É razoável pensar que o ecossistema de startups coloque em destaque um setor da economia que representa 10% da força de trabalho de um país e tenha entre 6 e 10% de participação no PIB. Mas não era o que ocorria com Construção ou Atividade Imobiliária — nem no Brasil, nem no resto do mundo. Menos de 3% das startups olhavam para esse setor. Quem atua nesse mercado há mais de dez anos, como Bruno Loreto, 29, não se conformava com essa estatística. Foi dele, então, a ideia de levar adiante o Construtech Ventures, primeiro venture builder do mundo focado nos mercados imobiliário e da construção. O projeto tem como objetivo descobrir e apoiar construtechs — startups dedicadas a solucionar problemas do setor de infraestrutura.
Empolgado com o MBA executivo que fez no Insper e por tudo que viu durante o Startup Weekend do qual participou em 2015, ele deixou o trabalho de gerente regional de vendas da Softplan (empresa especializada em sistemas de gestão sediada em Florianópolis, que atende as áreas de Justiça, Governo e Construção, com faturamento anual de 300 milhões de reais) para iniciar um projeto de corporate venture dentro da diretoria de inovação e novos negócios da Unidade de Construção da empresa. “Essa unidade representa 25% do negócio, mas é a única que sempre foi voltada ao setor privado, então isso exigiu que olhássemos muito o mercado, a concorrência.”
Hoje, o Construtech Ventures funciona de forma autônoma com 12 pessoas: o ecosystem squad, time que busca oportunidades e está em contato permanente com startups e empreendedores; e a equipe de tecnologia, que ajuda as startups do portfólio a desenvolverem protótipos e dá mentoria aos fundadores em termos de arquitetura de sistema e visão de produto.
Essa estrutura opera em um modelo misto de venture capital (semelhante a um fundo de investimento focado em startups que buscam smart money, como se diz quando há investimento de conhecimento, além do financeiro) e de venture building (em tradução livre: construção de iniciativas de risco) “pelo qual se concebe negócios do zero, a partir da busca de um empreendedor disposto a atacar um problema específico, em um ambiente de alta colaboração, mão na massa, no qual se apoia o empreendedor até ele conseguir caminhar sozinho”, como define Bruno, o Head de Operações.
Atualmente, há dez startups no Construtech Ventures. O objetivo é ter 20 até o final de 2019 para formar um portfólio cuja missão é chegar ao final de 2020 faturando 25 milhões de reais. Bruno não abre os detalhes dos números. Afirma, apenas, que não há um orçamento fixado para a iniciativa, mas que o investimento inicial em cada startup vai de 500 mil a 2 milhões de reais.
Em 2018, o faturamento do atual portfólio (todas as startups têm, pelo menos, um cliente) representará 2% do faturamento da Unidade de Construção da Softplan. “Todas as startups já provaram que tem alguém disposto a pagar pelo serviço ou produto delas. Então, entraram em um novo ciclo que é provar como tornar os negócios escaláveis. O importante é termos uma métrica que nos mostre se o portfolio está se desenvolvendo”, diz. Ainda segundo o executivo, o planejamento estratégico da Softplan prevê ter 25% da receita da empresa oriundo de novos negócios.
MAPEANDO O ECOSSISTEMA
Bruno conta que o nascimento do projeto aconteceu um ano antes de existir o branding do Construtech Ventures e foi marcado pelo momento em que ele passou a se dedicar integralmente à proposta, em abril de 2016: “Foi quando entendi que não dá para querer construir o futuro, ao mesmo tempo em que se tem de vender o almoço para pagar a janta. São contextos, estímulos e formas de medir sucesso diferentes”. Em setembro daquele ano, ele foi para o Vale do Silício e por lá ficou dois meses a fim de adquirir mais entendimento sobre o contexto do mundo das startups e, acima de tudo, captar o aspecto de cultura, de mindset da mecânica de investimento e do método em si.
