Como quatro jovens arquitetos inventaram uma lucrativa empresa de projetos espaciais, a Vapor 324

Daniela Paiva - 2 jan 2015Fabio Riff, Rodrigo Oliveira, Thomas Frenk e Fabrizio Lenci, arquitetos, sócio-fundadores e faz-tudo da Vapor 324.
Fabio Riff, Rodrigo Oliveira, Thomas Frenk e Fabrizio Lenci, arquitetos, sócio-fundadores e faz-tudo da Vapor 324.
Daniela Paiva - 2 jan 2015
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Na segunda rodada de entrevistas com Thomas Frenk, um dos sócios da Vapor 324, ele estava (com o perdão do trocadilho inescapável) a pleno vapor. Trabalhava em uma instalação para o evento Sencity, que aconteceria no sábado, 20 de dezembro, no Museu de Arte Moderna (MAM), na capital paulista. A ideia era promover uma experiência multissensorial para surdos e ouvintes. A Vapor 324 era responsável por montar uma bateria eletrônica que a cada toque – por exemplo, uma batida no prato ou no bumbo – projetava uma imagem diferente em um telão de nove metros.

Thomas tem 27 anos. O quarteto de sócio-fundadores da Vapor ainda conta com Rodrigo Oliveira, também de 27, Fabio Riff, 28, e Fabrizio Lenci, 26. Todos com menos de 30 anos, diplomados em arquitetura e urbanismo, e unidos à frente de um escritório que trabalha projetos criativos e difíceis de definir, mas com três frentes primordiais: arquitetura, audiovisual e meios gráficos.

Não raro, isso tudo se mistura num tubo de ensaio para um mesmo projeto, como aconteceu na instalação para o evento do MAM. O conhecimento em arquitetura serviu de base para o planejamento da estrutura física e técnica do aparato. As outras duas especialidades estavam nas projeções de imagens, também criadas pelo grupo.

Para o Sencity, evento no MAM, a Vapor 324 bolou uma bateria em que os toques sonoros faziam surgir diferentes imagens em um telão.

Para o Sencity, evento no MAM, a Vapor 324 bolou uma bateria em que os toques sonoros faziam surgir diferentes imagens em um telão.

Os sócios se conhecem há uns dez anos, mas inauguraram a empresa somente em fevereiro do ano passado. A Vapor funciona em uma sala de escritório no edifício de número 324 da Avenida Ipiranga – daí o número, 324. Localizada no centro da capital paulista, a empresa está a alguns passos do mítico Edifício Copan e próxima a boa parte dos fornecedores que eles costumam usar, além das lojas de comércio popular na rua 25 de Março e de eletrônicos da rua Santa Ifigênia.

Os sócios estão fechando este segundo ano de operação com um faturamento de 320 mil reais, planos de expansão para 2015 e um horizonte cheio de projetos que têm a ver com um conceito fluido de trabalho, elaborado desde os tempos da faculdade.

DE UM COLETIVO PARA UMA EMPRESA DE VERDADE

Thomas, Fabrizio, Fabio e Rodrigo se conheceram na Escola da Cidade, uma faculdade que tem apenas 13 anos de existência e é inovadora na área de arquitetura e urbanismo por trazer para a sala de aula uma filosofia contemporânea de soluções criativas e com senso crítico e reflexivo sobre o espaço.

Thomas entrou para o curso de arquitetura e urbanismo em 2005, no quarto ano de vida da instituição. A Escola da Cidade era então uma faculdade para poucos alunos, cerca de 30 por ano, em uma graduação com cinco anos de duração. Hoje são seis, e o número de alunos quase triplicou.

O quarteto-pilar da Vapor acabaria se formando em sala de aula, precisamente na disciplina Estúdio Vertical, na qual estudantes de todos os semestres se encontravam para desenvolver projetos ousados e explorar a criatividade. Ali, surgem trabalhos e experimentos para eventos internos da faculdade de fim de ano, abertura e encerramento de exposições etc.

O vídeo SP– O-MATIC, projetado no edifício da Fiesp, na Av. Paulista, misturava etnias e a linguagem dos games.

Em abril deste ano, o vídeo SP– O-MATIC, projetado no edifício da Fiesp, na Av. Paulista, misturava etnias e a linguagem dos games.

Para um desses eventos, Fabrizio elaborou uma luminária industrial feita de luzes de Natal e copos de plástico. Inusitada e de custo baixíssimo. Thomas e outros colegas ajudaram a dar escala para a ideia, e pronto: sucesso na balada. Daí em diante, para eles a arquitetura definitivamente deixou de ser sinônimo de reforma e construção de casas e apartamentos. Tornou-se algo maior, com um quê de fabricação artística.

Nessa época, os ainda estudantes começaram a receber pedidos para produzirem instalações, fazerem cenografias em festas de amigos e shows de bandas. Cobravam apenas preço de custo e às vezes até não cobravam, conta Thomas. Mais valia estar em franca produção, o que acontecia em duplas ou trios e estreitava as relações entre os colegas. “Eu e o Fabrizio produzíamos muita coisa juntos, o Rodrigo e o Fabio chegaram depois e fomos ficando cada vez mais amigos”, relembra Thomas.

