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Na linha de produção da Doisélles, muita gente aprende a tecer o próprio caminho

Mirela Mazzola - 16 jun 2015 Raquell Guimarães, da Doisélles
Projeto Flor de Lótus, da estilista Raquell Guimarães, emprega hoje 40 internos de um presídio em Ribeirão das Neves, na Grande Belo Horizonte
Mirela Mazzola - 16 jun 2015
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A infância e a adolescência de Raquell Guimarães em Juiz de Fora (MG) remetem a uma época distante. Entre as imagens que ela guarda com carinho está a do avarandado da casa da avó materna, onde tias e primas se reuniam para tricotar entre novelos de lã e conversas ao sol da tarde.

Com apenas 5 anos, ela aprendeu as primeiras lições de crochê, com a avó paterna. Os homens da família, ligados à indústria têxtil, também a ajudaram a estreitar laços com o universo dos tecidos, moldes e teares.

Ao escolher a profissão, Raquell teve poucas dúvidas: moda, curso que frequentou em São Paulo e no Rio de Janeiro. Nos trabalhos da faculdade, sempre que possível, adaptava tarefas ao tricô e ao crochê. “No Brasil, esse tipo de artesanato é considerado um passatempo ou uma renda extra”, diz.

A dificuldade em conseguir mão de obra comprometida e especializada, somada a um episódio marcante na chegada a São Paulo, deram origem a uma pequena revolução no pavilhão 1 da Penitenciária Professor Ariosvaldo de Campos Pires, em Linhares (MG).

Quando chegou à capital paulista, em 2000, uma confusão no metrô levou Raquell a se deparar com o já desativado Complexo Penitenciário do Carandiru, pertinho de uma das estações. Quem conversou com ela e a ajudou a tomar o sentido certo do trem foi a mãe de um detento, que levava uma televisão para ele. “Essa história me marcou para sempre e me ajudou a enxergar pessoas encarceradas com mais naturalidade”, afirma.

A primeira coleção da grife Doisélles, lançada oito anos depois, foi confeccionada por amigas e familiares da estilista. “Tentei montar uma cooperativa e fazer parcerias, mas como a forma que cada senhora tricota é diferente, não conseguiria manter o padrão. Sem contar que a maioria não quer fazer do artesanato seu único ganha-pão”, lembra Raquell.

O COMEÇO DE UM TRABALHO

A estilista então procurou a Comissão de Direitos Humanos da Câmara Municipal de Juiz de Fora, que sugeriu que ela começasse um trabalho com vinte detentos. Era o início do projeto Flor de Lótus. Raquell ensinou os presos a tricotar segundo o padrão que precisava e, em troca, eles descontavam o trabalho da pena (um dia de liberdade para cada três trabalhados) e ganhavam um salário, metade depositada em uma poupança e a outra encaminhada à família.

Doisélles, de Raquell Guimarães

Detento trabalhando em peça da Doisélles

Atualmente, o trabalho é realizado por 40 internos do Complexo Penitenciário Público-Privado de Ribeirão das Neves, a 30 quilômetros de Belo Horizonte, onde Raquell, 35 anos, vive com a família (ela tem um filho de 1 ano, José, e está grávida do segundo menino).

Para ela, o mais importante é o trabalho realizado do lado de fora da penitenciária. “Entre aqueles muros, praticamente todos querem se recuperar. O problema é o que os espera do lado de fora, como a discriminação da sociedade e o reencontro com o crime”, diz.

Raquell conta ainda que o índice de reincidência de quem já passou pelo projeto é zero. “Tenho os contatos da maioria e um dos participantes é meu braço direito na Doisélles hoje”. Ela também busca inserir ex-internos no mercado de trabalho por meio dos contatos que mantém com empresários.

O Flor de Lótus já atendeu 500 pessoas – Raquell também presta consultoria para iniciativas semelhantes em outros Estados, como o Pará – e foi destaque em jornais  internacionais, como o francês Le Monde e o inglês The Guardian.

Ano passado, algumas peças compuseram o desfile da Iódice na São Paulo Fashion Week. O trabalho dela (e o dos detentos) pode ser conferido nas lojas das Doisélles em São Paulo, Nova York, São Francisco e Tóquio.

 

Esta matéria, e muitas outras conversas de marca da Natura, podem ser encontradas na Sala de Bem-Estar, na Rede Natura.

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