Realizado desde 1987, em Austin, no Texas, o festival South by Southwest (SXSW) construiu sua relevância no universo da inovação. Na conferência são debatidas tendências e os participantes podem entender, por meio de apresentações, exibições, trilhas, workshops etc., para onde caminha o mercado e quais as próximas inovações em áreas como empreendedorismo, entretenimento, mobilidade, propaganda, tecnologia e sustentabilidade.
O problema é saber qual parte do evento acompanhar, sem cair no FOMO (Fear Of Missing Out, o medo de perder alguma coisa), em meio a mais de 50 atividades realizadas ao mesmo tempo ao longo de dez dias. Resolver essa dor foi um dos fatores que impulsionaram, em 2019, a criação da Oxygen, empresa de “curadoria as a service”, com foco em lifelong learning.
A proposta é ajudar profissionais a ampliarem seu portfólio e empresas a entenderem o futuro. Ou, como resume a fundadora Andrea Janér:
“Em um mundo onde nunca se produziu tanta informação, é um desafio acompanhar tudo o que está acontecendo, conectar pontos e formar um pensamento crítico. A Oxygen surge para separar o sinal do ruído, com curadoria para captar os assuntos mais relevantes e entregá-los com profundidade”
Na época em que o conceito da Oxygen começou a despontar na cabeça de Andrea, ela passava por um momento de questionar os rumos de sua carreira. Sentia que era o momento de buscar novos ares. Ou, em outras palavras: oxigenar as ideias.
FORMADA EM DIREITO, ANDREA ACABOU DESCOBRINDO O MARKETING MEIO POR ACASO
Andrea é advogada por formação, mas nunca exerceu a profissão. Seu sonho era ser diplomata e viajar o mundo, mas logo na faculdade de direito ela percebeu que não seria este o seu caminho.
“Com 18 anos já tive minha primeira crise existencial. Comecei a me questionar se eu não fosse diplomata, o que eu faria? Não me via como advogada ou juíza.”
Andrea aproveitou uma viagem de férias com a família para repensar o que fazer, sem trancar o curso. O destino: Nova York.
“Comecei a escrever sobre a cidade. Escrever está na minha essência desde o início. Hoje, olhando para trás, percebo que errei e que deveria ter cursado jornalismo”
Segundo ela, escrever era seu método de registrar as coisas, de guardar memórias. Os textos, que se pareciam com crônicas, não ficaram guardados na gaveta graças aos pais de Andrea.“Eles sempre me incentivaram muito e disseram que eu deveria tentar publicar o material em um jornal.”
Ela morava em Santa Catarina e buscou os dois principais jornais locais, o Diário Catarinense, da extinta RBS, e O Estado. “Bati na porta de O Estado, levei meus textos no braço, na cara de pau e perguntei se eles não queriam publicar”, lembra. Três dias depois, recebeu uma ligação dizendo que seu artigo iria entrar no domingo. O material apareceu na capa do caderno de variedades.
Andrea ainda publicou mais cinco textos até tomar coragem para pedir um estágio. No jornal não tinha vaga e no concorrente disseram que não podiam contratá-la pois sua formação não era em jornalismo, mas ofereceram um estágio em marketing.
“Eu não tinha a menor ideia do que era marketing, mas topei. Acabei me apaixonando e fui efetivada depois que me formei”
Para se especializar, ela foi em busca de um curso de extensão na Universidade da Califórnia. “Na área acadêmica, acabei me apaixonando por uma disciplina chamada Branding”.
Na época do curso de extensão, Andrea procurou um estágio em uma consultoria. Por coincidência, a Addison precisava justamente de um profissional brasileiro para fazer um trabalho para os postos Ipiranga. “O projeto deu super certo. Mostrei a eles que existiam outras empresas legais para trabalhar no Brasil e prospectei outros clientes.”
A Addison fez uma joint-venture com a Ana Couto e Andrea acabou como representante da consultoria estrangeira nesta parceria, voltando ao Brasil. Entre a Ana Couto e outras empresas, ela ficou no mundo do branding por 25 anos. Sua última passagem foi na Interbrand, onde atuou como diretora de 2015 a 2019.