Também chamaram a atenção com intervenções e projeções que combinavam desenhos, luzes e cores fortes na fachada da própria Escola da Cidade em eventos especiais – um desses projetos aconteceu na Virada Cultural de 2010. “Tínhamos soluções criativas”, diz Thomas, ao tentar identificar o que fez aumentar o boca a boca, rendendo mais e mais solicitações de trabalhos ao grupo:

“A arquitetura possibilita que a gente faça coisas diferentes por ter a ver com composição, espaço, desenho, fotografia, cinema. Ao mesmo tempo, é uma formação vinculada ao prático, ao mundo da construção, do preço, do projeto realizado”

Entre 2009 e 2010, Fabrizio, Thomas e mais quatro colegas da arquitetura juntaram-se na Goma Oficina (não confundir com GOMA, núcleo de empreendedorismo criativo do Rio de Janeiro), um coletivo que trazia no DNA a ideia de desenvolver projetos diversos, e não só de arquitetura. Mais tarde, Rodrigo e Fabio seriam incorporados ao grupo.

Um dos trabalhos dessa fase é a instalação Bolhas, que fez parte de uma exposição com 28 artistas chamada Projeto Imóvel, no Copan. Espalharam bolhas grandes de plástico pela varanda do prédio de Oscar Niemeyer, causando uma forte impressão, principalmente para quem passava ao lado de fora.

No final de 2012, Fabrizio, Fabio, Thomas e Rodrigo resolveram se separar da Goma e montar o próprio escritório. Foi quando os quatro chegaram à conclusão de que queriam ter um negócio formal, bem diferente do modelo de coletivo, como Thomas conta:

“Queríamos nos organizar como empresa. Naquele momento, entendemos que nós quatro trabalhávamos muito bem juntos e que tínhamos mais interesses em comum do que com o resto das pessoas”.

Assim, a Vapor 324 surgiu no primeiro semestre do ano passado com um investimento de 15 mil reais, usados para a reforma e o aluguel do escritório, além dos equipamentos pessoais de cada sócio.

ENSAIANDO O CRESCIMENTO

A Vapor 324 se divide nas três áreas de atuação que já falamos, todas podendo gerar negócios e projetos. Dependendo do tipo de trabalho, pode ser necessário envolver a expertise de uma outra ou mesmo todas as áreas.

Na caixinha de meios gráficos entram materiais para revistas, LP, cartaz, animação, motion graphic e de design. A de vídeo comporta video mapping, vinhetas, conteúdo visual para shows e peças, documentários, instalação, projeção e vídeos para a internet. Já a de arquitetura tem a ver com construção, cenografia, mobiliário e reforma.

É na diversidade e na liberdade que eles encontraram a chave para criarem novidades sempre. “A inovação está em ter um mesmo lugar que agrega coisas diferentes. E isso nos garante uma qualidade de trabalho. Em uma semana estamos fazendo um projeto de reforma, na outra, uma instalação com liquidificadores. Esse olhar novo faz com o que o resultado seja novo também”, diz Thomas.

Neste exato momento, os quatro sócios da Vapor estão discutindo que tipo de equipe querem ter em 2015. A dúvida está entre buscar profissionais com perfis versáteis similares aos deles ou buscar especialistas. A necessidade de aumentar a equipe urge: “Em um ano difícil por conta da Copa do Mundo e das eleições, crescemos 50%”, afirma Thomas.

No restaurante Tuju, em São Paulo, a Vapor 324 colocou plantas comestíveis no paisagismo, além de fazer o cliente entrar no recinto passando pela cozinha.

No restaurante Tuju, em São Paulo, a Vapor 324 colocou plantas comestíveis no paisagismo, além de fazer o cliente entrar no recinto passando pela cozinha.

Na estrutura atual, todos se envolvem com os trabalhos, mas há uma divisão natural por conta das habilidades individuais. Fabio, que trabalhou no estúdio que produzia conteúdo visual para o cenógrafo e artista Zé Carratu, toma conta dos vídeos. Rodrigo lidera a arquitetura e Fabrizio cuida dos meios gráficos. Thomas trafega pelas três.

A cada novo job, os quatro fazem uma discussão prévia, espécie de briefing, na qual acontece a tempestade de ideias. A partir dela surgem um ou dois líderes, que ficarão responsáveis pelo projeto.

O toque de inovação da Vapor 324 pode ser visto no trabalho que fizeram para o o restaurante-sensação Tuju, no qual planejaram o paisagismo usando plantas comestíveis e legumes. “É um restaurante que queria ser transparente e mostrar de onde vêm os alimentos e sua produção”, conta Thomas. Daí também surgiu outra ideia pouco usual no setor: o cliente entra no restaurante passando pela cozinha.

Em abril deste ano 2014, o vídeo SP-O-MATIC, projetado no edifício da Fiesp, em plena Avenida Paulista, misturou etnias, São Paulo e a linguagem dos games. Entre os trabalhos que eles destacam no ano também estão o videomapping e a cenografia do 3o Grande Concerto de Francisca, promovido pela Casa de Francisca, que aconteceu em novembro no Theatro Municipal de São Paulo; e uma série de ilustrações para o jornal Folha de S. Paulo com o mapa do estado.

Com dois anos de atividade e previsão de crescimento de equipe e faturamento em 2015, os quatro fundadores, que não têm nenhuma formação ou conhecimento administrativo, se viram buscando conselhos e dicas de pessoas próximas. Uma das estratégias atualmente em uso é a remuneração pró-labore, em que os sócios recebem um salário fixo por serviços prestados, não vinculado à receita dos jobs, enquanto forma-se um caixa na empresa. “Por um tempo, a gente dividia, mas só quando tinha. Mas o pró-labore é bem mais legal porque tem uma constância na entrada de dinheiro. Você fica tranquilo porque consegue ver a empresa crescendo”, afirma Thomas. Que siga nesta toada, a todo vapor.

draft card VAPOR

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