Nos últimos 30 dias, o Grupo EDP recebeu dois importantes reconhecimentos sobre seus compromissos com a agenda ESG: em novembro, foi avaliada como empresa mais sustentável do setor elétrico no mundo, em lista da S&P Dow Jones Indices com 103 empresas. Em dezembro, a EDP Brasil foi a primeira colocada no ranking geral da carteira do Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE) da B3, entre 34 empresas.
Mais do que uma estratégia top-down para atrair investidores, impondo políticas a partir do top management, por trás desse sucesso está a criação de uma cultura organizacional que engaja todos os colaboradores da empresa. Se não pela boa vontade de todos, por incentivos financeiros concretos: um programa de bônus associados à agenda ESG, com indicadores objetivos e mensuráveis, acompanhados de perto no dia a dia da companhia.
A EDP Brasil criou seu programa de metas com compromissos em 2016. Segundo Gláucia Santos, gerente executiva de gestão de pessoas da companhia, o processo todo começou com discussões internas sobre como conectar a cultura organizacional e os propósitos da companhia às metas corporativas.
“Olhamos não só a perspectiva financeira mas também toda a cadeia de stakeholders, o impacto social e ambiental das nossas ações.”
O início, como não poderia deixar de ser, foi desafiador. “Trabalhamos bastante para sensibilizar a liderança, o que facilitou o entendimento da proposta”, lembra Santos. O esforço não foi pequeno. No Brasil, o grupo possui cerca de 3.200 colaboradores, sendo 200 em cargos de liderança (a partir da gerência). Todos são impactados pelas metas e podem receber – ou não – as bonificações atreladas a elas. Segundo a gerente de gestão de pessoas, no entanto, a maior parte das metas tem sido atingida, historicamente, “pelo engajamento forte que conquistamos”.
COMPANHIA É LISTADA ENTRE LUGARES INCRÍVEIS PARA TRABALHAR
Como resultado da implantação das metas com compromissos, Santos diz que o clima geral na empresa melhorou. A EDP Brasil ficou mais diversa e mais jovem.
“Esse posicionamento em ESG foi interessante em especial para o público mais jovem, o que ampliou a atração de novos talentos para a organização. Além disso, o engajamento dos colaboradores melhorou. As pessoas valorizam a diversidade e o respeito.”
No quesito clima organizacional, diz Santos, a filial brasileira saiu de uma das piores performances das subsidiárias do grupo (presente em 14 países) para as melhores, recebendo diversas premiações de diversidade e inclusão nesse percurso. Foi a primeira do grupo a adotar esse tipo de metas associadas a indicadores de ESG, e a ideia deu tão certo que foi exportada para outras geografias da EDP.
Como resultado desse trabalho, a empresa apareceu neste ano em 18º lugar no ranking de grandes empresas da pesquisa Lugares Incríveis para Trabalhar, realizada pela Fundação Instituto de Administração (FIA) e pelo portal UOL, que avalia práticas de bem-estar e desenvolvimento dos colaboradores. O levantamento apresenta 380 empresas. Na classificação geral, a EDP Brasil ficou na 61ª posição.
Na pesquisa, o item de maior peso na avaliação é justamente a opinião dos funcionários em quesitos como clima organizacional, coerência da atuação da liderança em relação aos valores corporativos, facilidade de acesso ao CEO, entre outros.
“Ao criar um ambiente de mais inclusão e diversidade, oferecemos uma segurança psicológica para as pessoas serem elas mesmas”, pondera a gerente de gestão de pessoas da EDP.
METAS SOCIAIS IMPULSIONARAM DIVERSIDADE
Alguns dos segredos do sucesso da implantação desses bônus na EDP são as métricas claras e, principalmente, o envolvimento de todos. Do top management ao eletricista na ponta da cadeia, todos podem se beneficiar do incentivo.
“Temos um pool de metas atreladas ao desenvolvimento dos parceiros e fornecedores, metas de diversidade e inclusão, metas ambientais, como o incentivo a fontes renováveis de energia e à descabornização, e financeiras.”
Por exemplo: em 2017, 14% das posições de liderança eram ocupadas por mulheres. Em 2020, esse índice tinha avançado muito pouco, para apenas 15%. Ou seja, sem um incentivo extra, o ritmo de melhora nesse indicador provavelmente se manteria insatisfatório. Era preciso dar um empurrãozinho para avançar mais rapidamente na paridade de gênero.
Com a criação de metas específicas para isso, de 2020 para 2021 o percentual de mulheres líderes já saltou para quase 18%, e para o próximo ano a meta é chegar a 20%. “Ainda é um percentual muito aquém de um cenário de equidade, mas fica nítido que se não tivéssemos uma meta específica para isso, não teríamos atingido esse resultado”, diz Santos, a gerente de gestão de pessoas da EDP Brasil.
