O que a Natura aprendeu com seu primeiro hackathon

Mirela Mazzola - 30 out 2014Natura Hackaton
Visita ao Beco do Batman, na Vila Madalena. A maratona hacker da Natura foi também um momento de redescoberta das relações e da cidade
Mirela Mazzola - 30 out 2014
COMPARTILHE

“O futuro é vivido e não imaginado”, diz o mantra do MIT Media Lab, laboratório de pesquisas interdisciplinares do MIT (Massachussetts Institute of Technology) e referência mundial em inovação. Pela primeira vez, a instituição se uniu a uma empresa brasileira para um hackathon (junção das palavras “hacker” e “marathon”), maratona de inovação que reúne desenvolvedores de softwares, designers e outros profissionais em um ambiente de cocriação e prototipagem.

Como a tecnologia pode conectar o produto no ambiente digital de modo a melhorar a experiência do consumidor? Essa é a pergunta que fundamentou o primeiro Hackathon Natura Campus Media Lab, que durou seis dias e envolveu 32 participantes de todo o país na sede da Natura, em Cajamar (SP). Eles se acomodaram no Núcleo de Aprendizagem Natura (NAN), onde foram montados dormitórios adaptados, e usaram a estrutura do clube interno para banho e refeições. Há três anos, a empresa mantém uma parceria com o Media Lab, sendo um de seus patrocinadores corporativos.

Nos primeiros três dias, dedicados a uma imersão conceitual, houve uma visita à fábrica de Cajamar, entrevistas com consumidores e discussões sobre cosmética e bem-estar, valores-chave da Natura. Os últimos três dias foram efetivamente dedicados ao desenvolvimento e à apresentação de projetos que respondessem à pergunta lançada pela empresa.

Natura

Mão na massa: hora de colocar ideias em prática e desenvolver protótipos

Para se inscrever no Hackathon bastava ter mais de 18 anos, residir no Brasil e estar cursando o ensino superior. Também foram abertas vagas para funcionários participarem dos grupos, compostos ainda por um convidado do estudante selecionado e por um pesquisador do Media Lab. Os candidatos tinham que enviar projetos que respondessem à chamada criativa da empresa. Das 88 propostas recebidas (em forma de texto, vídeo, apresentação ou infográfico) oito foram selecionadas pela gerência de inovação aberta – Open Innovation – da Natura e pelos representantes do Media Lab para serem prototipadas ao longo da maratona. As duas melhores ideias ganharam, ao final do Hackathon, bolsas de seis meses no programa estudante visitante do MIT Media Lab, em Boston, para desenvolver seus projetos em 2015.

UM APRENDIZADO COLETIVO

Testar no presente para vivenciar o futuro. Como se fosse apenas mais um participante do Hackathon, a própria Natura também experimentou, mudou planos no decorrer da jornada e aprendeu durante o processo. “Logo percebemos que o potencial de cada participante ia muito além da sua contribuição técnica e das funções que desempenhava no trabalho”, diz Adriano Jorge, gerente de inovação aberta da Natura.

Durante a maratona foi definido que estudantes seriam separados de seus convidados, para estimular colisões criativas, e que os funcionários não precisariam participar dos grupos com tema ligado diretamente a sua área de atuação. A inovação floresceu: no último dia foram concluídos oito projetos novinhos em folha, diferentes dos apresentados na seleção.

“Nosso grande aprendizado com o Hackathon foi operar esse modelo de prototipação, conectando pessoas diferentes, para desafios com diferentes níveis de complexidade”, diz Adriano.

Uma das vencedoras, Caroline Rozendo, 32, é formada em editoração e agora cursa design, ambos na USP. Ela trabalha com design da informação no jornal O Estado de S.Paulo e sempre cultivou o interesse pelo futuro do livro impresso, o que a levou a ler artigos produzidos pelo MIT. Participar do Hackathon Natura Campus Media Lab foi a chance de conhecer de perto o trabalho feito no Media Lab.

Além dos laboratórios e trabalhos em grupo, o programa incluiu palestras disruptivas

Além dos laboratórios e trabalhos em grupo, o programa incluiu palestras disruptivas

Inicialmente, Caroline pensou em um aparelho que identificasse o tipo e o tom de pele da consumidora de Natura e customizasse seu computador de modo a filtrar resultados de busca que correspondessem às necessidades dela. “Ao criar o projeto, comecei a pirar. Então percebi que teria que ser algo mais concreto”, conta. Mas veio a surpresa. “O novo projeto, vencedor, foi bem mais idealista que o inicial. Eu estava sendo conservadora e não sabia!”

Caroline descreve a experiência como “libertadora”. Criado por ela ao lado de um “helper” (como foram chamados os convidados indicados pelos estudantes), um pesquisador do Media Lab e um funcionário da Natura, o projeto será desenvolvido em Boston no primeiro semestre de 2015 e tem grandes chances de ser implementado. Por enquanto, o conteúdo é sigiloso.

Integrante do grupo de Caroline, a toxicologista Karen Assanome, 27, que trabalha na Natura há quatro anos, na área de segurança do consumidor, também irá a Boston, em janeiro, emprestar o olhar da empresa ao projeto que ajudou a idealizar. “Venho de um departamento supertécnico e no Hackathon tive a chance de despertar os sentidos e a imaginação”, diz. Karen afirma ter participado do evento mais disruptivo de sua vida.

QUANDO INOVAR ESTÁ NO DNA

A história da Natura com a cocriação no ambiente acadêmico começou em 2006, com a criação do programa Natura Campus, que abre a porta para que projetos sejam enviados das universidades para os pesquisadores da empresa. Desde então já surgiram a seiva em creme Ekos Pariparoba, com tecnologia licenciada pela USP, e o creme antirrugas Chronos Passiflora, cujo ativo foi desenvolvido em parceria com a Universidade Federal de Santa Catarina.

Por meio de chamadas na página do Facebook Cocriando Natura e de participação em dois dias da maratona, cerca de 50 consumidores tiveram seus pontos de vista considerados no questionamento lançado aos participantes do Hackathon. “A relação entre cosmética e tecnologia e a busca cada vez maior por personalização são assuntos recorrentes. O evento teria que desenvolver respostas para esses anseios”, diz Adriano Jorge.

Outro objetivo da maratona foi se aproximar dos estudantes – os “makers” – mais do que dos professores, pesquisadores ou das próprias instituições de ensino. A meta da empresa era ajudá-los a colocar a mão na massa. Foi montada uma oficina de prototipagem especialmente para o evento, com processadores, impressora 3D e máquina de corte a laser, entre outros aparatos tecnológicos.

Cumplicidade, alegria, reconhecimento: um hackathon pode gerar muito mais do que ideias novas

A Natura pretende repetir o Hackathon, talvez até no primeiro semestre de 2015, e ampliar suas possibilidades de cocriação. O grande legado do primeiro Hackathon Natura Campus Media Lab parece ter sido a certeza de que vale a pena unir pessoas diferentes para construir e testar ideias disruptivas. E de que o melhor caminho para enfrentar os riscos que um futuro incerto apresenta aos negócios, em empresas de qualquer tamanho, é inventar o amanhã, em vez de apenas imaginá-lo – ou de temê-lo.

COMPARTILHE

Confira Também: