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Ela se inspirou nas dificuldades vividas por seus pais para criar um marketplace com foco na saúde e no bem-estar do público maduro

Dani Rosolen - 10 abr 2023
Arine Rodrigues, fundadora do Vida60mais.
Dani Rosolen - 10 abr 2023
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“A longevidade é um presente. Com sorte, todos nós vamos alcançá-la.” Quem diz isso é Arine Rodrigues. E com propriedade, apesar dos seus 33 anos. 

Caçula de oito irmãos, a paulistana nasceu quando a mãe, dona Lourdes, tinha 40 anos e o pai, seu Valfredo, quase 50. A diferença entre ela e o irmão mais velho é de 20 anos. 

“Convivi, portanto, durante toda minha infância, adolescência e vida adulta com os aprendizados que pessoas mais velhas e experientes podiam proporcionar. Tive uma criação super serena”, afirma.

“Por outro lado, presenciei as insatisfações que meus pais tinham como consumidores. Eles não se sentiam representados no mercado”

Arine conta que quando os pais buscavam algo para comprar online, encontravam produtos estereotipados para idosos, como um gorrinho de tricô. Mas o mais complicado era o preparo dos sites em relação à usabilidade, com questões referentes a fontes, cores e contrastes.

Em 2018, quando o pai e a mãe faleceram, com quatro meses de diferença, cada um dos irmãos encontrou uma forma de lidar com o luto. E ali, Arine teve uma certeza: sua missão seria trabalhar com a longevidade, resolvendo problemas relevantes para esse público, a começar por esse enfrentado pelos pais.

Hoje, ela está à frente do Vida60mais, marketplace de impacto social, fundado em 2020, que oferece produtos e serviços para promover a saúde mental, física e o bem-estar dos maduros, além de estimular o empreendedorismo e a autonomia com representatividade deste público.

O negócio já ganhou duas vezes o Selo Municipal de Direitos Humanos e Diversidade na categoria Pessoa Idosa, concedido pela Prefeitura de São Paulo, e no começo do ano captou um aporte financeiro com o Grupo Adapta.

DEPOIS DE UMA LONGA PESQUISA, COM 3 MIL IDOSOS, A PROPOSTA DO VIDA60MAIS FOI SE DESENHANDO

Arine se formou em Relações Internacionais, mas se especializou em engenharia de alimentos. Ela já atuava nesta indústria quando decidiu dividir essa jornada de trabalho com o empreendedorismo. 

Chamou para a empreitada, como cofundadora, Gabriela Borges, sua madrinha de casamento, amiga da época da faculdade e profissional com experiência em finanças – Gabriela atua há dez anos no Credit Suisse.

A amiga se envolveu com a proposta, pois vivenciou as frustrações da própria avó com o despreparo do mercado para atender suas necessidades.

Em 2019, a dupla foi a campo, em feiras e eventos do setor, para entender os desejos e reclamações dos maduros e investigar esse mercado da longevidade. Quando a pandemia chegou, as empreendedoras continuaram a realizar pesquisas online. Conseguiram ouvir mais de 3 mil idosos. Arine afirma:

“Ficamos surpresas e assustadas ao descobrir que por mais que variássemos a forma de perguntar, 70% de nossa audiência tinha as mesmas insatisfações de meus pais”

Além disso, elas descobriram outras três questões. A primeira foi a falta de representatividade nos anúncios, propagandas e mídia, de forma geral; quando há representatividade, as fotos são evidentemente de idosos estrangeiros. As outras duas questões foram a falta de comunicação e a necessidade de geração de renda.

“A questão da comunicação entrou no radar porque os idosos foram o primeiro público a ser isolado na pandemia”, diz Arine. “E neste período também, por conta do aumento do desemprego no país, muitos se tornaram a principal [fonte de] renda da casa, apesar de só contarem com a aposentadoria. E outros pensavam em como usar uma habilidade que tinham para voltar ao mercado, porque ficar isolado não estava fazendo bem para a saúde mental.” 

