Desde a adolescência Gabryella Correa já era uma empreendedora. Cresceu trabalhando com o pai na empresa dele, uma oficina de autopeças e transportadoras. Mesmo quando foi para a faculdade – ela cursou nutrição – continuou trabalhando ali. “Eu adorava o que fazia na oficina”, lembra. Quando seu pai se aposentou e fechou a oficina, em 2013, passou a atuar na sua área de formação, gerindo toda alimentação dos operários que trabalhavam nas obras de construção das Olimpíadas. “Servia mais de 12 mil refeições por dia em uma cozinha de 200 metros, com 280 funcionários. Atendíamos 7 restaurantes. Fiquei ali durante 4 anos e nesse período me formei em Administração de Empresas com ênfase em finanças, porque para tocar um negócio próprio era necessário um conhecimento maior”.
Mas Gabryella resolveu investir em uma área totalmente diferente da nutrição. Os motivos que a levaram a tomar essa decisão e sua história a frente da Lady Driver, você encontra nessa entrevista.
Como surgiu a ideia de empreender e montar a Lady Driver?
A ideia surgiu depois que eu sofri um assédio pelo taxista que eu chamei via aplicativo. Foi uma situação muito difícil, fiquei muito nervosa, e depois disso decidi criar um aplicativo, porque eu não queria que outras mulheres passassem pela mesma situação. Acabei usando a minha experiência negativa para uma ideia positiva, capaz de ajudar outras mulheres. A partir daí eu comecei a estudar o mundo da tecnologia, a pesquisar, ler livros sobre startups e sistemas e busquei pessoas para desenvolver o aplicativo. Depois de um ano dedicado ao estudo de desenvolvimento, abertura de empresa e processo de legalização da prefeitura (somos o primeiro app legalizado em São Paulo para passageiras e motoristas mulheres), iniciamos o serviço no dia 08 de março de 2017.
Como você identificou o nicho e investiu neste setor?
Eu identifiquei por uma dor minha e conversando com algumas amigas eu pude perceber que elas também tinham o mesmo receio de pegar uma corrida por aplicativo. Geralmente nós, mulheres, temos medo e não denunciamos porque o motorista na maioria das vezes nos pega em casa ou no trabalho, sabe onde nos localizar caso queira fazer algum mal. Mas, para minha surpresa, depois que eu lancei o aplicativo e comecei a conversar com as motoristas, descobri que elas também sofrem assédio, mas se calam porque, se falarem em casa, talvez os maridos as impeçam de trabalhar.
Como foi o começo da empresa?
A Lady Driver é um aplicativo de transporte comum, mas com o diferencial de contar com motoristas mulheres que transportam somente passageiras mulheres. O homem pode acompanhar a mulher. Nossos preços são supercompetitivos com o mercado. Decidimos fazer um valor de corrida muito próximo aos concorrentes, porque infelizmente no mercado de trabalho grande parte das mulheres ainda ganha menos do que os homens, então não seria justo cobrar mais no transporte especializado para ela. Outro diferencial do nosso aplicativo é que cobramos uma taxa de 16% das motoristas. Os outros aplicativos cobram 25%. Queremos que Lady Driver seja uma empresa onde a mulher ganhe mais do que o homem nesse setor.
Como é a sua atuação?
Eu sou a CEO da empresa, faço a parte comercia, relacionamentos, parcerias, falo com investidores, apresento a empresa. E também acabo atuando internamente, buscando talentos para fazer parte da nossa equipe, pessoas qualificadas e que tenham o perfil da empresa.
Como foi no início?
No início foi muito difícil porque eu tive a ideia, mas não contei para o meu marido porque não queria que ele soubesse o que eu passei no táxi. Fui aos poucos falando sobre o assunto com as minhas amigas, minha família, perguntando o que eles achavam e se acreditavam na ideia. No começo tiveram muitas dúvidas, principalmente meu pai e a maioria dos homens da família ficaram com um pé atrás. Quem me apoiou foi minha mãe, minha irmã as mulheres da família porque compartilhavam da minha opinião. E quem entrou como sócia comigo foi a minha cunhada Bianca Saab Corrêa. Só depois de ter toda uma estrutura eu contei para o meu marido, e aí ele acabou aprovando o plano de negócio e me apoiando. No começo contei com o meu dinheiro e das minhas sócias e depois de quase 1 ano de empresa eu chamei meu marido para trabalhar comigo. Ele é engenheiro e me ajudou na parte de TI. Um dos maiores desafios foi o desenvolvimento do aplicativo, não foi tarefa fácil encontrar pessoas e empresas de confiança para desenvolvê-lo com uma grande escala. Hoje a Lady cresceu muito, nós iniciamos com 1.800 motoristas em março de 2017 hoje já temos 18 mil motoristas e 250 mil downloads.
