Apesar de ser um dos personagens mais queridos entre os “Jeep Lovers” brasileiros, João Alberto Barone Reis e Silva, não é do tipo que passa horas discutindo manobras de 4×4 ou detalhes de motores e tração de sua marca do coração. Por outro lado, não se importa de cruzar as noites pesquisando onde encontrar peças genuínas para restaurar um Jeep Willys da Segunda Guerra, ou cruzando informações sobre combatentes brasileiros que “largaram o violão e pegaram no fuzil”.
Na verdade, João Barone já havia ele próprio entrado para a história, do rock brasileiro, como baterista dos Paralamas do Sucesso e como virtuose em seu instrumento. Mas foi a história de seu pai, João Lavor Reis e Silva, soldado combatente na guerra, a fagulha que o fez mergulhar no período, comprar e restaurar minuciosamente dois Jeep de época, iguais aos que seu pai dirigiu durante os combates como soldado da Força Expedicionária Brasileira.
A atuação nos combates foi um dos motivos que tornou o Jeep um ícone da história da Segunda Guerra – e do automóvel. “O Jeep representou a mobilidade das tropas e a liberdade de levar a pessoa para onde ela quisesse, independentemente do tipo de terreno”, diz Barone, pontuando uma trajetória que segue até hoje, com os utilitários 4×4 e os SUVs ocupando o topo da preferência na lista de desejos de motoristas.
Um desses modelos ele viu de perto em São Paulo durante o Jeep Day 2019, quando conheceu a nova geração do Jeep Wrangler (foto). Mas, apesar de dirigir um pelas ruas do Rio de Janeiro, onde mora, sua paixão são mesmo os modelos MB usados em combate. “Dirigir um Jeep daqueles é como entrar em uma cápsula do tempo”, resume o músico.
“Meu interesse pela Segunda Guerra surgiu por meu pai ter sido combatente e por vê-la como uma ‘guerra justa’: as pessoas queriam derrubar aquela coisa horrorosa do nazismo, da opressão, do racismo e da segregação. Ela tinha um aspecto quase romântico de luta do ‘bem contra o mal’. Eu acho que foi uma guerra que se justificou por conta disso. Meu interesse é justamente a simbologia da Segunda Guerra e não o aspecto bélico em si’, explica.
Barone conta que o pai falava muito pouco sobre a guerra. Uma das poucas histórias que contou, diz o músico, foi sobre o dia em que estava levando munição para os soldados aliados e teve de sair correndo com o Jeep que dirigia, sob fogo inimigo. “Aquilo ficou na minha memória e quando tive oportunidade, decidi comprar um Jeep igualzinho e restaurar.”
Era final dos anos de 1990. Na época, os Paralamas já eram a mais internacional das bandas brasileiras de sua geração, já tendo ultrapassado diversas vezes as fronteiras do Brasil. Argentina, Chile, Paraguai, Uruguai, Venezuela e México faziam parte regular das turnês do grupo. “Em 1986, fomos convidados a participar de um festival de rock em Buenos Aires e nos deparamos com o que estava acontecendo com o rock latino”, lembra Barone. “Foi um encantamento.”
Sem falsa modéstia, ele acredita que os Paralamas abriram uma via de mão dupla entre o rock brasileiro e o latino. Por essa estrada, passaram os portenhos Fito Paez e Soda Stereo, e os mexicanos do Cafe Tacuba. “Uma das maiores plateias que tivemos foi na Venezuela, em um espaço de evento que antes havia sido um aeroporto, bem no meio de Caracas, e tinha 150 mil pessoas quando subimos no palco”.
Outra noite inesquecível, recorda Barone, foi quando o grupo fez, em Buenos Aires, o show de abertura de Keith Richards, que estava em turnê de sua carreira solo. “O estádio tinha mais de 50 mil pessoas e vou te contar, foi ruim para o Keith tocar depois do Paralamas porque nosso show foi uma hecatombe!”, diz ele, rindo muito.
É com essa mesma leveza que Barone conta como, em 2001, ajudou a fundar um clube de veículos militares antigos no Rio de Janeiro. A ideia surgiu do contato que teve com clubes semelhantes nos Estados Unidos e Europa enquanto buscava peças originais para restaurar o Jeep 1944 que tinha adquirido.
“Pouco antes de meu pai falecer, em 2000, eu levei o Jeep para ele ver, mas ele estava impossibilitado de andar, tinha muita dificuldade de se locomover e não pudemos desfrutar de um passeio juntos. Mesmo assim ele curtiu muito, achou sensacional eu ter conseguido um Jeep daquela época. Foi um momento incrível, muito sensível. Ainda não havia selfie, mas guardo essa cena na memória de forma muito especial.”
A paixão de Barone pela Segunda Guerra é quase uma carreira paralela do músico. Além de ter ajudado a fundar o Clube dos Veículos Militares Antigos do Rio de Janeiro (CVMARJ), Barone produziu dois documentários sobre a Segunda Guerra e escreveu o livro 1942: o Brasil e sua guerra quase desconhecida. Os três projetos surgiram de viagens de “resgate”. Em 2004, despachou seu Jeep 1944 para Paris e de lá seguiu até a Normandia para participar da comemoração dos 60 anos do Dia D. Dessa viagem nasceu o documentário Um brasileiro no Dia D, que conta a história do franco-brasileiro Pierre Closterman, descendente de franceses que nasceu em Curitiba (PR), em 1921, e foi o único brasileiro a ter participado do Dia D, como integrante da aviação francesa.
Em 2009, tendo novamente o Jeep como protagonista, partiu para a Itália e passou pelos mesmos lugares que seu pai, ao lado de outros soldados brasileiros, passaram. “Os brasileiros são lembrados até hoje com muito carinho pelos italianos pela forma como atuaram durante a guerra. Foi uma viagem muito emocionante”, diz. Dela, nasceu o documentário O caminho dos heróis, que refaz os passos e a luta da Força Expedicionária Brasileira (FEB) na Itália durante a Segunda Guerra Mundial.
Em 2014, Barone voltou à Normandia, desta vez para comemorar os 70 anos do Dia D e em 2015, foi a vez de retomar à Itália para participar dos festejos de 70 anos do fim da guerra. Nessas duas, o Jeep ficou na garagem, mas ele reconhece que foi graças a ele que as suas histórias surgiram.
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