As sócias juntaram esses pontos, refletiram, e conversaram com pessoas de dentro e de fora do Brasil para desenvolver uma solução. Passaram também por mentorias com especialistas e acelerações, entre elas a do Silver Hub. E assim, com cada uma investindo 25 mil reais no negócio, elas foram estruturando a proposta do marketplace, que entrou no ar em 2021.

A PROPOSTA NÃO É APENAS VENDER PARA OS 60+, MAS CONTAR COM UMA REDE DE FORNECEDORES MADUROS

Para resolver a questão principal, a dificuldade que os pais de Arine tinham em acessar os sites, quando a plataforma do Vida60mais foi criada, houve toda uma preocupação em relação a fontes, cores, contraste e layout de forma geral.

E claro, as sócias também fizeram uma pesquisa para entender os desejos do público-alvo na hora de selecionar o que seria oferecido no marketplace. Essas pesquisas, aliás, são realizadas de forma recorrente, todo mês.

Hoje, a plataforma conta com mais de 300 itens à venda, entre produtos e serviços, de categorias como alimentação, moda, calçados, jogos, higiene e beleza, saúde e fisioterapia etc. A curadoria das marcas é feita com base nos pedidos dos maduros, mas nem sempre a empresa fornecedora precisa ser focada em atender os 60+. 

“Mês passado, por exemplo, o campeão de venda do nosso site foi um sapato confortável”, diz Arine. “A empresa que vende não é focada em 60+, mas é um calçado bonito, estiloso e confortável, que atende esse público. Então, essa é nossa forma de curadoria.”

Para atrair fornecedores para a sua plataforma, o discurso de Arine é ainda mais certeiro, sobretudo se a empresa não tiver o público 60+ como foco: 

“Se ela não está mirando os maduros e eu já tenho a plataforma, sei qual o contraste, o layout, a fonte que funciona, já invisto em marketing, tenho um público direcionado sedento por aquele produto e serviço, o esforço para a empresa entrar neste mercado será maior do que vender no Vida60mais”

Muitos dos produtos oferecidos são produzidos ou vendidos por empreendedores 60+. Para se ter uma ideia, cerca de 70% dos fornecedores da plataforma são maduros. Isso vai de encontro com a missão de Arine: estimular o empreendedorismo e a geração de renda entre este público.

“Não temos como ser mais rápidos do que o Magalu, nem ter tantos vendedores como o Mercado Livre, mas precisamos estar dentro de um ecossistema em que construa uma comunidade 60+ de ponta a ponta.”

Na área de serviços, os maduros encontram desde aulas de dança, ginástica, serviços de tecnologia, escola de idiomas voltada para os 60+, além do eixo de saúde, com dentista a domicílio, cuidadores etc. 

O modelo de negócio da plataforma, assim como a maioria dos marketplaces, é a taxa de intermediação, que hoje fica em  9% (mais 70 centavos de custos fixos). A taxa é bem menor do que a praticada neste mercado, entre 15% a 20%.

“Não sabemos até quando conseguiremos sustentar esse valor, mas cobramos menos atualmente para incentivar que o empreendedor maduro tenha interesse em se cadastrar na nossa plataforma.” 

QUANDO O MARKETPLACE FOI LANÇADO, OS MADUROS NÃO APARECERAM — MAS OS FILHOS DELES, SIM

Assim que a plataforma foi ao ar, o acesso ao marketplace por parte dos maduros não foi como Arine e Gabriela esperavam.

Elas tinham criado uma persona, a Rosa, uma senhora que iria começar a comprar online assim que soubesse do lançamento do Vida60mais, porque sentia falta de um espaço de compras adequado para ela na internet. Mas não foi bem assim…

“Esquecemos que a Rosa teria suas desconfianças, não seria do dia para a noite que ela iria acreditar na nossa proposta. A Rosa não acessou o marketplace, mas veio o Antônio, que é o filho dela e nossa persona atual. Então, entendemos que para chegar na Rosa tem toda uma construção antes de confiança, de facilidade, de representatividade”

Hoje, o acesso está mais equilibrado entre idosos e seus filhos e familiares, mas Arine já traçou novas estratégias para conquistar sua persona inicial.

