Tive uma infância imersa na natureza. Me recordo até hoje do quanto me atraía ouvir as histórias de acampamentos contadas por meu avô. Era uma sensação de liberdade que me preenchia.
Passava o ano escolar ansioso para a chegada das férias vivenciadas em Araguari (MG), na fazenda dos meus outros avós.
Na juventude, foi na Serra da Bocaina que encontrei refúgio. Pensava: quero que outras pessoas e as próximas gerações vivenciem as experiências transformadoras que estou vivendo!
A paixão e o respeito pelos recursos naturais me guiaram profissionalmente para a área de meio ambiente de uma grande multinacional.
Ainda jovem, cursava a faculdade de engenharia química e fui trabalhar com preservação ambiental. Como estagiário, implementei um programa de reciclagem no prédio matriz.
Apesar de achar que fazia total sentido, me sentia longe do meu habitat natural. Mais do que isso: me sentia preso!
Para buscar essa reconexão, fundei com um amigo uma escola de escalada, que mais tarde se tornou uma operadora de turismo de aventura.
Era o início da minha vida de empreendedor misturada com a de funcionário. Durante a semana, eu estava na multinacional, à noite e aos finais de semana, compartilhava minha experiência guiando pessoas pela Floresta da Tijuca
Comandava atividades de rafting no Rio Paraibuna e no Ribeirão das Lages e ministrava aulas teóricas de mínimo impacto e primeiros socorros no nosso curso de escalada em rocha.
O sonho de ajudar outras pessoas a vivenciarem experiências como as minhas começava ali.
Eu sentia que as estimulava ao mesmo tempo em que as capacitava e fazia com que se sentissem seguras na minha companhia.
Logo, passei a estudar muito sobre equipamentos para camping, hiking e trekking e me aprofundei nas principais marcas.
Esse conhecimento foi essencial para iniciarmos o nosso segundo negócio: uma empresa de gestão de marcas outdoor, que teve início com a importação e distribuição no Brasil da Deuter, marca alemã e um dos principais fabricantes de mochilas de atividades ao ar livre do mundo. E o negócio foi crescendo com a chegada de outras marcas como Princeton Tec, Sea to Summit e a CamelBak.
Começamos com muita vontade, mas com pouco dinheiro e zero conhecimento de importação. Neste meio tempo, quase quebramos, nos endividamos, mas mantivemos nosso propósito firme.
Sabíamos que estar ao lado de grandes marcas era uma oportunidade de engajar novos praticantes por meio de experiências transformadoras. E nos reerguemos!
Não gerávamos grandes resultados financeiros, mas ficamos internacionalmente conhecidos por nossas ações inovadoras.
Inclusive, anos depois, ganhamos duas edições do Prêmio Deuter Golden Award, entre os mais de 50 distribuidores.
Neste período, acostumado a levar minha esposa e meu filho para as atividades ao ar livre, consegui realizar uma vontade antiga de conectar as famílias com a natureza. Idealizamos e colocamos na rua a CamelBak Mountain Race, uma prova de corrida na montanha voltada para toda a família e para quem estava começando a se aventurar na natureza.
Enquanto as grandes marcas ganhavam visibilidade com atletas de elite, nós formávamos uma comunidade interessada não só em se conectar com a natureza, mas em se capacitar e equipar para ter as melhores experiências
Além da competição, o evento reuniu palestrantes experientes em equipamentos e segurança. Hoje, a corrida se transformou na Liga WTR, com mais de seis provas — e não para de crescer.
Com ela, conquistamos nosso primeiro Prêmio Marketing Innovation Award. Depois vieram mais quatro premiações com outras iniciativas.
Além de eventos assim, uma das formas tradicionais de fazer as marcas crescerem no Brasil era a capacitação da equipe de vendas das lojas.
Eu adorava viajar o país para dar treinamento sobre equipamentos, mas pensava: por que estou falando somente com os vendedores se eu posso atingir diretamente o público final com a minha experiência?
Será que ser inspirado e orientado por alguém que já trilhou o caminho que essas pessoas querem percorrer não seria muito mais rico?
Na época, como praticante de atividades outdoor, eu ficava bastante incomodado ao ver a quantidade de informações erradas que circulavam na internet, principalmente, sobre a escolha de equipamentos adequados para cada atividade
E mais: me preocupava com o aumento do número de pessoas que estava vivenciando experiências negativas consequentes da desinformação. Hoje, enxergo que meu propósito sempre foi transformar o mundo empoderando pessoas a viverem experiências transformadoras na natureza por meio do conhecimento.
