É inegável que marcas são motores de transformação social. Elas não somente refletem o mundo, mas também criam mundos. Concebem novas formas de produção. Estabelecem padrões de consumo. Dão luz a novos comportamentos.
Por tudo isso, as marcas têm o poder de estimular novas maneiras de fazer negócio e de se viver em sociedade. Ativar esse poder de forma eficiente e consistente representa muito mais do que uma diferenciação competitiva.
Diante de um cenário contemporâneo de grave crise climática e aumento das desigualdades sociais, não faltam oportunidades para as marcas gerarem transformações efetivamente positivas. E riscos por não o fazerem, também.
Por que então as marcas, que se construíram como importantes ativos mercadológicos ao longo do tempo a partir do domínio das ferramentas de comunicação, ainda enfrentam desafios ao abordar temas relacionados à sustentabilidade e ao impacto positivo?
Por que não utilizam todo o conhecimento que dominam sobre uma boa comunicação a serviço de um assunto tão relevante e urgente como a sustentabilidade?
Por que, diferentemente das usuais campanhas publicitárias, esse tipo de comunicação ainda carece de sedução e engajamento?
Partindo de perguntas como essas, o estudo “Green Dull: How to put an end to boring sustainability communications”, publicado recentemente pela Revolt London, agência ativista inglesa, traz interessantes reflexões e provocações sobre o tema.
A pesquisa mostra o quanto a comunicação sobre sustentabilidade ainda é enfadonha, constituindo-se atualmente não apenas em um problema para as empresas, mas também em um entrave a mais para as tão necessárias e desafiadoras transformações socioambientais.
Segundo o estudo, há um perigoso descompasso entre a gravidade da crise climática e social, que requer mudanças urgentes, e a ineficácia de grande parte da comunicação voltada para o tema.
“Todos nós pagamos o preço por um trabalho que não consegue comover corações e mentes”, pontua o relatório da agência inglesa.
A metodologia utilizada pela Revolt parte da análise das emoções associadas às campanhas de sustentabilidade de grandes corporações, marcas, startups e ONGs provenientes de prêmios criativos e estratégicos como Cannes e Effie’s, ao longo dos últimos dez anos.
Como conclusão primeira é apontado que a maior parte da comunicação ligada a temas sustentáveis se encontra no espectro neutro ou de baixa emoção.
Em outras palavras, temas sustentáveis são comunicados, predominantemente, de forma enfadonha, sendo incapazes de emocionar ou engajar o público-alvo pretendido
Com o objetivo de apresentar possíveis soluções para o problema revelado, o estudo discorre sobre nove maneiras de provocar emoção e gerar mais impacto na comunicação sobre sustentabilidade, a partir de três grupos de possíveis abordagens: “Sentimentos mais profundos” (“Deeper feelings”), “Sentimentos viscerais” (“Gut feelings”) e “Sentimentos inabaláveis” (“Unshakeable feeelings”).
Cada um dos grupos se desdobra em outros três caminhos conceituais acompanhados de peças de comunicação que os exemplificam.
Ainda que as provocações e recomendações do estudo sejam extremamente valiosas para repensarmos a comunicação de marcas e instituições a respeito de temas sustentáveis, entendemos ser igualmente importante compreender que o rico cardápio de abordagens criativas apresentadas não pode ser considerado em isolado.
A criatividade é, sem dúvida, uma das premissas fundamentais de uma comunicação de excelência. Isoladamente, porém, não dá conta de contribuir com soluções concretas para os desafios socioambientais que estão postos e sobre os quais as marcas têm ingerência.
Uma comunicação criativa somente será válida se outras premissas anteriores forem cumpridas, como a clareza sobre o problema, a coerência e a verdade da promessa apresentada, a compreensão profunda sobre o público-alvo e a intencionalidade da mensagem, ou seja, o que se espera que esse público sinta e faça a partir daquela comunicação
Essas premissas, que são básicas para toda e qualquer boa comunicação, ganham camadas extras de complexidade quando falamos especificamente sobre a comunicação de temas sustentáveis. Mas que complexidade seria essa?
Comecemos pela clareza do problema a ser endereçado. Problemas relacionados a temas sustentáveis são problemas sistêmicos e sua compreensão exige aprofundamento e densidade de análise por meio de um pensamento crítico especializado.
Se não estudarmos verdadeiramente o problema, é preciso desconfiar: estamos navegando apenas em sua superfície e a comunicação irá, obviamente, refletir tal superficialidade.
Em um mundo onde a informação circula em alta velocidade e a transparência é cada vez mais exigida de empresas e instituições, as marcas são chamadas a exercer seus papéis socioambientais de forma concreta, uma vez que suas atuações estão significativamente mais expostas.
A ausência de profundidade sobre o assunto ou tema endereçado na comunicação de sustentabilidade leva, via de regra, a uma outra armadilha: promessas vazias.
A comunicação não pode se resumir a um ponto de vista da marca em relação a um tema sustentável. É preciso agir de acordo com esse ponto de vista.
Para que a comunicação seja convincente e engajadora, o discurso precisa estar contido na prática e compatível com o potencial transformador daquela marca em específico. De marcas fortes, esperam-se cada vez mais ações concretas e igualmente grandiosas.
Conhecer profundamente o público para o qual se destina a mensagem é outra premissa fundamental para uma boa comunicação sobre temas sustentáveis. Pessoas diferentes, em contextos de vida distintos, compreendem e vivem a sustentabilidade também de formas distintas
Traduzir corretamente os aspectos ambientais e sociais contidos na mensagem em dimensões conectadas com a realidade específica do público-alvo é outra condição para uma comunicação eficiente e engajadora. Não há mensagem mobilizadora sobre temas sustentáveis sem essa tradução.
Além de permitir a adequação da forma e conteúdo da mensagem, o conhecimento apurado sobre o público também se apresenta como ponto-chave para termos clareza sobre a intencionalidade da comunicação.
Ou seja, o que esperamos que esse público sinta e faça ao ser impactado pela mensagem e, mais do que isso, como essa ação esperada contribui na solução do problema mapeado.
Por fim, em nossa visão, abordagens comunicacionais simplistas e superficiais que geram os chamados greenwashing e socialwashing, constituem-se em um grande risco para marcas que pretendem se apresentar como socioambientalmente responsáveis.
E se a criatividade estiver a serviço desse tipo de comunicação, tal risco se potencializa vertiginosamente, uma vez que a visibilidade proporcionada pela abordagem criativa pode expor de forma ainda mais intensa as inconsistências entre o discurso e a prática.
Seria, no mínimo, ingênuo acreditar que apenas o talento criativo, desprovido de qualquer outro suporte, seja, em si, um recurso capaz de evitar o risco financeiro direto e indireto, reputacional ou legal, para uma marca inserida no contexto social e mercadológico contemporâneo.
Por outro lado, se estivermos atentos à profundidade que o assunto demanda, há um valor imenso na criatividade aportada na comunicação de temas sustentáveis, gerando resultados concretos não só para as marcas, mas também para a sociedade.
Afinal, se os problemas socioambientais que estão postos no cenário global não se apresentam, nem de longe, como simplórios ou pouco desafiadores, por que a comunicação para suas supostas soluções assim deveria ser?
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