O carioca Adriano Rodrigues de Oliveira conheceu o teatro há 15 anos, quando cumpria pena no Complexo Penitenciário de Gericinó, antigo Complexo Penitenciário de Bangu, no Rio de Janeiro.
Privado de liberdade há mais de uma década e depois de várias tentativas de fuga, ele já não tinha mais esperanças de sair dali vivo.
“Perdi meu pai, minha mãe e minha esposa [enquanto cumpria pena] dentro do sistema. Eu procurava a morte 24 horas por dia”
Hoje com 51 anos e em liberdade plena desde 2023 (depois de 14 anos em liberdade condicional), Adriano é um dos fundadores do Kriadaki, uma associação que, além do grupo de teatro, realiza ações culturais na favela do Jacarezinho.
“Muitos são salvos pela religião. Eu fui salvo pela cultura.”
Criado na comunidade do Jacaré, Adriano diz que “perdeu o rumo” cedo. Em uma família com 10 irmãos e um pai alcoólatra, ele afirma que não teve uma estrutura familiar que desse as referências de que precisava.
“Eu fui roubado desde o ventre da minha mãe. Roubaram minha educação e minha alimentação, me deixaram sem opção. Cresci e infelizmente fui marginalizado”, afirma Adriano, que estudou apenas até a quinta série.
“Nós temos que fazer uma mudança moral, porque a polícia entra com repressão e as coisas não evoluem. A educação que se dá para um não é a que se dá para todos – e aí, sem estudo, a gente nem tem conhecimento das consequências do que fez”
Depois de algumas passagens pelo Departamento Geral de Ações Socioeducativas (DEGASE) na adolescência, ele acabou condenado a 58 anos de prisão por assalto a banco em 1992.
Até que, em 2007, em Gericinó, conheceu um grupo de detentos que havia sido transferido de outro presídio. Ele era a “ligação” da penitenciária, a pessoa que podia circular entre as celas e tinha permissão para comprar lanches na cantina para os outros presos.
“Sempre que eu ia na cela dessa galera, eles falavam de abrir um grupo de teatro para ir ao Talavera Bruce [setor feminino do complexo]. E para a gente ir ao presídio das mulheres era uma utopia, né?”, diz Adriano. “Eu não acreditava que essa tal ‘cultura’ teria forças de nos levar ao presídio das mulheres.”
Um dia, Adriano resolveu arriscar. Viu o diretor do presídio no corredor e contou que alguns detentos queriam montar um grupo de teatro.
O diretor aceitou receber Adriano para uma conversa, na qual a vice-diretora acatou a ideia, e disse que tinha uma peça para adaptar: Os Saltimbancos.
“Eu voltei para a cela todo feliz”, diz. ‘Pô, essa mulher vai dar peça para a gente assaltar banco’. A peça seria fácil, roubar banco…, pensei que a mulher era das nossas.”
O crime, afinal, fazia parte de sua história – a cultura, ainda não. Quando recebeu o texto de Chico Buarque e entendeu que Saltimbancos não tinha nada a ver com “assalto a bancos”, Adriano diz que ficou decepcionado.
“Eu reclamei: cadê a peça para a gente assaltar o banco? Vi o texto e só tem bicho, cachorro, jumento. Eu não vou me vestir de jumento!”
Apesar da resistência inicial, os presidiários conseguiram montar Os Saltimbancos — a primeira peça realizada no Complexo Penitenciário de Gericinó, segundo Adriano. Apresentaram no pátio a crianças que visitavam familiares e, depois, no presídio feminino.
“Vi que através da arte podia passar emoção para as pessoas, abrir rodas de debates. Comecei a me sentir útil e isso me motivou, me mostrou que aquele era o caminho certo.”
O grupo, encabeçado por Adriano, Edson Sodré (63 anos, em regime aberto desde 2020) e Wellington Freitas (56 anos, um dos fundadores do Kriadaki, em regime aberto com tornozeleira eletrônica desde 2022), começou a escrever e apresentar as próprias peças.
De lá para cá, eles já encenaram em escolas, faculdades, parques, teatros e no Consulado da França, onde montaram, em 2018, Dois neurônios numa mente suja.
“As peças falam do nosso cotidiano. O preconceito sempre existe, gente que acha que somos malandros que vieram para a rua contar histórias… mas, depois de 15 anos, acho que conseguimos quebrar alguns preconceitos”
São as apresentações no DEGASE, porém, que mais dão orgulho a Adriano. Eles já estiveram em 27 unidades, nas quais, além das peças, realizam também rodas de conversas com os adolescentes.
“A maior parte da minha juventude passei no presídio de menor. Hoje, vou como ator.”
A educação não vem somente da escola, diz Adriano. Depende também de referência, bons exemplos na vida de uma pessoa.
Ele afirma que essas figuras de referências — ou “heróis”, como chama – fizeram falta em sua trajetória. E são uma peça fundamental para a ressocialização de ex-detentos.
“Eu virei protagonista da minha história depois de velho, porque tive oportunidades. Milhares de amigos meus não tiveram”
Outro motivo de orgulho para ele foi a inauguração da sede do Kriadaki, no Jacarezinho, em 2022.
“Era uma escola fechada; sempre abrem presídios e fecham escolas, mas a gente conseguiu abrir e colocar ali um curso profissionalizante. Tem informática, reforço escolar — tudo ‘no 0800’ [de graça para a população].”
Adriano faz questão de convidar quem tiver interesse para conhecer o local, na Rua Murilo, 14, no Jacarezinho, Rio de Janeiro. Manter o grupo não é fácil: o Kriadaki não recebe nenhum tipo de financiamento de governo ou empresas – é tudo “rodando o chapéu” (interessados em ajudar podem entrar em contato pelo número 21/97068-9491).
Para se sustentar, hoje ele depende do trabalho fora dos palcos, em obras e como ajudante de um advogado. Mas não esconde seus maiores sonhos: escrever um livro (para o qual já tem o título, Salvo pela arte) e ver o Kriadaki “viralizado”.
“A gente vai aos trancos e barrancos, mas queria ver o reforço escolar bombando e com merenda, o cinema com pipoquinha… Queria mesmo colocar a arte dentro do povo.”
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Giuliana Cavinato sofreu uma pancada forte praticando wakeboard que resultou num acidente vascular cerebral. Ela conta como uma técnica de reabilitação criada na Itália a ajudou a recuperar sua autonomia e a descobrir um novo propósito.