Nos últimos anos, um grande número de startups aceitaram o desafio de democratizar o conhecimento. Uma delas se especializou em unir design e ciência em uma plataforma que disponibiliza artes prontas para o próprio autor de aulas e artigos montar suas apresentações: a Mind the Graph.
O projeto é de Fabrício Pamplona, 33, empreendedor e cientista “desde que se conhece por gente”. Doutor de Farmacologia, ele fez mestrado, doutorado, pós-doutorado. Especializou-se na comunicação científica, publicando trabalhos e acompanhando de perto as tendências do meio. Para viabilizar a parte visual, que seria o DNA da empresa, ele apresentou a ideia da startup para Leonardo Minozzo, 33, designer experiente com quem esbarrava sempre em palestras.
Juntos, eles idealizaram as ferramentas que, hoje, ajudam acadêmicos a traduzir conteúdos em imagens simples e didáticas, uma alternativa à busca indiscriminada de imagens no Google ou em bancos de imagem gratuitos. “A gente começou a se encontrar em workshops, e eu imaginei que, no mínimo, tínhamos interesses em comum. O Leo foi o primeiro cara que eu tive de convencer, porque ele era muito experiente e crítico. Demoramos para configurar a ideia”, conta Fabrício. Mas a dor do cliente estava muito clara para ele: a maioria dos artigos científicos é complexa, não tem fluxo de leitura e nem apelo visual. Essa produção parecia parada no tempo, entre os textos de enciclopédia e as imagens de PowerPoint.
A primeira saída foi oferecer gráficos e ilustrações, como freelancers tradicionais, cobrando por arte. Fabrício ajudava a “traduzir” os pedidos dos usuários e Leonardo fazia a concepção das imagens. Não deu certo. Durante os primeiros testes, as idas e vindas de material tornaram o trabalho caro e demorado. “Esse processo era muito doloroso e a conta não fechava”, diz Leonardo.
EM VEZ DE FAZER, O VALOR ESTAVA EM EMPODERAR PESSOAS PARA FAZER
Isso também mostrou que o usuários não estavam tão abertos a sugestões por parte dos designers, e foi assim que a Mind the Graph assumiu que sua missão seria outra: se tornar uma plataforma “faça-você-mesmo”. Douglas Gimli, 25, foi “o cara” nessa transformação. “Programei o primeiro protótipo e foi um desafio gigante em um curto espaço de tempo”, conta o desenvolvedor.
Em 2014, essa versão foi criada dentro do Sinapse da Inovação, programa do Estado de Santa Catarina. Lá, conseguiram 80 mil reais de investimento e se assumiram como startup. Quando tinham acabado de rodar um protótipo, saíram no Draft, na seção de novos negócios chamada Acelerados.
Na nova plataforma, o usuário podia arrastar e aplicar as imagens em seus próprios gráficos, usando templates pré-definidos. E lá se foram outros meses para validar o novo produto.
Para ver se ele estava afiado, Fabrício convidou 100 usuários da sua rede de pesquisadores, de oito países diferentes, para testar todas as funções. O lançamento também chamou atenção na Campus Party daquele ano. Ele conta:
“Cogitamos cobrar por cada ilustração usada, mas migramos para uma versão gratuita para ganhar tração. A grande mudança de mentalidade de modelo de negócio foi a escala”
A estratégia, enfim, deu certo. Em um ano, a empresa triplicou seu número de usuários – hoje são mais de 3 500 – e passou a atender demandas de cientistas de 50 países. Em janeiro, a Mind the Graph adotou o modelo de assinaturas: 9 dólares por mês (ou 60 dólares por ano, por um custo equivalente a 5 dólares mensais) dão direito a usar todas as ferramentas, e o assinante pode, ainda, pedir imagens que não encontrou no banco gráfico. As demandas extras, eles contam, são bem específicas. “Por exemplo, sabemos que o pesquisador sabe exatamente a diferença entre um rato e um camundongo. Aqui, não só temos essa consciência, como produzimos imagens de diferentes linhagens dessas espécies”, diz Fabrício.
