Janelas panorâmicas deixam o vento, a luz e as ideias circularem no BiotechTown, hub privado de inovação em biotecnologia e ciências da vida inaugurado em julho de 2018 em Nova Lima, na região metropolitana de Belo Horizonte. O espaço de 2,1 mil metros quadrados em nada lembra laboratórios convencionais: em vez de corredores frios e portas com aviso de “não entre”, há paredes translúcidas, áreas de convívio coloridas e um jardim.
A arquitetura favorece a interação entre startups e investidores. A proposta é fazer com que a biotecnologia atravesse os muros universitários, chegue ao mercado e à população — fornecendo conhecimentos em gestão, prospecção, relacionamento e vendas a cientistas-empreendedores que nem sempre têm uma bússola afinada para os negócios. “Nosso objetivo é exatamente preencher esse gap e viabilizar empresas nascentes”, diz Pedro Vidigal, CEO do BiotechTown.
Ele sempre teve um pé na pesquisa e outro no mercado. Pós-doutor e professor licenciado de medicina na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Pedro é presidente da Anbiotec Brasil (Associação Nacional de Empresas de Biotecnologia) e ex-diretor da Fundepar (Fundep Participações), que desenvolve novas empresas de origem acadêmica e é sócia majoritária do BiotechTown, com 51%.
A outra sócia é a Codemge (Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais), por meio da Codepar, sua subsidiária. Juntas, já aplicaram mais de R$ 6 milhões no hub desde a inauguração — e a previsão é elevar o investimento para R$ 36 milhões até 2024.
“Há uma diferença entre invenção e inovação. Geralmente a academia inventa. Entretanto, a invenção só se torna inovação quando traz resultados econômicos ou benefícios para a sociedade. Inovação é o que fazemos no BiotechTown”
Inovar em bionegócios, explica o CEO, envolve dedicação, paciência, um período maior de maturação. “Não dá pra fazer biotecnologia na garagem.” Como qualquer projeto de hard science, demanda maquinários, laboratórios, investimentos robustos. É um dinamismo diferente de outros segmentos da tecnologia (é incomum, por exemplo, que startups de biotecnologia pivotem). Minimizar riscos para investidores, portanto, é crucial.
MENTORIA E INVESTIMENTO COMO ATALHOS PARA O MERCADO
O Programa de Desenvolvimento de Negócios do BiotechTown impulsiona empresas em fase de tração e escalonamento. Durante 12 meses, os empreendedores têm aulas e mentorias com especialistas em assuntos regulatórios, inteligência de mercado, captação de investimento, planejamento estratégico, marketing, propriedade intelectual, prospecção e vendas.
Após uma imersão “in loco” de um mês, que serve para traçar um diagnóstico da startup, o cronograma passa a ser semipresencial: uma semana por mês no hub e o restante por videoconferência e outros meios de comunicação. Segundo o CEO, esse formato parcialmente remoto não compromete o relacionamento. O próprio Pedro “entra em campo” para fomentar conexões necessárias entre empreendedores e executivos.
“Se for preciso, participo das reuniões, faço a introdução do negócio e ‘vendo o peixe’. Afinal, somos um dos acionistas”
A região já conta com uma aceleradora de startups com foco em ciências da vida: a Growbio, da Biominas, inaugurada em 2016. O BiotechTown, porém, refuta a comparação, afirmando se diferenciar de outras acelerações por meio de um programa “totalmente customizado”, com alocação de mão de obra própria para trabalhar nas startups e investimentos de R$ 100 mil a R$ 300 mil por empresa, que podem ser gastos em equipamentos, insumos, contratações, cursos, congressos, feiras etc.
O uso do dinheiro fica a critério dos empreendedores, desde que dentro das metas do plano de negócio traçado junto aos mentores. Como contrapartida, o BiotechTown tem participação de 8% a 15% em cada negócio. A expectativa é que as empresas gerem um retorno de 10 a 20 vezes seu valor de mercado em fase inicial — o equivalente a uma recompensa de R$ 15 milhões a R$ 30 milhões por startup nos próximos anos.