Santos diz ainda que, no setor energético, onde a EDP atua, a questão de paridade de gênero é especialmente complexa. A área é, historicamente, dominada por homens – e, sem esforços concentrados, dificilmente o cenário mudará por si próprio.
Em relação a novas contratações, a meta estabelecida foi mais ousada: o incentivo é para que ao menos metade das vagas seja preenchida por públicos de interesse da companhia, como mulheres, negros, transexuais, trabalhadores com mais de 50 anos de idade ou pessoas com deficiência.
“Tínhamos uma média de 35% a 40% das novas vagas preenchidas por pessoas desses grupos. Estabelecemos que para 2021 a meta seria de 50%, mas já estamos fechando o ano com quase 58% das contratações associadas a esses perfis.”
A empresa estabeleceu também metas para pessoas negras em cargos de liderança. Hoje, elas ocupam 12,9% das funções de gerência para cima. Até o fim do próximo ano, devem ser 15%. “É um número positivo quando comparamos com o mercado em geral, pois o estudo do Insituto Ethos com as 500 maiores empresas do país mostra que esse índice é de aproximadamente 6%. Ainda assim, está muito aquém de um cenário de equidade”, pondera Santos.
Como todos os líderes são responsáveis pela contratação e treinamento de colaboradores, o setor de gestão de pessoas está constantemente fazendo “um trabalho de sensibilização das lideranças em relação à importância da equidade de gênero e da diversidade” – trabalho que, como mostram os rankings de ESG e o próprio crescimento da EDP no país, tem contribuído para resultados importantes na empresa.
Atingidas, as metas se traduzem em no mínimo dois salários extras na conta do funcionário no fim do ano. Isso vale para todos os níveis da empresa.
“Por exemplo, temos metas relativas a acidentes de trabalho e a incidentes em geral. Se um eletricista estiver muito consciente do uso correto de equipamentos de proteção para evitar acidentes, se reporta questões que podem vir a ocasionar problemas, se agiliza o processo de atendimento, ele vai contribuir para ele e para toda a empresa atingir a meta e receber esse bônus”, explica Santos. “Assim ele adquire a consciência do seu próprio impacto na cadeia toda, em toda a organização.”
FORNECEDORES TAMBÉM SÃO BENEFICIADOS POR AÇÕES E METAS
Outro público-alvo de interesse são os próprios fornecedores da companhia – de grandes empreiteiras a pequenas empresas. Para eles, a EDP criou o IDF (Índice de Desenvolvimento de Fornecedores), onde os parceiros recebem uma pontuação em questões de diversidade, qualidade, gestão de pessoas e dos negócios, e concorrem a uma premiação para os fornecedores que se destacam.
Paralelamente, um portal mantido pela EDP, a Academia de Parceiros, espécie de universidade online direcionada aos fornecedores do grupo, traz conteúdos para ajudá-los a compreender e implantar essas políticas de qualidade e diversidade.
ESCOLA DARÁ FORMAÇÃO DE ELETRICISTA A PESSOAS TRANSEXUAIS
Uma das mais recentes ações afirmativas da EDP Brasil está mirando o público transexual. A empresa lançou suas primeiras turmas dedicadas exclusivamente a trans na Escola de Eletricistas, um programa de formação profissional completa, ministrada pelo Senai, com possibilidade de contratação ao término do curso. A princípio serão abertas duas turmas, com 16 participantes cada uma, uma em Guarulhos (SP) e a outra em Serra (ES).
Em 2018, a empresa já havia feito uma ação afirmativa pioneira no setor, direcionando o curso de formação apenas para mulheres – como resultado, 40% das formadas foram contratadas.
A quem critica o estabelecimento de metas e bônus associados ao ESG por crer que essas ações deveriam ser espontâneas, e não incentivadas financeiramente, Santos concorda que, em um mundo ideal, isso não seria necessário. Porém não vivemos no mundo ideal, e, diante disso, precisamos de incentivos concretos para avançar.
“Neste momento precisamos ter metas, pois temos um cenário de não equidade. Quando olhamos as perspectivas de equidade, da questão ambiental e social, não dá para apenas deixar que as coisas sigam seu curso. Não vejo como não ter metas como forma de mitigar o atraso de séculos e séculos”, argumenta Santos.
“Claro que o objetivo é que não precisemos mais disso um dia, que isso não seja mais uma agenda das organizações, mas sim da sociedade como um todo, mas agora não há como dar os saltos necessários sem pensar em metas.”
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