Há ainda outra fonte de receita: a produção de conteúdo patrocinado para empresas e instituições, incluindo universidades gringas, interessadas na atenção de quem experimenta o Mind the Graph. “Conseguimos um tempo de retenção entre 18 e 20 minutos, o que torna a plataforma interessante para patrocinadores e pode ajudar a bancar a versão gratuita”, diz o CEO.
O valor cobrado e o processo criativo não são as únicas diferenças entre o trabalho da startup e os jobs sob encomenda feitos por infografistas freelancers. Todas as licenças de uso das imagens da Mind the Graph estão dentro da Creative Commons, ou seja, podem ser publicadas pelos autores, inclusive em veículos de mídia, sem qualquer implicação legal. Para os sócios, isso faz todo sentido, pois todo o processo é uma cocriação.
O EMPURRÃO PARA ESCALAR
Desde março de 2015, a startup opera dentro do Cafundó Estúdio Criativo, escritório de Leonardo em frente à Lagoa da Conceição, em Florianópolis. A equipe é formada por um infografista, um desenvolvedor, além de uma bióloga, também responsável pela comunicação. Além deles, há três estagiários para realizarem vendas internacionais — principalmente na China, Noruega e Alemanha. Recentemente, eles receberam seu maior aporte, 380 mil reais do CNPq, em um programa que fomenta o empreendedorismo científico e atrai cientistas para dentro de empresas. A Mind The Graph ficou, ainda, entre as oito empresas mais promissoras em um edital de economia criativa da Samsung (em parceria com a CCEI Daegu e a Anprotec), que vai lhes render mais 200 mil reais até o segundo semestre deste ano.
Com os incentivos, a equipe tem conseguido trabalhar mais tranquila. Quer dizer, sem preocupações para financiar o desenvolvimento do negócio, mas na correria para deixar a plataforma cada vez mais completa e expandir o serviço internacionalmente. Aliás, este plano é levado tão a sério desde o início, já que os sócios não consideram a Mind the Graph uma empresa nacional. “Não nos posicionamos como empresa brasileira”, diz Fabrício, apostando na universalidade das imagens. Tanto que o site é totalmente em inglês. Esse planejamento também se reflete na escalada da empresa, até agora constante. O sócio diz:
“A gente ainda não explodiu, mas acho que por termos nos preparado muito, temos as condições e sabemos o caminho. Não foi uma coisa de impulso”
Para essa “explosão” acontecer, os sócios dizem que é inevitável buscar um aporte para investir especificamente em marketing, mas que essa ainda não é prioridade. Por enquanto, os esforços estão concentrados na melhora da experiência do usuários e no aumento da variedade de imagens disponíveis para os cientistas, além das vendas B2B — que na opinião dos sócios é o que vai trazer o lucro “grosso” para a startup. Douglas tenta resumir os desafios mais urgentes: “Como a maioria das empresas jovens, precisamos monetizar, manter uma equipe boa e buscar inovações, sem esquecer do nosso real objetivo, que é ajudar os cientistas a divulgar e consumir conteúdo de forma mais objetiva e clara”.
O FUTURO PODE SER MUITO MAIS VISUAL
Para manter a motivação, nada melhor do que exemplos práticos de que eles estão no caminho certo. Um dos gráficos mais famosos sobre a relação do vírus Zika e a microcefalia circulando pela web foi feito com o Mind the Graph. Pelas redes sociais, a equipe também recebe feedbacks constantes de pesquisadores que estão usando a ferramenta.
Fabrício fala seguro da empresa, não só por ter conhecimento do que a comunidade científica sente falta, em termos de alcance. Ele aposta que não é o único sonhando com estudos e pequisas que pareçam menos lista telefônica e mais gibi: “O artigos científicos do futuro não são estáticos. A aceitação pode ser devagar, mas a ideia é que eles se tornem multimídia, com vídeos, entrevistas, chats, figuras, animações, hiperlinks”. E a Mind the Graph quer estar na dianteira dessa transformação.
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