por Fabio Zoppi Barrionuevo
Nunca ouvimos tanto sobre tecnologia como nos últimos anos. Que a Inteligência Artificial mudará os mercados, o Blockchain trará novas oportunidades, a Internet das Coisas com o 5G deixará o mundo diferente e um monte de outras previsões que prometem transformar nossos destinos com Big Data, Realidade Virtual, Realidade Aumentada, Impressão 3D em metal, entre outras. Contudo, nossas vidas seguem como sempre foram: um dia de cada vez!
Dentre tantos aspectos importantes para tornar uma tecnologia um sucesso no mercado, aponto como um dos mais representativos: a figura do empreendedor ou da empreendedora. Não aquela à frente de um negócio próprio, necessariamente, e sim a pessoa que vê o que a grande maioria não vê. A grande questão é que para esse tipo de pessoa, a inquietude a faz partir para a ação.
Faço parte desse perfil. Empreendi por 12 anos um negócio próprio na área de tecnologia industrial. Experimentei sucessos, geri equipes, processos e ótimos fluxos de caixa nesta fase.
Também experimentei fracassos, trabalhando somente com meu sócio e sozinho, assíncrono com o mundo, para me recuperar desses tombos. Acredito que tudo isso é meu maior patrimônio e o que me fez chegar até aqui
Atualmente estou responsável por um dos programas de desenvolvimento de startups do Sebrae/SP, onde continuo a aprender com tudo e todos. E foi com a inquietude de um profissional em início de carreira que embarquei, em setembro de 2019, para Israel em uma visita prospectiva, representando a instituição juntamente com a diretoria e o conselho de administração, com o objetivo de criar o novo para a nossa organização e para os nossos clientes.
Já é sabido que Israel tem o maior número de startups per capita do mundo, sendo uma das nações que mais desenvolvem com sucesso empresas com crescimento exponencial. O nosso desafio ali era, em pouco tempo, absorver o máximo de cada visita que fazíamos e também do todo experienciado, juntamente com a cultura intrínseca em cada metro quadrado que andávamos.
Sabemos que uma startup é uma experiência de alto risco e, consequentemente, de muito aprendizado. Ter tido a oportunidade de conversar com profissionais de lá que trabalham em equivalência a nossa, foi, sem dúvida, disruptivo na maneira de pensar. Pois somado às mesmas dificuldades de mercado que qualquer novo negócio tem, existem os fatores educacionais e culturais a serem compreendidos.
A conclusão que cheguei é que não existe nada a ser copiado do ecossistema de Israel, nenhuma ação ou processo, nada! Precisamos, sim, compreender como o país chegou aonde está
Israel é conhecido por estar em um ambiente geopolítico conflituoso. Foi fundado em 14 de maio de 1948, com base em uma resolução aprovada em 1947 na ONU (que previa a divisão do então território da Palestina em um estado árabe e outro judeu). No dia seguinte à sua criação, o país já entrava em sua primeira guerra. Assim, nascia a impermanência da paz para seus cidadãos e a necessidade de estruturas militares para proteger o território.
A Unidade 8200 faz parte desta estrutura, sendo uma unidade do Corpo de Inteligência de Israel, surgida em 1952 e responsável pela coleta de inteligência de sinais e leitura de códigos criptografados. Sua composição se dá, principalmente, por jovens entre 18 e 21 anos, muitos vindos de programas pós-escolares que ensinam codificação e hacking por computadores. Essa unidade é provavelmente a principal agência de inteligência do mundo e seus integrantes conduzem as operações com um grau de firmeza, propósito e obstinação dificilmente encontrado em outros lugares.
Ex-integrantes da Unidade 8200 fundaram muitas das empresas de alta tecnologia mais bem-sucedidas do Estado de Israel ou passaram a ocupar posições de destaque em muitas empresas de TI no Vale do Silício e no mundo
Atualmente, existe um programa de desenvolvimento de startups chamado “8200 Entrepreneurship and Innovation Support Program”, criado também por ex-integrantes da unidade e destinado a orientar empreendedores na fundação de novos negócios, ajudando o país a passar de uma luta militar para uma luta econômica. Esta aceleradora integra um dos mais de 261 programas que foram criados desde 2011 como parte de um ecossistema de inovação em amadurecimento.
Se comparado ao Brasil, Israel é um país muito pequeno territorialmente, o equivalente ao estado de Sergipe. Contudo, há diversas universidades de ponta por lá, como a Universidade Hebraica de Jerusalém, a Universidade de Tel Aviv, a Universidade de Haifa, a Universidade Bar-Ilan, a Universidade Ben-Gurion do Negev, o Technion (Instituto Israelita de Tecnologia), o Instituto Weizmann da Ciência e a Universidade Aberta de Israel. Delas saíram muitos prêmios Nobel e também muitos empreendedores de sucesso. Assim, juntamente com as organizações militares, esses polos ajudam o país a ser reconhecido como Startup Nation.
Leia também: “O que faz as startups de Israel terem tanto sucesso? Elas são como as flores no deserto de lá”
Além das demandas militares, da pesquisa dentro de universidades, da formação tecnológica e da cultura empreendedora dos cidadãos, o que pude ver foram grandes empresas de tecnologia instaladas no entorno das universidades para desenvolver demandas civis, criando Parques Tecnológicos. Tudo isso potencializou o surgimento e o sucesso de startups como o Wix, em franco crescimento, o Waze, comprada pelo Google, a Mobileye, comprada pela Intel, ICQ, Viber, entre tantas outras.
Dentre as cidades que compõe o ecossistema de inovação de Israel, a que mais me impressionou foi Beer-Sheva. Olhando para o mapa do país, a cidade encontra-se no centro, onde começa o deserto de Negev. Ou seja, quase nada está pronto por lá, apenas a Universidade Ben-Gurion do Negev, fundada em 1969
Em 2013, foi criada o Advanced Technologies Park (ATP), uma parceria pública-privada entre a Universidade Ben-Gurion, Prefeitura Municipal de Beer-Sheva e uma empresa internacional do ramo imobiliário e outra nacional do mesmo ramo. Na ocasião, segundo os israelenses, o então presidente da universidade disse que seu sonho era que a instituição de ensino fizesse por Beer-Sheva o que a Universidade Stanford fez para o início do Vale do Silício.
De fato, com muito propósito envolvido, o que pudemos ver era um parque tecnológico denominado HiTech Park, com alguns prédios de seu projeto entregues meses antes, além de máquinas trabalhando na infraestrutura em estradas no entorno e com grandes empresas e startups já operando nos prédios, conectados por uma passarela de pedestres ao campus da Universidade Ben-Gurion. Pelo projeto, o governo de Israel também participará das transferências de tecnologia, com o Israel Defense Forces Technology Campus (ou IDF Technology Campus).
Retornei da missão satisfeito com o que vi e vivi lá, continuando a trabalhar e estudar, e sonhando com o dia em que os esforços de todos os brasileiros do passado construído e deste presente incerto transformarão nosso país dos commodities em um país com ótimas oportunidades para todos, efetivamente e sem distinção a quem.
Fabio Zoppi Barrionuevo, 39, é gestor estadual de programas para startups do Sebrae paulista. Acredita em atitudes empreendedoras como ferramenta para as transformações que o Brasil precisa.