Quais estratégias têm dado melhor resultado nesta trajetória?
A estratégia que nós usamos é a autenticidade. Eu tive uma história real, passei por um assédio. Além disso, sempre gostei de carro e sou mulher, então eu consigo entender a necessidade da motorista e da passageira. Acredito que as melhores estratégias são atuar com a verdade e o propósito de ajudar mulheres. Hoje temos motoristas ganhando entre 8 a 10 mil reais dirigindo somente para a Lady Driver, e isso me enche de orgulho. Eu fui criticada por muitos homens, pelos aplicativos mistos as pessoas desacreditavam o meu negócio, mas segui adiante. Eu tinha uma certeza dentro de mim que me motivava e eu consegui tocar em frente o projeto. Recentemente o Jornal Financial Times fez uma pesquisa com várias iniciativas pelo mundo e identificou a Lady Driver como a maior empresa de transporte feminino do mundo, com maior número de motoristas e de passageiras.
Na sua opinião, o que o empreendedorismo feminino tem de diferente?
Eu acho que nós, mulheres, temos a questão da alma, da sororidade. Para se ter uma ideia, sempre que surge uma vaga no escritório, procuro primeiro avaliar as nossas motoristas para identificar se alguma delas pode completar o nosso time, porque eu quero ajuda-las, quero oferecer oportunidades para que cresçam. A mulher geralmente tem muito forte o propósito de ajudar, de fazer as coisas de coração. Mas sim radicalismos. Os homens são minoria mas fazem parte da equipe, é importante ter um time diverso para ter um equilíbrio.
Qual seu maior objetivo?
É mostrar que podemos ser excelentes motoristas e quebrar o preconceito de que mulher no volante é perigo constante ou que mulher não sabe dirigir. O que me motiva todos os dias é ver as mulheres da Lady Driver transformando suas vidas, ganhando dinheiro, sustentando suas famílias, sendo independentes.
Qual é o seu sonho?
Meu sonho é que a Lady Driver, esteja em todas as capitais e regiões e que as mulheres possam ser transportadas com segurança, dignidade e que seja normal ver uma mulher dirigindo sem preconceito, sendo independente e tendo uma boa renda.
Se pudesse voltar no tempo e refazer uma decisão, corrigir algum momento de sua trajetória, o que seria?
Eu acho que estudaria mais sobre investimento. Porque é um tema muito difícil e você encontra pessoas que querem te ajudar e outras que querem apenas tirar proveito da sua empresa.
Se pudesse dar apenas uma dica para quem está querendo empreender, qual seria?
Procure se capacitar, estudar e pesquisar muito. Faça um bom plano de negócio, leia biografias de pessoas que conseguiram ter sucesso com as suas empresas e hoje são referências. Para mim, por exemplo, o livro “Startup Enxuta”, do Eric Ries, foi excelente, pois consegui entender todo o conceito de uma startup. Como eu não era da área de tecnologia, esta leitura foi fundamental. E lembre-se: O sucesso é difícil de alcançar. Enfrentamos dias e dias sem ter resultados, mas a persistência é muito importante. É importante, também, buscar bons profissionais para fazer parte da equipe porque ninguém constrói nada sozinho.
Para saber mais
Lady Driver: https://ladydriver.com.br/
O que faz: 1º aplicativo de transporte de mulheres para mulheres.
Funcionários: 27 funcionários
Sede: Av. Angélica, 2529 – São Paulo – SP
Início das atividades: janeiro de 2017
Investimento inicial: R$ 500 mil
Esta matéria pode ser encontrada no Itaú Mulher Empreendedora, uma plataforma feita para mulheres que acreditam nos seus sonhos. Não deixe de conferir (e se inspirar)!
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