O zunido das abelhas na lavoura é um bom sinal para os produtores rurais: a polinização feita por esses insetos ajuda a incrementar a produtividade no campo.
Esse processo natural vem sendo intensificado pela Agrobee. Com sede em Ribeirão Preto (SP), a startup conecta fazendeiros e criadores de abelhas que alugam as suas colmeias para turbinar a polinização – e a produtividade – das fazendas.
O negócio surgiu em 2018 com um aporte da Fapesp e Finep de 1,2 milhão de reais. Naquele ano, foram polinizados 4 hectares em fazendas de café na região de Franca, interior de São Paulo.
No passado, 2021, esse número deu um salto com a polinização de mais de 1 700 hectares em culturas de café, soja, girassol, abacate e canola em propriedades de São Paulo, Mato Grosso, Goiás, Minas Gerais e Espírito Santo.
Ao todo, a startup tem um banco de oportunidades (terras cadastradas dentro daquelas culturas que a empresa trabalha) com 20 mil hectares de produtores rurais com áreas polinizáveis.
Andresa Berretta é uma das sócias da Agrobee. Com 20 anos de experiência no mercado apícola, ela hoje se divide entre o cargo de diretora da startup e gerente de pesquisa, desenvolvimento e inovação da Apis Flora, fabricante de extratos de própolis, mel e derivados.
Além de buscar uma forma de diversificar e melhorar a renda dos apicultores, Andresa conta que a principal motivação para desenvolver a Agrobee veio da vontade de fazer algo pela preservação das abelhas.
“Quando começamos, o Brasil estava com altos índices de mortalidade das abelhas, principalmente pelo uso indevido ou irracional de defensivos agrícolas… É uma indústria pesada, que embute na cabeça dos produtores que eles têm que aplicar todo dia – quando na verdade isso não é necessário”
Quando se ensina o produtor a fazer uso “racional” dos defensivos, diz Andresa, os números de morte de abelhas despencam. “Uma das consequências desse trabalho tem sido evitar a mortandande.”
A startup procura alertar os produtores sobre o uso inteligente dos produtos químicos – que fica proibido no período em que as abelhas estão na fazenda, assim como uso de tratores e caminhões (por causa do comportamento defensivo dos insetos).
Membro da Abemel (Associação Brasileira dos Exportadores de Mel), Andresa já vinha falando sobre empreender em conversas com Carlos Pamplona Rehder, que é gerente de exportação da empresa Novo Mel e foi presidente da associação (entre 2012 e 2015).
A ideia de criarem um negócio juntos ganhou um empurrãozinho decisivo em 2015, quando Andresa conheceu Guilherme Gomes Jorge durante um treinamento de inovação na Royal Academy, em Londres.
Guilherme é engenheiro de computação, um perfil que se encaixava com a proposta de Carlos e Andresa de usar tecnologia para facilitar a polinização – um aplicativo está em desenvolvimento. Eles se uniram, submeteram o projeto à Fapesp e conseguiram o recurso para tirar o negócio do papel.
Daniel Malusá Gonçalves completa o quarteto de sócios. Dono da agência 6P Marketing e Propaganda, de Ribeirão Preto, ele também é voluntário da ONG Bee or Not to Be, de proteção às abelhas, e fundador do e-commerce Clube do Mel.
A Agrobee tem um banco de dados com 60 mil colônias de abelhas. Nessa base há tanto meliponicultores – ou seja, criadores de abelhas nativas, aquelas sem ferrão – quanto apicultores, aqueles que criam abelhas africanizadas (Apis mellifera).
A cultura a ser polinizada influencia na decisão. A Apis é um polinizador universal e é a mais utilizada. Mas há casos em que essa abelha não dá certo; na cultura de morango, por exemplo, a abelha Jataí – uma espécie nativa sem ferrão – é mais adequada para o tamanho da flor.
A localização da área a ser polinizada também deve ser levada em conta, explica a empreendedora.
“Trabalhamos com um produtor de café usando apenas a abelha mandaguari [espécie sem ferrão] porque, pela localização da fazenda, que praticamente envolvia toda uma cidadezinha, havia um grande risco de as abelhas invadirem a área urbana”
Em média, as abelhas ficam duas semanas na propriedade a ser polinizada. Elas são levadas um pouco antes da floração e retiradas logo depois. No caso do café, por exemplo, a florada dura entre 5 e 7 dias, que é o tempo que as abelhas têm para fazer o seu trabalho.