Tudo caminhava bem, conta Andrea, até que, em 2017, já beirando os 45 anos, ela passou a se questionar por estar fazendo o mesmo tipo de trabalho há muito tempo.
“Pensei que como hoje em dia a gente pode chegar bem até os 90 anos, segundo os estudiosos da longevidade, eu poderia iniciar algo novo, pois provavelmente não me aposentaria aos 60. Então, comecei a pensar o que mais poderia fazer”
Para descobrir qual seria esse próximo passo, Andrea embarcou em uma jornada de autoconhecimento que incluiu um curso de transformação digital da Hyper Island. Ali, diz, ficou claro o quanto o branding no Brasil estava ficando para trás em relação ao resto do mundo.
Ela conta que até tentou levar as novidades para a Interbrand e mudar de área lá dentro, mas percebeu que não havia para onde crescer na organização. Era hora de sair.
Angustiada, Andrea resolveu fazer coaching e até um mapa astral, por indicação de uma amiga. E foi assim que entendeu que deveria voltar a escrever.
“A pessoa que fez o meu mapa astral me perguntou o que eu fazia muito bem aos 19 anos, mas tinha deixado para trás… Na hora, me lembrei dos artigos para jornais. Ela disse que essa era a direção, que eu tinha que voltar a escrever — e precisava viajar para isso.”
Ela não tinha nenhuma viagem planejada, mas logo depois veio o insight: viajar para o SXSW de 2018, que começaria em alguns dias. Ela nunca tinha ido ao evento, mas decidiu que escreveria de lá. Tirou férias e três dias antes de embarcar criou uma conta no Instagram para postar de forma ágil os conteúdos captados em Austin.
“Eu não tinha nenhuma pretensão com esse Instagram. Era só uma forma de compartilhar o que via e eu estava maravilhada com tudo aquilo. Me sentia de novo com 22 anos, como se tivesse encontrado minha turma”
Andrea conta que, antes, chegou a procurar um perfil de atualidades conhecido no Insta, se oferecendo para fazer a cobertura do evento. “Não me deram bola, porque eu tinha uns 30 seguidores… Mas quando estava lá, eles passaram a repostar minhas coisas e eu ganhando seguidores.”
De volta a São Paulo, ainda trabalhando na Interbrand, ela começou a palestrar sobre inovação. No fim daquele ano, embarcou para outro evento concorrido, o Web Summit, em Portugal.
Em fevereiro de 2019, Andrea retornou ao SXSW. Desta vez, aconteceu algo diferente. “Comecei a ir nos eventos e as pessoas me reconheciam, diziam que estavam me seguindo no Instagram. Ali, passei a ter uns 4 mil seguidores e ser convidada para dar palestras quando voltasse ao Brasil.”
Com os horários das palestras entrando em conflito com o de trabalho, ela percebeu: era hora de dizer adeus ao mundo corporativo. “Fui demitida. Na hora, abriu um buraco no meu estômago, mas foi o empurrão que eu precisava.”
Foram surgindo convites para dar outras palestras e até aulas, até que Silvia Rosenthal, uma amiga da área de turismo, sugeriu que as duas criassem um negócio para levar pessoas aos festivais de inovação — começando com o SXSW de 2020. A sócia ficaria encarregada das reservas de passagens, hotéis etc., enquanto Andrea entraria com a curadoria exclusiva e individual para cada cliente. Assim nascia a empresa e seu primeiro produto, o Oxygen Journeys.
“Eu já tinha feito uma curadoria das palestras que as pessoas deveriam ir no SXSW — mas informalmente, compartilhando minha agenda. Com a Oxygen, comecei a fazer pesquisas do line up e a identificar quem valia a pena assistir naquelas outras salas menos conhecidas”
Além da curadoria do evento e de uma newsletter semanal, Andrea decidiu oferecer um curso presencial, com 12 aulas realizadas no Civi-co e na sala Eva Hertz, da Livraria Cultura, no shopping Iguatemi, em São Paulo.
“Eu temia que as pessoas chegassem lá [no South by Southwest] um pouco perdidas, sem saber quem era quem… Então, criei o curso para abordar temas que estariam em pauta no festival: desinformação, fake news, novas formas de mobilidade, inteligência artificial, blockchain etc.”
