Quem nunca associou diversão para idosos a um bailinho da terceira idade? Mas no Divas Dance você não encontrará nenhuma senhora esperando ser tirada para uma valsinha.
Basta a aula começar e elas estarão dançando e cantando ao som de músicas dos anos 1960/70 e ritmos de hoje, sem preocupação com coreografias. Depois do exercício, as “divas” (como as alunas são chamadas) ainda têm pique para sair e planejar viagens.
Surgido como um projeto dentro da academia Vip Training, em Brasília, o negócio se propõe a integrar mulheres de 50+ pela atividade física. Segundo a empreendedora, Roberta Marques:
“É super gratificante perceber que ajudamos alguém a se reencontrar, de que as alunas se sentem pertences de novo, ainda mais numa época da vida na qual elas muitas vezes não têm mais perspectivas de ‘pertencer’ a alguma coisa”
O Divas Dance começou em 2010 — e não demorou a dar mostras de como ajudava a conectar (e a empolgar) as senhoras. Em 2012, esbanjando bom-humor, um grupo delas participou do programa “Mais Você”, depois de coletar mil assinaturas.
“Elas queriam muito participar”, diz Roberta. “Quando vi a repercussão, percebi que o projeto era mais promissor do que eu imaginava.”
Homens e mulheres mais novas não precisam se sentir excluídos do Divas Dance. Se quiserem participar das atividades, serão bem-vindos, afirma a empreendedora.
“Mas por uma necessidade de nos posicionarmos, de trabalhar com a autoestima feminina e criar conexões entre essas mulheres maduras, focamos nossa comunicação neste segmento, até porque existem diversas iniciativas para os outros grupos.”
APÓS A MORTE DO AVÔ, ELA DECIDIU AJUDAR A RESGATAR A VITALIDADE DA AVÓ
A ideia do Divas Dance veio a partir da experiência de Roberta, 43, professora de educação física, com sua avó.
Dona Hilda passou muito tempo cuidando do marido, com a saúde debilitada. “Ela tinha uma vida social muito ativa, era conectada com vários grupos, mas deixou de fazer tudo para acompanhar meu avô nessa fase.”
Até que, em 2007, o marido de dona Hilda faleceu.
“Minha avó se viu perdida em um ‘mar de tristeza’… Não tinha ânimo para nada, não sabia qual era o lugar dela no mundo… Estava sem identidade”
Em 2009, dona Hilda tomou coragem e contou com o apoio da filha e da neta para, aos 82 anos, voltar a se exercitar na academia gerenciada pela família e fundada há duas décadas.
Porém, continuava com o “olhar perdido”, diz a neta.
A situação só mudou quando, em 2010, Roberta a convidou para uma aula de dança para senhoras que seria oferecida na academia de forma experimental.
MAIS DO QUE DANÇA: AS AULAS COMO UMA OPORTUNIDADE PARA SE CONECTAR
Aquela primeira aula foi um “desastre”, diz Roberta; ela ainda não adaptara a metodologia pensando nas condições físicas do novo público.
Mas, surpresa: as alunas adoraram a experiência. Inclusive sua avó.
“Senhoras que antes treinavam sozinhas na nossa academia começaram a se interessar pelas aulas de dança… E passaram a vir com o cabelo arrumado e batom”
Foi aí que Roberta notou que havia algo mais importante do que a dança nessa história: a conexão entre as participantes.
Resolveu, então, criar atividades para além da sala de aula, como idas em grupo a cafés, palestras e mesmo viagens. E assim nascia o Divas Dance.
Dona Hilda morreu aos 83 anos — mas, por nove meses, aproveitou a programação. “Acredito que tem um pedacinho da minha avó em cada diva que passa no nosso caminho.”
ELA VIU QUE PODERIA DIFERENCIAR SEU NEGÓCIO COM INVESTIMENTO BAIXO
Na época em que o Divas Dance surgiu, a academia de Roberta acabara de mudar de uma área residencial para uma região comercial.
A empreendedora viu que poderia diferenciar seu negócio com um investimento baixo. “Era preciso apenas uma sala de aula com espelho, um som e uma professora capacitada.”
O que ela não esperava é que donos de outras academias viriam procurá-la para adotar a aula — e, no final, se tornariam clientes.
Roberta registrou a metodologia, procedimentos e marca no INPI e passou a oferecer um modelo de licenciamento do Divas Dance.
As alunas não desembolsam nada a mais. Para ter o Divas Dance na sua programação, as academias pagam o dobro do valor de sua própria mensalidade por mês, independente do número de alunas ou turmas.
Antes da pandemia, 39 academias, clubes e centros de treinamento estavam licenciados em Brasília, Goiânia, Buriti Alegre (GO), Palmas, Patos de Minas (MG) e Tapejara (RS), totalizando 1 200 alunas.
Os donos de academias desses outros municípios conheceram o Divas Dance em convenções, palestras ou pela própria rede social. Muitos estabelecimentos fecharam na crise do coronavírus e hoje 14 academias seguem com as atividades para as divas no online ou no presencial.
Não bastava replicar o sistema em outros espaços: era preciso ter gente capacitada a dar as aulas de dança. Roberta montou um treinamento e passou a oferecê-lo como um segundo modelo de negócio.
Desde 2018, a capacitação é online, com seis módulos de preparação e custo de 697 reais para as professoras. A cada semestre é fornecida uma atualização da metodologia. Cerca de 260 profissionais já concluíram o curso de formação.
