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O Bike Tour levou mobilidade ao turismo de São Paulo apostando no patrocínio para gerar receita

Mirela Mazzola - 15 mar 2017 Daniel Moral organiza passeios turísticos gratuitos em São Paulo e se dedica a projetos para melhorar a convivência urbana. (foto: Ivson Miranda)
Daniel Moral organiza passeios turísticos gratuitos em São Paulo e se dedica a projetos para melhorar a convivência urbana. (foto: Ivson Miranda)
Mirela Mazzola - 15 mar 2017
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Uma infância movida a bicicleta, carrinho de rolimã e confraternizações entre vizinhos, com aquelas festas juninas com fogueira na rua. Nos anos 80, uma atmosfera interiorana ainda pairava sobre a Chácara Klabin, bairro paulistano entre a Vila Mariana e a Avenida Ricardo Jafet, um dos principais acessos ao sistema Anchieta-Imigrantes e ao ABC. Hoje, o pedaço é tomado por prédios luxuosos, como o que foi erguido no lugar da casa dos irmãos Daniel, 36 anos, e André Moral, 42. Os dois são os idealizadores do Bike Tour SP, um passeio de bicicleta que percorre roteiros da capital e que, ao longo de três anos, tornou-se referência em turismo unido à mobilidade urbana.

Os passeios são gratuitos e quem banca o negócios são patrocinadores (empresas que se identificam com a proposta), como Bradesco Seguros, Lanchonete da Cidade e Eventbrite. Os roteiros incluem a Avenida Paulista, Avenida Faria Lima, Parque do Ibirapuera, além das regiões da Vila Madalena, Centro Histórico e Centro Novo.

Os grupos são formados por até 10 pessoas que pedalam acompanhados por dois monitores e com um equipamento de áudio acoplado no capacete, que informa dados e curiosidades dos pontos culturais visitados, em português e inglês. Apesar de não cobrarem pelos roteiros, os sócios pedem dois quilos de alimento não perecível por participante, que são doados ao Núcleo Assistencial Bezerra de Menezes (Nabem) e a Comunidade Evangélica Nova Aurora (Missão Cena).

Quase quatro anos depois, o Bike Tour SP realiza 12 roteiros por fim de semana, com uma equipe de 43 pessoas (40 monitores que recebem por dia trabalhado e três coordenadores), que conduzem 300 participantes. Até agora, mais de 17 mil pessoas já rodaram a cidade a bordo das bicicletas do projeto.

DESCOBRIR A CIDADE DE BIKE FOI UM HOBBY QUE VIROU NEGÓCIO

Daniel é analista de sistemas, com MBA em gestão de empresas pela FGV, e atuou como gerente de sistemas no Banco Itaú por sete anos. Sua debandada do mundo corporativo aconteceu em junho de 2013. Nessa época, mobilidade urbana já era um assunto corrente – falamos de um período entre a inauguração da ciclofaixa de lazer na Avenida Paulista, em 2010, e os primeiros meses da gestão do ex-prefeito Fernando Haddad, que coincidiu com o acidente do ciclista David Santos de Souza, que teve o braço decepado por um motorista. Todo esse contexto aumentou o desejo dele e do irmão, André, de incentivar o uso da bicicleta em São Paulo. E se isso também pudesse incluir acesso gratuito à cultura, melhor ainda.

“Eu queria retribuir o que São Paulo fez por mim quando eu era criança”, diz Daniel. Foi esse desejo que fez a dupla investir os 50 mil reais de suas economias para começar o negócio. Mas ainda era preciso pensar com cuidado em um modelo sustentável.

O conceito do Bike Tour SP ganhou forma de vez quando André, que é arquiteto e tinha uma empresa de instalação de revestimentos, esteve em Barcelona e conheceu os audioguias, aparelhos comuns em museus europeus. Eles representavam o elemento que faltava para estruturar a proposta da empresa. Com a ideia amadurecida, era preciso investir em bicicletas – sete, incluindo as que seriam usadas pelos sócios – e nos audioguias, com conteúdo produzido por uma empresa especializada. Mas o plano de negócios ainda dependia de patrocinadores, pois a ideia era oferecer passeios gratuitos.

“O pior que poderia acontecer era ter de cobrar pelo serviço, mas isso a gente não cogitava. Sempre acreditamos no patrocínio, e o risco era grande”

O primeiro roteiro do Bike Tour aconteceu em 19 de maio de 2013, um domingo de sol, e percorreu a Avenida Paulista e o Centro Histórico, com cerca de duas horas e meia de duração. “Os primeiros passeios foram testes com amigos, amigos de amigos, eu e o André”, conta Daniel. Eram apenas cinco vagas e os irmãos dependiam de um posto de gasolina para servir de concentração e da capacidade do carro de André para acomodar sete bikes, que ficavam guardadas na casa deles.

NADA COMO UM BOM TIMING E PARCERIAS PARA IMPULSIONAR O PROJETO

Três meses depois do início da empresa, uma matéria na Rede Globo foi providencial para que o Bike Tour SP deslanchasse. Formou-se uma fila de espera de 400 pessoas cadastradas no site do projeto, atraindo patrocinadores. Primeiro se interessaram os shoppings Light e Top Center (localizados no Centro e na Av. Paulista), que além de aporte financeiro ofereceram lugar para guardar as bicicletas.

