Espalhar notícias boas é a missão do Razões Para Acreditar, o blog que virou (mais de um) negócio

Isabela Mena - 13 nov 2014
Vicente na ação Campeões do Carinho, que a Johnsons fez durante a Copa do Mundo.
Isabela Mena - 13 nov 2014
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O desejo de um respiro em meio a tantas notícias ruins na internet e o de ser um instrumento da própria rede levaram o designer Vicente Carvalho, 30, a criar o blog Razões Para Acreditar. Hoje com status de site e faturando alguns milhares de reais com ações casadas com marcas, o Razões se prepara para dar o próximo passo: passará a chancelar as ações de marketing social de um empreendimento que Vicente está prestes a lançar, voltado ao marketing social.

Mas comecemos do começo. Maranhense apenas de nascimento (ele se mudou criança pra Rondônia, onde a família está até hoje), Vicente estava na faculdade de Publicidade quando ganhou uma bolsa para um curso de capacitação no Instituto Europeo di Design, em Porto Velho. Quatro anos depois de terminar a graduação, ele veio a São Paulo para fazer, dessa vez, uma pós no mesmo IED. Na época, ele já trabalhava como designer para o Sebrae de Rondônia (posto que mantém ainda hoje) o que possibilitou a transição entre os trabalhos de professor no IED e de designer até o momento atual, em que pode se dedicar integralmente às razões que escolheu para viver.

O Razões surgiu há pouco mais de dois anos: cansado de tanta gente reclamando da vida em sua timeline no Facebook, Vicente se deparou com um post de uma amiga sobre pequenos atos que pessoas faziam umas para as outras. Comentou que “existem razões para se acreditar num mundo melhor”. Horas mais tarde, já tinha criado o domínio e escrito 15 histórias positivas, como a de quando apareceu de surpresa no casamento da irmã ou a de amigos que ajudaram moradores de rua.

“Eu queria que as pessoas lessem esses textos para espairecer”, diz Vicente. Ele divulgou o blog em redes sociais mas sem muito alarde ou pretensão. O Razões encontraria seu público e seu espaço depois de uma parceria com o portal Hypeness, que Vicente contatou como fã para apresentar o seu blog recém-criado.

Histórias de pegar o lencinho: o último desejo de Sheila Marsh era dar adeus  ao seu cavalo. O hospital realizou o pedido, e ela faleceu horas depois.

Histórias de pegar o lencinho: o último desejo de Sheila Marsh era dar adeus ao seu cavalo. Realizada, ela faleceu horas depois.

Acredite: o sucesso do segundo post do Razões no Hypeness derrubou o servidor do portal. Era a história de amor entre um soldado americano, que perdeu pernas e braços no Oriente Médio, e da namorada que não saiu do seu lado. A viralização excepcional também levaria de 100 para 80 mil os acessos diários do Razões, à época com 15 dias de vida.

Vicente acabou contratado do Hypeness e atualmente publica dois posts por dia lá, sem replicar as histórias no seu blog. “Vi que estava no caminho certo a partir daí. Os meus posts no Hypeness são os que mais estouram porque são bastante emocionais e as pessoas se identificam.”

DO HYPE PARA O BUSINESS

Enquanto Vicente atraía mais acessos ao portal, a visibilidade deste lhe rendia contatos com agências de publicidade e marcas. Convites para eventos, viagens e publieditoriais começaram a surgir e com isso Vicente teve de preparar não só um mídia kit (ele mal sabia quanto cobrar) e, nesta época, estabeleceu algumas diretrizes: seu blog nunca divulga produtos, apenas ações que tenham um viés emocional positivo ou um posicionamento social e sustentável.

O primeiro post patrocinado do Razões foi ao ar no ano passado, para a Claro. Ele recebeu cerca de 2 mil reais para falar sobre uma ação comemorativa dos 53 anos de Brasília que incluía vôos de balão. Ele continua cobrando valor parecido para os publieditoriais. Mas, dependendo do projeto, isso pode mudar.

Um exemplo foram os 10 mil reais que Vicente recebeu para divulgar a ação “Campeões do Carinho”, da Johnson & Johnson, na época da Copa do Mundo. Por sua vez, ele não recebeu nada da Coca-Cola para publicar posts semanais sobre iniciativas sustentáveis da empresa escolhidas por ele, e que a Coca-Cola replicou em sua fanpage mundial (que tem quase 90 milhões de fãs).

“Já declinei ofertas que não tinham a ver com o site. Não quero perder a confiança do leitor só porque o Razões é também um negócio. Ele começou de algo genuíno e vai continuar assim”

O Razões faz ao menos um post patrocinado por mês e o desejo é que chegue a, no máximo, quatro. Vicente tem um colaborador na área comercial, que ganha 25% do valor de cada acordo fechado.

O NEGÓCIO DO MARKETING SOCIAL

Mas a proximidade com as marcas traria muito mais do que a receita dos publieditoriais: fez Vicente vislumbrar um novo empreendimento. De tanto comparecer a eventos de projetos sociais e sustentáveis das marcas, ele percebeu que a maioria das apresentações eram chatas, ou frias e cheias de relatórios, ou exageradas e soando falsas ou promocionais —mesmo quando o projeto era super legal. Viu aí a oportunidade de um novo negócio.

Vicente (de óculos escuros) participa de uma ação da Coca-Cola. Quando há um propósito comum, a parceria acontece

Vicente (de óculos escuros) participa de uma ação da Coca-Cola. Quando há um propósito comum, a parceria flui.

Vicente juntou-se a um publicitário carioca e acaba de montar um coletivo — o nome ele ainda não pode divulgar — para apresentar e difundir, em parceria com as empresas, os projetos sociais e sustentáveis com mais criatividade e eficiência. O Razões, que tem 400 mil visitantes únicos por mês, passará a atuar como uma espécie de chancela para estas divulgações. O coletivo será lançado ainda este mês.

“Fizemos uma pesquisa e descobrimos que esse mercado, conhecido como Social Marketing, já existe fora do Brasil mas as pessoas ainda não estão dando muita bola pra isso por aqui”, diz ele.

O novo negócio não deixa de ser filantrópico, e seguirá duas premissas interessantes: a de usar 20% do valor líquido de cada projeto fechado para financiar causas em que os sócios acreditem, e a de que os sócios trabalharão um dia por semana pro bono, ou seja, apenas para difundir histórias de ONGs, empresas do Capitalismo Consciente e do Sistema B.

“Há um certo mito em torno da filantropia, como se fosse proibido ganhar dinheiro ou aparecer. Tem muita coisa legal para se fazer de uma forma vendável e, ainda assim, causar impacto positivo na vida das pessoas. Vamos mostrar isso”

Desde o começo, o Razões se alimenta tanto de notícias encontradas na internet como de histórias que desconhecidos enviam por email ou via fanpage. Há cerca de duas semanas foi adicionado no site o botão “Envie uma Razão”, um canal aberto a quem quiser escrever uma história de próprio punho. O usuário coloca título, foto, vídeo e o conteúdo vai para um painel de moderação, aguardando aprovação. Aprovado, o post vai ao ar assinado pelo autor. Em caso de negativa, Vicente escreve explicando o motivo.

“Está dando super certo, nem divulguei ainda e já tem uns 15 posts aguardando moderação. É interessante tanto para me desafogar como para democratizar o site”, diz ele. Esta ideia Vicente tirou do Bored Panda, um site americano sobre arte, design e fotografia que usa como fonte para o Razões. Há outras fontes que ele não divulga, mas entre as conhecidas estão Up Worthy, Huffington Post, Good Magazine, PSFK e Daily Mail. E há também sites nacionais, como o IdeaFixa e o Brainstorm9 e até grandes portais como G1 e UOL. Nestes últimos, o segredo é procurar notícias sem destaque, nos cantos das páginas: “Lá estão as histórias que interessam para o Razões”.

Pelo menos sete posts vão ao ar diariamente no blog, nem todos feitos por Vicente. Ele tem uma equipe de 15 colaboradores voluntários que postam quando querem e não recebem por isso. Em média, há pelo menos um post desse time por dia. Há um único membro fixo na equipe, Danilo Cardoso, que o ajuda na edição de textos.

O Razões tem oito categorias temáticas, todas definidas por verbos: Sentir (sobre histórias emocionais), Ser (gentileza e cidadania), Viver (inovações médicas), Cuidar (bichos de estimação), Cultivar (sustentabilidade), Criar (design e fotografia), Aprender (educação) e Empreender (empreendedorismo inspirador e economia criativa).

A essência do negócio continua ser editar e publicar histórias inspiradoras e de superação. Mas outros temas, como a sustentabilidade, também são bem recebidos pelo público. Tanto que o post que teve maior pico de visualizações este ano (500 mil acessos) ensinava como descartar corretamente as esponjas de lavar louça.

“Achei muito legal ver que tanta gente está nessa pegada sustentável. Além disso, se eu postar apenas histórias que fazem as pessoas chorarem pode ficar muito cansativo”, diz ele. Se ele falou, pode acreditar.

draft card razoes

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