Qual é o nome que está escrito no seu documento? Talvez esta pergunta seja de simples resposta para você. Mas para uma pessoa trans ela pode ser constrangedora, abalar a auto-estima, e causar muito sofrimento. Esta é uma questão que permeia a sociedade e, como não poderia deixar de ser, bate às portas de empresas. Por isso, em um projeto inédito, a CI&T, multinacional de soluções tecnológicas, lançou o projeto “Meu nome, Meu Direito”, que oferece apoio à retificação de nome e gênero de pessoas colaboradoras trans interessadas.
“Esta é uma ação com resultados efetivos. Para trabalhar a diversidade, é preciso ir além das aulas, workshops e letramentos. Este projeto é uma ação concreta que a empresa pode fazer”, diz Antonia Moreira, travesti, analista de marca, colíder do Grupo de Ação LGBTQIAPN+ na organização e uma das idealizadoras do projeto.
O direito à identidade anda de mãos dadas com a dignidade e, inclusive, isso é reconhecido pela Constituição: desde 2018 pessoas trans podem requerir em cartório a retificação de seu nome e gênero. Entretanto, este processo não é tão simples e muita gente pode precisar de um apoio – é o que estava acontecendo, por exemplo, com algumas pessoas colaboradoras da CI&T.
Antonia conta que, em 2021, o grupo de ação LGBTQIAPN+ da empresa enviou uma pesquisa interna para pessoas colaboradoras que não tinham seus documentos atualizados e percebeu que havia uma demanda pela retificação. A empresa abraçou a ideia e decidiu fazer uma parceria com a ONG Casa Neon Cunha, que já realiza este trabalho. Até o momento, 4 pessoas colaboradoras já estão em processo de retificação – ainda há outras 6 vagas abertas.
APOIO DAS LIDERANÇAS
Para que a iniciativa fosse adiante, foi preciso contar com o apoio e o engajamento das lideranças.
“Líderes se comprometeram para fazer isso acontecer: tivemos respaldo jurídico e uma ação interna de políticas afirmativas. Não estamos propondo nenhum privilégio: trata-se de um benefício que vai ajudar a empresa a reter estes profissionais. É um amadurecimento empresarial”.
De acordo com Antonia, o impacto interno da ação foi positivo, as mensagens recebidas foram de entusiasmo e não houve ruídos. Segundo ela, a CI&T foi a primeira empresa em que ela, como travesti, recebeu um cartão com seu nome retificado, sem precisar passar pelo constrangimento de ter que usar um nome com o qual não se identifica. Mas isso é raro. Ela conta que, depois que transicionou de gênero, em 2018, muitas portas se fecharam. Chegou a ouvir de uma empresa que “o mercado é capitalista e só quer saber de lucro, portanto não podia contratá-la”.
“As mulheres trans, muitas vezes nem estamos no mercado de trabalho – até porque muitas nem tem a oportunidade de terminar o colégio. Não existe nenhuma estrutura para receber estas pessoas em nenhuma instituição. Então, nas empresas, ninguém quer investir em quem está começando e mal estudou. Estamos lá atrás, tentando vencer a barreira da educação básica, para depois chegar na universidade, e só então explicar ao mercado que precisa investir neste nicho se quiser realmente uma sociedade diversa”, diz ela, que, diferentemente da maioria, estudou em uma universidade de grande porte e atualmente é fellow do 2022-23 Human Rights Advocates Program da Columbia University, em Nova York.
UM POTENTE DIFERENCIAL
Antonia chama a atenção para que a diversidade – braço importante de toda a estratégia ESG – não seja um apêndice. “Não dá pra ter só a ‘turminha do ESG’ e o resto continuar tudo igual. Esta é uma fronteira que precisamos superar. A diversidade, os direitos humanos, são pilares do ESG e da sustentabilidade financeira do negócio. Se você quer uma empresa que dure séculos, precisa pensar nas questões contemporâneas, que fazem parte da sociedade em que vive”.
Segundo ela, uma empresa que contrata pessoas LGBTQIAPN+ tem muito a ganhar – especialmente quando se trata de lidar com adversidades. “Na pandemia, por exemplo, as empresas tiveram que encontrar soluções para o isolamento. Travestis conhecem melhor do que ninguém esta realidade – elas vivem na noite, isoladas do mundo. Quem tinha uma profissional com estas habilidades na equipe, saiu na frente”.
É preciso levar em conta, diz Antonia, toda uma vida destas profissionais – e não apenas um diploma.
“Uma pessoa trans não mudou apenas de gênero. Ela transicionou todo um mundo ao redor dela. Portanto, ela é capaz de trazer perguntas que nunca foram colocadas, uma nova perspectiva para sua realidade, com muita criatividade – porque assim é a vida dela. A maioria das mulheres trans, por exemplo, trazem experiência de liderança porque estiveram à frente de batalhas de movimentos sociais. São mudanças desruptivas, que só trazem benefícios”
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