Ela sabe, no entanto, que a desconfiança de Rosa é plausível, levando em consideração que esse público nunca foi bem acolhido antes pelo mercado e os casos de golpes contra idosos e de etarismo continuam a ocupar as manchetes dos jornais.

O exemplo mais recente a aparecer na mídia — o caso das jovens universitárias de Bauru (SP) que fizeram um vídeo para zombar de uma colega de mais 40 anos anos — está aí para provar que isso infelizmente existe…  

Parte do trabalho do Vida60mais também é esclarecer sobre o tema e combater esse tipo de preconceito, o que atualmente é feito nas redes sociais do negócio.  

“Temos uma série de vídeos chamada ‘+ Propósito’, na qual conversamos com várias pessoas sobre etarismo. Falamos com pessoas que fortalecem esse eixo, como a vovó Neuza [Neuza Guerreiro de Carvalho], 92, garota propaganda do iFood, para mostrar que as pessoas estão ativas, produzindo, usando a experiência de maneira bacana”

Ela complementa: “E trazemos especialistas, como o médico e professor Egídio Lima Dórea, coordenador do Programa USP 60+ da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária da USP. Ele explica o que é etarismo e que às vezes isso existe entre os próprios  60+”.

COM MAIS DUAS SÓCIAS E UM APORTE, NOVAS POSSIBILIDADES PARA O VIDA 60MAIS ESTÃO SENDO CONSTRUÍDAS

Em 2022 e nos poucos meses de 2023, muita coisa aconteceu na jornada da Vida60mais. Uma delas foi a chegada de duas novas sócias, as geriatras Carla N. Borges e Mirella R. Bezerra.

Como o negócio oferece serviços na área da saúde e Arine vivia tendo discussões neste eixo, ela achou importante encontrar representantes da área médica para fortalecer o time e embasar futuras decisões relacionadas a esse setor. 

Outra novidade foi o recebimento de um aporte de 750 mil reais do Grupo Adapta, que está sendo investido para lançar uma nova versão da  plataforma.

“Essa nova plataforma terá um layout ainda mais claro, uma parte de comunicação, dicas e conteúdos melhor estruturada e acessível, com um blog falado, menos cliques na jornada e uma parte de identidade e comunidade. Queremos que os clientes conheçam os fornecedores 60+ de quem estão comprando” 

Além disso, voltando à questão da representatividade, para que o site e a publicidade e propaganda de modo geral tenham imagens de idosos brasileiros reais, o Vida60mais lançou uma parceria com a agência UinStock convidando maduros a enviarem suas imagens. 

“Eles mesmos podem se fotografar — fotos normais, de belezas reais, que vão servir para ilustrar nosso próximo site. E aquelas que tiverem possibilidade de uso comercial vão gerar renda para eles, porque vamos vender para outros bancos de imagens” 

Por fim, mais recentemente, o negócio passou a integrar o portfólio da Sêniortech Ventures, braço da FCJ, venture builder focada no mercado de longevidade. “Isso fará nossa comunicação e alcance nesse mercado crescer muito.”        

Com essas novidades, Arine diz que as perspectivas do negócio são positivas. A previsão é fechar 2023 faturando 300 mil reais. Mas muito mais do que resultados financeiros, o plano da empreendedora é cumprir com a missão que sonhou lá atrás:  

“Gostaria muito de conseguir endereçar vários problemas e dores que meus pais sentiam, e também esses 3 mil maduros que inicialmente pararam para conversar um pouco com a gente. Queremos ser um agente transformador e de fomento não só da indústria 60+, mas do atendimento, do relacionamento com o cliente 60+. É esse tipo de referência que buscamos ser no futuro.”

DRAFT CARD

Draft Card Logo
  • Projeto: Vida60mais
  • O que faz: marketplace com foco no público 60+
  • Sócio(s): Arine Rodrigues, Gabriela Borges, Carla N. Borges e Mirella R. Bezerra
  • Funcionários: 10 (com os freelancers)
  • Início das atividades: 2020
  • Investimento inicial: R$ 50 mil
  • Faturamento: R$ 300 mil (previsão para 2023)
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