“Levamos um pouco antes e deixamos um pouco mais para que elas se aclimatem e façam um bom trabalho quando essas flores estiverem no ponto correto”, diz Andresa.
A startup atua como uma intermediadora entre os fazendeiros e os apicultores e monetiza ficando com uma porcentagem (não revelada) sobre a transação.
O serviço inclui o match entre as duas pontas e o aporte de conhecimento para o produtor rural. Os técnicos da startup definem a quantidade de abelhas para cada propriedade, quais são as melhores espécies, onde elas devem ser alocadas para otimizar o resultado e o que precisa ser feito na propriedade durante a estadia dos insetos.
A partir das coordenadas geográficas, o time já consegue extrair informações como o clima local, o tamanho da área, a existência de declives e fontes de água – fatores que impactam nas decisões sobre tipo de abelha, quantidade e localização.
Hoje, porém, esse trabalho ainda requer uma visita a cada propriedade, para uma avaliação completa. Andresa ressalva:
“Ficamos conhecido como ‘Uber das abelhas’, mas ainda não estamos nesse ‘estado da arte’ tecnológico: precisamos trabalhar com algoritmos complexos, já que cada cultura tem suas particularidades e as espécies de abelhas são diferentes…”
A meta para o futuro é automatizar todo o processo de cadastro, contato e compra do serviço por meio do aplicativo da Agrobee (já disponível, porém ainda em desenvolvimento).
AO INCREMENTAR A PRODUTIVIDADE, A POLINIZAÇÃO ASSISTIDA TRAZ TAMBÉM BENEFÍCIOS PARA O MEIO AMBIENTE
A polinização assistida traz benefícios para o produtor rural, para o apicultor – e também para o meio ambiente.
No caso dos produtores, o benefício mais evidente é o aumento da produtividade que, segundo Andresa, chega a 17% na cultura do café, 20% na soja, 40% no girassol e 60% no abacate.
Ela explica que isso acontece porque em culturas autopolinizadas (quando a própria planta se poliniza, como acontece com o café e a soja, por exemplo) o uso de um polinizador melhora a qualidade genética do fruto pelo fato de a abelha coletar pólen em diversas flores.
Uma das vantagens desse processo na cultura do café – que em 2021 respondeu por 700 hectares polinizados pela Agrobee – é a redução no abortamento, que acontece quando os frutos caem ou não vingam.
Com a melhora da qualidade genética pela polinização, menos frutos são perdidos e eles ficam com um tamanho maior, o que agrega na produtividade (o café em grão é medido por saca; quando os frutos são maiores, uma saca mantém o peso com menos grãos)
Para o meio ambiente, o fato da polinização aumentar a produtividade sem precisar usar mais terra é considerado um benefício.
“Imagina ter um aumento de 20% de produto sem desmatar para abrir área, consumindo a mesma quantia de água, a mesma quantia de fertilizante e emitindo a mesma quantia de gases de efeito estufa? É produzir mais com o mesmo recurso.”
A STARTUP GERA RENDA E AJUDA OS CRIADORES DE ABELHAS A ENFRENTAREM A ENTRESSAFRA DA AGRICULTURA FAMILIAR
Há ainda um benefício social pelo lado dos criadores de abelhas, já que a apicultura e a meliponicultura são muito ligadas à agricultura familiar.
Com o aluguel das colmeias, esses criadores têm uma nova fonte de renda além da produção de mel e própolis.
“É uma frente de trabalho bonita do ponto de vista de benefícios para a cadeia apícola… Normalmente, esses produtores já trabalham com coleta e venda de mel e própolis, mas nas entressafras têm que custear e alimentar essas abelhas. Então, geramos renda fora da safra dele”
A aceitação do serviço vem crescendo, diz a sócia da Agrobee, mas ainda esbarra na desconfiança dos produtores – nem todos enxergam de cara os benefícios do aluguel de colmeias.
Andresa acredita que, vendo os resultados financeiros de quem já está trabalhando com polinização assistida, os produtores vão aderir e alimentar um círculo virtuoso para produtores, criadores e abelhas.
“O nosso negócio é totalmente baseado em sustentabilidade. E não somente ligado ao meio ambiente, mas também a sustentabilidade econômica. Agora está super em alta falar de ESG… Mas, no fim das contas, se não tiver retorno financeiro ninguém adere.”
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