LONGE DAS AULAS POR CAUSA DA COVID, ALGUMAS DIVAS FICARAM DEPRIMIDAS
A pandemia derrubou em 80% a participação das academias e alunas, e também o faturamento (que em 2019 foi de 250 mil reais).
Assim que o distanciamento social fechou as academias, Roberta passou a disponibilizar gratuitamente aulas gravadas no canal do YouTube do Divas Dance.
Desde março, o número de assinantes subiu de 1 200 para 3 500, atingindo mulheres que vivem em cidades onde não há academias licenciadas.
Ela também ofereceu aulas pelo Zoom. Mas nem todas as academias e divas se animaram.
“A gente até levantou a possibilidade de alguém ensinar as alunas a usar o Zoom, mas muitas academias e até familiares preferiram esperar a crise passar. E, com isso, algumas divas já estão sedentárias — e deprimidas…”
Outra iniciativa foi criar uma plataforma de conteúdo e cursos online hospedada no Hotmart. A ideia é fortalecer esse canal para que traga resultados também ao formato presencial.
As alunas pagam 39,90 por mês para ter acesso às aulas de dança, cursos sobre prevenção de acidentes, yoga, meditação, dicas de beleza e receitas culinárias.
O nome da plataforma, Clube Divas, é o mesmo do e-commerce da empresa, onde são vendidos acessórios e roupas da marca Divas Dance.
DANÇAR E VIAJAR, A DOBRADINHA PERFEITA. PENA QUE A PANDEMIA ATRAPALHOU
As viagens organizadas pela empresa foram afetadas pela pandemia. Em novembro que vem, 85 divas se apresentariam no Disney Springs, em Orlando — segundo Roberta, seria o primeiro grupo de mulheres maduras a subir nesse palco.
Elas também participariam de uma aula no Broadway Dance Center, uma das maiores academias de dança dos Estados Unidos localizada em Nova York.
“Tivemos que adiar a viagem para maio do ano que vem. Com isso, já houve a desistência de 20 alunas… Mas acredito que dá para recuperar. Elas estão empolgadas com essa chance de viajar à Disney sozinhas, sem ter que ficar cuidando dos outros, olhando neto na fila…”
Dentre as atividades extraclasse, as viagens são as que fazem mais sucesso.
“Vamos todo ano a Pirenópolis para um encontro de vitalidade e qualidade de vida”, diz. “Já fomos para Bonito, para o resort Costão do Santinho, em Florianópolis, para Gramado, e a todas as cidades onde o Divas Dance tem unidades em operação.”
Essas viagens, diz, aumentam a conexão entre elas. “É uma forma de as divas se conhecerem e viverem experiências que sozinhas talvez não viveriam.”
O NEGÓCIO PASSA AGORA POR UMA ACELERAÇÃO FOCADA EM MATURIDADE
Em agosto, o Divas Dance foi selecionado em um processo da Neo Acelera para negócios com foco na terceira idade.
Roberta já tinha feito parte, em 2014, do Programa 10.000 Mulheres, um curso com tutoria e consultoria em empreendedorismo da Fundação Getúlio Vargas — mas agora é a primeira vez que participa, de fato, de uma aceleração.
“Os bootcamp online já começaram e estão sendo úteis para comprovar que a empresa está no caminho certo. Por outro lado, quando vejo que já temos uma década de estrada, me pergunto por que não somos maiores”
Parte do motivo, ela sabe responder.
“Empreendo duas empresas, a Divas Dance e também a Vip Training”, diz Roberta. “Muitas vezes, não consigo dar a atenção que gostaria a cada uma. Além disso, enfrentamos uma crise no setor desde 2014, com a chegada das redes de baixo custo.”
Leia também: “As pessoas precisam entender que a longevidade é um mercado. Estamos falando de algo que já está acontecendo”
Apesar de ouvir sempre em congressos que a terceira idade e os negócios focados nesse público são o “futuro”, Roberta acha que o mercado ainda não se sensibilizou para o tema.
“Na prática, os gestores não estão dispostos a fazer mudanças como, por exemplo treinar a equipe para atender essas pessoas.”
A LIGA SECRETA DAS DIVAS. OU: COMO SE FORTALECER EM GRUPO
Roberta diz que o maior impacto de seu trabalho é fazer com que as alunas parem de olhar para trás e sigam em frente.
“É uma época da vida em que as mulheres sentem saudades de tudo: de quando o filho era pequeno e ficava no seu colo, das amigas com quem perderam o contato…”
As viagens ajudam a direcionar esse olhar adiante. A empreendedora descreve a reação de uma das participantes do Divas Dance, num dos cruzeiros organizados pela empresa (já foram seis até hoje):
“Uma vez, no navio, ouvi de uma aluna: ‘Roberta, isso é uma coisa muito doida… A gente acha que não vai mais viver grandes emoções e, de repente, estamos em alto-mar, com um frio na barriga e o coração palpitando!’”
A sensação de pertencer a um grupo ajuda a fortalecer as alunas e a manter os sonhos vivos:
“Às vezes, as divas se encontram na rua e se reconhecem pela camiseta que vendemos na loja”, diz Roberta. “E é como se elas fossem de uma liga secreta. É muito lindo de ver essa identidade que não está ligada a marido ou filhos — está ligada simplesmente a viver bem e se cuidar.”
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