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“Após o diagnóstico, decidi que não iria alimentar o tabu em torno dessa doença, e nem deixar o câncer redefinir quem eu sou”

Vanessa Verea - 19 ago 2022
Vanessa Verea, gerente executiva de Cuidados Pessoais da NIVEA.
Vanessa Verea - 19 ago 2022
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Como todo começo de ano, cheguei em 2022 com aquela energia de fazer com que ele fosse especial, um período para o autoconhecimento, transformação e, com certeza, para o que mais amo fazer na vida: viajar! 

Já tinha três viagens planejadas só entre janeiro e fevereiro. Então, decidi fazer meu check-up anual antes delas. Fui ao laboratório na quinta-feira, 21 de janeiro. Fiz o exame de sangue e na sequência ultrassom de mamas.

Nós nunca imaginamos que temos nada, até chegar naquela sala e sentir o geladinho do ultrassom. É naquele momento que a cabeça vai longe e pensa no pior.

Mas, quando a avaliação da minha mama direita terminou e a radiologista falou que estava tudo bem, relaxei. 

Começamos a conversar enquanto ela fazia o ultrassom na minha mama esquerda — já estava mais tranquila nessa hora. Ao finalizar o procedimento, ela sinalizou que havia um nódulo ali e foi descrevendo para mim… 

Nesse momento, a tranquilidade virou tensão. Eu já não entendia mais nada, fosse pela preocupação repentina que me gerou ou pelos termos técnicos que não conseguia entender.

Bom, o exame acabou e a única coisa que absorvi era que eu tinha um nódulo e que ainda não conseguia saber se era benigno ou maligno, portanto, teria que fazer uma biópsia.

Saí do laboratório tensa, torcendo para a médica ter se enganado. Já no dia seguinte, o laudo médico chegou e tive a confirmação: eu realmente teria que fazer a biópsia. 

TENTEI ME TRANQUILIZAR E ESPERAR O RESULTADO DO EXAME SEM SOFRER

Acionei meu ginecologista de confiança, que olhando o laudo e as imagens sinalizou que provavelmente seria um nódulo benigno, muito comum na minha idade. 

Me acalmei um pouco e, no dia seguinte, parti para a primeira das três viagens planejadas. Mal sabia que as outras nem chegariam a acontecer…

Passei esses dias tentando não pensar, afastando de mim qualquer suposição sobre o tema e tentando aproveitar ao máximo o momento. 

Voltei para casa e dias depois fiz a biópsia. No momento do exame, a médica falou o mesmo que meu ginecologista, que, provavelmente, não seria nada grave e que realizar esse exame é o procedimento padrão.

Com isso, fiquei tranquila e terminei o exame bem mais calma. Logo após finalizar a consulta, já até consegui contar para minhas amigas o que tinha acontecido, confiante que tinha sido só um susto. Mas, ainda assim, estava apreensiva. Todos os dias checava se o resultado estava pronto.

Muito em breve, eu iria para minha segunda viagem e como o resultado chegaria logo em seguida, já estava planejando tomar um drique em frente ao mar para comemorar que tudo tinha sido só um alarme falso. 

Porém, no dia anterior à viagem, data de aniversário da minha mãe, o diagnóstico veio.

Estava almoçando num restaurante com ela quando vi o laudo. A tensão voltou! Não entendi nada, era uma completa ignorante no tema, nunca tive ninguém próximo que passou por algo parecido. 

COMO CONVIVER COM O DIAGNÓSTICO QUEBRANDO TABUS

Mandei o resultado ao meu ginecologista, que logo na sequência perguntou se poderia me telefonar. Então, ele me ligou e falou: “O resultado não foi bom”.

Esse foi o primeiro momento que percebi que o tabu realmente existia e não era só comigo. A delicadeza de não falar diretamente “você está com câncer de mama” me impactou

Aqui, fiz uma breve comparação: alguns anos antes, tive endometriose e o diagnóstico veio com muita naturalidade.

A diferença na forma como o médico conduziu as duas notícias me deixou naquele momento ainda mais angustiada para saber sobre o resultado da biópsia. 

Depois dos primeiros infinitos três minutos, aqueles desde que soube da notícia, tive a certeza de que não queria alimentar o tabu que já existia em torno dessa doença.

Sabia que não deveria lidar com isso de forma tão pesada. Claro, é algo grave, mas, dali para frente, decidi viver o processo da forma mais natural possível, não deixando com que o câncer ressignificasse quem eu era — nem para mim, nem para os outros 

Hoje, cá estou eu, me apresentando como uma pessoa que teve um câncer e está forte! Mas me apresento não da mesma forma como via a doença antes de tudo o que vivi; e sim como alguém positiva, leve e para frente!

Alguém que viveu uma experiência complicada, mas não mais difícil do que muitas outras que acontecem na vida das pessoas. Todos têm suas dores, seus desafios e suas superações para enfrentar. 

