Imagine estar à frente de uma empresa quase cinquentenária, referência em um setor que tende a não ser mais o preferido de seus clientes, no médio prazo. Como se preparar para as mudanças? Como se manter relevante? Como se aproximar de um cliente que, talvez, não lhe queira mais? Essas são algumas dúvidas que movem o engenheiro e diretor geral da Quiksilver no Brasil, Gustavo Belloc, de 40 anos.
No Brasil desde 1998, a marca australiana de surfwear mais do que nunca concentra esforços em desvendar o próprio consumidor e permanecer relevante para o público jovem. A companhia quer estar pronta para o desafio já colocado: permanecer vendendo roupas e acessórios de surf para clientes cada vez menos ligado às marcas, que ultimamente consomem roupas em quantidades mais modestas e priorizam a compra de um smartphone em vez de uma nova coleção de bonés. “Essa mudança ainda não é tão perceptível no Brasil, mas está em curso lá fora e deve chegar aqui nos próximos anos”, diz Gustavo Belloc.
Como convém à empresa onde está, Gustavo é o avesso da imagem tradicional de um executivo de multinacional. Com jeitão de surfista e fala calma, recebeu o Draft na sede da empresa no bairro do Bom Retiro, em São Paulo. De jeans e camiseta, conversava enquanto tomava um suco de açaí. “Temos 160 pessoas no time aqui no Brasil. Em geral o ambiente é informal e a equipe, jovem”, conta.
Talvez Gustavo defenda a informalidade por entender que não dá mesmo para controlar tudo. A própria carreira dele tomou rumos bastante improváveis para um engenheiro civil que “não sabe construir nem casinha de cachorro”, como brinca. Ainda na faculdade, teve a chance de fazer um estágio na área nos Estados Unidos, em uma companhia que seria concorrente da Deca — sim, a fabricante de torneiras.
Com tudo acertado, ele foi à universidade trancar a matrícula e topou com a foto de uma onda fixada no mural e o anúncio de uma (outra) empresa de surfwear procurando estagiário. Ele já surfava e não teve dúvida em trocar a oportunidade internacional engravatada por um trabalho que tinha a ver com seu estilo de vida:
“Fui atrás do que gostava, mas sempre me pergunto como tudo seria diferente se eu tivesse escolhido o outro caminho profissional”
Gustavo passou por uma série de cargos e empresas do segmento antes de chegar à Quiksilver, em 2009, já como diretor geral. O grupo também detém o controle da Roxy, voltada ao público feminino, e da DC, marca californiana skatewear. As três marcas hoje têm 1 500 pontos de venda, distribuídos entre lojas multimarca, e-commerce e até em óticas, por exemplo, que vendem os óculos de sol da empresa.
Desde 2014, no entanto, o foco de Gustavo é se aproximar do consumidor não só em quantidade, mas em qualidade, entendendo o que o cliente das marcas busca e refinando a entrega. Ele conta: “A relação com o consumidor está mudando. Nosso desafio é ficar mais próximos do cliente”.
QUANDO INOVAR NADA MAIS É QUE ESTAR MAIS PERTO
A idéia, ele prossegue, não é apenas vender produtos, mas construir experiência e relacionamento com o próprio cliente — algo que antes era terceirizado para as multimarcas. Este processo começou com o desenho um plano de expansão que previa a abertura de lojas próprias do grupo. Hoje há três dessas unidades: a flagship no Shopping Iguatemi, em São Paulo, e os pontos da Barra e de Ipanema, no Rio de Janeiro. É nessas lojas que a Quiksilver trabalha para desenvolver uma linguagem própria com o consumidor, melhorar a abordagem, firmar sua imagem e ter contato direto com o cliente.
Um exemplo disso é um estudo de produtividade que a marca fez por metro quadrado de exposição. O objetivo era entender quais produtos devem ficar em quais espaços da loja. Gustavo conta que os resultados de uma aparentemente simples mudança na disposição das peças é impressionante. Após as mudanças, as bermudas de surf, que são hit da marca e representam 30% das vendas, passaram a dar ainda mais resultados. “Também percebemos que os tênis da DC estavam subaproveitados e tinham potencial maior.”
