A paulistana Carol Rocha havia saído para trabalhar na manhã chuvosa da quarta-feira que mudaria sua vida e faria dela um exemplo na campanha pela doação de sangue. O ano era 2011, época em que ela já havia se tornado uma referência na internet. Mais conhecida pelo apelido Tchulim, a paulistana nascida na zona leste da cidade começou um relacionamento sério com a web por volta de 2008, quando estudava psicologia. “Em todos os trabalhos eu aproveitava a oportunidade para pesquisar sobre a internet”, diz ela. “Eu tinha um blog e conheci muita gente. Assim, fui ganhando popularidade.”
Mas seu grande salto para a fama online foi durante uma brincadeira conhecida como o “dia da lingerie” no Twitter, em que usuárias postavam fotos suas usando apenas as roupas de baixo. “Participei da brincadeira, mas não imaginava o alcance que teria. Era uma foto “comportada”, então todo o veículo de imprensa que falava sobre o lingerie day usava a minha imagem”, diz Carol. Na época, o debate sobre liberdade feminina ganhava força na web, e ela foi uma das vozes que ampliou esse coro, participando de eventos como palestrante convidada. Com a forte repercussão, ela foi convidada pela revista Trip para participar de um ensaio que por anos se manteve como um dos mais populares no site da publicação.
Foi nesse período que ocorreu o acidente que mudaria sua vida. Um mês depois de Carol ter posado para a Trip, ela foi atropelada. Ao atravessar a rua, em frente ao apartamento que ela dividia com uma amiga na Vila Mariana, Carol foi atingida por um ônibus que não parou no farol vermelho. Ela foi arrastada para debaixo do veículo e ficou prensada entre o asfalto e a estrutura metálica. Seu quadril quebrou em três partes, e o osso do tornozelo esquerdo foi moído. Além das fraturas, ela sofreu uma grave hemorragia interna ocasionada pelos múltiplos ferimentos.
“Ainda fui para o hospital consciente e, chegando lá, como não havia lesão externa, me colocaram em uma máquina de tomografia. Mas eu percebi que havia algo errado, que minha barriga estava inchando, e quando os médicos viram isso, eles me tiraram de lá. Foi aí que a médica falou que eu estava perdendo sangue.” Carol passou cinco dias na UTI em estado grave, correndo risco de morte.
“Depois desse tempo, quando fui para o quarto, o médico veio falar comigo. Ele disse que o estado era grave, que eu havia precisado de dez bolsas de sangue e que isso havia me salvado. Aquilo me tocou profundamente. Foi nesse momento que percebi que precisava fazer algo em retribuição.”
Carol foi informada sobre os problemas pelos quais o banco de sangue passava. O estoque permanecia em constante baixa, agravada pela proximidade dos períodos de final de ano e férias, em que as pessoas deixam de doar, e ela soube do problema gravíssimo da falta de sangue que afeta o país todo. Movida pelo caso, ela decidiu usar a popularidade que havia conquistado nos anos anteriores e a influência que tinha na internet. Com a ajuda de uma amiga jornalista, gravou um vídeo em que falava sobre o problema, e a repercussão foi instantânea. Outros amigos famosos na web ajudaram a compartilhar a mensagem, e ainda no hospital Carol passou a receber fotos e relatos de voluntários fazendo doações.
Para reunir esses depoimentos, amigos montaram um Tumblr que compilava em uma única página todas essas histórias, e assim nasceu o projeto Vaidoa com uma hashtag que até hoje se mantém no Instagram. No Tumblr, ainda no ar, dezenas de imagens mostram voluntários na cadeira de doação, com muitos sorrisos e mensagens de apoio. Felizmente, Carol se recuperou, saiu do hospital após três meses, e continuou a trabalhar em prol da campanha pela doação nos anos seguintes. “O assunto nunca mais saiu da minha vida”, diz. “Até hoje falo sobre isso, recebo pedidos e conheço doadores. É a minha forma de devolver para o mundo a ajuda das pessoas que salvaram a minha vida.”
Uma das missões que ela tomou para si, além de incentivar a doação, é desmistificar alguns fatos que ainda persistem em torno do assunto. No site do Vaidoa, ela reúne uma lista com mitos, e explica a verdade por trás de cada um deles. “Infelizmente, foi só precisando que soube o valor de uma doação de sangue, pois não temos essa cultura no país. Só falamos quando alguém próximo precisa. Então é preciso explicar que doar não dói, que o doador não vai pegar doença, etc.”
Carol ainda mora em São Paulo, com seu filho de 1 ano e meio, namorado e cinco gatos. “Sempre fui muito positiva. As pessoas me perguntavam, quando eu estava no hospital, como eu conseguia manter o alto astral naquela situação. Mas eu estava tão grata por ter sobrevivido que fui movida por esse sentimento, de estar viva e bem assistida. Depois, virei doadora de tudo o que você possa imaginar.”
Após a gravidez, o público de Carol mudou. “Hoje meu Instagram bomba de mães”, diz ela, que também trabalha na área da publicidade. Mas a vocação por compartilhar informações que possam ajudar os outros continua. “Produzo conteúdo sobre maternidade, e conto as coisas que aprendi pesquisando durante todo esse período. Informação de qualidade pode salvar vidas.”