Na área da saúde, a pesquisa clínica é uma etapa fundamental para que novos medicamentos cheguem de forma segura aos pacientes. Porém, uma das dificuldades de empresas e hospitais é encontrar pessoas que não só apresentem os quadros de saúde específicos para o tratamento, mas que aceitem participar.
Facilitar esse processo é a missão da Comsentimento, startup que utiliza inteligência artificial para aumentar a eficiência do recrutamento de pacientes para testes clínicos.
Fundada no final de 2020 pelo engenheiro paulistano Guilherme Sakajiri, de 39 anos, a empresa nasceu a partir da percepção de que, nas palavras do próprio CEO, os dados de saúde talvez sejam o ativo mais valioso e, ao mesmo tempo, mais mal utilizado do mundo. Guilherme afirma:
“Quero ajudar hospitais a usarem melhor os dados e gerar valor tanto para as entidades da cadeia quanto para os pacientes”
Desde o surgimento, e a partir principalmente de parcerias com hospitais e centros de saúde, a healthtech já analisou prontuários de mais de 14 mil pacientes e cerca de 200 mil documentos médicos, ajudando a encaminhar centenas de pacientes para pesquisas de novos tratamentos para doenças como câncer.
Por enquanto, porém, a startup ainda não consolidou maneiras de monetizar a tecnologia desenvolvida. Em 2022, atraiu 1,5 milhão de reais em investimentos numa rodada pré-seed. Agora, em 2023, busca arrecadar 3 milhões de reais com o plano de aperfeiçoar o modelo de negócios para atingir mais clientes.
“Para a gente, o indicador mais importante é o número de vidas impactadas”, diz o fundador.
O caminho entre a formação em Engenharia Naval e o empreendedorismo na área de saúde e tecnologia não é nada óbvio – exceto para Guilherme, que consegue explicar a trajetória detalhadamente.
Filho de um médico e de uma fonoaudióloga, gostava mesmo era de matemática. “Saúde sempre fez parte da minha vida. Mas, por afinidade, acabei indo para uma formação de exatas”, conta.
Embora apaixonado por transporte e logística aquaviária, acabou escolhendo uma carreira em gestão e negócios. Isso aconteceu no quarto ano da faculdade, durante um intercâmbio em Sydney, na Austrália, onde cursou administração de empresas.
“Nunca me vi muito como um engenheiro projetando motor ou construindo um navio. Fui pela visão sistêmica de olhar problemas de maneira mais ampla”
Assim, encontrou em uma empresa de consultoria e gestão a oportunidade de exercer sua curiosidade e trabalhar em diferentes setores.
Formado em 2008, ficou quatro anos em uma grande empresa especializada em projetos de fusão. Em 2012, recebeu a oferta de cursar um MBA patrocinado pela empresa. “Recusei o patrocínio, porque depois queria trabalhar com outras problemáticas”, conta. Em vez disso, se jogou por contra própria na escola de negócios francesa Insead, cursando os primeiros dois períodos em Cingapura e os três últimos, na França.
Durante o MBA, Guilherme fez um estágio de verão na McKinsey & Company, empresa de consultoria conhecida globalmente. Ficou interessado em possibilidades de assumir projetos em escopos diferentes, como estratégia e operação, e decidiu aceitar a proposta de ser efetivado em 2013. Trabalhou por dois anos e meio até decidir realizar a vontade antiga e adormecida de empreender.
Um perfil comum entre consultores, diz Guilherme, é o de “insecure overachiever”: pessoas com alto potencial que acabam buscando caminhos mais seguros e que podem, eventualmente, limitar esse potencial.
“Vivi isso por muito tempo. Sempre buscando um carimbo a mais, algo que desse segurança antes de tomar algum risco. Depois de ter feito MBA e ido para mais uma empresa, pensei que se eu empreendesse e desse errado, ainda assim conseguiria um emprego”
A primeira experiência por conta própria foi justamente em uma healthtech, a Tagfit, criada em 2015. Na época, o setor de saúde e fitness estava forte, impulsionado por aplicativos de bem-estar que faziam as empresas desenvolvedoras serem adquiridas por grandes marcas.
Nisso, Guilherme viu uma onda a ser surfada, e decidiu criar ele mesmo seu próprio app.
“Era como uma rede social com fotos para entender o comportamento dos usuários e tentar influenciar esse comportamento com metas, desafios e gamificação”, explica.
Três anos depois, a empresa não deu certo financeiramente, e Guilherme decidiu voltar para o mundo corporativo.