A uma semana do início, o South by Southwest de 2020 foi cancelado por conta da Covid-19. A Oxygem, então com apenas nove meses de operação, já tinha vendido 37 pacotes para o evento. “Foi um golpe, mas acho que tive a resiliência de saber pivotar e focar no curso.”
Com o cenário pandêmico e as restrições às viagens, Silvia acabou optando por deixar o negócio. A primeira coisa que Andrea fez para manter a empresa de pé foi migrar o curso presencial para aulas ao vivo no Zoom.
“Em junho de 2020, vi que tinha na mão a possibilidade de criar um business de recorrência com uma grade de conteúdos que conectassem as pessoas e as empresas com o futuro, que fizessem elas entenderem cenários”, diz.
No mês seguinte, a empreendedora lançou o Oxygen Club, que oferece “curadoria as a service” em modelo de assinatura.
“As pessoas confiam na gente para dizer o que importa, o que elas precisam saber, quais são as tendências e oferecer um mergulho mais profundo em relação ao que encontram nas mídias tradicionais, que muitas vezes elas não têm tempo de acompanhar”
Hoje, a Oxygen tem três planos à venda: o Light (mensalidade de 125 reais), o Plus (295 reais) e o Pro (495 reais). Os valores variam de acordo com a quantidade e variedade de formatos dos conteúdos oferecidos.
Os pacotes incluem desde newsletter semanal a aulas, webinars e masterclasses (sempre ao vivo e muitas vezes com palestrantes convidados), resenhas de festivais de inovação, mentorias, clube do livro/filme e acesso ao Mingle, uma espécie de rede social dentro do app da empresa.
Os temas abordados no Club vão de inteligência artificial à mobilidade, de novas mídias a consumo, wellness, sustentabilidade, ética, diversidade, longevidade e arte.
“Abraçamos pautas importantes para a humanidade, como questão climática, diversidade, cannabis, psicodélicos, afrofuturismo. A gente sempre diz que não pode ter preconceito, do tipo ‘NFT ou metaverso é besteira’…. Calma, tem muita espuma, sim, mas também muitas possibilidades interessantes”
Em 2022, a política entrou como um tema na programação, por conta do cenário atual e das eleições por vir. “É um tema super importante neste ano. Para isso, trouxemos em uma das nossas conversas o Sylvio Costa, jornalista do Congresso em Foco.”
A empresa já conta com 350 assinantes, entre executivos, empreendedores e profissionais liberais. “A Oxygen é para quem é curioso, para quem gosta de estar duas casinhas à frente do jogo, que não se contenta em reproduzir opiniões dos outros.”
Em maio, a programação oferecia, entre outras atividades, uma conversa sobre o filme Medida Provisória (dirigido pro Lázaro Ramos) com a crítica e fundadora do Cinema Na Mesa, Juliana Sabbag, e Sabrina Nudeliman, cofundadora e CEO da Elo Company, distribuidora do longa.
A agenda do mês incluiu ainda um bate-papo sobre futuro do trabalho e as discussões sobre retorno ao escritório, modelo híbrido ou remoto; uma masterclass com o tema “Como a mediação pode melhorar nossas relações”, com Veronica Cattan e Débora Matalon; e um Chats (entrevista ao vivo) com o jornalista Pedro Doria, fundador do Meio.
Segundo Andrea, através dos clientes no B2C a Oxygen chegou no B2B de forma orgânica, com o Oxygen Studio.
“Muita gente que assina o Club sugere a gente para a empresa onde trabalham, para fazer desde uma aula inspiracional, mostrando cases hands on, a ciclos de tendências, projetos de transformação digital, brand content e curadoria de conteúdo para eventos.”
A Oxygen, afirma a empreendedora, já atendeu 15 empresas (quatro são clientes recorrentes). A lista inclui Cosan, Google, Iguatemi, Mattos Filho, Plenae, Porto Seguro e Unilever; o valor dos projetos varia de 50 mil reais a 300 mil reais.
