A Ecomunica, que se posiciona como uma agência de comunicação integrada, atingiu neste ano uma marca importante: 53,3% dos colaboradores são pessoas não brancas, das quais 30% são pessoas pretas, 18,5% pardas e 4% amarelas, um número bem superior ao do mercado. Segundo o último Anuário de Comunicação Corporativa da Mega Brasil, o número de pretos e pardos em agências de comunicação é de cerca de 26%.
A empresa nasceu em 2012, a partir de uma inquietação pessoal e profissional da jornalista Ellen Bileski: como aliar comunicação, ética e impacto social em um mercado predominantemente branco, elitista e desconectado da diversidade brasileira?
Vinda de uma origem periférica na Baixada Santista, Ellen cresceu cercada por diversidade racial e cultural e desde criança tomava as dores das pessoas em vulnerabilidade. Ela conta que sentiu um choque ao ingressar no mercado de comunicação em São Paulo e se deparar com uma realidade completamente diferente.
“Sou de uma família branca, mas cresci cercada de pessoas negras na periferia da baixada santista. Fui à escola com pessoas negras, fui à igreja com pessoas negras e muitos dos meus amigos eram pessoas negras. Quando fui pra São Paulo trabalhar, em 2004, comecei a perceber que a realidade das agências era muito mais branca e elitista. Eu, como mulher branca, não me sentia pertencente à maior parte dos lugares em que trabalhei”
Foi para mudar esse cenário e impactar o mercado de comunicação que ela fundou a Ecomunica. Começou sozinha, atendendo a loja de departamentos inglesa Harrods, indicação de um antigo cliente de quando trabalhava em agência.
Hoje, a Ecomunica tem um faturamento de 7,6 milhões de reais, 46 funcionários, é certificada pelo Sistema B desde 2022 e, no ano passado, fez a aquisição da Shoot, estúdio de criação de projetos de comunicação para impacto social positivo (que foi pauta no Draft em 2014 e de novo em 2016), trazendo Luciano Braga e Artur Scartazzini para a sociedade e o serviço de publicidade para o portfólio, transformando a Ecomunica em uma agência full service.
“É interessante pensar nisso porque quando comecei, em 2012, já tinha o olhar de que a gente viraria full service em algum momento, mas sabia que tinha que ir devagar.”
PARA ALCANÇAR A DIVERSIDADE, É PRECISO CAMINHAR PASSO A PASSO
Atingir a marca de 53,3% de colaboradores não brancos foi celebrado pela Ecomunica porque esse número fazia parte das metas. A empresa busca refletir no seu quadro de funcionários a população brasileira, que tem 56% de pessoas não brancas, segundo o IBGE.
Além da população não branca, a Ecomunica tem 65% de mulheres e 37% de pessoas LGBTQIAPN+. Entre as lideranças, 58,8% são mulheres, 21% LGBTQIAPN+ e 26% de pessoas não-brancas. Ellen afirma:
“Estamos há alguns anos trabalhando para equilibrar nosso time e fazê-lo refletir a população brasileira. Nos últimos anos, nosso foco foi a contratação de pessoas negras. Apesar de ainda não contarmos com colaboradores diretos com deficiência, trabalhamos com empresas fornecedoras lideradas e compostas por pessoas com deficiência”
Para chegar neste resultado, a agência adotou práticas como a abertura de vagas afirmativas e a revisão de critérios de seleção que tradicionalmente excluem talentos, como a exigência de inglês para posições que não demandam o idioma ou o uso de filtros de seleção por universidade. Além disso, a Ecomunica ampliou seu alcance geográfico ao permitir o trabalho remoto, contratando profissionais de diferentes regiões do Brasil, o que é um facilitador da diversidade.
Outro ponto fundamental para se chegar nessa meta foi ter as lideranças totalmente imersas na jornada, porque os desafios que se apresentam não são pequenos. A contratação via vagas afirmativas, por exemplo, pode demorar mais para acontecer e, muitas vezes, existe a necessidade de ter o profissional rapidamente.
“É preciso ter lideranças muito comprometidas para, de fato, aguardar a pessoa certa. Por isso é importante que a diversidade seja uma meta da empresa”
E o trabalho não termina quando a meta é atingida, porque ainda existe o desafio de manter essa diversidade. Quando um colaborador deixa a empresa, por exemplo, a Ecomunica avalia como a reposição pode impactar o equilíbrio dos times, já que a ideia é que as equipes sejam, sempre, diversas.
Essa vigilância é acompanhada de um esforço para garantir que o ambiente seja acolhedor e permita o crescimento profissional de todos. “Eu acho que a nossa maior riqueza é o time e o senso de pertencimento que as pessoas têm na empresa”, diz Ellen. “Queremos ser um lugar em que elas queiram ficar e crescer.”
O VALOR DA CULTURA ORGANIZACIONAL
Para criar um ambiente que favoreça a diversidade e o pertencimento, a cultura organizacional é bem importante.