“Tive um ganho de aprendizado sobre saúde, tecnologia e empreendedorismo. Aprendi a lidar com pessoas de um jeito diferente, entender minhas emoções, meus gaps na tomada de decisão, o que eu fazia bem e o que não fazia”
Entre 2018 e 2020, Guilherme teve duas passagens no mundo corporativo. A primeira foi como gerente de produtos em uma empresa multinacional que estava entrando no Brasil com soluções de tecnologia e dados para a área da saúde. A segunda foi como head da vertical de saúde de uma companhia especializada em IA e big data.
Embora as duas experiências tenham sido breves – a segunda interrompida principalmente pela pandemia —, o engenheiro teve contato com conceitos que viriam a embasar seu segundo empreendimento.
Na metade de 2020, Guilherme reconhecia o potencial dos dados de saúde para melhorar a prestação de serviços e, principalmente, a qualidade de vida dos pacientes. E entendia que o caminho para conectar os vários agentes dessa cadeia e as bases de dados era através da inteligência artificial.
Em benchmarkings sobre uso da IA na saúde, encontrou dois casos de uso típicos no mundo. O primeiro era em codificação médica (medical coding), processo utilizado para reunir e classificar informações clínicas de pacientes, muito aplicado no contexto da saúde suplementar nos EUA. O segundo era justamente o recrutamento de pacientes para pesquisas clínicas. Guilherme decidiu então que este seria o propósito da Comsentimento.
“Fui atrás de um sócio que entendesse dessa área. Encontrei o Lucas [Lucas Emanuel Silva e Oliveira], que estava terminando doutorado no Paraná justamente na área de Processamento de Linguagem Natural em dados de saúde. E ele queria dar um tempo no mundo acadêmico e ver o que estava pesquisando sendo utilizado na prática”
Em 2021, a Comsentimento desenvolveu uma metodologia para aplicar IA no recrutamento de pacientes para pesquisas clínicas. A ideia foi selecionada na primeira edição do programa de aceleração do Harena, o hub de inovação do Hospital de Amor de Barretos (SP).
Hoje, esse recrutamento é feito de forma manual. Para encontrar pacientes elegíveis a determinada pesquisa clínica, funcionários das instituições precisam abrir cada prontuário e ler informações como quadro de saúde, medicamentos e sintomas.
O que a IA da Comsentimento faz, por meio do Processamento de Linguagem Natural, é ler de forma automatizada esses dados, indicando com mais eficiência os pacientes elegíveis. Após o programa de aceleração, o Hospital e a startup fizeram um acordo de cooperação técnica para rodar uma prova de conceito.
“Fizemos uma análise retrospectiva em um caso na área de câncer de próstata. O objetivo era comparar quantos pacientes eles encontraram no estudo com quantos a gente conseguia encontrar com a tecnologia”
A partir de uma lista inicial de 1,3 mil pessoas, enquanto o estudo do hospital tinha selecionado 36 pacientes, a IA da Comsentimento chegou a 70.
Em 2021, a Comsentimento descobriu seu produto e seu mercado. Arrecadou 400 mil reais em uma rodada de investimento anjo. E, no final daquele ano, conquistou o primeiro — e até hoje único — cliente pagante com um estudo na área de saúde mental.
O ano de 2022 foi de colocar o produto à prova e aperfeiçoar os algoritmos. Para tanto, expandiram o acordo de cooperação com o Barretos e fecharam outros dois contratos de provas de conceito não-remuneradas com um hospital oncológico e uma rede de clínicas. Naquele ano, arrecadaram 1,5 milhão de reais no pré-seed e aumentaram a equipe, que passou de três para nove pessoas. Agora, 2023, vem sendo o ano do desafio.
“A gente mostrou que a solução funciona, criou uma interface, teve bons cases de sucesso. Atualmente estamos numa fase de monetização e de tentar converter PoCs em acordos comerciais”
Uma das hipóteses de negócio é lançar uma versão light do produto. Nela, a Comsentimento não fará a revisão e o refinamento da lista, mas proporcionará que o cliente faça a busca sozinho. Além de baratear os custos – da casa de dezenas de milhares para centenas de reais – ele espera diversificar a oferta.
“A gente entende que essa funcionalidade de busca pode ser aplicada para outras finalidades, como identificar pacientes para participar de um programa de crônicos, ou para análises sobre diferentes protocolos de tratamento”, diz Guilherme. “Estamos em uma fase de experimentação para achar outros casos de uso para essa ferramenta.”
Baixar o preço, diversificar os clientes e rentabilizar os grandes projetos são o plano para que a Comsentimento atinja seu objetivo de longo prazo: se tornar, ela própria, uma infraestrutura de dados de saúde.
“Queremos fazer os players que geram esses dados enxergarem que o dado gera valor ao trafegar por nossa rede”, diz Guilherme. O objetivo final é criar uma espécie de “open health”, em que todo o ecossistema de saúde se conecte utilizando a solução da Comsentimento para movimentar dados.
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