EM BREVE, O HUB TERÁ UM LABORATÓRIO E UMA PLANTA DE PRODUÇÃO
Até para estimular o encontro entre empreendedores iniciantes e executivos tarimbados, o hub tem estrutura de coworking, com 64 estações de trabalho e nove salas, alugadas para sete companhias do setor: desde a multinacional Erba Mannheim, voltada à indústria de diagnóstico in vitro, até empresas menores como Enzytec (especializada em registros de patentes, marcas e propriedade intelectual) e a Biotech Logística, que transporta material biológico, equipamentos e medicamentos sensíveis.
No espaço de um antigo galpão estão sendo construídas duas estruturas previstas para o fim de 2019: o Open Lab, um laboratório multiuso de 363 m² que poderá ser alugado e compartilhado por empresas para o desenvolvimento de produtos e serviços de microbiologia e biologia molecular; e o CMO (Contract Manufacturing Organization), uma planta de produção com 500 m² para companhias que precisem de uma área licenciada e certificada para desenvolver lotes-piloto ou lotes comerciais dos seus produtos.
“Ao invés de construírem a própria fábrica ou o laboratório, empresas e pesquisadores poderão usar essas estruturas, pagando pela locação dos espaços”
Para ampliar a estrutura laboratorial e oferecer equipamentos específicos, o hub firmou um acordo com o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (em outras frentes de atuação, há ainda parcerias com mais entidades, como a UFMG, a Rede de Cuidados de Saúde (RCS) e a Fiocruz). Enquanto o laboratório e CMO não ficam prontos, as startups podem usar a estrutura e equipamentos do Instituto — e também futuramente, caso tenham demandas laboratoriais específicas.
DE LEVEDURAS INTELIGENTES À REDUÇÃO DE TESTES EM ANIMAIS
Mas e as startups? A primeira edição do Programa de Desenvolvimento de Negócios do BiotechTown começou em outubro e ainda está em andamento. São cinco empresas mineiras e outras quatro de Campinas, Goiânia, Vitória e Mossoró (RN). Espera-se que as nove estejam comercializando e faturando até dezembro.
Um desses negócios é a OncoTag, voltada a elevar a expectativa de vida de pacientes oncológicos. Hoje, a empresa de Belo Horizonte comercializa um teste molecular para que médicos identifiquem o perfil genético de pacientes com câncer de ovário de modo a prever a resposta à quimioterapia e conduzir tratamentos mais eficazes, com métodos menos invasivos e maior tempo de sobrevida. Segundo o CEO do BiotechTown, desde que chegou ao hub, a startup reduziu seu “time to market” em um ano e meio.
Outra acelerada, a goianiense InsilicAll aplica inteligência artificial e big data para criar o que a empresa anuncia como a primeira plataforma digital de “drug discovery” da América Latina. A ideia é desenvolver e testar novos medicamentos por meio de cruzamento de dados, evitando o uso de cobaias. Uma vantagem adicional seria otimizar os processos de pesquisa, reduzindo o tempo de experimentação.
Uma terceira aposta é o Laboratório da Cerveja, que mira o setor de cervejarias artesanais com a oferta de leveduras líquidas (que em tese adicionam mais complexidade de sabor e aroma do que leveduras secas) e análises microbiológicas, possibilitando mais rigor no controle de qualidade e incrementando a produção da bebida. Hoje, a startup belo-horizontina utiliza a estrutura da UFMG, mas a ideia é ocupar o Open Lab a partir de dezembro, aumentando assim sua capacidade produtiva.
A segunda edição do programa está com inscrições abertas até 18 de agosto para startups em fase de tração. Em comum entre as empresas e o hub, segundo seu CEO, está a ambição de buscar o progresso, mas não o “lucro pelo lucro”:
“Ninguém está aqui por ideologia, mas queremos gerar impacto, conexões, algo que faça diferença para a inovação, para a sociedade e para o desenvolvimento regional e nacional.”
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