“Já realizamos curadoria de evento para o Google, que na época queria algo para engajar as agências de publicidade que vendem Google Ads. Fizemos encontros online em que trouxemos quatro speakers do marketing digital, criamos as dinâmicas e convidamos um parceiro para fazer algumas atividades”
Para a plataforma de bem-estar Plenae, Andrea diz que a Oxygen está realizando a curadoria de um evento na Itália. “A gente cria desde o conceito, a partir disso definimos os temas e vamos buscar os palestrantes no mundo todo.”
Na frente de brand content, a empresa cria a newsletter mensal do Iguatemi e alguns talks para clientes. Toda a curadoria é proprietária.
“Não pegamos as informações de ‘um relatório’, lemos pelo menos 15 fontes diferentes. A gente consegue fazer isso com uma equipe pequena, de seis pessoas, porque temos uma metodologia de ronda de veículos nos quais confiamos — inclusive o Draft — e nas leituras vamos dividindo as pautas por tema, formato do conteúdo e cliente”
A ideia é disponibilizar a assinatura do Club como benefício para que as empresas entreguem a seus colaboradores. Por enquanto, diz Andrea, a plataforma tecnológica usada pela Oxygen ainda não tem suporte para viabilizar isso em larga escala — mas o plano está no radar.
Mais do que um investimento financeiro, Andrea dedicou tempo e energia para tirar a Oxygen do papel. “Para não dizer que [o investimento] foi zero, paguei um site no WordPress e o logo.”
O faturamento veio logo, sinalizando que a empreendedora estava na direção certa. “Começamos a vender o pacote para o SXSW e os cursos, e assim geramos caixa”, diz. A Oxygen fechou 2021 com 2 milhões de reais — e a expectativa para 2022 é encorpar esse resultado em 50%, alcançando 3 milhões de reais.
Para este ano, a empresa pretende continuar a crescer na vertente B2B, já que muitas empresas estão atrás de formas de inovar e atrair e reter talentos, e os serviços oferecidos pela Oxygen podem ajudar a resolver esta dor.
A Oxygen também vem retomando alguns eventos presenciais. No começo deste mês, realizou um café da manhã no Rio de Janeiro, onde tem cerca de 60 assinantes. E no fim de maio, vai realizar um Meetup, um encontro informal para promover conexões e interações com a comunidade de assinantes em São Paulo.
“Acho que nunca mais voltaremos a fazer aulas recorrentes presenciais, pois temos assinantes no mundo inteiro… Mas a comunidade quer encontros como cafés e happy hours para fazer networking; estamos começando a retomar isso aos poucos”
Outro objetivo é acelerar o serviço de curadoria de festivais para o público interessado. Em 2021, a Oxygen pinçou suas dicas sobre a SXSW online e a edição presencial do Web Summit, em Lisboa. Mais recentemente, em março de 2022, a empresa orientou 15 pessoas em suas viagens para o South by Southwest e já está vendendo pacotes para o Web Summit 2022 e o SXSW 2023.
Além desse serviço mais personalizado, para grupos de até 15 integrantes, a Oxygen passou a vender uma “curadoria geral”, para pessoas que vão aos eventos com uma visão mais aberta; por meio de um workshop de 4 horas, a empresa “destrincha” o festival, e a partir daí cada cliente cria a sua própria jornada.
A meta agora é continuar na vanguarda. “Sempre me questiono se estou inovando o bastante, buscando as fontes e reports fora do repertório dos clientes e utilizando formatos diferentes”, diz Andrea. “E isso dá muito trabalho, não dá para se acomodar e relaxar… Mas acredito que essa é a missão de uma empresa como a Oxygen.”
A informação é o melhor antídoto contra o tabu. Filipe Vilicic e Anita Krepp comandam a Breeza, uma revista online sobre cannabis e psicodélicos que entrevista artistas como Gilberto Gil e Ney Matogrosso e vem pautando a mídia mainstream.
Nossa vida ultraconectada gera uma montanha de lixo eletrônico. Diante desse cenário, Rodrigo Lacerda criou a Händz, que produz cabos, carregadores, fones e caixas de som com materiais como algodão, bambu, cortiça e grãos de café.
O Brasil é um país de leitores? Tainã Bispo acredita que sim. Ela migrou de carreira, criou duas editoras independentes (a Claraboia, que só publica mulheres, e a Paraquedas), um selo editorial e um serviço de apoio a escritores iniciantes.