A FÉ FOI MUITO IMPORTANTE PARA MIM DURANTE A ACEITAÇÃO DA DOENÇA

A fé me ajudou muito nesse processo. Desde o início sabia que era tudo para o meu bem.

Em nenhum momento me vieram pensamentos de morte ou questionamentos de “por que eu?”. Por que não eu? Por que o outro seria mais merecedor? Ou até mesmo, por que ver isso de forma ruim?

Desde o diagnóstico, lidei com o câncer como uma experiência que de certa forma seria enriquecedora e importante de ser vivida

“Gam Zu Le Tová” é uma expressão em hebraico que significa: “tudo que nos acontece, mesmo sendo uma situação ruim, é para o nosso bem”.

Foi com essa mentalidade que soube o quanto queria compartilhar com o mundo a minha história para desmitificar o tabu em torno do câncer e conseguir conscientizar outras pessoas, dividindo informações e o meu olhar.

MEU MANTRA PASSOU A SER O DO “COPO MEIO CHEIO”

Nos primeiros dias após a descoberta, estava com esperanças de só precisar operar para tirar o nódulo, de não ter que fazer quimioterapia.

Ao longo dos dias seguintes, com exames complementares, vi que não seria assim e que precisaria fazer esse tratamento.

Foi um momento difícil. Fiquei com medo do meu cabelo cair e de ter que descobrir que o tabu que queria desmistificar talvez fosse a realidade que viveria naquele momento.

Esse pensamento durou minutos, não me permiti continuar pensando assim. Como dizem, é uma sequência de acontecimentos que, aos poucos, fazem a ficha cair. 

Por isso, nessa etapa, confirmei a mensagem que nunca deve cair no clichê: a mente é poderosa. Só com ela, consigo afastar pensamentos negativos, não sentir pena de mim mesma, não alimentar preocupações, abraçar o desafio e buscar encontrar o lado positivo dele.

Foi e continua sendo essa a minha receita para suavizar o meu processo. É isso o que me traz leveza! Nos últimos seis meses, as frases que mais falei foram: “sempre dá para ser pior” e “o copo meio cheio”. 

Meu câncer não era pequeno, mas o “copo meio cheio” é que não tinha chegado nos linfonodos; tive que fazer quimioterapia, mas o “copo meio cheio” é que foram apenas seis sessões; minha quimioterapia gera queda de cabelo, mas o “copo meio cheio” é que hoje em dia existe uma touca que reduz significativamente essa perda

A quimioterapia pode ter efeitos colaterais, mas o “copo meio cheio” é que existem remédios para evitá-los; o processo é chato, mas o “copo meio cheio” é que tenho uma família e amigas incríveis ao meu lado.

Foi assim que, mesmo com o diagnóstico de câncer e em um processo de quimioterapia, hoje eu me orgulho de conseguir passar por isso sem me sentir e nem me ver como doente, como coitada, como incapaz. Pelo contrário!

FALAR ABERTAMENTE SOBRE O QUE ESTOU PASSANDO É UMA FORMA DE ENCORAJAR OUTRAS PESSOAS

Desde o início de toda essa jornada, tive a certeza de que falar abertamente sobre o tema seria o caminho certo, ou melhor, o meu caminho.

Por isso, sempre expus o que estava vivendo sem segredos, conversando com as pessoas de forma honesta, verdadeira, quebrando tabu.

Sinto que é meu propósito (ou parte dele) estimular um olhar positivo sobre o que vivemos e desmistificar e conscientizar as pessoas sobre o câncer tem sido minha maneira de fazer isso. 

A NIVEA, empresa onde trabalho, realiza Círculos de Propósito, rodas de conversa para discutir o propósito dos funcionários, e logo percebi que o meu estava conectado a fazer a diferença na vida de pessoas que estão passando por momentos e desafios nas suas vidas, indiferente quais são.

Por isso, resolvi me expor e conversar francamente sobre a minha experiência com o câncer com colegas, amigos e pessoas novas que estão chegando na minha vida e, quando ouço alguns relatos, me sinto ainda mais forte e confiante com essa escolha

É claro que não é bom estar nessa situação. Existem dias com mais limitações, que me sinto mais cansada, mas há situações em que nem lembro da doença. Eu estou vivendo, viajei, fui promovida, estou trabalhando e saindo com meus amigos, curtindo minha família.

É claro que hoje essa é a prioridade na minha vida — mas não é o único tema.

 

Vanessa Verea é formada em Administração de Empresas e Marketing pela ESPM, em São Paulo, com pós-graduação em Ciências do Consumo pela mesma instituição e especialização em Inteligência Digital pela Miami Ad School Brasil e em e pela International Brands e Cross-Cultural Management pela McGill University, de Montreal. É gerente executiva de Cuidados Pessoais da NIVEA.

 

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