O Gear Tips nasceu em 2016, quando tive a ideia de transformar esses treinamentos com foco em vendas em treinamentos educativos e informativos para ajudar as pessoas a escolherem suas mochilas, sacos de dormir e demais equipamentos.
Em quatro anos, treinei presencialmente mais de 13 mil pessoas, mas, obviamente, isso não era o suficiente, pois seria humanamente impossível viajar o Brasil todo. Então, decidi criar o canal no YouTube.
Comecei falando sobre equipamentos, que ainda é o forte do canal, mas trouxe alguns parceiros experientes para falar sobre outras duas engrenagens essenciais para experiências transformadoras na natureza: condicionamento físico e mental, e conhecimento de habilidades técnicas
Os workshops cresceram, o canal no YouTube ganhou relevância, mas eu estava incomodado com um projeto que não conseguia tirar da gaveta: o 1º Congresso Online de Trekking.
Na verdade, faltava alguém que abraçasse a ideia, até conhecer a Jéssica Marinho, que já fundou uma agência de aventuras e hoje é uma de minhas sócias.
A sintonia nos levou a colocar o projeto de pé em apenas três meses no ano de 2018. O 1º Congresso Online de Trekking (do Brasil e do mundo), contou com 36 palestras e atingiu mais de 14 mil pessoas.
Inquieto, não quis parar por ali e idealizamos um evento presencial, o Gear Tips Trekking Experience. Depois de vendermos as vagas em 48 horas, partimos para a montagem. Depois, vieram mais três congressos e atingimos mais de 40 mil pessoas.
Minha outra sócia, Fernanda May, montanhista e médica, foi a responsável pelo Gear Tips deixar mais um legado positivo para a comunidade de atividades outdoor.
Nós já éramos amigos de aventuras e ela atuava como embaixadora Gear Tips. Durante a pandemia, comecei a idealizar eventos ainda maiores e, conversando com ela, Fernanda compartilhou sua experiência como fundadora da Jornada Científica de Montanhismo.
Tínhamos, entre outras características comuns, levar conhecimento de qualidade e capacitar as pessoas para experiências na natureza.
Resolvemos, então, transformar uma possível concorrência em união. Passado o isolamento, realizamos a terceira e quarta edição do evento, que passou a se chamar Jornada Cultural e Científica de Montanhismo
E desde então, é ela quem comanda o relacionamento com os parceiros do nosso programa de benefícios, o Gear Tips Club, lançado há três anos.
Por fim, esse ano, cumprimos a nossa missão de cuidar não apenas das pessoas, mas do planeta, com mais uma iniciativa inédita no Brasil e no mundo.
Lançamos o nosso Programa de Reciclagem de Cartuchos de Gás usados em áreas de camping, e mais uma vez fomos acolhidos pela comunidade e por 30 parceiros (inclusive o Parque Nacional do Caparaó), que são nossos pontos de coleta.
Pela iniciativa, capitaneada por Bruno Negreiros, nosso coordenador de responsabilidade socioambiental, recebemos o prêmio Mountain Protection Award 2023, da UIAA (União Internacional das Associações de Alpinismo).
Essa trajetória só reafirma a minha certeza de que atividades na natureza são transformadoras. Quanto mais pessoas puderem vivenciar isso, melhor
Não só para elas mesmas, mas para o planeta, pois quanto mais o conhecemos, mais o preservamos.
Pedro Lacaz Amaral é fundador e CEO do Gear Tips, plataforma de educação e comunidade voltada a atividades na natureza. Já esteve em expedição no Alasca e participou do El Cruce, prova de 100 quilômetros de corrida nas montanhas da Patagônia, na Argentina. É instrutor Leave no Trace (Não deixe rastros).
Irmãs gêmeas, Cláudia e Kátia Alencar fizeram história como atletas de remo e polo aquático. Hoje elas estão à frente do Instituto Esporte pelo Planeta, que apoia a comunidade esportiva e populações vulneráveis contra as mudanças climáticas.
Por que a discussão sobre a crise climática exclui quem mais sofrerá com o aquecimento global? Saiba como Amanda Costa, do Instituto Perifa Sustentável, batalha para levar vozes periféricas aos espaços de tomada de decisão.
Angústias e dilemas da paternidade. Autoconhecimento por meio de uma transição capilar. Leia a nossa retrospectiva Lifehackers, com os relatos potentes de pessoas que tiveram a coragem de trazer disrupção para suas vidas.