A Ecomunica tem uma coordenadora de pessoas e cultura – intencionalmente uma mulher negra para que as pessoas negras tenham abertura para falar sobre qualquer assunto, inclusive sobre o que não estiver bom.
Outro ponto estratégico é o plano de saúde sem coparticipação, oferecido para todos os colaboradores independentemente da posição. É uma forma de olhar, também, para as questões sociais.
“Ninguém paga nada para ter o convênio, nem 50 reais. Porque a gente sabe que para uma pessoa periférica que ajuda a bancar a casa, isso é muito dinheiro. E queremos que ela tenha acesso a um bom plano de saúde – que, aliás, é o mesmo plano para todas as pessoas, independentemente da sua função”
Além de olhar para a diversidade na hora de contratar e oferecer benefícios, a Ecomunica investe na capacitação da equipe para garantir que o ambiente seja realmente inclusivo. Todos os funcionários passam por treinamentos regulares em temas como letramento racial, gênero e acessibilidade.
Um exemplo é o curso de audiodescrição profissional, oferecido internamente para que o time crie conteúdos acessíveis desde a origem, como legendas e descrições para pessoas cegas ou com baixa visão.
COMO A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL LEVA A INCLUSÃO PARA FORA DA EMPRESA
Toda essa jornada pela diversidade trouxe para a Ecomunica um know-how no tema e um papel importante de letramento dentro do mercado.
Por isso, em parceria com a Integra Diversidade, a empresa lançou o Manual de Comunicação Inclusiva, que transpõe essa experiência e pesquisa em técnicas para criação de conteúdo com acessibilidade, boas práticas e linguagem.
Mais recentemente, esse manual virou um assistente de IA integrado ao ChatGPT que usa o letramento inclusivo para avaliar textos com um olhar crítico e ajustá-los a partir de parâmetros personalizados. Segundo Ellen:
“Eu gostaria que mais e mais pessoas cegas e de baixa visão pudessem acessar os conteúdos. Liberar esse assistente para quem quiser usar é uma das formas de fazer isso e, também, de chegar um pouco no mundo que queremos, evitando termos que criam gatilhos nas pessoas e não deveriam ser mais usados”
Esse cuidado com a diversidade que começa dentro da empresa se reflete no serviço oferecido e nas entregas feitas. Para Ellen, o fato de 90% dos clientes terem renovado contrato ou feito upselling é a prova disso.
“Temos uma entrega de muita qualidade. Não somos o menor preço do mercado porque tudo isso tem um custo. Então, a minha entrega tem que ser impecável e, para isso, temos regras de produtividade muito eficazes. Foi assim que a gente conseguiu construir tudo isso até aqui.”
Mesmo sendo um valor inegociável para a Ecomunica, a diversidade não é um critério de seleção de clientes. A agência já atendeu empresas de impacto, como Sistema B, Eu Reciclo e Green Elétron, e também companhias como Gerdau, Sony, C6 Bank e Sodexo. O que não entra no portfólio são setores como petróleo, tabaco, armas e produtos com impactos negativos claros, como fertilizantes à base de glifosato.
“Não queremos fazer campanhas de comunicação que ajudem a vender um produto que está fazendo muito mal para o planeta ou para as pessoas. Ou, ainda, um produto que deveria estar em fade out, como o petróleo… A gente atenderia uma área da Petrobras só de energia eólica? Sim. Temos um comitê interno em que discutimos questões como esta”
No caso da diversidade, ela não chega a ser um filtro, mas a equipe da Ecomunica leva para os clientes as questões relativas ao tema, muitas vezes em forma de provocações como propor influenciadores não brancos, pessoas com deficiência ou com mais de 60 anos.
QUESTÕES CLIMÁTICAS TAMBÉM SÃO PARTE DA JORNADA
Enquanto segue a jornada pela diversidade, a Ecomunica vem ampliando sua atuação no campo da sustentabilidade, principalmente fortalecendo seu conhecimento em questões climáticas e ambientais.
Esse aprofundamento resultou em novos projetos e parcerias estratégicas. Um exemplo é a colaboração com a World Climate Foundation, organização global que organiza eventos paralelos à COP (Conferência das Partes) e fomenta diálogos entre empresas, investidores e governos sobre transição energética e temas correlatos.
A parceria resultou no projeto Jornada COP, que quer ajudar marcas a se posicionarem estrategicamente na COP de Belém, em 2025, buscando, entre outras coisas, deixar um legado real para a cidade e a comunidade. A agência participa da criação de uma casa cultural que será usada durante a COP para ativações de marcas e eventos culturais e, depois, deixada como legado para a capital paraense.
“Estamos fomentando nas empresas com as quais conversamos esse legado real, que é deixar algo para Belém e para as pessoas do território. Acho que, cada vez mais, somos uma agência full service que tem essa lente do ESG como algo inegociável.”
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