O aprendizado das lojas próprias é ampliado para a rede de franquias. Atualmente são sete lojas, todas abertas no ano passado, com a meta de chegar a 30 até 2018. “A crise atrapalhou este plano, mas, ao mesmo tempo, começamos a viver um momento de visibilidade para o surf e o skate, com atletas brasileiros entre os melhores do mundo e os esportes entrando para os Jogos Olímpicos. No fim das contas, isso amenizou um pouco o efeito”, diz, reconhecendo que menos de 10% do público é, efetivamente de surfistas ou skatistas, mas que o estilo de vida leve, próximo da natureza e livre tem um belo apelo. O faturamento só com lojas próprias e franquias já chega a 15 milhões de reais por ano.
TUDO CERTO? SIM. MAS A BOA ONDA NÃO VEIO
Ainda assim, o desaquecimento da economia fez a Quiksilver suspender o plano de instalar uma megaloja no país — teria 400 metros quadrados e incluiria bar e barbearia, com apelo na experiência da marca. “Só existem 20 unidades destas no mundo. Estávamos estudando instalar a unidade na Barra ou em Moema, que têm o nosso público, mas o mercado piorou muito. Quando a economia melhorar devemos fazer”, afirma. A operação brasileira também perdeu em 2016 o posto de mais lucrativa do mundo para a companhia:
“Somos pequenos e sempre tivemos bons resultados. No ano passado não fomos os melhores, mas ainda estamos entre os mais lucrativos”
A companhia também lançou em 2016 e-commerce próprio com investimento de 200 mil dólares. “Teria sido mais caro se não tivéssemos já a plataforma com a tecnologia usada lá fora”, diz o diretor. Os resultados têm sido interessantes, conta Gustavo, mas o grande aprendizado está em entender a concorrência online. “Há clientes nossos que, no meio digital, viram concorrentes, como Netshoes e Dafiti”, conta. Ele reconhece também que a conversa com o cliente é outra no novo ambiente. “Temos ferramentas para entender exatamente o que ele quer e direcionar o nosso marketing.”
MENOS CONSUMO, CONSUMO MAIS CONSCIENTE
Com as mudanças, a Quiksilver prepara terreno para acompanhar transformações que já acontecem em mercados mais maduros, como Europa e Estados Unidos. Lá, diz Gustavo, já é clara a mudança do interesse dos consumidores mais jovens, que compram menos e não acham que ter uma camiseta da marca X ou Y seja sinal de status.
“A prioridade de consumo mudou muito. Hoje, as pessoas não querem ter mais um monte de roupas. Preferem um bom celular”
Há ainda a questão com o consumo ético, com uma cadeia produtiva livre de trabalho escravo. Gustavo afirma que esta já é uma preocupação da operação brasileira. Principalmente nos últimos anos, quando a Quiksilver decidiu fazer mais roupas aqui para se proteger da variação do dólar. “Antes importávamos 50%, agora esse porcentual caiu para 20%”, diz. Sem fábrica própria, eles credenciam fornecedores e fazem contratos rigorosos para evitar que eles subcontratem oficinas que abusam da mão de obra. “Também fazemos auditorias para ter certeza que a cadeia produtiva segue as nossas normas.”
Ele diz que, ao ter mais produtos nacionais, a oferta das marcas também fica mais adequada ao gosto local, com clientes que gostam mais de cores e ainda curtem roupas e acessórios estampados com logos das marcas. Nacionalizar também é uma maneira de ganhar velocidade nos lançamentos, conta. “Precisamos ter novidades sempre”, ele diz, falando sobre como nos últimos anos o fortalecimento das cadeias de fast fashion criou uma nova concorrência para marcas como a Quiksilver.
Ainda que a onda de consumir menos não tenha chegado de forma clara no Brasil, Gustavo quer estar com a estrutura pronta para quando isso acontecer. A nova rede de lojas e franquias é um dos passos nessa direção, ele diz. Com a proximidade do cliente, a marca pretende construir mais valor. “Nossa linha de produtos também é uma ferramenta importante. As marcas precisam inovar, entregar muita qualidade e tecnologia nas peças”, diz. Lição de casa a fazer não falta, mas a Quiksilver segue remando.
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