Quando voltou, Bruno enxergava duas formas bem diferentes de atuar. Para ele, startups em estágio bem inicial precisam, mais do que de dinheiro, de conhecimento, apoio, acesso a mercado e mentoria. Então, na base da pirâmide, o intuito do projeto deveria ser fomentar e começar a chamar mais a atenção para os desafios do setor de infraestrutura. Startups em estágios mais maduros precisam de capital para crescer. A elas, a Softplan poderia agregar com a sinergia de negócio, mercado e base de clientes. Começou, então, a busca por startups com esse perfil. Ele fala mais a respeito:
“As construtechs não tinham uma identidade, como têm as fintechs. Até isso faltava! Tivemos de reforçar a questão da identidade, que também é importante”
Dia após dia, ficava evidente que, no Brasil, havia muito poucas startups que atendessem aos requisitos. Bruno foi procurar fora do país e analisou cerca de 1 600 startups dos principais ecossistemas do mundo, com exceção de Ásia. Notou um crescimento significativo em todos os mercados. Daí, decidiu mapear o mercado local. Encontrou apenas 250 startups. “Para mim nunca fez sentido sentar e esperar surgir bons negócios. Percebi que precisávamos fazer um trabalho ativo para gerar novas startups”.
HORA DE CRIAR STARTUPS PARA RESOLVER OS PROBLEMAS DO SETOR
Era hora de evoluir o plano inicial. Além de investir em bons negócios que surgiam no mercado, demonstravam tração e conseguiam clientes, como um venture capital faz, o Construtech Ventures passou a criar negócios em torno de problemas para os quais não encontrava boas startups e que demonstravam bom potencial de mercado.
“Temos uma atuação desde o processo inicial de very early stage até uma atuação em seed stage, com quem já deu os primeiros passos. Com a vantagem de que não precisamos de um empreendedor que já tenha uma ideia ou um produto. Preciso de alguém que saiba tocar um negócio e, juntos, a gente cocria.” Essa nova visão exigiu ainda uma assimilação de atitude diferente por parte da liderança da Softplan. Bruno fala:
“As startups não estão ali para serem comandadas, mas para receberem investimento. Isso implica em parar de pensar como dono e agir como sócio minoritário”
Felizmente, de acordo com o executivo, isso não foi um problema na Softplan. Mas ele alerta que no modelo de venture building é preciso deixar as decisões a cargo do empreendedor que está na linha de frente. “Isso tem para o empreendedor um efeito psicológico muito forte. Não se pode tratá-lo como um funcionário, simplesmente porque o trouxemos e convidamos a cocriar um negócio”, afirma.
O FUTURO COMO SPIN-OFF
Este ano, o Construtech Ventures já mapeou no país mais de 350 startups de construção e mercado imobiliário. Dessas, 71% nasceram nos últimos cinco anos e 55%, nos últimos três. Ou seja, a tendência de crescimento replica-se em território nacional.
Entre as iniciativas cocriadas pelo Construtech Ventures, Bruno cita duas. A Vendo Meu Terreno – primeiro marketplace de terrenos para empreendimentos do Brasil e segunda startup desenvolvida no modelo venture building, com sede em Florianópolis e em expansão para o norte de Santa Catarina. Ela se focou em entender a jornada de compra e venda de grandes áreas e percebeu que o mercado, de forma geral, trata com a mesma ineficácia a venda de um imóvel de 100 mil reais e de um terreno de 10 milhões de reais. Sua proposta é organizar o processo com tecnologia e fazer a aproximação entre compradores e vendedores de forma mais profissional.
Já a Urbank – fintech especializada na gestão de crédito imobiliário e quarta startup trabalhada no modelo venture building – tem sede em Curitiba. Ela acompanha os clientes das construtoras desde o momento em que a compra se efetiva até a entrega de chaves, quando o repasse do financiamento é feito às construtoras (e quando costuma haver problemas com a aprovação de crédito para os clientes). A startup está finalizando um piloto dentro do Grupo Thá, uma das maiores construtoras do Paraná, e prepara-se para entrar no ciclo de expansão para outras empresas e mercados.
O Head de Operações do Construtech Ventures fala ainda do resultado intangível da iniciativa: “O nosso primeiro objetivo era geração de aprendizado. Hoje, temos várias oportunidades e ameaças identificadas que não estariam no radar se não fosse o trabalho com as startups. É a visão desses gaps que pode transformar uma empresa de milhões em uma de bilhões.”
Hoje, o Construtech Ventures ainda é uma unidade da Softplan, mas Bruno conta que estão no meio de um processo para se tornarem uma spin-off. Para 2019, o objetivo é ser uma empresa independente, que gere resultados por si só. “Esse é nosso caminho. A nossa visão para aumentar a atuação e investir em mais startups é trazer outros players e investidores, profissionalizar o processo e, com isso, até buscar atuar em outros países, possivelmente, olhando a América do Sul”. O deadline de Bruno é dezembro próximo. E assim vão se construindo pontes, conexões e negócios.
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