online.
Criei um podcast (caseiro) para aproximar distâncias, enviar afeto em forma de contos, crônicas, histórias, poemas, orações para a família, em princípio. Aos poucos, mais ouvidos gentis foram sendo alcançados, e assim a arte da escuta foi ocupando seu espaço e sendo “abraço”. (Você já ouviu algum episódio de Biblioterapia em Casa?)
Mesmo exausta das telas no home office e desconfiada dos cursos à distância (sou defensora das aulas presenciais), fiz uma pós-graduação EAD.
Que decisão assertiva! Agora, sou especialista em Biblioterapia e Mediação de Leitura Literária.
Essa formação me trouxe pertencimento, empoderamento e grande realização pessoal.
Também passei a assinar a coluna “Biblioencontro”, na Revista Voo Livre, publicação na qual procuro promover a prática da biblioterapia, proporcionar um espaço de partilha de vivências e inspirar os leitores através do meu trabalho.
Continuo professando na sala de aula e no hospital. Em 2022, passei a ministrar o curso de extensão de “Contação de histórias” na Escola de Sorrisos, da UNIFESP, onde oriento a mediação de leitura afetuosa e levo a biblioterapia para alunos da área da saúde (estudantes de medicina, enfermagem, fonoaudiologia e nutrição)
Eles levam histórias para crianças na hemodiálise do Hospital São Paulo e nos humanizamos juntos, entre dores e sorrisos. Acredito que bibliolaços nos unem!
E, por fim, toda essa jornada ainda resultou em outros frutos. As leituras, as histórias e os cursos me levaram à escrita, a desengavetar meus poemas.
O resultado foi o livro Quintais, publicado em 2022 pela Caravana Grupo Editorial. Eis aqui um dos poemas da obra, de presente para vocês:
Poesia psicografada
Os livros cuidam de mim…
Eu cuido com eles!
Os livros me leem…
Aprendi a ler para ser mais EU!
Os livros me conhecem como ninguém…
Conheço os outros por meio deles também!
Os livros falam comigo…
Diálogos internos, abrigo!
Os livros escutam meus gritos…
Vou ao seu encontro, entre amigos!
Os livros são meus mundos alternativos…
Minha rota de fuga… e de cura!
Os livros me abraçam ou me rasgam…
Viro folha, crio versos!
Os livros me fazem sonhar…
Me acordo melhor!
Os livros me desnudam…
Visto minha roupa de mundo!
Os livros me acompanham…
Caminho sem volta!
Os livros me habitam…
Moro nesse lugar de colo!
Os livros me atravessam…
Muitas vezes sem resposta!
Os livros me chegam…
Sempre na hora certa!
Os livros me ensinam…
A aceitar outros jeitos de Viver!
Christyanne Bueno é ser de alma poética. Professora, biblioterapeuta e apaixonada por livros e pessoas. Acredita no poder transformador da educação dos afetos.
E se você só tivesse 40 segundos para evitar uma tragédia? Voluntário do Centro de Valorização da Vida, Thiago Ito fala sobre o desafio de criar um mini doc que viralizou nas redes com uma mensagem de esperança em favor da saúde mental.
Na infância, Marina Amaral teve de mudar a alimentação e se exercitar para lidar com o ganho de peso devido ao hipotireoidismo. Adulta, ela deu uma guinada na carreira e desenvolveu o Lia, uma plataforma para fortalecer o bem-estar feminino.
Pouco se fala sobre o envelhecimento de pessoas LGBT+. Para combater essa invisibilidade (e o clichê de “literatura regional”), a dramaturga não-binária Euler Lopes resolveu se aventurar em seu primeiro romance, ambientado em Sergipe.