Em setembro de 2013, o Centro Histórico e Paulista foram desmembrados em dois roteiros diferentes. Agora, os passeios incluem Vila Madalena, Avenida Faria Lima, Centro Novo e Parque do Ibirapuera. Os sócios ainda incluíram bikes adaptadas para crianças e pessoas com mobilidade reduzida à frota, que fica estacionada nos pontos de saída dos passeios, como o hotel Ibis Paulista e a administração do Parque do Ibirapuera.

Atualmente, Bradesco Seguros, Lanchonete da Cidade e Eventbrite investem um valor anual na empresa, mas Daniel não especifica o número. O lucro é revertido ao próprio negócio, com investimento em marketing e manutenção, por exemplo – os sócios dizem que ficam apenas “com uma pequena fração”. Outra parceria bem-vinda foi firmada com a rede de lojas Decathlon, especializada em artigos esportivos. Ela cedeu mais 17 bikes para os passeios. Daniel fala do crescimento na procura:

“A maioria dos interessados é paulistana e boa parte volta a andar de bicicleta regularmente depois de participar do Bike Tour SP. São provas de que as pessoas estão buscando reencontrar a cidade”

Durante os roteiros, monitores e coordenadores recebem uma ajuda de custo e alimentação. Embora o condutor principal tenha que ser guia turístico formado, as informações culturais e históricas sobre cada parada estão nos audioguias, que ficam acoplados aos capacetes.

DE GRAFITEIRO E SKATISTA A ARTICULADOR URBANO

“Meu primeiro empreendimento foi vender geladinho na porta do Museu do Ipiranga, com uns sete anos”, conta Daniel. Na adolescência, ele participava de grupos de grafite e skate. Mas foi depois de sair do setor bancário que a carreira dele passou a orbitar iniciativas de convivência e mobilidade urbana.

Hoje, ele não tem carro e, quando as ladeiras não perdoam, usa uma bicicleta elétrica ou pega uma carona com a esposa, Fanny. Os dois são sócios no Eureka Coworking, aberto em 2014 na própria casa do casal, na Vila Mariana. “Chegou um momento que tínhamos praticamente um cômodo para a família na casa toda”, conta. A solução foi alugar a casa ao lado, que abriga a outra metade do Eureka, e ir morar em um apartamento.

Há quatro anos, o Bike Tour pedala turistas e locais por pontos famosos de São Paulo.

Há quatro anos, o Bike Tour pedala com turistas e locais por pontos famosos de São Paulo, como o Centro Histórico.

Trabalhar em uma das 12 estações do Eureka custa a partir de 100 reais por dia e também há salas privativas e de reunião. “Naturalmente, atraímos iniciativas que se relacionam à cidade, à mobilidade e à economia compartilhada”, diz Daniel. Ali também ficam a redação da revista CHK, informativo da região da Chácara Klabin criado por Daniel em 2002, e o Bike Ajuda, aplicativo que disponibiliza uma rede de voluntários e mecânicos e aciona o Samu e a PM, em caso de acidente ou furto de bicicleta. Por enquanto, ele só funciona em São Paulo e no Rio de Janeiro e há 550 usuários cadastrados..

O aplicativo está disponível grátis na Apple Store desde setembro de 2016. Uma investidora apostou no desenvolvimento da ferramenta, mas a ideia ainda carece de patrocínio para seguir Brasil afora. “A ideia surgiu do dia em que estava indo para uma reunião na Faria Lima e o pneu da bicicleta furou. Tive o insight quando alguém na própria ciclovia me ajudou”, conta Daniel.

REFLETIR SOBRE A MOBILIDADE URBANA É UMA ATIVIDADE DIÁRIA

Terrenos subaproveitados também estão na mira de Daniel. Em maio de 2016, ele e duas arquitetas moradoras da Chácara Klabin inauguraram o primeiro Parcão, área em frente ao Metrô Imigrantes com cercamento e circuito de agility para pets, além de aparelhos de ginástica e playground.

Depois de estruturado, o projeto foi levado à Subprefeitura da Vila Mariana, que comprou a ideia e a viabilizou em três meses. Até agora, ela já foi replicada em mais quatro praças paulistanas – duas em Moema, uma na Aclimação e outra em Santana, na Zona Norte.

A variedade de iniciativas de Daniel mostram que a sua maneira de pensar na mobilidade urbana vai muito além de estimular o uso da bicicleta em roteiros turísticos. Ela também passa por assumir a responsabilidade de cada um dentro da cidade e fazer da convivência uma experiência além dos muros de condomínios.

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  • Projeto: Bike Tour SP
  • O que faz: Organiza passeios turísticos gratuitos de bicicleta em SP
  • Sócio(s): André Moral e Daniel Moral
  • Funcionários: 43 (além dos sócios)
  • Sede: São Paulo
  • Início das atividades: Maio de 2013
  • Investimento inicial: R$ 50.000
  • Faturamento: NI
  • Contato: [email protected]
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